Uma canção de esperança escrita por Lu Rosa


Capítulo 22
Vinte e Dois




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Lucille entrou pela entrada lateral do Le Moulin parando quando avistou Henri.

– Eu não agradeci a você pelo meu salvamento da outra noite.

– Foi um prazer, madame. Eu gostei de socar a cara de alguns nazistas.

– Espero que isso não lhe traga problemas.

– Estava escuro. E eles não olhariam uma segunda vez para um humilde porteiro. – o francês deu uma risada.

Lucille ficou surpresa. Nunca pensaria que aquele senhorzinho tão tranquilo pudesse lutar como um profissional.

Ela acenou em despedida e se dirigiu ao setor dos camarins. Lá algumas das bailarinas estavam realizando suas tarefas. Umas consertavam as vestimentas, outras se aqueciam para ensaiar.

– Olá, meninas. Bom dia. – Lucille cumprimentou enquanto passava em direção ao seu camarim. Parou surpresa quando nenhum delas respondeu ao seu cumprimento. Ela voltou-se.

– Gente, o que aconteceu?

Mimi, uma das mais velhas do grupo e que tinha mortal inveja de Lucille, adiantou-se.

– Como você tem coragem de falar conosco depois do que fez?

– Eu não estou entendendo? O que eu fiz?

– Não se faça de ingênua, Angelique. Todo mundo viu você saindo com os nazistas. São seus novos amigos agora? E na frente da esposa dele? Que vergonha!

– Você está louca, Mimi? Eu não cedi favores a nazista nenhum, se é isso que você está insinuando. – Lucille cruzou os braços. – Mas acho que você queria que os olhos do comandante tivessem ido na sua direção, não é? Eu não acredito que estão todos pensando isso? – ela olhou para os outros funcionários.

Nenhuma das outras bailarinas se manifestou. Algumas até baixavam a cabeça. Suzette, outra bailarina veterana, falou:

– Nós vimos como ele tratou você, Angelique. E você estava se derretendo para ele.

Lucille as fitou, estarrecida.

– Acham mesmo que eu me derretia para aquele porco nazista? – o rosto dela estava vermelho com a cólera e seus olhos ardiam de lágrimas de humilhação. – Nunca! Nunca, ouviram. Só se eu estivesse morta. Tudo que eu fiz, foi para preservar-nos. Imaginem o que ele não faria se pensasse que não estava sendo bem tratado?

– Angelique tem razão. – declarou Serge chegando ao grupo. – Quando ele a retirou do palco, eu tentei impedi-lo. Ele não iria admitir ser contrariado. Angelique agiu pensando em todos.

– Apesar da esposa dele estar presente, ele estava me levando para uma armadilha. Henri e outros dois homens me tiraram das garras dele. Ele pode confirmar.

Todos os olhos se voltaram para o simpático velhinho que nesse momento colocava fumo em seu cachimbo e o acendia. Pacientemente, ele tragou algumas baforadas soltando a fumaça para cima.

Um dos contra regras riu desdenhoso.

– Imagine, Henri não aguenta nem com ele!

O francês levantou-se e olhando para o rapaz disse.

– Me ataque.

Ele olhou para os companheiros como se dissesse; “Olha o velhinho. Quer me enfrentar.”

Henri repetiu a ordem mais uma vez.

– Me ataque.

O jovem lançou-se para frente para esmurrar Henri. O francês apenas desviou-se para o lado e agarrando o braço do rapaz o torceu. O rapaz gritou de dor. Com um volteio do corpo, Henri fez com que o rapaz desse uma pirueta e caísse estatelado no chão. E tudo isso sem tirar o cachimbo da boca.

Os presentes olharam espantados para o homem não acreditando em seus olhos.

– Por que vocês acham que ele é meu funcionário mais antigo? – declarou Claude chegando na aglomeração. – Um empresário como eu acaba tendo muitos inimigos. Henri foi um pugilista em seu tempo de exercito e conhece outros tipos de luta. Ele treina todos os dias. Não se deixem levar pelas aparências. – ele voltou-se para Mimi. – E isso serve para você também, Mimi Blanc.

Mimi fungou e teatralmente deu as costas para todos e saiu. Suzette aproximou-se de Lucille falando:

– Desculpe-nos, Angelique. Mas da maneira que Mimi falou e pelo que todas nós vimos, achamos realmente que você havia concedido favores ao comandante.

– Nem em pensamento, Suzette. Eu não o desejo nem de presente para Mimi. E olha que eles combinam direitinho.

Todos riram. A harmonia tinha sido reestabelecida no Le Moulin. Nas sombras, Mimi escutava as risadas e estremecia de ódio. Isso não ficaria assim. Por muito tempo almejara a posição de estrela do Le Moulin. Posição essa que já contava como certa depois da saída de Margueritte. Mas Claude aparecera com essa desconhecida e sua oportunidade se perdera. Agora, tinha sido motivo de escárnio por Claude e pelos outros funcionários. Mas essa miserável não perdia por esperar. Mimi havia descoberto uma ou duas coisinhas que iriam interessar muito ao comandante.

***

– Você está bem? – Claude perguntou a Lucille quando o grupo se dispersou.

– Estou sim. Mimi tentou fazer todos ficarem contra mim. Eu não sei por que ela tem tanta raiva de mim.

– Ora, - os dois começaram a andar em direção as escadas. – ela achou que ficaria no lugar de Margueritte. Como isso não aconteceu e ela não pôde fazer nada, a frustração ficou e transformou-se em raiva.

– É uma boba! Se ela soubesse o quanto eu estava relutante...

– Se você pudesse deixar os palcos, você deixaria? – Claude perguntou.

– A situação atual não me permite pensar no futuro, Claude. Vamos deixar para pensar nessa situação quando ela aparecer, está bem? – ela o tranquilizou enquanto ele segurava a porta do escritório para que ela entrasse.

Mas, na verdade, a pergunta de Claude fez eco em seus pensamentos. O que ela faria se deixasse os palcos? Voltar a lecionar? Lucille não sabia muito que esperar. Mas como dissera a Claude. Quando o momento chegasse, ela pensaria nisso.

***

Gerard olhou para o documento e sorriu. A assinatura estava perfeita! Durante seu treinamento, era a parte de que ele mais gostava. Copiar letras até a perfeição. Agora era só entregar a autorização para o contador e pegar o dinheiro. Mesmo que Von Gorthel descobrisse, ele nunca poderia negar que a assinatura era sua.

Ele se dirigiu para a Contabilidade e entregou o documento ao contador.

– Aqui está, Sr. Fritz. O comandante realmente tinha esquecido em cima da mesa.

– Muito bem, capitão. Vou separar a quantia para o senhor. – O homem entrou em outra sala e ficou lá por alguns minutos. Gerard foi até a janela, vendo o movimento das pessoas na rua.

– Pronto, capitão. – Fritz lhe entregou dois envelopes. – Por favor assine aqui.

Gerard assinou os dois recibos e agradeceu. De posse dos dois envelopes, ele se preparava para sair quando um soldado o interpelou.

– Capitão! Capitão! – ele chamou.

Gerard voltou-se para ver. O soldado perfilou-se batendo uma continência.

– O que foi, soldado?

– O Sargento Heine pediu para lhe avisar que ele e o sargento Kroll já o aguardam lá fora senhor.

Gerard olhou para a rua e viu um jipe com três soldados. Ele havia esquecido das vistorias nos Orfanatos da cidade à procura dos jovens para treinamento. Como gostaria que Von Gorthel tivesse esquecido disso. Levar jovens franceses para lutar pelos alemães era algo que ele abominava. Mas, como estava representando um papel, resignou-se a sua sorte.

– Obrigado, soldado. – ele se despediu do rapaz e foi em direção ao veiculo.

Ele cumprimentou os três homens com um aceno de cabeça após entrar no carro.

– Sargento Heine, qual é o primeiro Orfanato da lista?

Heine olhou para a lista em sua mão e disse:

– Orfanato Sagrado Coração de Jesus. É aqui perto senhor.

Gerard precisou de toda sua experiência para não exprimir seu desagrado. Era justamente o orfanato em que Lucille dava aulas. Ele só não esperava encontrá-la por lá.


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