Série WHO I AM? - Short Fic Peeta escrita por Serena Bin


Capítulo 6
Episódio 6 - Efeito Borboleta


Notas iniciais do capítulo

Olá amores!
Depois de muito tempo, aqui estou novamente.
Gostaria de agradecer aos comentários até aqui. Voces são lindos!
Who I Am está chegando ao fim. Planejo apenas mais três episódios para a fic.

Boa Leitura!!



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O único som que invade meus ouvidos é o tic tac do relógio que marca poucos minutos para o fim da madrugada. Levanto-me da cama e com cuidado retiro o acesso que transmite soro ao meu braço e vou em direção à porta. Apesar de eu já estar bem melhor em relação ao tele sequestro, Dr. Aurélius ainda acha prudente continuar com minha medicação.

Encosto meu ouvido na superfície gelada do plástico e me ponho a captar os ruídos vindos do lado de fora da porta, exatamente como eu fazia na Capital. Capto algumas vozes ao longe, onde o que parecem ser dois médicos conversando sobre café e biscoitos de aveia. Mas há também algo a mais, algo um sibilo ou quem sabe um coro de vozes e é esse som que busco ouvir. 

Me concentro em diferenciar de onde o som e ao me aproximar da enorme janela do quarto, eu os vejo. Centenas e milhares deles. Os cidadãos e cidadãs de Panem. Todos os distritos reunidos em torno do circulo da cidade e gritando apenas uma palavra: justiça.

Não poderia ser diferente de qualquer jeito. Hoje é o dia da execução de Snow. Todos aqueles lá em baixo esperam pelo momento em que ela dará fim de uma vez por todas com a era dos Jogos Vorazes.

Acompanho o local onde a execução será feita. Um pelourinho fora instalado no meio da praça, onde como consta na programação, Snow será amarrado e então morto. 

As pessoas dizem que esta é a forma mais justa. A própria Alma Coin acredita que matando o ex-presidente, acabará com a cede de sangue a qual a população tanto clama há setenta e cinco anos. Mas eu não estou certo de que este seja o caminho mais correto a ser seguido. Mesmo eu tendo sofrido nas mãos dele, ainda assim não gosto da ideia de matá-lo publicamente apenas para saciar a fome social das pessoas. Mas todos, inclusive Katniss Everdeen, estão vendo isso como um ato de honra e justiça. Eu, no entanto, penso diferente. Não será o senso de justiça que moverá a flecha até Snow, mas sim a cede de vingança.

— Isso aqui está uma maravilha, não acha, padeiro? – uma mão ossuda toca meu ombro esquerdo e vejo refletida no espelho a silhueta alta e esguia de Johanna Mason, a única vitoriosa viva do distrito sete. Ela, ainda que danificada pelas torturas sofridas na Capital, aparenta estar bem melhor do que esteve há alguns meses atras quando nos vimos no distrito treze. Sua pele já não está tomada por enormes hematomas e uma considerável quantidade de cabelos castanhos se espalham por sua cabeça. – Finalmente chegamos à parte boa da coisa. - Johanna dá uma gargalhada verdadeira enquanto admira o coro de pessoas na praça.

— Você não sente medo? – digo quase num murmuro reflexivo – Quero dizer, como será daqui para frente? Será que estamos mesmo fazendo a coisa correta? Retribuindo sangue com sangue? O que vamos fazer hoje vai impactar gerações...como um efeito borboleta.

Johanna imediatamente para de rir; vira o rosto para mim de uma forma que sugere incredulidade e indignação.

— Você tá curtindo com a minha cara, não?  - a voz de Johanna sai irônica e pesada como é de costume – A gente passou a vida toda vivendo a mercê de um futuro incerto e agora, quando existe de fato um futuro, você vem com essas suas filosofias de garoto bonzinho?  Eu quero mais é que o mar pegue fogo para eu poder comer peixe frito!

Johanna então endireita o corpo e arruma suas mangas da camisa. Em seguida conclui de forma categórica:

— Um futuro sem Snow não tem como ser ruim – ela pisca o olho e se joga em uma enorme poltrona roxa.

Johanna Mason nunca pôde ser usada como exemplo de muitas coisas, mas em uma lista mental que uso para classificar as pessoas, ela é a única que consegue fazer frente à Katniss Everdeen no quesito ousadia e determinação. Ela poderia muito bem atirar em Snow se lhe fosse dada esta oportunidade.

A voz de Haymitch invade a enorme sala dizendo que precisamos descer para nos juntar aos outros vitoriosos. A execução terá inicio em poucos minutos. Antes que todos saiam, intercepto Haymitch e o chamo para uma rápida conversa.

— Eu preciso mesmo estar lá? – pergunto angustiado. Os olhos cinzentos e frios de Haymitch fixam-se em mim. Acho que ele vai entender o porque de eu não querer acompanhar a execução.

— Precisa. – Haymitch responde secamente.

— Eu...Eu...

— Peeta, - ele reinicia – Se juntasse-mos todos os vitoriosos em um caldeirão, não sobraria nada que pudesse ser reaproveitado, porque tanto eu, quanto Katniss, Johanna e até mesmo Annie Cresta, sobrevivemos até aqui por meio de jogadas precisas, sempre calculando onde pisar simplesmente porque somos mentirosos, teimosos e não valemos o chão que pisamos.

A voz de Haymitch assume um tom calmo, diferente do que ele usa para falar comigo geralmente.

 - Mas você Peeta, você é diferente de nós. – ele continua - Você, dentre todos nós de Panem, é ao meu ver, a única pessoa realmente digna de um futuro feliz. E eu compreendo que o seu caráter não lhe permita, mesmo que modificado, encontrar satisfação em um ato como a execução publica de Snow. Mas pense que a vida é um tabuleiro onde toda ação provoca uma reação. Não foi assim nos Jogos e na guerra?  Katniss, eu, Johanna...todos nós causamos danos e recebemos a devolutiva da Capital. De certa forma, merecemos os castigos porque não tínhamos a noção de consequência. Quando se recebe uma rasteira, o próximo ato é a vingança.   Só existe uma pessoa para a qual a morte de Snow terá o verdadeiro sentido de justiça: você. Que perdeu tudo e ao contrario dos outros, nunca mereceu as consequências que teve.

         As palavras de Haymich entram em minha mente e me fazem lembrar de tudo o que me foi tirado. Minha família, minha casa, minha liberdade, minha identidade. Olhando por esse angulo onde toda ação gera uma reação, consigo finalmente entender o que meu antigo mentor quer dizer.  Haymitch não esta tentando me convencer de que a morte de Snow é um ato de heroísmo. Mas sim, que Snow merece ser punido por todo o mal que causou.

— Você deve estar lá em baixo não para se vingar como a maioria dos vitoriosos, - Haymitch diz -  pelo contrario, para você, a morte de Snow significa que a justiça foi feita, porque eu, Katniss, Johanna e cia merecemos cada represália que sofremos, mas você não.

Antes de sairmos, Haymitch diz:

— Quando estiver lá em baixo, olhe bem nos olhos de Snow e diga a ele, mesmo que em pensamento, que genocídio é um crime inafiançável. Pode fazer isso?

— Posso. – respondo. Haymitch sorri e conclui:

— Você realmente merece um futuro feliz, Peeta.

* * *

O circulo da cidade fica menor quando se está no meio dele. Por todos os lados que olho, vejo um muro de pessoas entusiasmadas. Eu não fazia ideia de que Panem pudesse ter tanta gente querendo a queda do sistema.

No centro, preso ao pelourinho está um homem velho e decadente. Seu rosto não exibe nenhum tipo de medo ou tristeza. Pelo contrário, há um sorriso irônico em seus lábios levemente arroxeados. Os guardas que o prenderam agora estão deixando o local e Haymitch aparece atras de mim dizendo que é hora de os vitoriosos se posicionarem.

Em minha mente, faço o exercício indicado por Dr. Aurélius. Traço uma linha do tempo onde retomo todas as ações importantes de minha vida. Tento de lembrar de coisas do passado até chegar nas ações do presente. De algum lugar de minhas memórias, meu cérebro então puxa a imagem de Snow. Um dia, onde estive de alguma forma sob seus domínios. Um tempo onde ele se apropriou de tudo o que era meu, inclusive minha mente. Um sentimento estranho então toma o meu ser. Não é raiva, tampouco mágoa...É algo mais vergonhoso...É pena. Pena do fim que o aguarda, pena de tudo o que ele se tornou, pena dele mesmo tão fraco e debilitado, mas ainda assim tão maléfico.

Haymitch e eu caminhamos um ao lado do outro até nos encontramos com as três vitoriosas intensamente envolvidas na guerra: ao lado de Haymich, Johanna Mason e sua cara de desprezo por Snow; ao lado de Johanna, Annie Cresta, a viúva de Finnick Odair sustenta além de seu semblante pouco lúcido, uma sutil barriga de gestante; por fim, avisto na ponta da fila uma figura inquieta e um tanto sorridente, Enobária, a vampira do distrito 2. Algumas pessoas dizem que ela participou do terceiro massacre quaternário e que tentou matar Katniss, as pessoas também dizem que eu fui o responsável pela morte de seu companheiro de Jogo, Brutus.

Estão todos gritando palavras de ordem ao nosso redor. Gritam para que Katniss atire bem no meio do coração do presidente. Na sacada, acima do centro da praça, está a cúpula do governo transitório. A Presidente Coin, auto-nomeada presidente interina de Panem, mantém um semblante que sugere um ar de triunfo e não estou muito certo de que seja sobre a tirania de Snow.

         De repente, uma orquestra de tambores anuncia que o ato está tendo inicio. A multidão se cala e todos os presentes inclinam suas cabeças para a entrada da praça. Faço o mesmo e então, sob a luz pálida da manhã, ela está mais radiante do que nunca. Sua silhueta bem demarcada pelo traje de Tordo lhe proporciona ao mesmo tempo poder e força. Mas, muito embora ela esteja maquiada, produzida para ser a heroína construída para salvar o país, de alguma forma, sei que ela está quebrada por dentro. Estilhaçada em mil pedacinhos. Prim era o ar que ela respirava. O motivo pelo qual ela se jogou em toda essa balbúrdia e a perda de alguém tão amado é uma dor que nenhuma quantidade de maquiagem dramática e reluzente consegue esconder.

         Katniss caminha a passos marcados e curtos. Em sua mão direita, o arco reluz. Na aljava, apenas uma flecha, o que transforma o momento em um verdadeiro show onde neste exato momento, centenas de pessoas assistem ansiosas; ávidas por sangue. Quando Katniss se posiciona a dez metro do pilar onde Snow se encontra preso, faço o que Haymitch me orientou.

         Olho para o presidente e tento imaginar todos os atos de loucura e transgressões cometidas por ele ao longo de setenta e cinco anos. Quero dar a esse momento, um senso de justiça, algo que faça com que a ideia de show televisivo e vingança desapareça.

Toda ação gera uma reação. Penso. Snow, você está recebendo a consequência de seus atos.

Neste momento, relembro minha família e de cada pequena coisa que foi tirada de mim, mas me parece egoísta demais julgar-me o único injustiçado. Apesar do que Haymitch disse a mim horas antes, não acho que os vitoriosos dos jogos não mereçam que a justiça também lhes seja feita. Penso em Johanna, toda a família dizimada por causa das régras da Capital; penso em Haymitch, sozinho e bêbado; Annie, instável, gestante e viúva.  Lentamente, nomes e mais nomes vão se juntando a lista de injustiçados. Não só vitoriosos, mas todas as pessoas que vi morrer por causa ações que de alguma forma sempre tinham Snow como responsável.

Castor, Messalla, Jackson, Mitchell, Boggs, as gêmeas Leeg, a morfinácea, Mags, Cinna, Portia,minha antiga equipe de preparação – Kara e Pearl -Darius, Lavínia, Cato, Glimmer, Clove, Cara de Raposa, Marvel, Treash, Brutus, Gloss, Cashmere, Seader, Chaff, Cecelia, Blide, Wires, Rue, Prim e centenas de outros nomes que jamais vou poder contar.

— Espero que você alcance perdão em algum lugar. – digo a mim mesmo enquanto miro os olhos de Snow. Quando ele olha para mim, lança uma expressão que destrói todas minhas perspectivas de que ele de fato possa se arrepender porque é como se ele me dissesse com o olhar que faria tudo de novo.

         Quando Katniss empunha o arco e a flecha, a excitação silenciosa toma conta de Panem. Todos sabem que a pontaria de Katniss é perfeita, mas neste momento, ninguém se quer respira com medo de interferir na mira do Tordo. No momento em que ela respira fundo, eu fecho os olhos. De repente, a multidão explode e eu abro os olhos esperando ver a flecha cravada no peito de Snow, mas o ex-presidente continua vivo. Contudo, quando olho para a sacada onde a cúpula do governo se reúne, encontro a flecha do Tordo caindo juntamente com o corpo que a abriga. O corpo de Alma Coin.

         Uma risada gutural e sombria corta o ar. A reação estupefata da audiência explica a balbúrdia. Katniss acaba de dar mais uma de suas viradas inesperadas. Imediatamente, dezenas de guardas saem de seus postos para controlar a multidão que agora se espalha vorazmente por toda a praça. Em um flash, acompanho o pilar onde Snow está preso ser alvejado por centenas pessoas enfurecidas. Em questão de segundos a confusão generalizada se estende por todos os lugares.

         Olho para Katniss e a vejo arregaçar de maneira sutil a manga de sua camisa. Involuntariamente, me lanço em direção a ela. Um misto de medo e desespero faz com que me jogue em cima dela somente para impedi-la de cometer suicídio.  Sinto seus dentes morder com força a minha carne sensível e sangue começa a gotejar.

         - Me solta! – ela arqueja, mas eu não a liberto até ver a pílula cadeado ser destruída pela bota de um guarda.  Tento arrancá-la para um local seguro, mas Katniss agora se transformou em um animal selvagem, incompreensível e feroz, mesmo assim, eu a mantenho presa em meus braços, mas de repente, três guardas a arrancam de mim e a levam para longe.

         Num ultimo momento, eu a escuto gritar por Gale, talvez na esperança de que ele a mate antes de ser entregue ao poder da Capital. É apenas neste instante que percebo o que fiz. Quem sabe o que pode esperar por ela agora que é uma assassina presa em flagrante?  Prisão perpétua? Pena de Morte?

Algo dentro de mim martela essas questões, mas eu não a quero morta. Condenada talvez, mas nunca morta. Não sei exatamente o que me levou a impedi-la de se matar, mas seja lá o que for, é mais forte que eu. No entanto, eu tenho plena consciência de que a morte de Coin terá um desfecho legal. Katniss é aos olhos da legislação, uma criminosa e isso eu não negar.

Os gritos dela ainda ecoam pela praça, mas agora de maneira cada vez mais abafada. Quando vislumbro seu rosto pálido pela ultima vez, um pensamento se forma em minha mente.

Toda ação gera uma reação.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler!
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