COMER NÃO ME PARECIA uma boa opção naquele momento. Eu retorcia minhas mãos sobre o colo enquanto a hora do Jornal Oficial se aproximava. Meu pai havia saído até mais cedo do trabalho e estava esparramado sobre o sofá devorando a torta de banana que Lily havia preparado.

Minha mãe estava sentada próxima a ele, e estava surpreendentemente quieta, mas eu conseguia ver pela forma como seus lábios se contraíam que ela estava tensa. Eu estava sentada sobre uma das poltronas com os braços em volta dos joelhos, achava que se ousasse me mexer provavelmente desmontaria.

Aquilo era mesmo uma boa ideia? Será que eu não haveria me equivocado?

Prendi a respiração quando a insígnia de Illéa brilhou na tela e Fray Devereaux, o apresentador, surgiu com seu sorriso gigantesco e brilhante o suficiente para cegar um. Seu paletó azul marinho com detalhes prateados disputava com seus dentes o que ganhava mais destaque.

— Boa noite, povo de Illéa — começou, animado. — Temos um motivo em especial para estar aqui hoje. Como vocês sabem, nosso querido príncipe, Nicholas, acabou de completar a maior idade e como faz parte da tradição, está prestes a passar pela tão conhecida Seleção.

A câmera fez um giro e mostrou o príncipe sentado com um sorriso tranquilo no rosto. Era em gênero, número e grau, parecido com o pai. Os cabelos loiros, as feições suaves e nobres. A única diferença eram seus olhos azuis, herdados da rainha America.

— Como se sente com relação a essa situação, Alteza? — indagou Fray, aparecendo em um cubículo no canto.

O príncipe sorriu.

— Depois que meus pais me acalmaram dizendo que não é nenhum bicho de sete cabeças, devo dizer que estou até empolgado — respondeu.

— Já teve algum vislumbre das garotas?

— Nenhum, a coisa toda foi muito sigilosa.

— Certo — concluiu Fray, com uma risada. — Logo nossa curiosidade será saciada. Agora, nossa amada rainha America — ele fez uma breve reverência —, como se sente recebendo em sua casa trinta e cinco jovens?

A câmera focou no rosto da rainha e senti meu próprio deslumbramento. Ela era linda de um jeito completamente peculiar. Os cabelos ruivos destacavam-se sobre a pele clara, e seus olhos azuis cor de gelo eram intensos e decididos.

— É como estar voltando no tempo, Fray — respondeu, com um sorriso gracioso. — Me faz lembrar da minha própria Seleção.

Observei que ela e o rei Maxon permaneciam de mãos dadas, e ele não conseguia esconder sua própria admiração pela esposa enquanto a olhava.

— Algum conselho para nossas futuras Selecionadas?

— Sejam determinadas, batalhem pelo que vocês acreditam ser o certo — ela virou-se para o rei e afagou a mão dele. — Não tenham medo de ser vocês mesmas.

— Sábias palavras, sábias palavras — disse Fray. — Agora, o momento que todo o país está esperando. Hora de anunciarmos nossas Selecionadas.

Eu estava respirando com dificuldade e quase pedi para minha mãe ligar para Mike e dizer para ele fazer uma traqueostomia em mim. Lily estava parada na soleira da porta da cozinha, com os olhos cheios de expectativa e os dedos cruzados. Ela me lançou um sorriso, mas acho que o que mandei de volta foi mais uma careta.

A tela ficou divida em duas partes. Uma mostrava o príncipe em tempo real, para captar suas reações, e a outra seria onde as Selecionadas apareceriam quando fossem anunciadas. Seguiu-se um momento de silêncio enquanto Fray se preparava e eu notei o quanto tudo a nossa volta estava silencioso.

Respirei fundo três vezes seguidas, então Fray aprumou-se em seu lugar e sorriu radiante.

— Preparem-se, garotas, a partir do que se desenrolar agora a vida de vocês mudará para sempre!

“Fantástico Fray, melhorou muito as coisas, agora ande logo!”, pensei.

— Senhorita Brittany Lowel, de Indiana, Dois.

Brittany surgiu na tela com um sorriso de orelha a orelha, os cabelos longos e loiros cintilavam à luz do flash da câmera. Ela tinha um jeito bom para ser atriz, ao menos foi o que pude deduzir olhando a foto dela.

— Camile Lavroir, de Yarshire, Quatro.

Essa já não era tão bonita. A maquiagem que ela usava era tão artificial que o rosto dela parecia ter sido todo editado. O príncipe, por sua vez, se pensou a mesma coisa não deixou transparecer. Ele apenas sorria observando a foto das garotas; provavelmente repetindo para si mesmo que uma delas, de uma forma ou de outra, viria a ser sua esposa.

Ele já havia anunciado treze nomes, e ainda assim meu coração não desacelerava. Continuava lá, martelando, pronto para me arrebentar o peito.

— Senhorita Alexia Walcolt, de Columbia, Três.

Parei de respirar naquele minuto. Meu coração pulou uma batida e logo depois senti o mesmo começar a se contrair. Meus braços despencaram ao lado do meu corpo, enquanto perplexa, eu observava minha foto na televisão. Eu parecia até simples demais comparada as outras meninas que já haviam passado, ainda assim, meu sorriso me dava um ar brincalhão, quase despreocupado.

O príncipe Nicholas continuava sorrindo, ao passo que as outras candidatas continuavam a ser anunciadas. Já não havia mais como me pedir para prestar atenção. Cada parte do meu corpo estava paralisada.

Meu pai deu um berro e pulou do sofá completamente empolgado. Minha mãe voltou-se para mim parecendo chocada e surpreendentemente animada ao mesmo tempo. Lily dava pulinhos discretos e exibia um sorriso de satisfação.

Observei tudo aquilo como se estivesse vendo um filme.

Como eu deveria agir?

Não tive tempo para processar tudo direito. Meu pai lançou-se sobre mim, me envolvendo em um abraço apertado, e dizendo coisas que eu não conseguia compreender.

Minha mãe correu para atender o telefone que quase imediatamente começou a tocar. O Jornal encerrou e eu não compreendi as últimas palavras de Fray. Estava atordoada demais para pensar, tudo a minha volta estava confuso.

“Você deveria saber, deveria estar preparada para caso isso viesse a ocorrer”, disse para mim mesma.

— Querida, meu Deus! — meu pai segurou meu rosto entre as mãos. — Você está bem?

Assenti lentamente.

— Foi um grande salto — disse minha mãe. E ela estava sorrindo, sorrindo para mim!

— Estou apavorada — confessei.

— E não é para menos, a partir de agora você pode ser uma das futuras princesas de Illéa — respondeu ela. — As pessoas saberão seu nome, pesquisarão a seu respeito... Você será uma nova pessoa, Alexia.

Comecei a concordar lentamente. O telefone tornou a tocar e minha mãe se virou para mim.

— É para você — disse.

Agarrei o telefone com as mãos trêmulas, e respirei fundo antes de falar.

— Alô?

— Eu sabia! Eu te disse! — berrava Theo, do outro lado da linha. — Eu falei para você, Alexia. Essa coroa é sua!

— Não é para tanto — repliquei, com uma risada nervosa. — Existem outras trinta e quatro, esqueceu?

— Vá por mim, nenhuma delas superou você naquela foto — ele gargalhou. — Estou tão feliz por você, já recebi até a dispensa para ir na sua despedida. E mesmo se não tivesse recebido eu iria.

Depois de desligar deixei minha mãe responsável por atender os telefonemas. Corri para o meu quarto e me lancei sobre a cama. Fitei o teto escuro com a cabeça girando a mil.

Estremeci por completo ao pensar na possibilidade de vir a ser a nova princesa de Illéa.

Ideia que agora já não me parecia mais tão impossível.