Escola de Guardiões escrita por Tynn


Capítulo 18
Capítulo 16 - Relato de um ex-prisioneiro




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Jorge bateu o tacape no chão para liberar toda a revolta. Eu coloquei Samyra sentada em um banco na própria cela de Zeca e fui falar com Jorge, tentar acalmá-lo antes que ele destrua todo o castelo e nos deixe soterrados.

– Jorge, respira um pouco. A gente vai dar um jeito nisso, Natália pode curar as pessoas e o diretor deve ter alguma forma de recuperar a visão de Zeca.

– Não, Natália não pode curar feridas que já foram cicatrizadas. – O garoto revelou. Ele já tinha jogado o capacete da armadura no chão e agora esmurrava a parede. – Manipuladores não são fáceis de regenerar. Não são como nós, humanos, que podemos trocar de rins caso algum dê defeito. Não existe transplante ou magia que faça o Zeca voltar a enxergar... Eu falhei, cara! O diretor acreditou em mim para salvar Zeca e eu não consegui.

Ele marchou para fora da jaula e olhou ao seu redor. Existiam várias outras celas onde grupos de prisioneiros eram mantidos, aguardando o momento de serem servos e começarem a trabalhar sem parar. Jorge colocou o tacape no ombro e balançou o cabelo castanho a cada passo, tentando decidir o que faria primeiro. Fiquei em dúvida se a decisão seria entre destruir todas as celas ou me matar. Afinal de contas, tudo começou por minha causa.

Com um passo, vi que ele pretendia abrir as celas das outras pessoas. Os prisioneiros deram uivos de alegria e pareceram animados com a ideia, mas logo percebi a real intenção de Jorge.

– Você não pode criar um motim agora! – Avisei, ficando entre ele e a cela. - Esses prisioneiros estão desarmados e há guardas lá fora com espadas, arcos-e-flechas e o arsenal inteiro de Jogos Vorazes. Se os prisioneiros ficarem na cela, eles não sofrerão. Mas se eles saírem, cara... Vai ser muito ruim.

– A gente tem que fazer alguma coisa! Você acha certo deixá-los aqui para sofrerem na mão daquela doida?

– Não. – Samyra falou. Ela estava em pé, apoiada na grade, e olhou firme para nós. – Marcelo tem razão, os prisioneiros ficarão seguros onde estão. Entreguem-me a coroa real e eu colocarei todo o Reino de Crisélia nos eixos. Os escravos voltarão a ser livre! Não se preocupe com isso.

O clima não estava muito bom. Jorge passou um tempo pensativo. Dava para ver o quanto ele queria quebrar todos os cadeados com o seu tacape e libertar os escravos, mas nossos argumentos eram bons. Ele precisava agir com a razão caso quisesse sair de lá vivo. Jorge desistiu de sua revolta e voltou para a cela de Zeca; colocou o rapaz no ombro e o carregou até a porta de entrada. Natália estava com as mãos espalmadas para frente, soando frio.

– Já achava que tinham se esquecido de mim. – Ela comentou. De repente, viu o seu antigo parceiro de equipe. – ZECA!

Uma onda de choque se espalhou do campo de força, derrubando todos os soldados que tentavam invadir o calabouço. A curandeira desceu as escadas de dois em dois degraus e segurou a mão do amigo, que ainda estava sendo carregado. Ela beijou a bochecha de Zeca e deu um abraço estranho, já que o rapaz não conseguia se mexer muito bem por estar no ombro de Jorge. Foi então que Samyra apontou para o canto esquerdo do calabouço.

– Ali tem um corredor que nos levará ao interior do castelo. Devemos sair daqui logo! Daqui a pouco os guardas se levantam e voltam a nos atacar! – E nós corremos como um louco para o tal corredor.

O local era úmido e as paredes feitas de pedra, sendo tudo iluminado por tochas penduradas. Eu fiquei responsável por ajudar Samyra a andar, já que ela ainda estava bastante fraca, enquanto Jorge carregava o colega com facilidade. Depois de algum tempo de atraso, Jorge finalmente resolveu carregar Samyra no outro ombro e voltou a correr naturalmente. Isso que eu chamo de disposição.

Passamos alguns minutos indo de corredor em corredor, com Samyra sempre apontando a direção certa a seguir. Podíamos confiar nela, já que tinha sido criada e crescera naquele ambiente. Quando finalmente já tínhamos corrido meia-maratona, os barulhos de armas e pessoas marchando em nossa direção puderam ser ouvidos.

– Vamos pelo outro lado. – Ela avisou.

Todo mundo se virou para correr na outra direção, quando o mesmo barulho de passos nos alarmou. As tochas mostraram a silhueta de um grupo de soldados vindo até nós. Eles estavam nos dois extremos, direita e esquerda; não tínhamos muitas escolhas.

Natália puxou o seu arco-e-flecha e apontou para o seu lado esquerdo. Jorge colocou os dois frágeis aliados no chão, pegando o seu tacape para defender o outro lado do corredor. Eu estava com a minha espada em mãos e dei um passo para trás, batendo as costas em algo com muitos detalhes para ser a parede do castelo. Ao me virar, me deparei com uma grande porta de ferro trancada. A fechadura era grande, mas estava bastante enferrujada. Com alguns golpes da minha espada, consegui destruí-la e abri uma brechinha da porta, vendo que lá dentro existiam tochas acessas. Ajudei Zeca a se levantar e o guiei até a sala, fazendo o mesmo com Samyra. A essa altura, Natália e Jorge já haviam percebidos meu plano e entraram na sala misteriosa, assim como eu.

A primeira coisa que fizemos foi empurrar uma enorme estante até a porta, impedindo que os soldados consigam entrar. O local era um verdadeiro museu de guerra, com armaduras, espadas, lanças e emblemas espalhados no enorme salão. Samyra olhou para tudo com ar de nostalgia, caminhando até uma armadura de cobre.

– Esse é o museu do meu pai. Ele costumava colecionar armaduras antigas de todos os lugares do mundo. Acho que estamos seguros aqui por um tempo. Existe uma porta do outro lado do salão, que dá direto aos antigos aposentos reais. Podemos sair por lá.

Todos nós assentimentos. Então, Natália foi até Zeca e lhe deu um abraço de verdade, deixando algumas lágrimas descerem de seu rosto. Ela puxou a mão dele e olhou bem nos seus olhos, percebendo a pupila sem vida do garoto.

– Zeca... – Ela começou, balbuciando. – Nós viemos aqui te buscar e faremos o máximo para que você se recupere. Não se preocupe, vamos dar um jeito naquela bruxa sem coração. Jorge não me disse, mas eu percebi assim que o vi. Eles fizeram algo muito cruel com a sua visão.

– Eu estou muito feliz por vocês terem vindo. Não precisavam se esforçar tanto. – Ele respondeu. – Quando vim para esse mundo, um soldado da rainha Samyra me nocauteou e quando eu acordei, já estava no calabouço. Eu usei minha manipulação para sair, mas logo veio outro guarda me prender. Eu continuei fazendo isso e sempre aparecia mais alguém. Até que aquela rainha surgiu na sala. Ela possuía um pano em frente aos olhos e eu não podia vê-la diretamente. Ela me expôs a um vapor fedorento e, em segundos, eu só vi a escuridão.

Um silêncio fúnebre se instalou. Todos nós paramos para escutar o relato de Zeca e eu mesmo fiquei bastante emocionado. Estávamos sentados ao redor dele, exceto por Samyra que caminhava lentamente pelo aposento, apesar de ter escutado todas as palavras do manipulador. Ela puxou a lança dourada de uma armadura de cavaleiro e caminhou até nós. A lança serviu como bengala durante alguns passos, até ela segurá-la como uma verdadeira amazona faria.

– Essa bruxa não vai se safar. – Disse.

– Zeca, a mulher que lhe tirou a visão não é a rainha de verdade. Ela é uma feiticeira que está disfarçada. A verdadeira rainha desse reino está aqui, ao nosso lado.

Ele escutou as palavras de Natália com especial atenção. Uma expressão de dúvida se formou em seu rosto, mas logo Samyra se agachou e tocou levemente nas mãos do manipulador.

– Eu prometo que tudo voltará ao normal. Você não precisa ter medo. A justiça será feita.

Eles se abraçaram por um instante e voltamos a planejar nossa fuga. A ideia inicial era encontrar a rainha e acabar com ela, isso todo mundo concordou. Quando Samyra recuperasse a sua aparência, ela poderá contar uma história para os demais cidadãos, ou simplesmente falar toda a verdade, trazendo o reino de volta ao normal. Ficamos um tempo sentados, descansando da correria, quando um barulho nos fez levantar em um salto. Eu apontei minha espada para frente e um novo estralar foi ouvido. Era barulho de ferro rangendo, se mexendo. Natália apontava o arco para todas as direções, pois parecia que os ruídos vinham de qualquer lugar. De repente, todas as viseiras das armaduras em nossa frente se fecharam como uma sinfonia aguda e elas apontaram suas armas em nossa direção.

– Me diz que isso é zueira... – Jorge comentou, já armado com seu tacape.

– Samyra, fique ao lado de Zeca e use a lança para defendê-lo. – Natália disse. – Deixa que a gente destrói essas armaduras vivas.

– Tudo bem. – Dessa vez foi Samyra que respondeu. – Mamãe nunca gostou da coleção do meu pai mesmo. Podem quebrar tudo.

Eu também queria dizer uma frase de efeito, mas a única coisa que me veio à mente foi:

– GERÔNIMO!

E a batalha contra as armaduras ambulantes começou.


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