Uma canção de esperança escrita por Lu Rosa


Capítulo 27
Vinte e Sete




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– Ah você não vai me escapar dessa vez... – ela saiu correndo atrás dele.

Seus passos não ecoavam na noite, ela viu aliviada, pois usava sapatilhas. Esgueirando-se pelas paredes a moça o seguiu até uma parte de Paris onde ficavam alguns armazéns. Sentiu-se um pouco amedrontada, pois nada sabia sobre esse homem.

Viu quando ele abriu uma porta de correr e quando ele passou por ela, a porta voltou fechar-se.

Cautelosamente, Lucille o seguiu e fazendo um pouco de força, conseguiu abrir a porta.

Lá dentro estava uma escuridão total. Nenhuma luz penetrava por nenhuma fresta. Ela não se permitiu deixar dominar-se pelo pânico.

– Então você me seguiu. – uma voz soou na escuridão.

Estendendo as mãos, procurou tatear pelas paredes. Uma luz forte incidiu sobre ela, fazendo-a voltar-se assustada.

– Quem está ai?! – a luz voltou a apagar-se, deixando-a novamente no escuro. – Me desculpa por segui-lo, mas eu tenho que descobrir quem é você. Você nunca se apresentou formalmente.

– E você nunca adivinhou?

– Não. Todas as vezes que nós nos encontramos foi numa penumbra, você estava mascarado e agora nessa escuridão total. Tudo que eu tenho é a sua voz, que me soa familiar e ao mesmo tempo tão diferente

– Você disse que as minhas cicatrizes eram sinais de coragem. Foram elas que tornaram minha voz diferente.

Lucille continuava tateando o escuro. Ela escutava passos perto dela, como se ele quisesse se aproximar, mas ao mesmo tempo se afastava.

– Por que você me ajudou? Salvou-me duas vezes. Por quê?

– Eu sou seu salvador da noite... Mas você me conhece de outras formas.

– Como? Como eu posso ter reconhecido você? – um nervosismo já permeava a sua voz.

Mas Lucille realmente ficou paralisada de terror quando a voz masculina se manifestou novamente.

– Ora Madame... Não vai me dizer que já esqueceu o nosso beijo. – era outra voz com certeza. Num francês com sotaque alemão... Só podia significar uma coisa: Caíra numa armadilha!

– Não! Não pode ser! – ela ofegou – Apenas a mudança do timbre de voz! Quem é você? Meu salvador ou alguém que quer a minha perdição?

– E por que eu iria querer sua perdição? Pensei já lhe ter dado amostras de minha estima, madame.

– Por favor, Capitão... Se nós nos encontramos por acaso e, por cavalheirismo, você se sentiu o impulso de me salvar, por que não me contou que era você ? Eu achei... Eu pensei... – Lucille balançou a cabeça desanimada.

Cometera um erro ao vir ali. Ser seu salvador misterioso era parte de um plano do capitão nazista. Mas por quê? Lágrimas de decepção arderam em seus olhos. Pensara tanto sobre ele... De inicio chegou a pensar que ele fosse Gerard. Talvez estivesse desfigurado devido ao acidente, mas nunca deixara de olhar por ela e protegê-la. Depois achou que fosse algum admirador de seu talento. Mas agora ela via que não. Ela procurou chegar até a porta.

– Eu sabia que você seria um obstáculo a minha missão. Fui instruído a me manter longe, mas claro, eu não consegui.

– Você é um agente nazista?

– Não. – a voz mudou de timbre. – Apenas alguém cumprindo uma promessa.

Algumas luzes mais fracas foram se acendendo. Lucille viu que o galpão não era grande. A porta estava a passos de distancia dela. No lugar havia uma mesa com uma única cadeira. Sobre a mesa estava um quepe e um sobretudo estava pendurado sobre uma cadeira.

Ela olhou para o homem parado a alguns metros de distância. Lucille sentiu um nó se formando em sua garganta quando ele deu alguns passos em sua direção.

– Ah Meu Deus! – e caiu de joelhos.

Gerard correu até ela ajoelhando-se também.

– Minha amada. Minha amada esposa.

Lucille colocou as mãos sobre o rosto, chorando copiosamente.

Lucille, - ele pegou em suas mãos. Estavam geladas. Lágrimas corriam abundantes pelo rosto dela, enquanto ela olhava para ele. - há coisas em minha vida que você não soube e que eu te deixei antes mesmo de contar. Você me adivinhou quando eu lhe toquei, não foi?

– Sim. Não. Quer dizer... Você tinha o toque do meu Gerard. Mas o que eu estou dizendo! Aqueles agentes ingleses...

– Huntingdon? Cavendish?

– Isso! Eles disseram que você estava morto! Que você não ia mais voltar. Que repousava em algum lugar do Canal da Mancha. – ela estava começando a compreender tudo e isso a estava deixando furiosa. – Eu. Não. Tive. O. Consolo. De. Me. Despedir. Eu enterrei nossa filha sozinha! Eu chorei em seu túmulo! – sua voz estava embargada pela dor. E pela a raiva.

– Eu sei, meu amor. – ele soltou as mãos dela das suas e colocou-as sobre os olhos. – Quando eu voltei, procurei saber informações sobre você. Então Huntingdon me contou. Você não imagina o desespero que eu fiquei.

– Mas mesmo assim não me procurou.

– Não podia! Eu era um agente britânico. Tinha uma missão a realizar. Eu disse a eles que era minha última missão. E depois eu voltaria para você.

Lucille levantou-se do chão e virou de costas para ele.

– E você pensou que eu iria ficar lhe esperando? A um defunto? Por quê? A minha vida continuou, Gerard.

– Ah, eu sei. A sensação de Paris. E com muitos admiradores, não é? – a irritação começava a tomar conta de suas palavras.

Ela percebeu a ironia. Ele desaparecera por dois anos e ficava irritado por sua vida continuara? Era demais! Virou-se para ele.

– Sim. Muitos homens me mandavam flores e convidavam-me para cear. Mas eu nunca aceitei. Ia direto para casa depois do espetáculo. Mas...

– Mas...

– Eu me envolvi com alguém. – ela admitiu.

– Seu suposto marido? Como será que ele vai reagir quando eu, o verdadeiro Gerard Vermont, se apresentar.

– Pessimamente. Ele não vai me entregar de mão beijada, pode estar certo. Julian esperou muito tempo por mim.

– Julian Desmonts... É. Ele já deixou bem claro que você pertence a ele.

Ela ficou surpresa com o que ele disse.

– Vocês se encontraram?

– Já. Uma operação em conjunto. Bem sucedida, devo dizer. Um primeiro encontro turbulento, mas agora... Acho que posso dizer que ele não quer mais me matar.

– Ele não me disse nada a respeito. – ela disse baixinho, como se refletisse.

– Eu pedi a ele para nada dizer. No meu mundo, devemos proteger quem amamos. Deixá-los na ignorância é o melhor caminho. Sinto muito, Lucille.

Ele se aproximou dela. Lucille ficou tensa com a aproximação. Ela viu pelo colarinho da camisa aberta a rede de cicatrizes em seu pescoço.

– Seu pescoço... – ela queria muito tocá-lo. – Você se feriu muito?

– O avião, na verdade, não caiu no Canal. Quando nós fomos atingidos, o piloto tentou levar o avião para a costa. Ele foi hábil e conseguiu aterrissar. Eu consegui me soltar, mas ele ficou preso pelo cinto. No afã de tentar soltá-lo, não vi que combustível vazava do avião. Houve uma explosão e eu fui atingido. – ele tocou o pescoço. – Eu queimei o rosto e parte do corpo. Fiquei quase um ano me recuperando.

– Mas por que você não mandou eles me procurarem? Por que me deixou pensar que estava morto?

– Em parte, por que eu tinha medo da sua reação quando me visse. Eu me senti destruído. E por fim, por causa da missão que eu assumira em Londres, eu tive que assumir uma nova identidade.

– Capitão Alexander Vaan Sucher... Meu pesadelo ambulante.

– Ah, mas você ficava bem perturbada perto dele...

– Eu tinha raiva dele. Era um arrogante, abusado. Beijou-me mesmo sabendo que eu era casada. – ela disse com um meio sorriso.

– Hum.. Então ele não fez nada errado, por que era o seu marido beijando você. – Gerard disse com voz profunda aproximando-se mais de Lucille.

Ela sentiu que ele ia beijá-la. Não. Ainda não...

– Não, Gerard. – a moça deu as costas para ele, afastando-se.

– Por que, querida? Agora que você sabe que eu estou de volta...

– Você acha que podemos recomeçar de onde paramos?

– Sim. Minha missão está quase terminada. As tropas britânicas ganharam mais tempo no norte da África, o comandante Von Gorthel está desmoralizado perante o comando alemão e provavelmente será substituído. – Gerard a segurou pelos ombros, fazendo-a voltar-se para ele - Foi o que eu pensei. Sinto muita falta de você.

– E eu de você. - a moça admitiu - Mas eu preciso pensar...

– Eu queria que você entendesse. É o meu trabalho. - ele exasperou-se, soltando-a.

Ela perdeu a calma.

– E era o nosso casamento! Era a nossa vida!- ela gritou.

– Eu sei disso! - ele gritou de volta.

Os dois ficaram olhando-se, os corpos pulsando com raiva mas também com desejo.

Ele foi o primeiro a se controlar. Perder a calma era o maior erro de um espião.

– Eu estava sempre por perto... Cuidando de você. - ele disse com voz baixa, tranquilizante.

Mas Lucille era passional. Não se acalmava com facilidade.

– Ah sim... Como um homem misterioso que não revelava sua face nem sua identidade. E como um capitão nazista.

– Você queria a verdade, não é? Você me seguiu por que queria saber a verdade.

Ela se encaminhou para a porta, mas antes de abri-la virou-se para ele. Seus olhos brilhavam com lágrimas contidas, mas seus ombros estavam erguidos.

– No fundo eu acho que eu sempre soube a verdade. Que meu marido era um estranho. Na verdade, eu nunca soube quem você era. - dizendo isso, ela saiu pela porta o deixando mais sozinho do que nunca.


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