Quando se senta na varanda com uma lata de cerveja na mão e o cabelo ainda úmido do banho, ele percebe que já é noite e que as luzes da rua estão ligadas. O chão de madeira ainda está morno debaixo de seus pés e da casa ao lado vem um cheiro molhado de bacon e o som das risadas das crianças. É a primeira vez em muito tempo que Heron para e percebe essas coisas — porque sua vida tem sido uma merda tão grande que ele não se lembra mais de como é estar ali, sentado vendo a noite passar. E essa noite é diferente.

Ele está esperando por ela.

Annie.

Em todos esses anos, ele sempre pensou nela. Pensou em como seria tê-la para si de verdade, não num relacionamento fracassado e à distância — que era o que eles vinham tentando quando sentiam que ainda poderia haver alguma esperança. Pensou em dormir e acordar ao lado dela todos os dias. Pensou em todas as coisas que ela já lhe disse sobre amá-lo para sempre — “e mesmo daqui a dez, vinte ou cinquenta anos, você pode voltar a falar comigo, e não importa se eu estiver casada ou tiver filhos, eu ainda vou te amar e querer te ver” —, embora aquilo lhe parecesse conversa de adolescente. Pensou em não estar mais sozinho. Mas sempre havia algo entre eles e tudo afundava outra vez num buraco escuro e sem fim.

Eles ficavam sem se falar por meses até que um dos dois quebrasse o gelo.

________________________________________________________

A porta de tela geme e bate quando Heron entra de volta em casa. O telefone da cozinha está tocando e ele o atende para ouvir Josh reclamando que eles não saem mais para beber e pegar umas garotas por aí. Josh é seu único amigo de verdade. Ele está escorado ao lado da geladeira enquanto escuta todo aquele melodrama e dá umas risadas, mas precisa dizer que não, que não vai sair essa noite porque precisa buscar Annie na rodoviária às seis da manhã.

“Aquela Annie?”

Sim. Aquela Annie que ele conheceu quando era apenas um garoto idiota.

________________________________________________________

A sala está toda escura exceto pela luz da TV, e sentado ali com os pés sobre a mesinha de centro e a forma quase vazia da lasanha que ele fez no micro-ondas, Heron pensa que não há prazer nenhum naquela vida. Nem o gosto da comida congelada, nem a cerveja gelada no fim do dia, nem um programa estúpido de TV, nem o trabalho bem pago com o qual foi possível comprar o sofá grande e confortável onde ele está sentado agora, nada.

Nenhuma daquelas coisas o faz feliz.

Mas então há Annie.

Ela o ama e desta vez está perto, bem perto.

Heron sorri e se pergunta se ela, afinal, vai conseguir.