O Reflexo escrita por Jéssica Sanz


Capítulo 8
Capítulo 8


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítulo. Como Wes vai reagir à presença de um possível Reflexo?



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Eu deixei o menu cair no chão, e todos olharam para mim. Eu abaixei e peguei como se nada tivesse acontecido. Thomas levou o casal para uma mesa, não muito longe da porta. Percebi quando ele disse que ia chamar alguém para atende-los, e veio até mim. Antes que ele pudesse dizer alguma coisa, eu perguntei.

– Quem são eles?

– Senhor Artie e Senhorita Mary Ann. Eu diria que são o casal de frequentadores mais jovens que temos.

– Eles são casados?

– Não, não... Só namoram. Costumam vir aqui todo final de mês. A última sexta-feira do mês. Mas pra que está perguntando isso tudo?

Eu poderia ter dito que estava apenas interessado em conhecer melhor os frequentadores, mas ainda estava muito focado no casal, que conversava alegremente. Thomas balançou a mão na minha frente.

– Wes? – Assim, ele fez com que eu olhasse pra ele.

– O que foi, Thomas?

– A casa tá cheia, presta atenção. Se está reparando que o rapaz parece com você, acorde. Isso aqui não é o Brasil. Tem muito loirinho em Nova York. Tô cheio de mesa, cuida deles pra mim?

– Claro.

Havia um cardápio sobre a mesa do casal, mas eles não estavam interessados. Peguei meu bloco de anotações e fui até lá, tentando controlar meu nervosismo. Quanto mais perto eu chegava, mais o rapaz se parecia com Reflexo.

– Boa noite. Meu nome é Wes e serei o seu garçom hoje.

– Boa noite - disse o tal de Artie, sorridente – Prazer em conhece-lo, Wes.

– O prazer é meu – tentei parecer gentil, mas não era fácil. – Já escolheram o que vão pedir?

Os dois se entreolharam, e eu fiquei com medo de ter feito a pergunta errada.

– Bom, - disse a simpática garota ruiva - costumamos pedir Roasted Chicken Breast, acompanhado de Saint-émilion 2003, mas talvez tenha outra sugestão. Que vinho o senhor pode nos sugerir?

Eu sorri. Se tem uma coisa que eu aprendi nos restaurantes do Brasil, foi sobre vinhos.

– Bom, senhor, já que me perguntou, o Saint-émilion é um vinho conhecido e bem pedido, mas não o ideial para acompanhar o Roasted Chicken Breast. Para este prato, eu sugiro Saint-estèphe, que assim como o primeiro vinho, vem das vinícolas de Bordeaux, e o preço continua acessível.

– Uau – disse Mary Ann. – Gostei muito da sua sugestão, Wes.

– Nunca tínhamos te visto por aqui, você é novo não é mesmo?

– Sim, senhor.

– No entanto, um rapaz muito experiente, pelo que pude ver – continuou ele. - Já trabalhou como garçom antes?

– Eu acabei de chegar a Nova York, faz menos de um mês. Mas eu trabalhei em muitos dos bons restaurantes do Brasil, desde os dezessete anos.

– Hum, um brasileiro – disse a moça. Os dois pareciam altamente simpáticos. - Nunca poderia adivinhar tal coisa. Você tem uma aparência atípica do Brasil, a menos que eu esteja equivocada.

– Está certa, senhorita.

– É gratificante ver que o Cafe Boulud realmente sabe escolher seus garçons – disse Artie. - Eu não esperava muito menos, mas você me surpreendeu.

Um arrepio percorreu minhas costas.

– Bom, agradeço o elogio, mas é melhor eu não atrasar o pedido do senhor e da senhorita. Com licença.

Andei até o balcão e digitei o pedido que ia sair direto na cozinha. Minha mão estava tremendo. Não, eu não podia tremer. Não no melhor emprego que eu arrumei em toda a minha vida. Fui até a adega e peguei o Saint-estèphe, colocando numa bandeja em seguida. No caminho até a mesa deles, passei pelo aparador, que ficava no centro do salão, e peguei duas taças. Então, servi os dois.

– Reserva especial? – Perguntou Mary Ann.

– Por minha conta – eu disse, o que fez o casal sorrir.

– É muito gentil Wes.

– Obrigado – eu disse, ainda servindo o vinho para Mary Ann, sem olhar para ele, ou acabaria fazendo uma besteira. – O pedido de vocês virá logo.

Pedi licença e fui atender às outras mesas. Uma dúvida cruel me perseguia. Eu não sabia se deveria perguntar aquele rapaz se ele era mesmo quem eu pensava. Seria algo altamente invasivo, não recomendável para um garçom. Principalmente, não para um garçom do Cafe Boulud. Se eu quisesse fazer tal pergunta, eu deveria ficar íntimo do casal de clientes. Bom, eu já os estava conquistando, ainda mais tirando do meu bolso a caríssima garrafa da reserva especial.

Pouco mais tarde, vieram da cozinha os dois pratos de Roasted Chicken Breast, e eu os levei para o casal.

– Hum, que saudade eu estava deste prato.

– Calma, querido, foi só um mês.

– Bom, qualquer coisa, é só me chamar.

– Tudo bem, Wes. Muito obrigada.

Fiquei servindo as mesas, olhando para o casal de vez em quando. As colunas, inclusive a do aparador, eram cercadas por espelhos, o que me incomodava. Eu sentia que havia três de nós.

~

Mais tarde, eles me chamaram para pedir uma sobremesa.

– Aqui está o super garçom – disse Artie. – O que pode nos sugerir depois de um Roasted Chicken Breast acompanhado de Saint-estèphe Reserva Especial? Aliás, devo dizer, esse vinho ficou perfeito. Obrigado pela sugestão.

– Eu que agradeço por aceita-la. E tenho mais uma para a sobremesa, na minha opinião, a mais deliciosa da casa: Molten Chocolate Cake. Confiem, é deliciosa.

– Eu ficaria surpresa se alguma coisa daqui não fosse – disse Mary Ann, rindo em seguida. – Vamos aceitar mais uma vez, Wes.

Registrei o pedido, que ficou pronto logo. Então, rapidamente eu estava de volta.

– Wes, não vá embora – disse Artie. Eu quase disse que ele tinha ido embora, mas esperei que ele terminasse. – Queremos que fique aqui para já agradecermos a delícia que vamos provar.

– Isso se você não estiver com muito trabalho.

Olhei para o restaurante. Eu estava com algumas mesas, mas eram bem poucas. O movimento já tinha diminuído naquela hora.

– Não, não muito.

Artie e Mary Ann provaram, se deliciaram, agradeceram e continuaram conversando comigo. As coisas começaram a ficar difíceis para mim.

– Wes, você é um garoto esplêndido – disse Artie. – Você é experiente, gentil, dá pra ver que leva seu trabalho a sério. Se essa simpatia não se restringe ao Cafe Boulud, você deve ser dono de belas amizades.

Ouvir aquele homem falar sobre minhas amizades me deixou completamente nervoso. Não tinha a menor possibilidade de ele não ser Reflexo. Como podia fazer uma coisa daquelas comigo? Era possível que tivesse se esquecido de mim, ou que estivesse brincando com a minha cara? Sinceramente, eu tive vontade de gritar, mas não poderia fazer isso no meu trabalho. Além disso, a pobre Mary Ann era alheia à história toda. E havia uma remota possibilidade de aquele homem não ser Reflexo. Como seria possível nos encontrarmos no mesmo restaurante depois de tantos anos? Resolvi responder a verdade sobre “minhas amizades”, para ver se ele baixaria a guarda. Falei olhando nos olhos dele, para tentar provocar uma reação.

– Na verdade, não senhor. Eu só tive um grande amigo durante toda a minha vida. Um garoto parecido comigo, que foi a melhor coisa que já me aconteceu, e depois me abandonou.

– Por quê? – Perguntou ele.

– Porque nós discutimos. Eu gritei com ele, e o mandei ir embora. Ele voltou uma vez, mas não falou comigo. Então, foi embora pra sempre. Eu nunca mais o vi, mas nunca me esqueci dele. Vivemos essa amizade por pouco tempo. Mas foi uma amizade linda, forte. Algo que... Corroeu meu coração. E ele nunca se recuperou.


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Notas finais do capítulo

A situação está tensa. Será que Artie e Reflexo são a mesma pessoa? Como o casal reagirá à história de Wes?



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