You Belong With Me escrita por Fernanda Redfield


Capítulo 14
Capítulo 13: A constância e o refúgio


Notas iniciais do capítulo

Santa madrugada! Só assim para, finalmente, sair o último capítulo!
Hahahahaha

Bem, eu não costumo me prolongar muito nas notas dos meus últimos capítulos... Até porque, vocês estão mais ansiosos para o final do que para os meus devaneios.

Mas, gostaria de dizer que esse capítulo foi muito difícil de escrever. Era como se eu não quisesse dizer adeus a essa história tão apaixonante. Eu, literalmente, me apaixonei pelo que pude criar aqui... Desde a relação das duas construída através da literatura até as nuances de cada personagens e dos temas que eu trabalhei aqui. Foram sutis, eu sei, mas, eu não queria algo pesado (para isso, existe La Petite Mort xD). Mas, eles foram abordados. O preconceito, a aceitação... Enfim, espero que tenham gostado.

Como disse, eu estava bloqueada com esse capítulo e ele somente saiu graças a duas músicas que eu peço, encarecidamente, que vocês escutem: "Agape", Bear's Den e "Somewhere Only We Know", Keane.

Espero que gostem e nos vemos lá embaixo!



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Hermione passara os últimos dias do ano letivo dividida entre lidar com as conseqüências de suas decisões e distanciar-se o máximo de Fleur Delacour. De certa forma, esses seus dois objetivos estavam entrelaçados e ela, mesmo cheia de mágoa e até de arrependimento, conseguiu manter-se longe. Contudo, esse abismo que a separava da mais velha só era possível quando ela se prendia à razão e, também, enquanto não visse Fleur.

A líder de torcida tentou, nos primeiros dias depois da conversa da biblioteca - e do último beijo e do último poema dividido - conversar, porém, em algum momento nos dias subseqüentes, o celular de Hermione parou de tocar assim como as flores que recebera morreram de causas naturais. A morena também abandonou os óculos de grau e o livro de Elizabeth Bishop foi socado para o fundo de sua gaveta de meias. E Hermione só pisou, novamente, na Seção de Literatura Vitoriana quando a quantidade de livros a serem repostos era escandalosa demais para ser escondida de Madame Pince.

Resumidamente, a vida de Hermione Granger continuou trôpega e vacilante mesmo ser a presença apaixonante de Fleur Delacour.

As duas se perderam uma da outra, ainda assim, conseguiram se encontrar sozinhas em seus desamores. Não eram mais as mesmas e não seriam enquanto não se afastassem, de vez. Hermione estava, de certa forma, ansiosa e curiosa em relação a esse momento. Durante todo aquele tempo, acostumara-se a observava Fleur. E, o ano seguinte seria a primeira vez que entraria na Academia de Hogwarts sem procurar pelos olhos azuis cerúleos em cada canto dos corredores, das salas avançadas e do campo de futebol.

E por mais que, racionalmente, desejasse àquilo, emocionalmente, ela se encolhia e sentia o seu coração reclamar apertado em seu peito. Ao mesmo tempo em que a partida de Fleur significava o alívio, ela também denotava o fim. O fim derradeiro e cruel, a realidade se fazendo enxergar por entre as páginas de literatura que trocaram, as juras que proferiram e as citações literárias que dividiram.

O fim delas era real, diferente do fim das páginas de um belo romance literário.  

Hermione sabia que quando chegasse ao fim, ela não poderia fazer como sempre fazia... Não poderia reler essas páginas porque elas a machucariam, não importasse o tempo passado. As páginas de seu romance com Fleur eram intensas como um clássico, curtas como algo contemporâneo, intensas como as páginas de um épico. Talvez, no futuro, as lágrimas se secassem, contudo, o sentimento ainda existiria.

A morena sabia que o peso de sua confiança pendera a balança do relacionamento para o término, entretanto, o sentimento não entregara tão fácil e, mesmo depois de sua escolha e da despedida, Hermione sentira o amor enlouquecendo-a com as possibilidades de um final feliz.

“Possibilidade”.

Uma palavra que não exalava a certeza, assim como tantas outras que a mente de Hermione detestava. Palavras que ela procurava ignorar e que, agora, praticamente eram relembradas e analisadas por sua mente, sempre tão pragmática, em busca de outra coisa que ela não se lembrava de ter pensado até então.

“Esperança”.

Hermione Granger era uma pessoa que se esforçava e alcançava os seus objetivos, porém, pela primeira vez, ela queria que a vida lhe surpreendesse. Ela queria que, de alguma forma, Fleur voltasse para ela... Quando fossem mais maduras, quando não existisse a Academia e as pessoas desprezíveis entre elas... Hermione queria que Fleur voltasse quando ela mesma soubesse o que fazer com esse sentimento.

Esse sentimento era algo que não mudara e, por isso, enlouquecia. Era uma das poucas verdades sobre si que não mudara com a passagem de Fleur pela sua vida... Era uma das coisas que Hermione sentia que ainda lhe pertencia e que, tão cedo, não seria esquecido.

E nessa bagunça de sentimentos, pensamentos, esperanças e realidades, Hermione decidira que o seu último dia de aula não deveria ser o último porque ela não precisava ir. Ela não precisava procurar Fleur, pela última vez, nos corredores. Tampouco precisava de motivos para questionar a já questionável razão que, nos últimos dias, lhe faltava.

A morena estava em casa e os seus pais estavam prestes a chegar para o almoço, ela sabia que teria que se explicar, contudo, tudo o que queria era permanecer deitada. Os seus olhos castanhos estavam perdidos no teto de seu quarto e seu corpo flutuava entre os cobertores de sua cama, Hermione tentava esvaziar a cabeça e voltar a fechar os olhos. Só que, naquele dia, tudo nela parecia sentir saudade de Fleur.

Hermione fechou os olhos e, talvez, até tenha dormido. Ela não sabia ao certo quanto tempo tinha se passado, mas, despertou com carinhos delicados em seus cabelos cheios. A morena abriu os olhos, encontrou um sorriso e um par de olhos castanhos bem semelhantes aos seus. Jane Granger estava sentada no pequeno espaço que ainda restava na cama e a observava, a senhora suspirou e perguntou preocupada:

— O que ainda faz na cama, querida?

— É o nosso último dia, eu sei que passei de todas as disciplinas e não existem muitos livros a serem arrumados na biblioteca. - Hermione dissimulou uma naturalidade que não existia em sua mente e, muito menos, em seu coração. Os olhos castanhos de Jane piscaram, mas, não demonstraram muita coisa, afinal, ela sabia dissimular como a filha. Ainda assim, a mãe sorriu tristonha e sussurrou gentil:

— Você sabe que nunca foi muito bem em mentir, certo?

— O que a senhora quer dizer com isso?! Não tem nada acontecendo, mamãe... - A jovem morena exasperou-se, sentou-se abruptamente na cama e, na defensiva, encolheu o corpo para longe da mãe. Jane observou as atitudes da filha e o sorriso desapareceu, a mulher mais velha deixou que a preocupação chegasse e tomasse a neutralidade de seus olhos. Hermione engoliu em seco diante da postura protetora que a mãe assumiu, Jane respirou fundo e, com a voz leve e compreensiva, disse:

— Eu sei que tem algo acontecendo, assim como você também sabe do que eu falo e, principalmente, de quem nós duas falamos... E eu entendo que não queira dividir algo assim comigo e com seu pai, pelo menos, não nesse momento. Só quero que saiba que estamos aqui, sempre estaremos e só sumiremos se você quiser.

Os lábios de Hermione tremeram, denunciando a força de seu choro contido e a intensidade de seus sentimentos calados. Os seus pais sabiam, sempre souberam e nunca a julgaram, muito menos, tentaram forçá-la a falar. Nas palavras da mãe, a morena encontrou um pouco de calmaria para as turbulências que enfrentava sozinha... E, na forma como a mãe a olhava, compreensiva e acolhedora, ela, ironicamente, encontrou algo de Fleur.

Jane olhava para a filha como se ela fosse o que existia de mais precioso no universo, mesmo diante de algo que era tão difícil de assumir. A sexualidade de Hermione importava, sim, mas, muito mais porque era algo que a morena considerara um fardo do que por ser “diferente” ou digna de aprovação dos pais. Algo doce e quente preencheu o peito de Hermione, mais do que aceita, ela era respeitada pelos pais e, essencialmente, amada.

Ela nunca pensara em dizer e sequer precisou, era próxima o bastante dos pais para deduzir que eles descobririam e que a amariam da mesma forma...

Contudo, Fleur não tinha essa proximidade. A líder de torcida viveu a maior parte do tempo em uma grande casa vazia, distante dos pais e longe daquele tipo de olhar que Hermione recebia da mãe. Ninguém exigiu que Fleur fosse perfeita, mas, ela assumiu essa postura para ser vista pelos pais. Eles a amavam, porém, Fleur nunca teve evidências como Hermione, sempre, tivera.

Os anos que Hermione passara observando a outra garota lhe mostraram toda a solidão e a insegurança da mais velha. Fleur vivia de uma popularidade que não permitia que fosse quem quisesse ser e, quando voltava para casa, não tinha com quem falar... Era compreensível que ser quem era, amar quem amava, a assustasse.

E, somente agora, Hermione a entendia.

De forma irônica e dolorida, foram nas palavras amáveis e carinhosas da mãe que Hermione encontrou as razões para compreender a coragem e, principalmente, o amor de Fleur.

Os jovens olhos castanhos estavam chorosos quando encontraram o seu reflexo amadurecido. Jane sorriu e esticou-se, apanhou a mão da filha e apertou-a entre as suas, Hermione retribuiu o aperto e mordeu o lábio inferior, ansiosa. Jane desviou os olhos da filha, concedendo-lhe um pouco de privacidade, e disse risonha:

— Eu não sei o que aconteceu, mas, eu lhe conheço e sei como é teimosa. Sei também que não quer falar com ninguém, mas, Ginny e Luna virão aqui à tarde. As duas também são teimosas e esperam convencer você a ir ao baile de formatura dessa noite.      

— Você sabe que elas desistirão mais rápido do que eu. - Hermione deixou que o riso amenizasse as suas tímidas lágrimas. Jane sorriu para a tentativa da filha, mas, logo voltou a se preocupar quando viu que ela voltara para as cobertas. A mãe, mais uma vez, afagou os cabelos da filha e se levantou, derrotada. Só conseguia pensar nas conseqüências de um coração partido para alguém tão racional como Hermione Granger, uma vida sem proximidade, talvez? - Mas, obrigada, mamãe.

O agradecimento da filha provocou um sorriso triste nos lábios de mãe. A voz trêmula de Hermione entregou que ela se rendia às lágrimas e Jane, mesmo indecisa, deixou a filha sozinha na escuridão de seu próprio quarto e na insegurança de seu sentimento.

Hermione, enrolada em suas cobertas, só se perguntava se aquela conclusão a respeito de Fleur era o sinal que esperava para ser surpreendida ou se era a vida, mostrando muito cedo, quão errada era fora ao não enxergar, em totalidade, quem tanto amava.    

# # # # #

Como Hermione pensara, Fleur estava silenciosa, em sua imensa casa vazia. Os seus pais estavam trabalhando e Gabrielle estava em uma de suas inúmeras atividades extracurriculares, cabendo a ela o silêncio da sala de leitura com aquele livro em suas mãos e o corpo encolhido na poltrona de seu pai.

Os livros já foram o seu refúgio preferido da rotina insossa e superficial que vivia, neles vivia um mundo em que aparências não importavam, as pessoas de boa índole quase sempre venciam os maus e, principalmente, o amor era a maior força que guiava todos os homens e mulheres da Terra. Através das palavras, Fleur aprendera a acreditar no valor das atitudes e nas essências de caráter. Os livros ensinaram muito a ela... Entretanto, por mais descritivos e belos que fossem, eles não ensinaram a ela o que era amar.

Mesmo tão jovem e prestes a passar por mais uma avassaladora mudança em sua vida, Fleur Delacour tinha a plena certeza que amava Hermione Granger.

A forma como o sentimento continuava intacto em seu peito, pronto para acelerar o seu coração ao lembrar-se da morena - do sorriso verdadeiro que evidenciava o tamanho dos seus dentes centrais deixando-a ainda mais charmosa; do som musical da risada que lhe fazia rir junto, simplesmente por parecer, aos seus ouvidos, a sinfonia mais bela criada pelos homens; dos olhos castanhos, escaldantes como o cobre derretido, que queimava todos os contras que existiam na relação das duas; das mãos que a seguraram e a reconheceram quando já desistia de ser vista de verdade - só evidenciava a intensidade daquele sentimento que não poderia ser descrito de outra maneira que não fosse o amor.

Os livros não a ensinaram a amar, mas, a teoria existia e sequer se aproximava do que Fleur sentia, no momento. Por isso, aquele livro pesava em suas mãos assim como o seu coração pesava em seu peito. Aquele era o último livro sugerido por Hermione, a última obra escrita por Jane Austen e o último livro que Fleur leria antes de deixar a Academia de Hogwarts,

Existiam muitos “fins” entre aquelas páginas e, por isso, ela adiara o final propriamente dito como se pudesse adiar o seu e o de Hermione. Aquele livro era um símbolo e Fleur queria estar presa a ele porque ele ainda a ligava a Hermione, mesmo que não conseguisse enxergar a morena no fim da linha.

Fleur suspirou, para seu desespero, a última página chegara e seus olhos a percorreram. O azul cerúleo estava marejado, não pelo final feliz de Anne Elliot e o seu Capitão Wentworth, mas, sim, pelo seu próprio final. Nas páginas felizes vividos pelos dois protagonistas, Fleur encontrara as páginas tristes do fim amargo de seu próprio romance.

Quando o livro fora entregue a ela, Hermione desejara que aquele final feliz aplacasse o final das duas. Todavia, o que Fleur sentia agora destoava completamente de um consolo ou de algo semelhante à esperança, da mesma forma como Anne, Fleur deixou-se levar por aqueles que a cercavam e diferentemente da protagonista, a vida não lhe trazia quem amava de volta e sim, levava-a para longe.

No ano que vem, a Academia de Hogwarts faria parte de um passado decente e Hermione seria uma porção gigantesca e dolorosa dentro de seu peito... Fleur fechou e abraçou o livro junto ao seu corpo, escurecia do lado de fora da imensa janela da sala e ela sabia que, em algumas horas, voltaria a sua popularidade e as suas aparências pela última vez.

Os filetes de lágrimas mancharam o seu rosto e ela subiu as escadas, a caminho do seu quarto. Em cima de sua cama, o vestido de festa prateado parecia uma viva cascata de águas cristalinas. Fleur Delacour estaria maravilhosa no baile de formatura, como se um coração quebrado não fizesse parte de todo o belo conjunto. Contudo, somente ela sabia o quanto os pedaços quebrados pesavam e cortavam o seu interior.

Mais do que isso, os pedaços de seu coração perfuravam a sua alma e afastavam de quem deveria ser. Tudo o que queria, naquele momento, era ser quem era com Hermione... A garota sonhadora, de sorrio fácil e palavras ágeis. Simplesmente, a garota de Hermione. Fleur se vangloriava de sua independência, mas, queria voltar a sentir-se pertencente a alguém, queria que Hermione voltasse a segurá-la. Queria voltar a ser corajosa o bastante.

Porém, os desejos se foram no instante em que ela pôs o livro em cima de sua mesa de estudos. A dor impulsionou os seus movimentos e as pontas de seus dedos tocaram o tecido sedoso do vestido. O pragmatismo a guiou e ela tomou um banho, assim como se arrumou.

Quando se olhou no espelho não encontrou um rosto realizado e sim, a expressão do fracasso. A sua casa não mais estava vazia e seus pais chegaram com Gabrielle, ainda assim, ela se sentia tão sozinha quanto antes e, sozinha como sempre esteve desde que Hermione a abandonara.

Em seus olhos azuis cerúleos, as lágrimas eram firmemente seguras, contudo, elas derramavam por dentro de si e molhavam o buraco em sua alma e o abismo em seu peito. A saudade a apertava e ela lutava para não se render à saudade. Venceu a batalha e desceu às escadas, os seus pais a olhavam preocupados e voltaram a perguntar se ela, realmente, queria ir àquele baile depois de tudo o que acontecera...

Fleur não respondeu de forma verbal, as palavras não tinham o mesmo valor depois de tudo que acontecera. As ações falaram por si e ela endireitou a postura, olhando para frente e caminhando decidida em direção ao carro.

De todas as coisas que Hermione lhe entregara e de tudo que perdera, uma coisa ficara: a coragem.

Fleur poderia até ter perdido quem amava, mas, não mais deixaria de ser quem era. E era uma garota apaixonada por outra garota, separadas por preconceitos enfadonhos que ainda permanecia em pé e que estava disposta a enfrentar o que ainda tinha em seu caminho... Porque não ir ao baile era o mesmo que fugir dos comentários e dos olhares que receberia, não ir significava, mais uma vez, negar Hermione.

E, mesmo que a morena não visse ou ficasse sabendo, Fleur não voltaria a negá-la. E não a negaria enquanto os pedaços de seu coração cortassem sua alma e ardessem a sua essência, mantendo-a viva e ensinando-a, da forma mais dolorosa, do que era feito o amor.

No final das contas, Ginny e Luna não vieram à tarde e sim, durante a noite, em um horário muito próximo ao do baile. Hermione, assim que as recebeu na porta, soube da intenção delas. As duas estavam prontas para a festa - Luna usando azul celeste e Ginny, vermelho fogo; o perfeito contraste entre os sonhos enevoados e a realidade fumegante - e esperavam carregá-la consigo.

Porém, a morena apenas as observou da cabeça aos pés e sorriu verdadeiramente feliz por elas. Hermione pigarreou, a sua voz sumira durante o choro e o dia na cama, e elogiou:

— Vocês estão lindas.

— E você também pode ficar! Se for agora para o banho, podemos desaparecer com esses olhos inchados e essa cara de choro! - Ginny não tinha qualquer filtro e, por isso, falou tudo de uma vez, sem se importar com o que as palavras provocariam na morena. Luna acotovelou a namorada e franziu a expressão para ela, Ginny revirou os olhos e Hermione, mesmo sentindo cortar-se por inteira, respondeu risonha:

— Acho que não há o que fazer por mim hoje, mas, agradeço a preocupação...

— Tem certeza que não quer ir conosco? Eu sei que pode ser difícil, mas, Rony está indo com Lilá Brown e Harry, finalmente, convidou Cho Chang para algo! Acho que você não conseguirá ficar totalmente triste com esses dois tapados passando vergonha em frente as suas companhias! - Ginny voltou a insistir, forçando-se a parecer animada em meio à preocupação contida em sua voz. Hermione acenou a cabeça de forma negativa e preferiu entregar o silêncio, talvez, se falasse, as palavras viessem banhadas em lágrimas.

No incômodo silêncio que se instalou na sala, Hermione trocou um discreto, mas, intenso olhar com Luna. A loirinha sonhadora, que sabia muito mais do que falava, logo entendeu as razões e as emoções que levavam sua melhor amiga a preferir a casa ao baile.

Na segurança de casa e na escuridão de seu quarto, Hermione poderia entregar-se ao sono pesado pelo cansaço de seu choro e de seus pensamentos ou à insônia diante do peso de suas ações. Em ambas as situações, ela não precisaria enfrentar os olhos cerúleos pedintes ou a bela figura de Fleur Delacour entregando-se, novamente, a ela.

Diante da conclusão a que chegara durante à tarde, Hermione sentia vergonha do que fizera. Ela despedaçara o coração de Fleur porque tivera o próprio despedaçado antes, contudo, o enredo do romance das duas não era feito de vingança e sim, de redenção. Hermione sabia, agora, que deveria ter recolhido os seus pedaços e ter esperado, deveria ter pensado com o coração e sentido com a sua alma... Deveria ter visto nas entrelinhas, interpretado o subtexto e esperado.

Na iminência do baile e na crueldade de suas ações, a esperança não valia de nada. A vida dera um sinal, um grotesco sinal que representava quão imperfeita era para Fleur. A mais velha precisava de uma constante e não de uma turbulência tão grande quanto à própria. E Hermione, com todas as inseguranças de um primeiro amor e todas as incertezas de um futuro, não fora forte o bastante para enfrentar a tempestade.

Hermione caíra na primeira dificuldade e deixara-se contaminar pelo o orgulho ferido. O seu próprio orgulho amargara o seu amor e, principalmente, fora destilado em forma de veneno para Fleur.

Nenhuma das duas era inocente no fim que estendia as garras para elas, mas, Hermione agia sabiamente, como sempre agira antes de Fleur, e, por isso, deixava-a ir.

Afinal, se ficasse, qual seria a sua próxima quebra? Fleur estaria distante no próximo ano e não sabia se resistiria o bastante. Diante daquela falha tão infantil, a morena não mais tinha certeza do quanto machucaria a mais velha na próxima vez.

E tudo que Hermione queria era que Fleur ficasse em pé e voltasse a trilhar o seu caminho, triunfante.

Luna viu cada uma das inseguranças de Hermione relampejar nos olhos castanhos. De certa forma, ela já vira algo do tipo em Ginny. A ruiva também não se perdoava por ter feito a melhor amiga sofrer antes de entender os seus próprios sentimentos, mas, diferentemente de Hermione, Ginny não se preocupava em ser perfeita e sim, em ser o necessário.

E era justamente isso que faltava a Hermione. A morena não entendia que um amor era feito dos erros mais absurdos, dos atos mais cruéis e das palavras mais dolorosas antes de ser convertido para os gestos mais delicados, os beijos mais audaciosos e os “eu te amo” mais sôfregos. O amor era, sobretudo, um conjunto de erros que, quando somados, formavam o certo.

Naquela bagunça em que Fleur e Hermione se converteram, os erros e as lágrimas doíam porque ansiavam pelos acertos e os sorrisos. Aquele não era o fim das duas, não deveria ser e a dor só mostrara que não acabara. Luna, de alguma forma, sabia que Fleur provavelmente se sentia da mesma forma.

Ainda que soubesse muito, a atitude cabia a poucos. Tudo o que Luna poderia fazer, no momento, pela amiga, era deixá-la sozinha e torcer para que aquele cérebro tão brilhante ecoasse algo no coração tão ingênuo e machucado.

Por isso, a loira se levantou do sofá e puxou a namorada consigo. Ginny pareceu não entender o que tinha decidido, contudo, o ano de namoro e os outros de amizade a fizeram confiar na namorada quando Luna a olhou tranquilamente antes de dizer a Hermione:

— Eu suspeitava que isso fosse acontecer... Se tudo ficar muito difícil, ligue para a gente e estaremos aqui em um instante!

— Até parece que eu vou estragar a festa de vocês... - Hermione respondeu aliviada, colocando-se em pé e acompanhando-as até a porta. Ginny e Luna pararam na soleira da residência dos Granger e tentaram, pela última vez, convencê-la com olhares de cachorrinho abandonado. Hermione riu das duas e as empurrou para os degraus. - Eu vou ficar bem, divirtam-se por mim!

A morena fechou a porta antes que as amigas pudessem dizer algo mais. A sua postura voltou a relaxar, mas, os pesos em seus ombros e em seu coração ainda deixavam-na ofegante. Hermione subiu às escadas aos saltos e ignorou os pais que tentavam fazê-la se sentir querida quando tudo que ela queria era se odiar.

A escuridão a recebeu de braços abertos e entregou justamente o que a morena queria: a solidão.

# # # # #

Pior do que os olhares e os comentários que acompanharam Fleur durante toda a noite foi aquilo que sentiu quando viu todos os amigos de Hermione chegar e a morena não. Por mais que a sua resoluta mente já estivesse tentando conviver com a ideia de que Hermione não era mais sua, o seu coração apaixonado ainda sorvia da esperança.

Ela não negara Hermione nem o que era e tinha esperanças de que isso ainda valesse de algo... Quão iludida era? Verdadeiramente machucara Hermione e, no processo, também se machucara. O sorriso que escancarava os seus lábios não chegava aos seus olhos chorosos e os elogios a sua beleza não poderiam ser estendidos ao que tinha dentro de si.

Fleur suspirou, na última hora, decidira que se esconderia na maior parte do tempo e que apenas aguardaria o anúncio de Rainha do Baile. Porém, era complicado se manter desconhecida quando se assumira para toda a escola e agredira o capitão do time de futebol. Essas atitudes eram as poucas das quais se orgulhava no meio de toda a inconseqüência que a guiou. Não podia estar mais feliz diante da expressão de medo no rosto de Roger Davies ao vê-la no baile, valera mais do que qualquer elogio.

A meia-noite se aproximava e o diretor da Academia de Hogwarts, Alvo Dumbledore, já estava em cima do palco pronto para fazer o anúncio que a maioria dos formandos e convidados esperava. Fleur voltou a sua mesa com as líderes de esquadrão e sorriu verdadeiramente quando Cho sentou ao seu lado, acompanhada por Harry Potter e comentou:

— Pronta para ganhar de novo, Delacour?

— Não sei se o corpo discente elegerá uma rainha lésbica e que agride garotos por aí. A heterossexualidade é inerente ao título, assim como a elegância. - Fleur respondeu ácida e o sorriso maldoso nos lábios, Cho riu realizada e até mesmo Harry sorriu de forma tímida. Fleur desviou os olhos dos dois e voltou-os para Dumbledore. O diretor sorriu e anunciou:

— É com prazer e muita saudade que eu venho até vocês nesse momento. Sei que muitos só querem dançar e beber até esquecerem os seus próprios nomes, mas, dois anúncios são necessários. Por isso, vamos conhecer o nosso Rei e a nossa Rainha do Baile!

Aplausos educados e risadas baixinhas foram escutados. Fleur também se permitiu um sorriso diante do humor peculiar do diretor, ela se viu invadida por certa nostalgia e olhou ao seu redor, para o imenso salão da Academia e suspirou. O que se estendia em seu futuro a amedrontava, mas, o que deixava para trás era o que mais lhe machucava.

Se, ao menos, Hermione estivesse naquele baile, poderia se contentar em observá-la como sempre a observou desde que a conhecera. Sentia falta dos olhos castanhos assim como sentia falta de quem era com ela.

— Uma disputa acirrada entre os nossos candidatos a Rei do Baile e que foi vencida somente nas últimas semanas, creio eu que motivada pelos emocionantes acontecimentos envolvendo o vencedor. Bem, sem delongas, o nosso Rei é... Roger Davies! - Dumbledore não parecia muito feliz com o resultado, tampouco, os convidados e formandos que não eram amigos de Roger. Uma mesa próxima batia palmas e gritava de forma exagerada e Fleur revirou os olhos após ver Roger beijar Daphne de forma escandalosa. Ele se adiantou para o palco, gingando e ajeitando o smoking de forma pomposa. Assim que chegou ao palco, ajoelhou-se em frente a Profa. McGonagall que praticamente fundiu a coroa em sua cabeça, Roger a olhou ofendido e ela sequer retribuiu o olhar. Dumbledore suspirou e pigarreou. - Quanto a nossa Rainha, não é surpresa alguma. Ela já era bela e inteligente e, nos últimos dias, também provou que era especial. É com imensa felicidade que coroamos Fleur Delacour como a nossa Rainha do Baile!

Dumbledore estava visivelmente animado ao anunciar enquanto Fleur parecia querer se encolher em sua mesa. Cho a chutou embaixo da mesa e só assim que Fleur levantou-se. Os aplausos eram audíveis, assim como os sorrisos e as felicitações. A maioria do salão a congratulava de forma verdadeira, as pessoas sorriam para ela, verdadeiramente realizadas. Daphne, na outra mesa, cruzara os braços e desatara a chorar.

Fleur olhou ao seu redor, surpresa. O sentimento de nostalgia voltou a tomá-la, mais forte, dessa vez. Cada um daqueles rostos deixaria de fazer parte de sua rotina e, principalmente, Hermione deixaria de iluminar o seu dia-a-dia. A lembrança da morena, tão viva e tão intensa, a fez reagir. Fleur agradeceu, mas, não caminhou para o palco. Os sons avassaladores diminuíram até o silêncio reinar e quando Fleur não escutou nada, fora a sua respiração, ela anunciou:

— Eu agradeço o prêmio, mas, eu não posso reinar sozinha. Por isso, eu não vou recebê-lo ao lado de um homem se eu já tenho minha rainha!

— É isso aí, garota! - Cho gritou ao seu lado e Fleur desviou os olhos da multidão, sorrindo enlouquecida para a amiga. Novos murmurinhos e olhares voltaram a preencher o salão, mas, esses não incomodaram Fleur. Ela segurou a barra de seu vestido e correu através das mesas e pessoas que a observavam surpresas.

Durante o trajeto, ela apanhou o celular e discou o conhecido número de Hermione. Nem mesmo a caixa postal a assustou daquela vez. Ela não deixaria a morena sumir de sua vida tão facilmente. Se Hermione podia ser teimosa, ela mesma poderia ser insuportavelmente insistente. E se o seu perdão não bastasse, ela faria por merecê-lo.

Só não podia acabar daquela forma e, por isso, quando o bipe soou na linha, Fleur respirou fundo e disse:

— Olá, sou eu de novo. Sei que é tarde, mas, eu preciso dizer algumas coisas... Eu vim ao baile e não lhe encontrei. Como provavelmente saberá quando escutar essa mensagem, eu fui coroada Rainha do Baile e fiz o que sei melhor: eu fugi. Mas, diferentemente do que fiz quando lhe deixei, eu fugi das pessoas que não mais importavam. E espero que a minha fuga me leve em direção a você. Eu tenho plena consciência do que fiz e lhe peço perdão, eu... Eu terminei o nosso último livro e... (...)

— (...) E eu queria que o que temos se mantivesse da forma como começamos. Jane Austen foi o nosso início, mas, ela não precisa ser o nosso fim por que... “Você perfura a minha alma. Não posso mais ouvir em silêncio. Preciso falar com você pelos meios que disponho nesse momento. Você partiu a minha alma... Sou metade agonia, metade esperança. Não me diga que é tarde demais, que sentimentos preciosos foram-se para sempre...”* — O bipe cortara o resto da mensagem de Fleur, mas, Hermione não precisava escutar mais nada.

Acordou na manhã seguinte com a voz ofegante e aveludada de Fleur, sussurrando as palavras que não julgava merecer. Hermione se via confusa entre sua razão que pedia para manter-se distante, para não ferir mais alguém e o seu coração que não queria mais saber dos outros quando poderia ter, novamente, Fleur.

A morena tinha os olhos no teto, mas, a mente estava montando planos e o coração estava imerso em fantasias.

O livro, Fleur precisava devolver o livro!

Hermione chutou as cobertas e entrou no banheiro, fez a sua higiene matinal e tomou um banho. Vestiu-se depressa e saiu de casa antes que o relógio da cozinha marcasse sete horas. Ela chegou à Academia quando o zelador Filch abria as portas principais. Ofegante, descabelada e imensamente feliz. Ela até se permitiu ajudar o rabugento zelador e ainda lhe sorriu ao dizer:

— Bom dia!

Filch não a respondeu, mas, ela não precisava. A única resposta que queria poderia vir de Fleur.

# # # # #

Fleur acordou com dor de cabeça e essa não estava relacionada com uma possível ressaca ou com a noite de festa. Ela simplesmente tinha a cabeça doendo porque, aparentemente, estava emocionalmente esgotada e o que sentia se alastrara para o seu corpo.

Mal abrira os olhos e estes já encontraram “Persuasão” em sua mesa de cabeceira. Essa visão lhe lembrou que Hermione ainda não retornara a sua ligação, sequer sabia se ela tinha ouvido a sua mensagem e começava a desejar que ela não retornasse... Não saberia o que dizer diante de uma negativa, não saberia o que sentiria diante de mais uma despedida. Ao enviar, estava tão esperançosa que não se preparara para o pior e, com todas aquelas horas passadas, só podia pressentir o pior.

O seu coração já estava acelerado em seu peito e quase saía de sua boca a cada vez que olhava para aquele maldito livro. Sentia-se ingênua, como uma criança, Hermione não seria capaz de perdoar um erro tão grande tendo, apenas, palavras bonitas como garantia. Agora, não havia mais tempo para grandes atos... Honestamente, depois das flores, Fleur sequer sabia se os grandes atos poderiam compensar a sua tremenda burrada.

Desanimada e ressentida, Fleur levantou-se e se preparou para ir, pela última vez, a Academia de Hogwarts. Ainda existiam alguns pertences em seu armário e aquele livro precisava, urgentemente, ser devolvido. Depois de se arrumar, Fleur o colocou na bolsa e ele pareceu pesar algumas toneladas.

O trajeto foi feito sozinha, ao volante, no silêncio agourento de seu carro. Ao chegar na Academia, estacionou e desceu do carro. A nostalgia e a saudade esmagavam o seu peito a cada passo que dava em direção às imensas escadarias do prédio. Ao subi-las, ela ofegou pela primeira vez desde que se tornara chefe de torcida. Talvez, aquele livro realmente estivesse pesando algumas toneladas.

E nessas toneladas estavam a sua culpa, o seu arrependimento, a sua covardia e a sua dúvida... Todos os sentimentos que a afastaram de Hermione e que, ironicamente, aproximaram-na de seus pais.

Fleur entrou no prédio e decidida, rumou para a biblioteca, pesando na balança se ainda existia alguma vantagem em todo aquele fardo que carregava. Ela daria tudo para se sentir leve, novamente. Ela daria tudo para voltar atrás e enfrentar as coisas de corpo, alma e coração. Ela sabia que faria qualquer coisa para voltar ao tempo e local em que Hermione ainda era sua.

Bem, o local existia e ela parou em frente as suas portas. A Biblioteca de Hogwarts se erguia majestosa diante dos seus olhos, o cheiro de livros novos e antigos ocupou o seu olfato assim como as lembranças - que relacionavam a queda de Hermione no gramado durante o ensaio, o carrinho de livros que ela empurrava pela Seção de Literatura Vitoriana e a sua falsa e desocupada coragem em abordá-la - invadiram a sua mente e despejaram um pouco de carinho no bater tão atribulado e dolorido de seu coração.

Fleur até tentou, mas, acabou sorrindo. As lembranças eram algo que não poderia ser tirado de sua mente e, muito menos, de seu peito.

Ela conviveria com cada um de seus momentos com Hermione e os reviveria até que cansasse ou que doesse.

Relembraria o primeiro beijo desajeitado nos vestiários da Academia, a forma como se sentia invencível por simplesmente segurar a garota de seus sonhos, a sua garota, em seus braços após dar o fora em seu namorado idiota. Também debateria até onde ia o significado do “impossível” se ele era frágil diante de um beijo apaixonado e roubado em uma galeria de arte, as outras obras de amor não eram nada perto do que elas fizeram naquele dia. E pensaria se valia mesmo dormir mais algumas horas, em um domingo, quando se podia surpreender quem amava nas primeiras horas da manhã.

Fleur converteria suas fantasias em lembranças e, através delas, manteria a sua promessa e ensinaria Hermione a patinar no gelo, no inverno. Nelas, não cederia a Roger e, tampouco, se separaria da morena. As flores não seriam cinco e sim, eternas porque, enquanto durasse o que tinham, Fleur deixaria uma flor no começo de todos os dias que passasse com Hermione. Não existiria choro, briga ou abandono.

Nas lembranças fantasiosas, essa seria a realidade.

Fleur retirou o livro da bolsa e o apertou entre os seus dedos, caminhou decidida até o balcão de devolução e Madame Pince, a bibliotecária, ergueu os olhos para os sons de seus sapatos Oxford no piso de madeira. A senhora a olhou através de seus óculos e, sem cumprimentá-la, perguntou:

— Tem algo a devolver?

— Sim... - A voz faltou e Fleur decidiu que era melhor agir do que falar. Ela estendeu o livro sobre o balcão e a sua mão repousou, saudosa e solitária, sobre a gasta capa do exemplar antigo. Fleur só o largou depois de alguns segundos e Madame Pince o apanhou, passou o código de barras do livro e estendeu a ela o comprovante de entrega, durante todo o tempo, os olhos azuis cerúleos não se desviaram do livro que foi pego do balcão e colocado em cima de um dos muitos carrinhos.

Fleur olhou chateada para o comprovante, subitamente, sentindo falta das muitas toneladas que carregou durante todo o trajeto até a biblioteca. Aquele peso a fazia viva porque mostrava que ela tinha o que carregar, enquanto estivesse com aquele livro, ele seria a prova de que ainda tinha algo físico relacionado a Hermione... Contudo, ao deixá-lo ali, transformara-o em um simples livro, sem significados, sem importância...

Será que, um dia, o que sentia se converteria a algo desse valor?

— Srta. Delacour, eu creio que esqueceu algo dentro do livro... - Madame Pince tirou Fleur de seus devaneios ao entregar-lhe, novamente, o exemplar de “Persuasão”. O peso do livro voltou as suas mãos e Fleur o folheou, encontrou uma folha dobrada ao meio que não se lembrara de ter colocado ali. A jovem ergueu os olhos para a bibliotecária e essa piscou, de forma conspiradora, para ela. Fleur arqueou a sobrancelha e Madame Pince, impaciente, revirou os olhos e a empurrou para dentro da biblioteca quando Fleur estava, na verdade, pronta para sair.

Dentro da biblioteca, Fleur apanhou a folha dobrada ao meio. Ela era lisa, simples e branca, não continha qualquer dedicatória e sequer parecia impressa. A folha tremia em suas mãos e o seu coração estava desgovernado em seu peito, Fleur lambeu os lábios e fechou as pálpebras antes de abrir o papel. Os seus olhos se abriram e ela, afoita, leu:

“Ofereço-me para você de novo com um novo coração, muito mais seu do que quando quase o despedaçou (...) Eu tenho amado somente a você, mais ninguém. Injusta posso ter sido, fraca e ressentida também, mas, nunca, inconstante.”*

Não tinha uma assinatura ou qualquer coisa que revelasse a identidade do autor daquele bilhete. Contudo, Fleur conhecia aquela caligrafia redonda e regular, assim como conhecia aquele trecho. Ela ergueu a cabeça tão rápido que os seus ossos se estalaram, olhou ansiosa para todos os cantos da biblioteca, as batidas de seu coração nublavam a racionalidade que ela precisava para se mover. Mais uma vez, Madame Pince a interrompeu e disse:

— Você sabe onde ela está. Ela não poderia estar em outro lugar.

Fleur mal escutara as palavras da bibliotecária e, no instante seguinte, já se colocara a correr por entre as estantes e seções da biblioteca. Ela tinha quase certeza que escutara Madame Pince ralhar com ela antes de sair de seu alcance, mas, isso não importava... Não agora. Algo mais importante a esperava e, essencialmente, voltava.

Durante a corrida, Fleur - que era naturalmente elegante e equilibrada - tropeçou e quase caiu. Os seus pulmões doeram pelo exagerado esforço de respirar e o seu coração não ajudava nada, batendo de forma descompensada em seu peito. Fleur fez mais uma curva para esquerda e quase passou de seu destino, derrapando em frente à Seção de Literatura Vitoriana.

Hermione estava sentada no chão, entre as estantes que abrigavam Jane Austen, Emile Brontë, Oscar Wilde e, sobretudo, o que elas tinham. A morena ergueu a cabeça assim que escutou os sons se aproximarem e quando viu quem era, se colocou em pé.

Hermione sorriu de lado, os seus olhos estavam inchados e ela estava de óculos - as lentes, provavelmente, ardiam ainda mais os seus olhos marejados - vestia uma calça jeans escura, um suéter vermelho de gola em V e tênis nos pés. Ela levantou-se e parou, entre as estantes, sem saber para onde ir ou o que fazer. Fleur se lembrou dela, naquele mesmo local, concentrada em sua tarefa de guardar os livros... As lembranças eram reais e aquele momento, também.

A realidade impulsionou o corpo de Fleur para frente, ela não correu, mas, os seus passos foram rápidos. Próxima a Hermione, a morena abriu a boca e começou:

— Me desculpe, eu...

— Sem mais palavras, por favor. - Fleur sentenciou ofegante antes de interrompê-la. Como dissera, sem palavras. Os lábios se tocaram afoitos e elas demoraram muito para encontrar o ritmo.

O beijo tinha a ansiedade e a saudade em cada ofegar e em cada movimento de língua. Era afoito tal como as mãos trêmulas que procuraram alcançar a outra, para não mais perdê-la. Era quente como o abraço em que se envolveram e se apertaram, esbarrando nas estantes que a cercavam. E era voraz como todos os batimentos cardíacos que ensurdeciam e guiavam cada uma das duas.

Naquele momento, elas esqueceram-se das palavras que as uniram e entregaram-se ao amor que era digno das páginas de um romance clássico.

Elas só se acalmaram quando os seus próprios corações sossegaram e os batimentos, enfim, voltaram a se sintonizar. As bocas só se separaram quando o oxigênio se fez mais necessário. E Hermione só abriu os olhos quando envolveu o rosto de Fleur entre os seus, assim como a mais velha só abriu os seus olhos quando segurou, firmemente, na cintura da morena e junto a sua testa a dela. E depois de abertos, esses olhos não se separaram.

O azul cerúleo, límpido e elétrico, fez casa no castanho, escuro e ansioso.

Os sorrisos brotaram iguais, reforçando a ideia de aquele era um caso clichê de uma alma que se dividira em duas, de pessoas que foram feitas uma para outra, de metades que se encontraram... De um caso de amor.

— Somente três palavras, eu prometo. - Hermione sussurrou em cima dos lábios de Fleur, sentindo a mais velha mordiscar a sua própria boca e respirar profundamente, enquanto apertava a sua cintura e a prensava de encontro à estante. A morena suspirou e Fleur a olhou, ansiosa. Naqueles olhos, Hermione se enxergou tão frágil e, ao mesmo tempo, tão forte. Somente por ela... Somente por Fleur. - Eu te amo.

— Sim, somente essas três palavras... Eu amo você. - Fleur respondeu, sem pestanejar e sem pensar, dessa vez.

Fleur não negou Hermione, assim como a morena se perdoou no instante em que foi surpreendida com o beijo.

As duas se olharam por mais alguns instantes, tentando acreditar no que tinha acontecido e não encontrando razões para explicar o que sentiam e a forma pela qual se resolveram. A única certeza era a de que se pertenciam e de que, fosse o que fosse, elas sempre encontrariam o caminho de volta. E esse reencontro seria, sempre, selado com um beijo.

Exatamente como agora.

Elas se beijavam e, em cada beijo trocado, eram perdoadas, refeitas e aceitas. Elas começaram com palavras, livros e significados, mas... Não precisam delas. Não naquele instante, naquela biblioteca, quando tinham o impossível se desvencilhando em realidade nos olhos uma da outra.

Elas não precisavam de mais palavras quando as mãos estavam entrelaçadas e os olhares conectados. Elas não precisavam mais de palavras quando enfim, pertenciam-se.

FIM

 

* “Persuasão”, Jane Austen.


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Notas finais do capítulo

Antes de me despedir, eu espero, de coração, que tenha conseguido satisfazer ou, ao menos, chegar perto do que vocês esperavam para esse fim!

Muito obrigada pelos comentários carinhosos, as críticas construtivas, as cobranças divertidas e as mensagens de apoio. Eu não teria conseguido terminar mais uma fanfic, em um fandom que não me é tão familiar, se eu não tivesse leitores e leitoras tão maravilhosos. Vocês são sensacionais e You Belong With Me é um presente meu para vocês que me apoiam tanto.

Espero que não me abandonem, pois tenho uma nova Fleurmione engatilhada. Essa se passará no Mundo Bruxo, após a queda de Voldemort e, primariamente, se chamará "The Blackest Day".

Mais uma vez, muito obrigada. Eu não mereço os leitores sensacionais que tenho, a escrita é um passatempo para mim, mas, eu continuo por ser tão bem recebida por todos vocês.

Se quiser, deixa seu review ou a sua recomendação a respeito de toda essa jornada literária a respeito do amor...

Já estou com saudades... Caso sintam muito a minha falta, sigam-me no Twitter (@redfieldfer).

Mais uma vez, muito obrigada. Beijos e nos vemos na próxima fanfic!
Com carinho,
Fernanda Redfield.