Inside escrita por maradyer


Capítulo 4
The Other


Notas iniciais do capítulo

Oi. Boa leitura.



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Enzo vai comigo até a coordenação para pegar a lista de atividades extracurriculares disponíveis. Se participasse de pelo menos três, ganharia pontos em outras matérias. Não eram muitos, mas é melhor do que nada.

Enrolei Will e Aisha o máximo que pude. Sorri para eles e dispensei a carona oferecida. Me perdi no caminho até a coordenação e vi Enzo no corredor. Pedi ajuda.

Havia um papel grudado na parede da coordenação. Estava lisinho, o que mostrava que havia sido recém impresso.

Basquete (esgotado)

Futebol (esgotado)

Líderes de torcida (esgotado)

Handebol

Vôlei

Natação

Música

Pintura

Teatro

Comitê

Havia também outras atividades das quais nunca havia ouvido na vida. Precisava escolher três. Eu odiava qualquer coisa que me fizesse correr por aí ou coisas do tipo. Handebol, vôlei e natação são logo descartados. Me decido por música, teatro e comitê, já que pintura não é meu forte.

Pego meus novos horários. Com o carro da minha mãe ainda batido, não posso voltar para casa dirigindo. Com a nossa recente briga, fui orgulhosa demais para pedir dinheiro para o táxi. Pela manhã sai cedo de casa, o que me fez ter tempo de vir a pé sem me atrasar. Porém agora estava faminta e o caminho até a minha casa demorava pelo menos meia hora caminhando. Estava decidindo comer algo pelo centro mesmo quando Enzo me fez o favor de me oferecer uma carona.

No estacionamento, encontramos seus amigos. Um grupinho de quatro meninos o cumprimenta. Não conheço nenhum deles, por isso apenas aceno de longe. Porém um rosto me é familiar. Tento lembrar de onde, caço em minha mente. Alto, branco, cabelos negros, olhos verdes... o garoto da biblioteca. Aisha o chamou de Travis.

– Vai ter a festa de boas-vindas hoje na casa de Charlotte - um dos meninos fala diretamente para mim. Ele tem cabelos castanhos escuros e olhos pequenos e azuis. - Você deveria ir.

Festa de boas-vindas. É claro. Bem coisa de cidadezinha pequena. Cerveja, provavelmente uma fogueira, drogas, meninos bêbados dando em cima da primeira menina que veem pela frente. Coisas totalmente pacatas de cidades tediosas.

– Eu vou.

– Courtney é nova na cidade - Enzo fala -, mas isso não quer dizer que ela não conhece gente como você, Harvey.

Olhando para aquela rodinha, vejo que todos os cinco meninos tem olhos claros. E todos eram incrivelmente bonitos. Um ponto para Alastair.

– Gente como eu? - Harvey pergunta, fingindo estar ofendido. Há um sorriso desafiador em seus lábios. - Courtney, querida, me diga: você conhece muita gente como eu?

– O suficiente - falo, divertida, arqueando a sobrancelha.

– E o que você sabe sobre pessoas como eu?

– Você são manipuladores, principalmente.

– E o que você acha de pessoas manipuladoras? - ele se aproxima. Está próximo demais. Demais.

– Elas gostam de estar no controle.

– E o que você acha de estar no controle?

– Eu acho que deve ser muito entediante.

– Entediante? - dessa vez não é Harvey quem fala, mas sim outro dos garotos. Seus cabelos são mais escuros que os de Harvey e o tom de azul dos seus olhos também.

– Sim - continuo. - Entediante. O bom da vida é se jogar. Se você manipula, significa que você quer tudo do seu jeito. Nada é surpreendente. Como eu disse: entediante.

– Eu gosto de como ela pensa - o outro garoto, um loiro, fala. Seus olhos azuis são, com certeza, os mais intensos. A fazem lembrar os olhos de Ragnar em Vikings. Sim, são tão intensos quanto os dele.

– Sinceramente, o que você sabe sobre a vida para falar tudo isso? - Travis se pronuncia pela primeira vez. - É só mais uma garota de quinze anos.

– Você deveria tomar cuidado, Travis - Enzo fala, brincalhão. - Courtney anda armada.

– Eu sei o suficiente para afirmar que manipulação não funciona se você busca uma vida satisfatória.

– Uma vida satisfatória - ele ri, debochado. - Você faz o que, psicologia?

– Deus me livre - falo mais rápido do que gostaria. Jamais faria qualquer coisa parecida com a minha mãe. O que eu mais queria era ir embora daquele lugar o mais rápido possível. - Só estou falando que eu acho q...

– Você está falando da boca pra fora. Ninguém aqui tem idade pra dizer o que é ser feliz.

Os garotos estão tensos. Eu até pensei em ir embora sem dizer mais nada, cortar o mal pela raiz, mas não sairia por baixo. Não mesmo. Quem Travis pensava que era?

– Eu sinto muito se você é uma pessoa frustrada, mas isso não significa que todos os outros são como você. Há pessoas que podem dizer, sim, o que é felicidade.

– Então me diga o que você acha que é felicidade?

– Nesse momento é estar bem longe de você.

Enzo segura o meu braço com calma e me puxa um pouco mais para perto de si.

– Acho que já está bom por hoje, não é, Travis? Já implicou o suficiente. Vamos indo, Courtney?

Deixo Enzo me levar até o seu carro. Com a raiva que estou, até esqueço de me despedir dos meninos. Bato a porta com força e vejo Enzo se mexer, inquieto.

– Desculpa pela porta - sussurro quando o carro para em um semáforo.

Ele ri de leve.

– Travis gostou de você, sabe.

– Ele tem uma forma muito estranha de gostar das pessoas.

– Se ele não tivesse gostado, simplesmente ignoraria. Se ele fala, é porque ele se importa. Ele é quieto, mas quando implica é porque gosta.

– Ele é complicado - concluo.

–--

– Você demorou - minha mãe fala quando chego.

– Você não me deu dinheiro para o táxi. Tive que arranjar carona.

– Você não pediu.

Depois das rápidas acusações, me sento a mesa. Eram quatro da tarde. Estava morta de fome.

– E o almoço?

– Tania serviu ao meio-dia.

– Você sabe que eu não estou em casa ao meio-dia.

– Há um refeitório no seu colégio para isso. A próxima refeição é as oito da noite. Enquanto isso, se vira.

Bufo. Reviro a geladeira e os armários. Sou péssima na cozinha e a empregada já tinha ido embora. Decido fazer um ovo frito com bacon mesmo, afinal é a única coisa que sei fazer. Tomo coca, porque não quero água. Depois precisaria correr um bom tempo pra perder as calorias que havia ganhado com esse prato gorduroso.

Mais para o final do dia, revirei meu guarda-roupa atrás de uma roupa boa o bastante para a festa de boas-vindas. Como não achei, me contentei com uma blusa preta escrita em branco people are poison e uma saia rosa. Sem vontade alguma de usar salto, coloquei uma sapatilha azul bic e deixei os cabelos secarem naturalmente, fazendo com que ficassem levemente ondulados. Passei um batom cor de boca e lápis ao redor dos olhos. Nada muito exagerado e nem simples demais.

Enzo veio me buscar não só porque eu estava sem carro, mas também porque eu não fazia ideia onde era a casa da tal Charlotte.

O carro parou em frente a uma grande casa de dois andares branca. Luzes coloridas brilhavam dos fundos e carros estacionavam por todo o quarteirão. Enzo estacionou perto da casa e nós entramos juntos.

– Enzo! - uma voz aguda e feminina chama por Enzo. Ela tem o cabelo loiro claramente pintado, já que é um tom platinado no estilo Targaryen, mas da para ver que seu cabelo era loiro escuro pelo tom das sobrancelhas. Tem olhos azuis, o que parece ser comum naquela cidade. Usa um vestido mega curto azul marinho.

Ela empurra Enzo com força contra a parede e o beija. Não sei como reagir, a princípio. Não me interessei por Enzo da mesma forma que me interessei por Will, mas me parecia estranho pensar que ele tinha uma namorada, já que ele parecia interessado em mim, já que tem sido tão legal e tudo o mais.

Ele sorriu para ela e a abraçou. Quando interrompeu o beijo tocou o seu queijo e voltou a beijá-la. Antes de finalmente parar, fez uma pequena trilha de beijos por seu rosto. Não podia negar que senti inveja naquele momento.

Depois disso, os amigos de Enzo apareceram. Acabei descobrindo que o garoto de cabelos escuros se chamava Thomas e loirinho se chamava Edward.

– Ed, pelo amor de Deus - ele pediu. - Há muitas pessoas que zombam do meu nome por causa daquela maldita saga de vampiros vegetarianos.

– Courtney - repeti para todos eles. - Não Court, obrigada.

Tom e Ed foram pegar bebidas para nós. Charlotte estava pendurada no pescoço de Enzo. Travis estava com a cara de antipático de sempre. Eu realmente deveria ter ido junto pegar as bebidas. Por isso, na primeira oportunidade, me afasto do grupo e me dirijo para o bar montado no enorme jardim dos fundos.

– Qualquer coisa que não seja cerveja.

– Por quê? - uma voz conhecida pergunta. - Cerveja é simples demais para você?

– Porque cerveja me lembra cafajestes - falo. - Sabe, homens que tem namorada e dormem com outras mulheres, esse tipo de coisa.

Will respira fundo.

– Eu e Aisha estávamos dando um tempo. Ela apareceu lá no hotel naquele dia e nós voltamos.

Não adiantava ele tentar explicar. Eu não sabia como encararia Aisha daqui para a frente. Precisava agir naturalmente, por mais difícil que fosse.

– O que você está fazendo aqui? - perguntei. - É uma festa do colegial.

– Aisha me chamou.

– Claro.

– Ei - a voz de Travis se aproximou. Ele segurou meu braço com força. - Enzo está te procurando. Vamos.

Solto meu braço da sua mão.

– Para quê?

– Charlotte precisa de uma menina lá. Vamos logo.

– Não estou afim.

– Courtney, pelo amor de Deus!

– Ei, Travis, ela disse que não quer - Will entra na conversa.

De onde eles se conhecem? Bom, a cidade é minúscula, mas não consigo visualizar nenhum cenário em que os dois estejam juntos.

– Você não opina, Horvat. Já não basta ter tomado conta da vida de Aisha, agora quer tomar conta da vida da novata também?

O que Travis tinha com Aisha, afinal, que o fazia protegê-la tanto? Me sentia tão perdida.

– Travis, se você tem problemas comigo, tudo bem. Agora não fique descontando nos outros...

– Ah, vai se foder, cara. Courtney, vamos logo.

– Eu não quero.

– Jesus amado... Charlotte precisa de um absorvente. Ela não pode abandonar a própria festa.

– Por que ela não pede para uma das amigas dela?

– Charlotte não tem amigas, tem seguidoras. E, de qualquer forma, você foi a primeira menina que eu achei por aqui q...

– Tem muitas meninas por aqui.

– ...que é confiável - ele completa.

Respiro fundo. Olho para Will.

– Essa conversa não acabou.

Travis apontou para Will.

– Te vejo lá fora, Horvat.

E ele me arrasta para longe.

– O que você tem contra Will?

– De onde você o conhece?

– Eu perguntei primeiro - falo.

– Ele namora a minha irmã.

Espera. Deus... a vida dessas pessoas é mais enrolada do que eu pensava.

– Aisha é sua irmã?

Ele assente.

– Por isso que você estava brigando com ela na biblioteca...

– Você estava na biblioteca?

Concordo com a cabeça.

– O que você ouviu?

– Nada importante.

– William está virando a cabeça da minha irmã. Ela não precisa trabalhar, não precisa morar em um apartamento minúsculo. Quando o conheceu, ela se rebelou contra a nossa família. Aquele desgraçado levou minha irmã para longe, assim como o pai dele fez com...

Ele para.

– Com quem?

– Não importa - ele balança a cabeça. - Agora me diga que mau caminho você trilhou para ter cruzado com William Horvat.

– Eu o conheci em um bar - conto. - Nada demais.

– Você dormiu com ele?

– Não creio que isso seja da sua conta.

– Certo. Você dormiu.

– Não - minto. Travis podia contar para Aisha e ela estava sendo uma das pessoas mais legais por ali comigo. - Nós só bebemos. Eu fui embora antes.

– Melhor assim. Se bem que eu não me importaria em dar um soco naquele nariz empinado dele para defender a honra de uma menina.

Rio alto.

– Defender a honra? Em que século você acha que estamos?

– Seria apenas uma desculpa para brigar com ele - Travis ri pela primeira vez. Vejo como seus dentes são brancos e bem alinhados. Apesar da cara de irritado, seu ar de arrogante era muito bonito. - Você deve aprender a abraçar as oportunidades, Court.

– Courtney - corrijo, irritada.

– Eu sei. Só adoro vê-la irritada.

–--

– Então... você tem namorada.

– É. Acho que sim.

– Charlotte - digo, olhando para meus pés.

– Nós ficamos frequentemente, mas não sei se...

– Ah, sem desculpas - forço um sorriso. - Vocês namoram sim.

Havia uma parede de gelo entre nós.

– Tem algum problema?

– Não. Na verdade, ela me parece ser bem... simpática.

Enzo ri.

– Charlotte é muita coisa, mas não é simpática. Não precisa tentar, Courtney, ela não é do tipo amigável. Eu e os meninos já conhecemos ela há um bom tempo.

Suspiro, aliviada. Pelo menos ele sabia com quem estava se metendo.

– Você não parece gostar dela de um jeito diferente.

O sorriso some dos seus lábios.

– Charlotte estava lá para mim em um momento difícil. Não importa o quão dura ela possa parecer com os outros, comigo ela é diferente.

Concordo com a cabeça, sem saber direito o que dizer. Não é como se eu estivesse gostando de Enzo, mas senti como se tivesse perdido algo, uma parte dele.

– Obrigada pela carona - digo, saindo do carro. Não digo mais nada, apenas entro correndo em casa e fecho a porta o mais rápido possível.

Subo as escadas rapidamente e fecho a porta do meu quarto. Depois de escorregar até o chão, respiro fundo, levanto e acendo a luz.

Tem alguém sentado na minha cama. Will.

– O que você... Como...

– O que eu estou fazendo aqui? Como eu descobri onde é a sua casa? - ele completa minhas palavras, já que estou surpresa demais para fazê-lo. - Essas são as perguntas erradas, não-Court.

Tranco a porta antes que minha querida mãe decida acordar e entrar abruptamente no meu quarto. Me afasto até o banheiro. Tiro a maquiagem do rosto, ignorando a presença de Will.

– Não-Court?

– O que você ainda está fazendo aqui? Pensei que tivesse dito que tinha voltado com a sua namorada.

– Não tenho problemas quanto a isso, se você também não tiver.

Me viro para ele.

– O que diabos você está querendo dizer?

Ele não fala nada, mas é óbvio o que está propondo.

– É um ultraje você vir até a minha casa de madrugada, invadir o meu quarto para me oferecer o cargo de a outra.

– Courtney...

– O que você esperava que eu fosse dizer? Eu fiquei com você sem nem o conhecer direito, ok, erro meu. Mas isso não te dá o direito de vir até a minha casa e me tratar como uma das suas vadias.

– Eu não tenho vadias - ele retruca - e eu não estou te tratando como uma.

– Nós ficamos uma vez, Will. Não temos o menor compromisso um com o outro. Vamos manter isso em segredo e ponto. Você não tem que se desculpar, tentar recompensar algo e...

– Eu gostei de ficar com você, Courtney. É isso que eu vim dizer. Eu gosto de Aisha, gosto de estar com ela, mas não do jeito que eu gostei de estar com você.

Balanço a cabeça. Eu sabia que seria mais uma em sua lista. É bem provável que seja um discurso ensaiado que ele já havia posto em prática com muitas garotas. Eu não seria mais uma. Não seria.

Mas Deus, aqueles olhos fixos diretamente nos meus, aquela barba roçando a minha bochecha e aquelas mãos paradas em minha cintura... era tão difícil ir para longe.

– Tudo o que eu quero é uma chance de organizar a minha vida e que você esteja lá.

– Eu não posso ajudar - sussurro. - Eu vou bagunçar tudo.

– Não importa. Então vamos bagunçar juntos.

– Will... não. Vai estragar tudo. Como eu vou encarar as pessoas? Tem Aisha e Travis e...

– Nós vamos dar um jeito. Não ligo se vai durar uma semana ou um mês. Eu sei que você quer tentar tanto quanto eu.

Isso era verdade. Estava enlouquecendo por estar tão perto dele e não poder tocá-lo da forma que eu queria, ter que manter a distância quando na verdade queria jogá-lo ali na minha cama agora mesmo.

Me afasto, vou para o banheiro. Tiro minha saia e minha blusa. Odiava dormir de roupa, preferia mil vezes dormir de roupas íntimas. Demorei no banheiro dez minutos esperando Will ir embora. Quando voltei para o quarto, vi que ele não havia ido.

– Courtney, eu... uau.

– Pensei que você tivesse ido - é tudo o que consigo dizer enquanto seus olhos percorrem o meu corpo.

Não havia mais como negar: eu estava completamente atraída por William Horvat. Me controlar não mudaria isso. Havia ficado um ano afastada do mundo e de tudo que era bom para mim. Havia sofrido perdas demais para uma vida toda. Tudo o que eu queria era ser feliz agora. Não importava por quanto tempo. Eu poderia morrer em minutos, em horas ou em anos. Eu precisava tentar.

– E então - digo, posicionando as mãos no fecho do meu sutiã. - Você vai ficar para o show?

Ele sorri maliciosamente.

– Isso é um sim?

Dou de ombros.

– É um talvez.

– Courtney...

– Você vai ficar?

– Você quer que eu fique?

Havia outra resposta para aquilo? Claro que não. Me aproximei e peguei suas mãos, fazendo-as pressionar o fecho do meu sutiã nas costas.

– Mais do que qualquer coisa.


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Notas finais do capítulo

E então?



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