— Você não me disse por que não podia ficar muito tempo longe... – Falou Chihiro quebrando o estranho silêncio.

— Meus poderes diminuem no mundo humano – ela respondeu de forma curta.

— Por que isso? – Chihiro perguntou.

— É uma antiga história, se dizia que as pessoas do mundo humano não queriam feiticeiros, espíritos ou deuses convivendo com eles, então pediram a um demônio que fingia ser um deus jogou um tipo de feitiço para acabar com a magia e tudo o que a envolvia isso fez com que todos esses seres fossem para outros mundos, tornando humanos os que ficaram ou até os matando...

— Que terrível...

— Não posso fazer muito – a guardiã disse desapontada – ainda tenho um pouco de meus poderes, mas tenho que usá-los para me recuperar da mordida.

Ela olhou para a barriga e Chihiro abriu a boca aterrorizada. Aquilo era uma mordida.

— O que mordeu você? – perguntou.

Ela fez um longo silêncio, tentando pensar se devia ou não contar.

— Um dragão...

— Um dragão? – Chihiro falou dando uma curta pausa – prateado com pelos esverdeados?

Ela parou e fitou a garota atentamente, um tanto chocada por Chihiro saber como era o dragão. Chihiro rapidamente pensou que se ela soubesse sobre Haku, ela poderia atacá-lo e por isso se apressou em fingir que não sabia mais sobre o dragão.

— Eu o vi, quando tirei você de lá – a garota falou correndo – Ele tentou me atacar...

Harumi abaixou a cabeça pensativa e desapontada, franziu os lábios e ficou assim por um tempo, passou as mãos pelos cabelos e depois as cruzou em cima das pernas.

— Preciso voltar... - Ela disse.

Chihiro olhou para o machucado dela e viu que mesmo tendo melhorado bastante ainda estava muito frágil, ela não podia voltar, ainda mais se tinha intenção de enfrentar Haku.

— Seu machucado ainda está muito frágil...

— Ele vai se curando no caminho

“Kohaku, não” Chihiro pensava a cada instante.

— Deixa eu ir junto então! – Ela gritou.

Ela arqueou uma sobrancelha e observou Chihiro atentamente.

— Por que? – Harumi perguntou.

— Eu quero conhecer mais daquele mundo...- A garota inventou, não havia nada ali para conhecer, ela pensava.

— E seus pais? – perguntou Harumi.

— Eles não se importam, e além disso estarão viajando a trabalho em dois dias e vão ficar fora por um tempo.

— Você tem noção que o tempo aqui e lá é um pouco diferente?

Chihiro entortou o rosto em questionamento.

— Às vezes o tempo aqui para – Harumi começou a falar – Às vezes passa mais devagar e as vezes passa muito mais rápido, está ciente disso?

Ela pensou por um longo tempo, sabia que o tempo não era igual, mas não imaginou que pudesse ser tão alternativo, mas ela não tinha opção, ela tinha que voltar. Haku estava em perigo, mesmo que não fosse por Harumi, ele parecia não estar bem, o dragão que o atacara, a raiva com o qual ele atacara Chihiro, a mordida em Harumi. Haku a salvara duas vezes, era a vez dela de ajudá-lo.

— Estou ciente...- Respondeu firme.

— Também está consciente de que eu posso não conseguir trazê-la de volta? – Harumi perguntou, ela já sabia a resposta.

— Como?

— Chihiro, eu não sei o que acontecera quando eu retornar – ela começou sua explicação – Eu terei de voltar ao meu mundo para relatar o por quê de eu estar longe por tanto tempo e eles podem acabar não devolvendo meus poderes.

Chihiro respirou e colocou a mão no peito, ofegante, passou a mão pelos cabelos, se levantou deu algumas voltar e começou a pensar, observou Harumi olhando para pensativa e começou a fazer o mesmo. Pensou em sua vida ao longo dos anos, desde que conhecera Kohaku. Seus pais pouco se importavam com sua existência, as amigas da escola eram boas com ela, mas não sentia tanta  afeição pelas meninas e no outro mundo sentia-se parte de algo.

— Eu não me importo – Ela falou decidida.

Harumi arqueou as sobrancelhas e entreabriu os lábios com muita surpresa.

— Tenho menos a perder aqui do que a ganhar lá – a garota falou decidida.

— Entendo – Ela falou, realmente compreensiva – tudo bem...partiremos em dois dias, eu quero ir de dia, até lá terei que preparar algumas coisas, por proteção.

— Certo – Falou Chihiro. O coração nunca esteve tão apertado.

***

No dia seguinte, Chihiro e Harumi sairam para comprar coisas que a feiticeira disse precisar para fazer alguns feitiços. Ervas, flores, essências e itens que Chihiro sequer conhecia. Foram em três tipos de lojas diferentes, uma bem esotérica, chegava a ser assustadora e visivelmente era o puro charlatanismo, não havia nenhum item que Harumi precisava e o dono tentou de todas as formas assustar as garotas. Sairam correndo dali.

A loja seguinte também vendia itens místicos e não era tão macabra, os donos foram gentis e tinham várias das coisas que Harumi pediu, o que ficou faltando tinha na floricultura. Lá a feiticeira comprou alguns tipos diferenciados de flores, Chihiro perguntou para que serviam e Harumi respondeu que era proteção para as duas.

— Como? - Questionou Chihiro.

— É uma magia, te explico quando fizermos...

Harumi observava tudo e todos em sua volta parecia ter saído de outro mundo, nada mais que a verdade. Era curioso vê-la dando voltas para observar as lojas e olhar para baixo achando o vestido que Chihiro a emprestara meio engraçado. Os pais de Chihiro achavam que Harumi era uma amiga da escola que dormiria lá uns dias, mesmo sendo vísivel que era ela consideravelmente mais velha que Chihiro, parecia que eles pouco tinham prestado atenção.

No dia da viagem todos acordaram muito cedo na casa, Harumi e Chihiro estavam aprontando as coisas para a partida e os pais de Chihiro também. Eles saíram primeiro e apenas acenaram para Chihiro, que não se incomodou, depois de pouco tempo, as garotas partiram para a estrada de terra no meio da floresta até avistarem a gigantesca construção vermelha.