O Reflexo escrita por Jéssica Sanz


Capítulo 7
Capítulo 7


Notas iniciais do capítulo

E começa a segunda fase. Como será que está o Wes depois de tantos anos?



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– Três minutos para decolagem do voo Rio de Janeiro, Nova York.

Agarrei minha maletinha, me levantei e corri. Passagem no bolso ok? Ok. Fui para a fila de embarque. Eu não sosseguei até estar sentado no avião com cinto de segurança. Aí respirei fundo e disse para mim mesmo, em pensamento: vai começar uma nova vida. Nova York, aí vou eu.

Não tinha ninguém do meu lado, então fiquei a vontade para rir quando o avião decolou. Foi nesse momento que eu tive certeza de que eu podia voar. E de que as coisas iriam melhorar assim que eu pousasse nos Estados Unidos.

Não, você não está lendo a história errada. Dois dias antes do voo, eu, Wes Ferreira, tinha completado meus vinte e um anos. Cada aniversário era um lembrete do incrível Reflexo que desapareceu naquela noite. Eu nunca mais o vi, e depois de tantos anos, não sabia dizer se eu tinha imaginado aquele beijo. Eu fiquei por muito tempo encarando o espelho antes de dormir, pensando que era ele me observando. Eu deixava a janela sempre aberta, para o caso de ele voltar. Eu realmente queria que ele tivesse voltado. Queria vê-lo de novo. Mas ele desapareceu completamente. E eu quase o esqueci.

Quase.

O tênue reflexo na janela do avião era uma prova de que aquele garoto ainda perturbava a minha mente. Parecia que estava vendo ele, e não a mim. Senti vontade de abrir a janela para que ele entrasse, mas isso não é possível no avião. Eu era uma criança naquela época, eu nem sabia se Reflexo existia ou se era apenas um fruto do meu imaginário infantil. Mas eu esperava que ele fosse real, e que eu o encontrasse.

No entanto, eu estava indo para Nova York, e ficaria difícil encontrá-lo. Mas eu sabia que ele estava em algum lugar, tinha que estar. E eu não me daria por satisfeito enquanto não o encontrasse e dissesse tudo o que eu tinha para dizer.

~

Horas depois, eu estava aterrissando em Nova York. O avião fez um barulho assustador ao pousar. Soltei o cinto, me levantei, peguei a maleta e sai. O ônibus nos levou da pista até a parte interna do aeroporto. Fiquei alguns minutos na luta para conseguir minhas malas de volta. Depois, peguei um táxi e fui para a minha casa.

Você deve estar se perguntando o que eu estava fazendo nos Estados Unidos. Mas é simples. Assim que eu fiz 18 anos, saí da casa dos meus pais, que nunca confiaram em mim. Passei a morar sozinho, mas não foi o suficiente. Meus pais continuaram me atormentando por achar que eu não tenho capacidade de me virar sozinho. Então eu decidi procurar emprego nos EUA, e consegui. Aluguei uma casa, comprei a passagem e pronto. Um novo começo, para esquecer meus pais, e quem sabe, esquecer o Reflexo. Eu nunca quis realmente esquecê-lo, mas sabia que a dúvida com relação a ele era um tormento para mim.

Eu passei o restante do dia descansando e resolvendo problemas. Ajeitei a casa, comprei algumas coisas, desfiz as malas. Esse tipo de coisa. Eu até pensei em ligar para alguém, mas para quem eu ligaria? Para meus pais? Não, nada disso. Ninguém queria saber onde eu estava e mesmo se quisessem, eu não me importaria em despreocupar essa pessoa. Eu deveria me apresentar no trabalho apenas no dia seguinte, e era melhor eu estar bem disposto, então fui dormir cedo.

~

Tomei banho, escovei os dentes e coloquei uma roupa bem apresentável. Eu tinha que impressionar, porque o trampo não era qualquer um. Era um trabalho de garçom, mas não de um restaurante qualquer. Garçom de um dos melhores restaurantes da cidade, primeiro lugar no “Guide Michelin”, seja lá o que for isso. Parece importante. Enfim, eu estava empolgado com esse recomeço, que parecia bom demais.

Saí de casa e peguei um táxi. Pedi para ele me deixar lá, era um endereço diferente para mim, assim como o endereço da casa. Eu não sabia nem pronunciar direito, então entreguei o papel com minhas anotações para o motorista. Ele reconheceu imediatamente.

– Cafe Boulud?

– Yes. Cafe Boulud, please.

O cara me levou até lá. As ruas de Nova York são simplesmente maravilhosas, cheias de lojas incríveis. O motorista me deixou bem em frente ao Cafe Boulud.

– Thank you.

Eu entrei e andei para a direita, onde encontrei a recepcionista. Conversei com ela em inglês.

– Bom dia. Eu sou Wesley Ferreira, eu vim para...

– Sim, Sr. Ferreira, eu o estava aguardando. Sou Katie. Bem-vindo ao seu novo trabalho – ela fez sinal para um cara que estava servindo chá a uma senhora na mesa adiante. – Thomas, esse é o Sr. Ferreira, veio para trabalhar conosco.

– Ah, sim, o Sr. Ferreira. Seja bem-vindo ao Cafe Boulud. Venha por aqui.

Eu acompanhei Thomas até a cozinha. As mesas eram quadradas e forradas com espessas toalhas brancas. Sobre cada mesa havia um vasinho quadrado e espelhado, com flores vermelhas, além dos pratos e taças já preparados. As cadeiras eram de madeira com assentos vermelhos. As paredes tinham tom de creme com detalhes de madeira, espelhos e arendelas, tudo deixando o lugar com aspecto aconchegante. No teto, as luminárias eram em formato de fatia de laranja. Thomas usava o uniforme tradicional: Uma camisa branca, calça e sapatos sociais e colete. Ele me falou um pouco sobre o restaurante e como trabalhar. Apesar disso, eu já tinha experiência, tinha trabalhado como garçom em vários restaurantes no Brasil. Thomas me entregou o uniforme como o dele e eu tratei de me vestir. Depois, comecei a trabalhar.

Thomas estava me observando, provavelmente para contar sobre meu desempenho. Tentei ser o mais perfeito e cordial que um garçom pode ser. Recepcionava quem chegava, levava o cardápio, até arriscava sugestões para quem não costumava ir ao restaurante, baseado no que eu já sabia sobre os restaurantes e os americanos. No fim do dia, Thomas elogiou minha conduta.

As coisas se saíram bem no primeiro dia, e nos outros também. Mas demorou até a o fim do mês para as coisas começarem a ficar esquisitas.

A essa altura, eu já estava familiarizado com a casa, com o menu, com os colegas de trabalho. Tinha conhecido muitos clientes, e até ficado amigo de alguns que frequentavam semanalmente. O Cafe Boulud era frequentado por pessoas de alta classe, homens de terno, mulheres bem vestidas, a maioria deles de idade elevada, mas isso não significava que jovens como eu não pudessem ser clientes assíduos. Naquela noite, eu estava atendendo a um simpático casal de velhinhos. Eu já tinha ficado amigo do Sr. Campbell e sua esposa, que jantavam no Boulud todas as segundas-feiras.

– Então você é brasileiro! Mas tem um rostinho de americano!

– É verdade, Sra. Campbell. Minha aparência sempre chamou a atenção no Brasil. Bom, vou deixar o senhor e a senhora a sós.

Fui para a bancada onde os pedidos são registrados, para ver o que mais havia para ser feito. Mas outra coisa chamou minha atenção. Na entrada, Thomas estava recepcionando um casal. Era uma jovem moça, de cabelos ruivos, soltos, cacheados e compridos, belos olhos azuis e um vestido verde. Seu acompanhante era um rapaz, mais ou menos da minha idade, cabelos loiros e olhos acinzentados, como eu.

Como eu? Eu poderia pensar que isso não fazia diferença, pois as chances de encontrar alguém parecido comigo em Nova York eram maiores. A diferença entre eu e o tal rapaz era bem notável, não seria possível nos confundir. Eu não me preocupava muito com a nossa semelhança, ela não era impressionante. O que era realmente impressionante era a semelhança que havia entre esse cara e um garoto muito parecido comigo.

Era como se eu estivesse olhando para Reflexo, porém crescido.


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Notas finais do capítulo

Fechando com esse mistério. A partir de agora, Wes vai tentar descobrir se o cliente é mesmo o Reflexo da sua infância.



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