Inside escrita por maradyer


Capítulo 3
Colegial Infernal


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem.



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Estou novamente em New Orleans. Voltei de uma viagem com meu pai de uma cidadezinha ali perto e Davina nos recebeu com um banquete. Jantamos, rimos e contamos novidades. Naquela noite, minha irmã contou que está noiva de George, seu namorado há cinco anos, e que ele viria pedir sua mão oficialmente após uma viagem nossa em família que faríamos na semana que vem. Meu pai soltou algumas lágrimas e depois riu da sua situação, parabenizando minha irmã. Fiquei feliz por ela estar começando a construir a sua vida independente, mas fiquei triste porque ela nos deixaria.

De qualquer forma, ela nunca nos deixou. Porque foi naquela viagem que tudo aconteceu. George jamais teve a oportunidade de pedir oficialmente a mão de Davina para o meu pai. Davina jamais teve a oportunidade de construir seu futuro independente. Eu jamais terei sobrinhos.

O sangue espalhado pelo quarto...

Acordo suada, meus cabelos grudando na nuca e na testa. A visão do sangue me deixa enjoada. Ultimamente eu não tinha sonhos, mas sim lembranças. E pesadelos. Às vezes eram boas lembranças, mas a morte das pessoas mais importantes da minha vida sempre entravam em foco.

O relógio marcava nove e dezessete da noite. Era sábado e minha mãe tinha saído. Não ficaria sozinha em casa no meu último sábado livre nem que estivesse chovendo canivete.

Subi e tomei um banho demorado, lavei os cabelos e sequei, deixando-os solto. Passei apenas rímel e um batom discreto nos lábios, coloquei um vestido preto e um salto não muito alto da mesma cor.

Quando cheguei em Alastair, me lembro de ter visto um barzinho legal por aqui. Peguei um táxi, falando sobre o bar, e o motorista me levou até lá, sabendo exatamente de onde eu estava falando. Paguei a corrida e desci.

O bar não era exatamente como as tavernas de New Orleans ou os pubs de New York, mas algo como uma mistura dos dois. Era servido apenas bebida e havia algo como saletas, pois uma área era mais popular e outra separada por um compartimento negro dava para uma área mais reservada. A luz era ambiente, dando um ar aconchegante e mais íntimo ao lugar, como luz de velas.

– Bourbon.

O barman se espanta ao ver uma mulher pedindo uísque, mas isso não era raro em New Orleans.

Suspiro ao me lembrar da minha cidade. O blue e o jazz, as apresentações de rua, os turistas com suas máquinas fotográficas e roupas coloridas, até o quarteirão das falsas bruxas, cartomantes e feiticeiras me faziam sentir nostalgia. Nunca acreditei nelas, mas adorava passar por lá. New Orleans é uma cidade tão cheia de cultura e a música exala. A minha cidade. Não me importa se nasci em Alastair e vivi aqui até os onze anos. New Orleans foi minha por poucos anos e com o meu pai sendo músico em uma cidade de música, eu conhecia cada esquina, cada bairro e cada bar daquele lugar. Era como se pudesse abraçar o mundo através da música. O meu mundo.

Infelizmente, estou de volta. Ao constatar isso, viro o uísque em apenas um gole e franzo a testa com o gosto amargo que desce rasgando minha garganta. Apesar da queimação, peço mais.

– Aqui em Alastair, dizem que quando uma mulher bebe com tanta vontade, é porque foi traída ou porque não se importa com mais ninguém além de si mesma.

Me viro para a voz masculina. Ele está sentado na banqueta ao meu lado no bar. O cabelo loiro escuro está bagunçado e os olhos verdes misteriosos e desconfiados são como águas caribenhas. Seu nariz é fino e ele veste um terno cinza, tem cara de seus vinte e três anos, talvez vinte e cinco. Meu radar de canalha apita. Encrenca!, meu cérebro me avisa.

Ele tira o paletó e o coloca na parte de trás da banqueta. Quando ele ergue o braço para pedir um uísque, vejo seus músculos flexionados contra a camisa social branca. Ao ver que ele me olha, dou de ombros.

– Então o seu caso é o segundo.

– Não sei. Talvez o seu charme esteja enferrujado.

Ele ri. Não precisa nem retrucar, porque o olhar que ele me lança e me faz enrubescer e isso é prova o suficiente de que ele não estava nem um pouco enferrujado.

– O que a fez ser assim?

– Você por acaso é psiquiatra ou algo assim?

– Então o seu caso é de psiquiatra? Interessante.

Suspiro.

– Minha mãe é psicóloga. Se for um, dê logo o fora daqui. Odeio psicólogos e afins.

– Para a nossa sorte, sou advogado.

– Ótimo - murmuro, virando outro uísque. - Quando eu for presa por agressão, talvez você possa me defender.

Ele sorri.

– William - ele se apresenta. - Will.

– Courtney - falo e como minha típica apresentação, completo: - não Court, obrigada.

– Tudo bem, não-Court. Me diga o que você faz.

– Nada. Fui arrastada para esse inferno de cidade pela minha mãe e aqui ficarei por algum tempo.

– Hum, problemas familiares. Meu pai me odeia - ele dá de ombros. - Quando ele separou da minha mãe, ela me deu a parte dela e isso o deixou espumando.

– Ele te odeia porque você disputa o poder com ele - opino, ele assente. - Interessante. Minha mãe sempre me odiou pelo simples fato de ter nascido. Morei com ela aqui até os onze e um belo dia meu pai aparece e me leva para longe. Aquele foi, definitivamente, o melhor momento de toda a minha vida.

– Já que você não ficará por muito tempo, não-Court - ele brinca, sinto seu hálito perto de mim. Suspiro ao sentir seu perfume - nós podemos pular algumas etapas. O que você acha?

Ele me puxa mais para si quando eu respondo:

– Concordo plenamente.

–--

Acordo com calor. Olho para meu lado e vejo pele. Uma bela pede definida e levemente bronzeada. O braço de Will está em volta do meu corpo e sua mão me comprime, me puxando. Me aconchego mais em seu corpo e fecho os olhos novamente, desfrutando das lembranças da noite passada. Sua mão pelo meu corpo, as palavras sussurradas em meu ouvido. Havia acabado de conhecê-lo e eu não costumava dormir com caras que não conhecia, mas Will era parecido comigo: filho de pais separados, o ressentimento guardado e o jeito ousado de agir e de usar as palavras. E também, me senti extremamente confortável com ele. Sinceramente, me senti mais confortável com ele do que com qualquer outro.

Levanto ao constatar isso. Nunca mais o veria. Tomo banho na suíte do hotel e volto para o quarto, colocando meu vestido da noite passada. Will havia me contado que quando sua mãe viajava, ele ficava morando temporariamente no hotel. Will parecia ser muito sociável, já eu sou péssima em fazer amigos.

Olho para ele, que ainda dorme. Lindo.

Fecho a porta do quarto de hotel e espero pelo elevador. As paredes do corredor são brancas e agradeço aos céus por ter não carpete no piso, caso contrário o salto afunda. Desço pelo elevador e passo rapidamente pela recepção.

Mas alguém me vê.

– Courtney?! - reconheço a voz de Enzo e me viro. - O que você faz aqui?

Não podia dizer que estava hospedada ali. Ele me levou em casa ontem depois do cara da oficina ter ido buscar o carro da minha mãe ma estrada.

Minha mãe.

– Briguei com minha mãe - não minto, apenas omito. - Decidi dormir em um hotel e esse me pareceu o mais decente nesse buraco dessa cidade.

Olho para ele, curiosa.

– E você?

– Ahm, eu... vim visitar uma amiga.

Sorrio maliciosamente.

– Visitar uma amiga, hein?

Ele fica vermelho e muito fofo. Lindo. Sorrio antes de caminhar até a porta automática.

– Noa vemos por aí, Enzo.

–--

Havia uma biblioteca na rua da casa da minha mãe.

Os exemplares eram grande e pequenos, novos e velhos, coloridos ou não. Algumas capas estavam caindo e o cheiro... Deus, o cheiro de livro era o paraíso.

– Travis, eu estou no meu trabalho - uma menina sussurra. - Sai, por favor.

– Você não precisa trabalhar, A. Giancarlo já disse que odeia você metida aqui.

– Travis sai!

Um garoto de cabelos negros e olhos verdes sai da biblioteca bufando. Uma menina de cabelo loiro brilhante e olhos azuis claros me vê.

– Ahm, desculpe. Em que posso ajudar?

– Estou apenas visitando - digo. - Sou nova na cidade.

– É mesmo? Seja bem-vinda...

– Courtney - completo.

Ela sorri.

– Courtney - ela repete. - Seja bem-vinda, Courtney. Eu sou Aisha.

–--

O colégio. Garotas metidas, meninos metidos, gente jogando na cara dos outros seus bens e falsas amizades. Eu definitivamente odeio o colegial.

Aisha está na minha turma de Inglês Avançado e História Americana, além da aula de laboratório. Encontrei Enzo, que também está na minha turma de laboratório e de Física B.

Tirando isso, o dia foi uma bosta. Aula de Educação Física juntou todas as turmas e foi um tédio. Na saída, então, eu o vejo.

Ele está parado em um lindo carro preto. Sorrio para ele. Sabia que não deveria, mas me aproximo.

– Will, o que você faz aqui?

– Não-Court - ele parece nervoso. - Oi.

– Pensei que você fosse advogado.

– E sou. Eu só vim buscar uma pessoa.

Uma pessoa. Seu tom me intriga, mas desejo não ter descoberto jamais.

Aisha se aproxima de nós com um sorriso incomum no rosto e fica na ponta dos pés para beijar Will.

– Vamos, amor?

Sim. O inferno, definitivamente, era Alastair.


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Notas finais do capítulo

Então?



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