As cores do meu mundo escrita por Lice Tribuzy


Capítulo 16
Lágrimas


Notas iniciais do capítulo

Espero que estejam gostando, pessoal...



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Entrei no carro e fui pra casa. Fiquei deitada na cama esperando o tempo passar. Esperando que o tempo pudesse me curar. Amanhã será o enterro dele. Será o momento em que meu corpo poderá estar perto do dele pela última vez, na vida terrena. Tentei escrever alguma coisa, mas não consegui. Foi então quando percebi que iria deixar simplesmente meu coração me guiar. Fechei os olhos e tentei ouvir bem os sussurros do mais profundo eu. Tentei sentir meus batimentos cardíacos acelerarem ao sentir falta dele.

“William... O que falar dele? O que falar desse rapaz que superou barreiras? Ele começou com uma vida boa, mas seguiu um mau caminho, até que então, superou seus problemas e renovou sua alma. Will era para mim a cor do meu mundo. Ele virou minha vida ao avesso e eu acabei percebendo que o avesso era meu lado certo. Ele chegou de mansinho, quase que do nada, para se tornar meu tudo. Ele era minha mistura perfeita de cores. Eu confesso que meu sonho era encontrar alguém que pudesse me mostrar à magia do mundo e as cores. E com ele pude finalmente encontrar uma cor nova dentre o infinito. Para mim, ele era único e isso basta para meu coração. Isso basta para meu corpo. Passamos momentos ótimos e inesquecíveis. Vivemos uma vida que qualquer pessoa deseja e que qualquer garota anseia. Tudo aconteceu tão rápido, que eu nem acredito que agora ele está dentro dessa caixa escura, ainda não acredito que vou chegar a minha casa e não verei uma mensagem dele no celular, não acredito que viverei sem ouvir sua voz, sem sentir seu corpo, sem desfrutar dos seus carinhos. Ainda não creio que estou realmente falando isso, que estou realmente dando minhas últimas palavras para o mundo, para o nosso amor. A única coisa que me move agora é saber que o nosso “sempre” ainda existe, porque nosso amor não acaba quando um se vai da vida terrena. Amor não acaba do dia pra noite. Eu ainda o amo muito e continuarei sempre o amando. Continuarei vendo as cores dele, sentindo-as em meu peito. Sabe, eu sinceramente aprendi muito com ele. Não por ser a namorada, não por ser mais nova, mas por sermos mais que amigos. Aprendi que nós não precisamos de alguém ao nosso lado simplesmente para dizer “Eu te amo” ou para nos elogiar ou até mesmo dizer coisas bonitas para nós. Tudo que nós queremos são atitudes porque palavras de nada valem se não puder prova-las. E ele sabia disso. Ele entendia. É por isso que vivíamos juntos. Por isso que vivíamos não apenas conversando, mas demonstrando carinho. Ele se foi tão repentinamente que nem tenho palavras certas para usar. O que sinto por ele não é amor, saudade ou raiva. O que sinto por ele ainda não existe palavras que possam descrever, porque tudo que fiz foi amá-lo. Tudo que fiz foi tentar proteger-nos. E me parece que fiz tudo isso em vão. Questiono a mim mesma ainda, por que a vida o tirou de mim. Pergunto no silencio, por que o destino não queria nos ver juntos. Talvez o erro tenha sido eu. Mudei a vida dele e ele mudou a minha. Talvez, talvez, talvez. Indecisões, indecisões, indecisões. Nenhuma certeza. Nunca tive certeza de nada a não ser o amor que tinha por ele. Agora, a única certeza que tenho é a da morte, mas não queria ter. Infelizmente, a realidade é inevitável. Mas mesmo assim, continuo o amando. Continuo sentindo sua presença em meu peito. Vai ser difícil viver sem sua presença física, mas sei que em algum lugar, ele está me vendo e me guiando, e é isso que me faz seguir em frente. Obrigada.”

Olho ao redor e vejo os olhos com lágrimas e sorrisos tristes, mesmo sem querer. Não podia parar de pensar que logo ali ao meu lado estava Will. Morto. Essa palavra me causa arrepios. Pensar em perdê-lo me dói, mas realmente perdê-lo é pior ainda. A única coisa que tenho a falar sobre a perda é que eu simplesmente não tenho o que comentar. A falta que ele me faz é tremenda. Tudo que eu queria agora é fechar os olhos e ficar sozinha, porque às vezes, o grito mais desesperado é gritado no silêncio.

Desci do palco e todos vieram dar-me os pêsames. A primeira pessoa é Tomás e logo depois Clarisse.

–Elena? –pergunta uma voz feminina.

Viro-me. Desconheço esta mulher branca, dos olhos claros e cabelos loiros. Uma moça bem bonita por sinal. Estava com o rosto meio triste, mas mantinha-se firme.

–Muito prazer, querida. Eu sou a mãe do William...

–O que? – paraliso – A senhora é... ah, muito prazer em conhecê-la e, bom, meus pêsames.

–Não, eu quem devo sentir muito. Você passou mais tempo com meu filho do que eu, você sofreu mais que qualquer um da família. E eu gostaria de agradecer a você por isso, por ter feito meu filho feliz, por tê-lo protegido dos perigos.

Apenas esboço um sorriso vergonhoso. Realmente não tenho palavras para aquele momento.

–É uma pena não termos nos conhecido antes, minha querida, mas saiba que sou extremamente grata por você existir e por dar a meu filho tudo que ele merecia: amor de verdade. –diz ela.

–Eu também devo agradecer à senhora, não apenas por ter vindo aqui, mas ter coragem de demonstrar seus sentimentos e acreditando que a culpa não foi minha de seu filho ter partido.

–Jamais pensaria que a culpa foi sua. –diz ela preocupada – venho mantendo contato com William há alguns dias e ele já havia me dito sobre você. Sei que tudo que ele mais apreciava era você, Elena. Se você quer saber, ele ia nos apresentar semana que vem. Já havia marcado comigo. Ele fala de você com muito carinho e eu sei que para meu filho dizer tão bem de uma garota, ela é muito mais perfeita do que posso imaginar, por isso tenho orgulho de você, minha querida, porque você deixou meu filho feliz – ela diz já segurando um pouco o choro. Vejo seus olhos já cheios de lágrimas e seu coração se despedaçando. Eu, por outro lado, já havia deixado cair lágrimas sobre meu rosto. Não conseguia aguentar o sofrimento que passo agora nem muito menos aguento o sofrimento que ela, a mãe de Will, pode estar sentindo agora.

–É realmente uma pena não termos nos encontrado como Will havia planejado, mas pelo menos agora a conheço. Não sou a melhor pessoa que ele podia conhecer, mas saiba que eu realmente o amava muito, mas digo com certeza que quem sofre mais com a perda, é a senhora, por não apenas perder um filho, mas por ter passado tanto tempo com ele, o visto crescer e tudo mais. Will era um garoto muito dócil e gentil. Mesmo ele não tendo passado tanto tempo com a senhora, sei que essas qualidades ele adquiriu com a pouca convivência que teve com você. Eu sinto muito por tê-lo perdido desta forma. Todos sofremos com a perda dele.

Disse essas palavras contendo-me ao máximo para não soluçar e me acabar ali mesmo, em frente a tantas pessoas.

Depois de ter falado com todos e abraçado meus amigos, Clarisse, Tomás e Simone, fui afastando-me da multidão. Fui para debaixo de uma árvore, ao lado de um banco cinza já um pouco desgastado. O sol estava se pondo. Respiro fundo ao olhar as pessoas de preto, ao olhar coveiros colocando-o, meu amado, debaixo da terra para todo o sempre. Fecho os olhos e lembro-me dos segundos mais rápidos e dolorosos da minha vida, o momento em que perdi tudo. Lembro-me das risadas que damos naquela noite, lembro-me dos últimos beijos dados e das ultimas palavras ditas. Ainda posso me lembrar das batidas do coração dele, o melhor som que já ouvi na minha vida, o som da liberdade, o som do viver, da presença, o som da esperança. Sinto-me agoniada só em pensar no futuro da minha vida sem ele, sem seus beijos, sua fala e sem minhas pernas. Perder o movimento das pernas foi o ápice de minha tristeza, pois cada vez que eu olhava para elas, sempre paradas, sem se mover, toda vez que me via sentada em uma cadeira de rodas, logo me lembrava em como isso foi acontecer e tudo que havia passado antes. O fardo da falta de movimento das pernas eu terei que carregar para todo o sempre. O pior de tudo é que além de uma perda física minha e carnal do meu namorado, houve uma perda psicológica do meu coração, que agora está em pedaços, como se tivesse sido esmagado pelo carro que nos atropelou.

Esforçava-me para não pensar nisso, para não me lembrar de tudo de novo e sofrer cada vez mais, mas era simplesmente inevitável. Tudo a minha volta sempre voltava para a tragédia. Ao olhar para minhas pernas, quando me movia para outro lugar, pois usava cadeira de rodas, ao fechar os olhos, ao sentir o vento sobre meu rosto, dentre várias outras coisas. Tudo que fazia era chorar. Deixava as lágrimas rolarem, porque às vezes quando esgotamos no corpo, devemos colocar para fora tudo que já foi, para que possamos aguentar outra remessa de tristes verdades.

Apesar de tudo, queria ficar sozinha. Não queria mais ouvir “sinto muito pela perda”, “meus pêsames”, “é uma pena ter acontecido isso com seu namorado”, “vocês se amavam tanto...” ou até mesmo “você é guerreira, aguentou perder o namorado e é cadeirante”. Essas coisas, por mais que sejam verdadeiras e algumas vezes necessárias, não me fazia bem porque eu não queria acreditar na verdade, não queria abrir os olhos para a vida e nem muito menos viver para o futuro. Eu queria pensar sozinha em Will, nas minhas pernas, nos meus amigos, e na minha vida, no meu destino, sem que ninguém me aconselhe e me relembre tudo que já havia acontecido, acontece e o que supostamente acontecerá.

Quando tudo acaba, vou para casa querendo realmente crer que tudo havia acabado. Assim que chego, a primeira coisa que faço é ir para o parque do condomínio, onde meus sonhos, minhas felicidades e momentos estavam. Fechei os olhos aos poucos, sentindo o por do sol sobre meu rosto, o vento sobre meu corpo e a felicidade em meu coração. Mesmo Will não estando lá, eu imagino como se ele ainda estivesse, de como será nosso futuro juntos, em quantas brigas teríamos, mas mesmo assim continuaríamos juntos para a consumação de um casamento, uma lua de mel e quantos filhos teríamos. Ainda imagino-o bem ao meu lado sussurrando em meu ouvido “tudo bem, Elena, sempre ficaremos juntos e eu te amo”. Ah, o que não faria para ouvir mais uma vez essas palavras saindo de sua boca, para olhar naqueles olhos azuis penetrantes, que gritam desesperadamente que me ama, o que eu não daria para ter mais um dia de companhia com ele, apenas um dia, nada mais.

Levanto minha cabeça e olho para as nuvens desesperada. Deus, por favor, cuide bem dele. Faça dele o anjo que merece ser. Mas, por que o Senhor o tirou de mim? Quais são seus planos? Será que não posso vê-lo pela ultima vez? E desta vez preparada para sua partida? Apesar de continuar com a vontade de vê-lo, sei que Ele me ouviu. Sei que Deus não me abandonará e tudo que devo crer agora, são em seus planos. O plano de que algo melhor me aguarda, de que foi preciso acontecer o que aconteceu tanto para mim quanto para Will. Será difícil aceitar que ele se foi, mas será preciso.


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Notas finais do capítulo

"Ele virou minha vida ao avesso e eu acabei percebendo que o avesso era meu lado certo. "



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