All Out War escrita por Filho de Kivi


Capítulo 44
Mabalo Lokela (Ab Aeterno)


Notas iniciais do capítulo

Quero agradecer ao apoio incondicional de minha amiga Menta! Kiitos! Você sabe o quanto é importante para esse Filho de Kivi aqui!

Não irei me alongar muito nas notas, mas preciso avisar que esse é um dos capítulos mais dramáticos que eu já escrevi. Eu realmente me senti triste ao relê-lo, então...

Bom, não irei adiantar mais nada. Espero que gostem!

Boa leitura!



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...

Ninguém entendeu nada quando três pessoas adentraram o galpão carregando o corpo da Imperatriz. Soltando exclamações de espanto, os reféns em quarentena nada puderam fazer, além de assistir, sem nem ter ideia do que havia ocorrido, a cirurgia que Desmond realizara totalmente às pressas.

O doutor reforçara a todos de sua equipe o pedido que fizera, solicitando que utilizassem em tempo integral todos os equipamentos de proteção a que tivessem acesso. Luvas, máscaras, toucas, a partir de agora, todos os mínimos detalhes precisavam ser revistos. Wales não imaginava que o grupo fosse permanecer a seu lado por tanto tempo, então precisava atestar-se de que eles não iriam se contaminar.

Por medida de segurança, deixara apenas que Marsha ficasse ao seu lado, ordenando a J.J. que organizasse um perímetro ao redor da clareira. Se Bill Flood viesse até eles, precisariam realmente estar preparados.

A jovem Cheever o auxiliara no procedimento, já habituada a situações emergenciais. O médico limpara o ferimento, e para sua sorte, atestara que nenhum órgão havia sido penetrado. Após estancar definitivamente a perfuração, aproximara e fixara as bordas, ponteando algumas vezes, antes de finalizar com uma bandagem triangular semiaberta.

A respiração de Eloise estava fraca, assim como sua pressão arterial, muito provavelmente. O médico então desobstruíra suas vias aéreas, retirando o sangue de suas narinas, resultado da pancada que recebera na face. O nariz fraturado fora posto no lugar, mas aquele era o menor dos problemas. O que o preocupava de verdade era a circulação sanguínea de McIntyre, além do fato de que havia grandes chances do ferimento infeccionar.

Precisava agora contar com a sorte. O que estava ao seu alcance já havia sido feito.

Após o fim da microcirurgia, Desmond deixara sua nova paciente deitada no centro do galpão, sob os olhos assustados das dez pessoas que trouxera a força do Garden. De certo modo a cena chegava a ser cômica. A causa e a consequência estavam agora lado a lado.

— E então?

Fora a primeira coisa que ouvira depois de passado uma hora e meia em que estivera lá dentro. Hanso deveria estar muito preocupado, mas ao invés de aparentar medo ou surpresa, o homem só transmitia ódio em seu olhar. E ainda segurava sua arma da mesma maneira.

— Ela perdeu muito sangue... – Wales sentiu-se tontear, fechara então brevemente os olhos – Eu fechei o ferimento e felizmente o baço está intacto. Mas isso não significa que ela ficará bem. – Alertara – Eu não sei quanto tempo ela ficou sangrando na floresta, e não sei se alguma bactéria... Bom, Hanso, só nos resta aguardar. Observar e aguardar...

— Você pode entrar se quiser, pode vê-la. Mas não toque em nada e muito menos em ninguém. – Ele apontara para a máscara cirúrgica no rosto de Hanso – Assim que sair de lá, troque sua máscara e sua luva. E o mesmo serve para todos! A cada hora quero que renovem os seus EPI’s! E não quero ver ninguém lá dentro por mais de cinco minutos, a não ser que eu autorize!

O médico apoiara-se em seu cajado, o seu rosto estava ainda mais pálido.

— Continuem o que estavam fazendo... – Ele estava disperso e sua visão começava a ficar turva – Preciso ver o Lawrence e a Annie, tenho que...

Desmond fora interrompido.

— Você não tem que fazer porra nenhuma agora! – Exclamara Lizzy Penn – Olha só pra você! Qual foi a última vez que dormiu? – A pergunta era retórica – Você não precisa vê-los agora, e não precisa carregar o mundo nas costas também. Descanse um pouco, pelo menos por alguns minutos... Estamos cuidando das coisas, tudo vai ficar bem.

O olhar de Penn conseguia mesclar impaciência com doçura em uma dose que o cirurgião jamais havia visto. Ele não conseguia negar nada a ela. Além de admitir internamente que seu estado de saúde piorava cada vez mais.

Só mais um pouco. Era isso que pedia. Só precisava de um pouco mais de tempo.

Acompanhando Lizzy, Desmond afastara-se alguns metros da cabana, sentando-se no chão de terra em frente às cinzas da fogueira que fizera na última noite. A tarde já começava a se despedir, e em poucas horas a noite chegaria. Ele estava preocupado, tinha um milhão de coisas em mente, e centenas de tarefas pendentes, mas ao olhar para sua parceira, aquela que o compreendia tão bem, inclusive em suas loucuras, tudo parecera sumir em um piscar de olhos.

— Quer que eu traga um dos sacos de dormir? – Indagara Penn – Seria legal você deitar um pouco.

Wales abrira um sorriso.

— Não, estou bem assim. – Respondera, tomando fôlego – Vou ficar só alguns minutos, preciso ver como Eloise vai reagir, ainda estou analisando se haverá como fazer uma transfusão. Ainda tenho que decidir também como separar as pessoas em quarentena, tenho que entrevistá-los, saber se são sintomáticos ou assintomáticos... Lawrence e Annie já estão na fase hemorrágica da infecção, e precisam ser reidratados constantemente, evitando que...

— Ei! – Penn o interrompera mais uma vez – Calma. Você vai fazer tudo isso, mas não agora. Dá pra ver no seu rosto que você não está bem, e se continuar nesse ritmo... Precisamos do nosso médico bem, firme. – Os olhos de Lizzy se destacavam ainda mais por conta da máscara – Hanso e Olga estão cuidando do perímetro, e sabem muito bem o que estão fazendo. J.J. e Marsha já provaram que podem te ajudar, e eles são bons em seguir ordens... E eu, eu estou aqui. Você sabe que vai sempre poder contar comigo.

Desmond suspirara. Sentia-se aliviado por ouvir aquelas palavras. Penn sempre teria um lugar especial em seu coração. Ele jamais a esqueceria, e sentia que também havia marcado a moça da mesma maneira.

O médico voltara o olhar para as bolsas e mochilas que se amontoavam próximo dali. Todos do grupo que o seguira, trouxera parte de seus pertences, assim como suprimentos e água. Estavam preparados para ficar semanas longe do Garden, se assim fosse necessário. Mas em meio a todo aquele emaranhado, um objeto em especial chamara sua atenção.

O violão de Lizzy Penn. Modelo Kansas, negro com as cordas de aço, o instrumento parecia largado ao lado das demais mochilas.

— Você bem que poderia cantar para mim.

A mulher surpreendera-se com o pedido.

— O quê?

— Eu estou falando sério. – Seguira – Você não está insistindo tanto para que eu relaxe? Cante para mim. Você me contou sua história, disse que era vocalista em Oakland, mas eu nunca a vi cantando.

A mulher meneara a cabeça negativa, exprimindo um sorriso.

— Bom, eu... – Ela então dera de ombros – Tudo bem, foda-se!

Lizzy erguera-se, tomando em mãos o instrumento que carregara consigo durante todo o seu trajeto pela sobrevivência. Após afiná-lo, começara a dedilhar alguns acordes. Desmond a fitava com atenção, seguindo os seus ágeis dedos com os olhos.

— Eu escrevi essa canção aqui no Garden... – Ela parecia estranhamente envergonhada, evitando olhar para o médico, mantendo um bobo sorriso em sua face – Ela se chama Prostitute...

Ela então tocara uma breve introdução, leve, muito diferente do que Wales imaginava.

— Seems like forever an a day... If my intentions are misunderstood. Please be kind, I’ve done all I should. I won’t ask of you, what I would not do. Oh, I saw the damage in you... My fortunate one. The eveny of youth...

Os acordes começaram a ganhar força, a voz de Lizzy saíra mais rasgada, sentimental.

— Why would they tell me to please those that laugh, in my face. When all of the reasons they’ve taught us fall over themselves to give way...

A voz voltara a soar doce. Desmond começara a notar a força que a letra trazia. Ele enxergava Penn totalmente naquela canção.

— So if my affections are misunderstood... And you decide I’m up to no good. Don’t ask me to enjoy them just for you...

A música acelerara outra vez.

— Ask yourself... Why I would choose to prostitute myself. To live with fortune and shame, oh yeah! When you should have turned to the hearts of the ones that you would not save... I told you when I found you. All that amounts to is love that you fed by perversion and pain!

Ela dedilhara mais algumas notas, antes de finalizar sua canção.

— Ainda preciso fazer alguns ajustes... – Ela olhara para Desmond, que passara a aplaudi-la – Foi a única coisa que eu compus depois que essa droga de apocalipse começou... O que achou? – Ela ainda parecia acanhada.

— É linda, Lizzy... Você tem muito talento.

 

[...]

 

A noite caíra. A escuridão chegara e trouxera junto consigo o frio, que tomara todos de sobressalto. Penn acendera uma fogueira, e algumas tochas foram colocadas nos limites da clareira, tentando iluminar o local de forma mais ampla.

Lawrence e Annie estavam dormindo, já haviam tomado mais uma rodada dos inúteis chás paliativos preparados por Wales e Olga, e pareciam estar estáveis. Eloise ainda não havia acordado, mas também não demonstrara nenhuma piora ou alteração em seus sinais vitais. E quanto aos que foram colocados em quarentena, boa parte deles já havia se acalmado. Os Cheever os alimentaram, e ressaltaram que ninguém ali lhes faria mal. Tudo que estavam fazendo era por um bem maior.

Hanso e a ucraniana seguiam cuidando da segurança, carregando suas armas em punho, atentos a toda e qualquer movimentação vinda da floresta. Ao redor do fogo, aquecendo-se enquanto se alimentavam, J.J., Marsha, Lizzy e Desmond, um pouco mais afastado do grupo tentavam distrair-se de alguma maneira, tentando esquecer-se de toda a merda que não parava de jorrar sobre suas cabeças.

Conversavam sobre a vida, sobre o passado, sobre como suas histórias havia tomado o rumo que tomaram, levando todos até aquele momento, a estarem ali, juntos ao redor da fogueira. A tensão não os deixaria, isso era um fato, mas se não fizessem algo para tentar diminuí-la, provavelmente explodiriam por dentro.

— Acho que todos nós já contamos todos os nossos podres... – Marsha raspava os últimos feijões de seu enlatado – E quanto a você, doutor Wales? Não vai dizer nada?

Desmond cobria-se com uma manta grossa, calafrios faziam os seus músculos tremerem. Ele seguia com o rosto coberto por um lenço, e apesar do frio, sentia o seu corpo todo se aquecer. Estava com febre. Sua dor de garganta só aumentava. Assim como as dores nas costas e articulações.

— Bom... Não tenho nada de tão interessante assim para contar...

J.J. refutara.

— O que é isso, cara? Você é sempre tão fechado... Manda aí, conta algo, tipo... Porque você escolheu ser médico?

Apesar de todas as dificuldades, Desmond conseguira sorrir. Não era um sorriso alegre, era apenas uma movimentação muscular espontânea, vazia de qualquer tipo de sentimento. O questionamento de Cheever o fizera voltar no tempo, em uma época quase esquecia pelo cirurgião.

...

Bom... Eu tenho uma lembrança muito marcante de quando eu tinha cinco, seis anos... Ela fica na minha cabeça quase que como sombras, e às vezes em nem sei dizer se são memórias reais, ou apenas o meu cérebro transformando algo que me fora contado em uma memória efetiva.

O meu pai, Anthony Hall, nasceu no País de Gales, onde cresceu e viveu quase toda a vida. Ele se casou com trinta e poucos anos com uma dançarina de Jazz. Ele sempre me contou que ela era extremamente amorosa, e tinha um talento incrível... Os meus pais eram envoltos de talentos artísticos, já que Anthony era um artesão muito bem quisto em sua terra natal.

Ela engravidou e ainda assim continuou dançando, se apresentando em teatros... Era uma vida pacata, mas feliz. Não havia do que se reclamar. Bom... Mas é aí que eu apareço...

Quando ela alcançou o sétimo mês de gravidez, enquanto voltava para casa depois de um jantar... Eu nunca soube ao certo o que ocorreu, e gosto de pensar que meu pai não havia bebido nada naquela noite. Digo isso porque eles bateram o carro tão forte em um poste, que o meu velho foi lançado metros longe. Teve um aneurisma severo, comprometeu partes importantes do lobo esquerdo do cérebro... Ele ficou com sequelas pelo resto da vida.

Já a minha mãe, ela não conseguiu suportar muito. Emily Hall faleceu no hospital algumas horas depois, mas por um “milagre”, já que foi assim que a coisa fora encarada na época, conseguiram salvar a criança... Conseguiram me salvar.

O meu pai nunca mais foi o mesmo, ele não podia cuidar de mim por conta de todas as dificuldades que sua lesão lhe trouxera, então contara sempre, durante toda a minha infância, com a ajuda de sua mãe... Minha avó Sophia. Como ela tinha recursos, decidiu que era melhor nos mudarmos para os EUA.

Ela acabou sendo a minha mãe, cuidando de mim. Anthony nunca pôde ser o meu pai de verdade, ele mal conseguia segurar um copo. E é nesse ponto que minha lembrança finalmente surge...

Eu havia acabado de chegar da escola, e diferentemente das outras vezes, fora Paul, um amigo do meu pai, quem fora me buscar. Tudo estava muito diferente, eu sentia isso, mas não conseguia imaginar o que havia acontecido.

Quando eu cheguei, vi Anthony sentado, como sempre fazia, olhando para fotos antigas, relembrando um tempo que não voltaria mais, um amor que perdera em uma noite longínqua, depois de um jantar. Só que não era para fotos de Emily que ele estava olhando.

Suas mãos tremiam, mais do que o habitual, e os seus olhos estavam vermelhos. Ele chorava tanto que parecia que iria se afogar nas próprias lágrimas. Eu percebi um vazio na casa, um silêncio incomum. E então perguntei por minha avó Sophia. Por minha mãe do coração...

Ela havia sido encontrada caída no banheiro, tomada por um mal súbito que lhe tirara a vida. Tentaram reanimá-la por quase uma hora... Mas ela não resistiu. Morreu com um sorriso no rosto, foi o que me disseram...

Eu nunca havia sentido uma dor tão grande quanto aquela. A notícia caiu como uma bomba, e eu era apenas uma criança de cinco anos, não sabia muito sobre a vida. Sabia que “papai do céu” levava as pessoas para junto dele, mas não conseguia aceitar o fato de que jamais veria minha avó de novo... Não me parecia justo. Não era justo, não para uma criança. Não para uma criança criada por um pai que jamais coseguira segurá-la no colo.

Eu cresci com aquilo na cabeça, com aqueles sentimentos presos no meu córtex. Nunca desenvolvi nenhuma habilidade artística como o meu pai ou minha mãe, mas decidi que cuidaria das pessoas... Passei a minha vida inteira me dedicando para chegar ao momento da minha formatura, como cirurgião geral, que fora minha primeira especialidade... Meu pai nunca me vira fazer o juramento. Eu não pude cuidar dele...

Não era por mim... Era por Anthony, por Sophia, por Emily... Vivi uma vida inteira tentando de alguma forma compensar o que fizeram por mim, tentando fazer com que sentissem orgulho, mesmo eles não estando mais aqui.

...

— Depois de tanta coisa... – Vincent direcionava o olhar fixamente para as chamas da fogueira – Nem sei o que eles pensariam de mim...

O jovem Cheever outra vez se interpusera.

— Você tá de sacanagem, não é? Porra cara. Olha só o que você fez! Olha o que tem feito pelo Garden! – J.J. abrira os braços – Se não fosse por você, nós...

Dois disparos oriundos da negritude da floresta interromperam subitamente as palavras do alegre J.J. Cheever. O primeiro lhe acertara o ombro direito, expandido por conta do gesto que fizera. O segundo atravessara o seu peito, a poucos centímetros do osso esterno, fazendo com que um jato único de sangue fosse espirrado para frente.

Ele então caíra de costas, sem conseguir terminar a frase que iniciara.

— NÃO! – Vociferara Marsha, cuspindo as palavras enquanto se lançava sobre o seu irmão tombado. Ela entrara em total desespero, sacudindo J.J. pelos ombros, tentando acreditar que ele pudesse voltar.

Ficara exposta demais. Não pensara na continuidade do caos.

O terceiro disparo vindo das sombras atingira a nuca de Marsha Cheever, tirando-lhe a vida imediatamente. A bala que perfurara o seu occipital, lançara longe massa encefálica mesclada ao sangue da jovem, que caíra ao lado do irmão, ainda segurando sua mão.

Sniper! – Bradara Olga, lançando-se ao solo em um rolamento, enquanto sinalizava para que todos se protegessem.

Hanso começara a disparar sua metralhadora a esmo, tentando encontrar o direcionamento daquele que acabara de assassinar os dois irmãos. Apesar de não ter nenhuma ideia de onde o atirador poderia se encontrar, conseguira intimidá-los por um momento, por conta do seu alto poder de fogo, dando espaço para que Lizzy ajudasse Hall a se esconder. Naquele mesmo momento, Olga simplesmente desaparecera.

Penn sacara sua arma da cintura, arrastando Vincent Hall, bastante debilitado, para longe do centro da confusão. O médico ainda tentara se aproximar dos Cheever, queria atestar se podia fazer alguma coisa, mas fora impedido por Lizzy, que o conduzira ao interior do grande galpão.

Ele ouvira mais tiros, mas não conseguia saber se vinham de Hanso ou daqueles que tentavam invadir o local. Lizzy posicionara-se perto da janela, tentando enxergar o que estava acontecendo.

— Não dá... Não consigo ver nada daqui! – Exclamara Penn.

As vozes dos sequestrados, mais agitados do que nunca, além de totalmente amedrontados pelo tiroteio do qual não faziam ideia da motivação, deixava a vocalista ainda mais nervosa. Nunca havia passado por algo semelhante.

— O que tá acontecendo lá fora? – Patricia, com os punhos amarrados para trás, arregalava os olhos enquanto tentava minimamente compreender a celeuma – São os Salvadores? Eles estão invadindo?

Apoiado em seu cajado, Hall aproveitara para verificar o estado de Eloise. Ela permanecia desacordada, e o inchaço em seu abdome não se expandira. Erguera-se então, com dificuldades, dirigindo-se até a posição de Penn.

Sem olhar para Patricia, apenas fitando o exterior da clareira, onde o conflito armado se dava com maior fervor, Vincent respondera ao questionamento da mulher de Lawrence, também replicado por quase todos naquela sala.

— Bill Flood esfaqueou nossa Imperatriz... Juntou aqueles que não mais concordavam com a sua liderança, e marcharam até aqui... Não para salvá-los, mas sim para matar todos nós. J.J. e Marsha foram atingidos, não sei se morreram, mas... – Ele engolira a seco as próprias palavras – Ele acha estar fazendo isso pelo bem da comunidade, mas na verdade, toda essa loucura está sendo ocasionada pelo fato de você estar aqui...

Peck nada dissera, apenas seguira com os olhos fixos no médico.

— Bill não consegue aceitar o fato de que estamos cercados por uma doença que pode nos matar a qualquer momento... Ele não consegue aceitar o fato de que você possa estar doente, então resolveu, precisou, escolher alguns culpados para isso... Eu, Eloise, meus amigos... É mais fácil para ele assim.

Mais disparos ecoaram.

— Ele não vai conseguir. – O médico proferia suas palavras com calma, mantendo um profundo vazio em seus orbes – Quando isso acabar ele verá o quanto estava errado, e vai ter que viver com essa culpa para sempre... Porque se eu sobreviver a essa noite, se eu conseguir salvar vocês. – Ele enfatizara – O Garden nunca mais será o mesmo!

— ACABOU!

Um grito ecoara do lado de fora do galpão. Hall manqueteara em direção a Penn, observando a movimentação externa.

Olga trazia Bill Flood com o pescoço envolto em um de seus braços, enquanto direcionava uma faca abaixo do queixo do caçador. Com os olhos queimando em raiva, a ex-militar ucraniana gritara algumas palavras em sua língua natal, ameaçando o hostil sujeito a cada momento.

— Eu sei que vocês estavam em cinco! – Prosseguira em voz alta – Eu matei um e capturei Bill! Hanso matou outro! – Vociferara – Entreguem-se e pouparemos suas vidas! Se tentarem alguma coisa, se atirarem em mim, acreditem, mesmo que me acertem na cabeça eu ainda conseguirei cravar essa faca tão fundo no Flood que nem mesmo o doutor Wales conseguiria retirar! – Ameaçara. Seu sotaque mais carregado do que nunca – Se o Flood morrer, essa bobagem de vocês passa a não fazer mais sentido!

Movimentações na floresta foram ouvidas.

Sasha e Malcolm dirigiram-se, de braços erguidos em sinal de rendição, até o centro da clareira, próximo a fogueira. Largando os rifles que traziam, os dois movimentavam-se lentamente, visivelmente assustados pelo resultado da operação. Olharam para os corpos de J.J. e Marsha, cerraram os olhos. Sabiam que aquilo havia ido longe demais.

Uma saraivada de disparos, em sequência. Sasha e Malcolm tombaram, fuzilados pela metralhadora de Hanso. O corpulento lenhador semicerrara os olhos, mantendo a mesma postura, como que se ainda houvesse perigo eminente. Por estarem próximos, Olga e Bill acabaram sendo atingidos pelo sangue que saltara das dezenas de buracos de bala nos corpos recém exterminados.

O homem então caminhara até Flood, seu velho amigo, parceiros desde que o Garden se estabelecera naquele bosque. Como tanta coisa havia mudado em tão pouco tempo?

Apontara o cano de sua arma para a testa do caçador, que perdera o fôlego pelo golpe da ucraniana, e nem mais conseguia se pronunciar. Os dois se olharam, não se reconheciam mais. Seria sem culpa e sem dor.

— Hanso, não!

Antes que pudesse acabar com a raça de Bill Flood, Vincent Hall o impedira, sinalizando com a mão direita espalmada, pedindo que nada fizesse. O homem chegara a hesitar, mas após respirar profundamente, retirara o dedo do gatilho, permitindo que o médico se aproximasse.

— Olga, amarre-o! – Solicitara.

A contragosto, fitando com o canto do olho, a soldado ucraniana questionara a decisão do cirurgião.

— O que pretende fazer, doutor? – Questionara com seriedade – Ele é o responsável por tudo isso...

Uma tosse chamara a atenção de todos. J.J. mexera o tronco, cuspindo uma boa quantidade de sangue pela boca. Por mais incrível que pudesse parecer, o garoto ainda se encontrava consciente.

Hall lançara-se em sua direção, deixando de lado tudo o que estava fazendo. Elevara a cabeça do garoto, tentando impedir que ele se afogasse com a própria hemorragia. Tocara os dois buracos de bala, de calibre considerável, grande o bastante para causar um dano interno irreversível.

— Lizzy! – Gritara Vincent – Corra até o galpão! Traga a minha mochila, terei que fazer uma cirurgia aqui mesmo! Ele perdeu muito sangue, talvez precise de uma transfusão... – Tocara o rosto do garoto, pálido e cada vez mais frio – J.J., qual o seu tipo sanguíneo?

O garoto estendera uma das mãos, tocando-lhe de leve o peito. Ele balançara a cabeça negativamente, já conhecia o seu destino.

Hall passara as mãos sobre os cabelos, despenteando-se nervosamente. Seus olhos começaram a se encher de lágrimas. Não fora possível conter sua emoção.

— Eu sei que eu vou partir, cara... – A voz de J.J. saíra tão fraca que Hall aproximara o ouvido dos lábios do jovem, para que pudesse ouvi-lo melhor – Eu nunca me separei da minha irmã, dessa loirinha chata... Não seria agora que eu deixaria ela partir sem mim... – J.J. utilizara a pouca força que ainda continha para segurar a mão de Marsha, morta ao seu lado.

— Se cuida, tá legal? – Hall apenas balançara a cabeça, chorando copiosamente – Eu prometo que dou um alô para o seu Anthony, pra dona Emily e pra vovó Sophia... – Vincent soluçara algumas vezes, confirmando em um gesto – Talvez demore um pouco para encontrá-los, soube que tem muita gente nesse tal de paraíso...

O garoto esboçara um sorriso. Com a mão livre, tocara o topo da cabeça de Vincent, fazendo com que os seus olhares se encontrassem.

Des... Te vejo em outra vida, brother!

Seus olhos se fecharam. Sua vida se esvaíra. J.J. Cheever estava morto.

Vincent Hall abraçara o amigo, chorando em meio a gritos raivosos. Sentira o toque suave das mãos de Lizzy Penn em suas costas, tentando reconfortá-lo. O baque fora muito grande. O garoto não merecia ter tido aquele final.

Depois de cerca de um minuto deixando-se consumir totalmente pela dor, Hall sentira suas lágrimas secarem. Tomara um pouco e ar, encarando as estrelas daquela noite fria. Deitara o cadáver dos Cheever, um ao lado do outro, ainda de mãos dadas. Fizera questão de dar um fim digno a suas vidas, não permitindo que se transformassem nos carniceiros que tanto combateram.

Bill o encarava sem nada dizer. Com as mãos amarradas e uma mordaça na boca, ele apenas fitava o médico, os olhos quase saltando de seus lacrimais. Vincent não conseguia imaginar o que se passava em sua cabeça. Mas também não importava.

Ele dera dois passos em direção ao caçador, ao responsável pela morte de um de seus melhores amigos em toda a vida. Olhara-o por alto, com ódio, uma fome de vingança incontrolável. Mas preferira engolir todos aqueles sentimentos. Precisava fazer algo.

Algo importante.

— Olga... – Sua voz tremulara – Venha comigo, nós vamos voltar para o Garden... – Ele então olhara para Flood – E vamos levá-lo conosco.

 

[...]

 

Aqueles que haviam permanecido na comunidade não dormiram por um só segundo. Os tiros há distância havia alcançado os seus ouvidos, e a expectativa para saber que fim o combate alcançaria, fizera com que todos permanecessem de olhos bem abertos.

Surpreenderam-se, é claro, ao avistar a dupla que retornara instantes após o cessar dos disparos. Hall exigira que os portões fossem abertos, e acuados, sem entender ao certo o que havia ocorrido, os moradores permitiram sua entrada.

Os dois caminharam em silêncio, arrastando Bill Flood pelas cordas que lhe prendia os braços e pernas, além de sua boca, que também fora amordaçada. Um aglomerado começara a se formar ao redor dos dois. Olhos assustados os encaravam, não havia como saber o que iria ocorrer.

— Alguns de vocês podem não saber ao certo – Bradara Vincent. Suas sobrancelhas arquearam-se sobre os olhos semicerrados –, mas essa noite o meu grupo foi atacado por cinco pessoas armadas! Nós nos defendemos e alguns conseguiram sobreviver! J.J., Marsha, Ted, Malcolm, Ferdinand e Sasha... Eles morreram agora a pouco, em um combate que não precisava ter sido iniciado.

O silêncio da madrugada fazia sua voz chegar ainda mais longe. Todos agora o ouviam com atenção.

— Bill Flood – Ele apontara para caçador, que fora obrigado a ficar de joelhos por Olga – esfaqueou Eloise McIntyre, a Imperatriz de nossa comunidade, para lhes fazer acreditar que eu representava perigo a vocês, e que estava mentindo sobre tudo! Mas a verdade é que o meu único erro foi achar que vocês não teriam a capacidade de compreender a gravidade em que nos encontrávamos...

— A verdade é que eu estava com medo... – Confessara – E ainda estou, na verdade. Tenho medo de não conseguir controlar essa epidemia, de não conseguir evitar que o Garden se destrua por dentro, de partir sem a ter certeza que haverá uma continuidade, que a vida aqui seguirá plena...

— Acho que nas atuais circunstâncias, eu terei que assumir provisoriamente o posto de liderança, até que a Imperatriz consiga se recuperar plenamente... E uma das coisas que posso lhes garantir, é que assim como ela, lutarei para que não voltemos ao barbarismo! Para que não tenhamos mais doses de sofrimento acéfalo, como o que ocorreu essa madrugada...

Vincent respirara profundamente. Suas feições seguiam fechadas.

— Se tem uma coisa que aprendi com Eloise, é que ser líder não significa fazê-los felizes. E muito menos fazê-los gostarem de nós... A prioridade número um é não permitir que o barbarismo impere! E se isso significa mentir para vocês, para que as coisas certas pudessem ser feitas, ou sequestrar um grupo de pessoas durante a noite para poder salvá-las, marcar suas costas com uma lâmina, ou até mesmo condenar a própria irmã a morte... Bom, então é o que deve ser feito!

— O ataque violento dessa noite me faz lembrar que esses momentos de ódio descontrolado, animalesco, estão dentro de nós o tempo inteiro, apenas aguardando para ser liberado... Devemos ficar juntos, ajudando uns aos outros, isso é o certo a se fazer! Isso nos deixará seguros! – Ele erguera uma das mãos – Temos uma guerra contra Negan para vencer! Mas como conseguiremos fazer isso se nem ao menos conseguimos nos unir para combater uma doença?

— Peço que me ajudem... Me ajudem a passar uma borracha sobre tudo isso! Me ajudem a reconstruir essa comunidade! Me ajudem a combater essa doença, mas principalmente... Me ajudem a combater o demônio dentro de nós mesmos! Podemos derrubar qualquer barreira... Basta acreditarem que eu não sou seu inimigo! Estamos do mesmo lado!

Hall sinalizara com a cabeça, pedindo que Olga arrastasse Bill Flood para mais próximo de si. O médico retirara a pistola da cintura, arrancando exclamações assustadas do público.

Após olhá-lo por alguns segundos, jogara a pistola de lado, voltando a falar.

— Eu não vou matá-lo, Bill... Não quando temos tantos inimigos em comum. Uma vez eu ouvi um grande líder dizer “segurança em números”. Agora vejo o quanto isso faz sentido! – Flood arregalara os olhos, não conseguia compreender a atitude do médico.

— Precisamos de cada um de nós! – Prosseguira – Todos têm um papel importante a desempenhar. Está na hora de nos juntarmos, ou então acabaremos nos destruindo! O mal está a nossa porta, nos rondando a todo o momento. Os Salvadores estão lá fora! O vírus está aqui dentro! Eles já mostraram o quanto são perigosos. Esse não é o momento para matarmos uns aos outros...

— É um momento para nos unirmos. Para derrotarmos os Salvadores, para banirmos essa droga de doença! Para silenciar todos os nossos medos de uma vez por todas! O “cada um por si” não irá mais funcionar. Se não pudermos viver juntos, então vamos morrer sozinhos!

Alguns moradores começaram a puxar palmas. Timidamente, o nome Desmond Wales começara a ser aclamado pelo público. O médico voltara a olhar para Bill Flood.

— Somos mais fortes do que isso! Fazer uma coisa ruim, não necessariamente irá fazer de você uma pessoa ruim. Se eu tivesse me livrado de você depois do seu erro... Pense em todo o bem que poderia ocorrer por suas mãos e que seria simplesmente apagado. Você não entende? É isso que estamos fazendo aqui! É isso que a Imperatriz sempre pregou!

As vivas se ampliaram. Gritos em coro de seu nome começaram a ecoar. Havia uma esperança para o Garden, e Vincent Hall conseguira resgatá-la do fundo do poço.

 

*****

 

[DIAS DEPOIS]

Assim como Hall pregara, ocorrera.

A comunidade se unira após o marcante discurso do médico, ajudando-o a cuidar dos doentes, na tentativa de evitar que o vírus se espalhasse. Daqueles que foram postos em quarentena, apenas quatro apresentaram sintomas, sendo separados assim que fora identificado.

Hall permitira que Patricia visitasse Lawrence em seu leito de morte, fazendo com que a ex-enfermeira da comunidade finalmente compreendesse que Vincent jamais fora o seu inimigo, e muito menos vilão. Depois que o seu marido morrera, Peck passara a auxiliar Hall em seus atendimentos, dedicando-se novamente ao trabalho.

Annie também se fora, vinte horas depois do falecimento de Lawrence.

Eloise, forte como um touro, se recuperava de forma assustadora. Acordara um dia após os conflitos armados, e apesar de protestar, seguira as indicações de seu médico, mantendo-se em repouso, tentando evitar piorar de alguma maneira. Não havia nenhuma infecção aparente, o inchaço na região diminuíra. Em algumas semanas talvez ela já pudesse retornar a normalidade de suas atividades.

Bill ficara sob custódia, sendo vigiado de perto por Hanso, ajudando nos trabalhos braçais, além de carregar e enterrar os corpos dos mortos. Desde a fatídica noite, não voltara a trocar uma palavra sequer com ninguém na comunidade.

Olga passara a cuidar da segurança, organizando as rondas, afastando os errantes, e liderando pequenos grupos de busca, principalmente para não deixar que faltasse água. Além disso, passara também a treinar aqueles que não sabiam atirar, visando os possíveis confrontos futuros contra os Salvadores.

Já Lizzy dedicara seu tempo a uma tarefa muito importante. Ela cuidara de Vincent depois que o médico piorara, depois que não tivera mais forças para se manter de pé. Seguira suas ordens, atendera aos seus pedidos, e ajudara a comunidade a seguir unida e organizada. Justamente como Hall queria.

Fazia três dias que ele se encontrava deitado na maca, isolado na mesma cabana em que cuidara dos primeiros infectados. As dores no corpo alcançaram um nível inimaginável, comprometendo suas articulações e impedindo que ele pudesse se mover. Além disso, em meio às crises de tosse, Vincent já começava a expelir sangue, juntamente a sua saliva.

Todos os dias, no mesmo horário, Elizabeth Penn se dirigia até a cabana, devidamente protegida, já que essa fora a exigência de Vincent para permitir que ela cuidasse dele. Ela lhe trazia água, uma xícara de chá, e os dois conversavam por alguns minutos, antes de Hall apagar, cansado e dopado.

Mas naquele dia em especial, a breve rotina se modificara.

Lizzy procurara, a pedido de Vincent, em praticamente todas as casas do Garden, por um objeto especial, que significava muito para ele. E conseguira encontrar na grande estante de livros da Imperatriz. Era antigo, mas bem preservado.

Assim como sempre fazia, a mulher sentara-se ao lado do médico, que sorrira ao avistá-la.

— Você conseguiu? – Sua voz estava sumindo. A inflamação na garganta criara um nódulo que o impedia de comer qualquer coisa sólida, e é claro, atrapalhava e muito sua fala.

Segurando pela capa, Lizzy lhe mostrara a edição especial do clássico irlandês Hunter’s Instinct. Uma obra mundialmente conhecida pela beleza de seus textos e suas significativas metáforas. Abaixo do título, podia-se ver escrito by Mint. A Autora fora sempre conhecida pelo pseudônimo, criando-se uma verdadeira lenda ao redor de sua identidade.

— Eu disse que ia conseguir encontrar...

Lizzy sentira um aperto no peito. Era cada vez mais difícil vê-lo daquele jeito, torturante até. A coloração do rosto do médico praticamente havia desaparecido. Hall encontrava-se bem mais magro, e o suor constante, assim como a falta de ar, deixava-o constantemente irrequieto.

— Eu deixei um envelope na minha cabana... – Ele precisava fazer pausas constantes entre as frases – Se você puder, quero que entregue a Leah Fisher, a pessoa da qual te falei... – Lizzy concordara, sem nada dizer – Deixei também cadernos de anotações... Há muitas coisas úteis lá, e quero que fique com você...

Ele tocara as mãos de Penn, recobertas por luvas.

— Você precisa segurar as pontas agora... O Garden precisará muito de você. Não deixe as coisas fugirem do controle... E por favor, ajude Rick a vencer essa guerra. Não deixe que Negan siga fazendo o que vem fazendo...

Hall fizera uma nova pausa. Seu corpo tremia em um calafrio incontrolável.

— Agora você pode... – Vincent virara a cabeça de lado, tossindo algumas vezes praticamente perdendo o fôlego – Você pode ler um pouco para mim? Eu já conheço essa obra de cor e salteado, mas... Seria ótimo ouvir essa história outra vez...

Respirando profundamente, Lizzy esforçara-se ao máximo para não chorar. Meneara a cabeça positivamente, abrindo o livro algumas páginas após o seu início. Acalmara-se, engolindo as lágrimas e atendendo ao último pedido de Vincent Hall.

Depois de três dias desde que protagonizara o primeiro — e até então, único — episódio de surto esquizofrênico da garota loira, Billy e Rebecca haviam descido o território montanhoso perto de Brush Creek e caminhado alguns quilômetros para nordeste. Depois de percorrerem cerca de 40 milhas a pé, conseguiram achar um antigo GMC Syclone, uma picape preta, típico sonho de consumo redneck, abandonada em meio a estrada erma.

Ela olhara para Hall, que fitava o teto. Um meio sorriso a fizera sentir que aquilo o fazia bem. Ela então seguira.

Por sorte, havia combustível o suficiente para percorrerem mais uma centena e meia de quilômetros, até terem de parar para abastecer. Moveram-se para nordeste, seguindo o mapa que Billy levara do Oceanário da Georgia, na direção de Wyoming County, em West Virginia.

Vincent seguia sorrindo, ouvindo atentamente a doce voz de Lizzy Penn.

No fim das contas, conseguiram se movimentar de carro por um total de quase quatrocentos quilômetros, revezando-se ao volante e mal parando para descansar ou dormir. Naquela manhã, o sexto dia de convivência com Becky, a jovem mulher parecia particularmente entusiasmada.

Mais uma vez ela fitara Vincent Hall. O sorriso em seu rosto se mantivera, em uma expressão fixa. Mas seus olhos agora se encontravam fechados. Vincent não respondera aos gritos desesperados de Lizzy, tocando o seu rosto, na esperança de que ele pudesse reagir.

Aos prantos, ela tentara de todas as maneiras despertá-lo, sacudindo-o pelos ombros, deixando o livro cair no solo da cabana, aberto, com as páginas brancas tocando o chão. Mas não houvera mais resposta.

Vincent Hall partira sorrindo. Deixara cumprida a missão para o qual fora destacado.


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Notas finais do capítulo

E então o que acharam?

Descansem em paz J.J e Marsha Cheever. Em minha visão eles tiveram uma morte bastante emocionante, principalmente a de J.J.

Esse capítulo fechou o arco de um personagem que para sempre ficará marcado em meu histórico de escritos! Vincent Hall (Desmond Wales) foi um grande desafio, e a todo o momento tentei fugir dos clichês que poderiam rondar um personagem principal desse tipo. Tentei dar a ele uma morte digna, fechando sua saga, compensando os seus erros. E acho que no fim das contas, ele acabou conseguindo o que sempre buscou... Redenção.

Estou muito curioso para saber o que acharam de todos esses acontecimentos. O capítulo foi bastante visceral, e sinceramente, fiquei feliz com o resultado...

~~

A imagem do capítulo foi criada por minha amiga Menta! Não poderia haver momento mais oportuno para postá-la! Muito obrigado! Essa imagem envolvendo Hall serviu para destacar ainda mais o final que queria dar a ele! Kiitos!

~~

A música Prostitute, cantada por Lizzy Penn nesse capítulo, é uma composição original de Axl Rose e Paul Tobias, lançada no ano de 2008 no álbum intitulado Chinese Democracy. Como temporalmente a história se passa antes mesmo dessa música ser gravada, tomei a liberdade de me apossar dela, dando-a a Penn, já que em minha visão, sua letra combina muito com sua trajetória pós-apocalíptica...

~~

E para finalizar, uma última explicação... Mabalo Lokela, título escolhido para os dois capítulos, é nada mais do que o nome daquele que é considerado o paciente zero da infecção por Ebola, ocorrida em 1976 em uma vila rural no distrito de Mongala, na República Democrática do Congo (a época conhecida como Zaire). É provável que sua infecção tenha se dado às margens do rio Ebola, entre 12 e 22 de agosto. Lokela morreu em 8 de setembro de 76 e acabou entrando para a história...

Bom, é isso...

Nos vemos nos próximos capítulos...

Moi moi.



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