Chá com leite. escrita por Isadora Nardes


Capítulo 9
Capítulo 9.


Notas iniciais do capítulo

Me desculpem a falta de notícias.
Música do capítulo: The Naked and Famous (Young Bllood)



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Matheus sentiu a aura no lugar mudar.

Antes, uma melancolia se fundia com o silêncio. Agora, havia tanto barulho, tanta empolgação no ar, que ninguém ousou ficar triste. Ficar triste ali parecia algum tipo de crime, como se aquele bando de adolescentes com ops rostos pingando suor e tinta fossem brandir suas espadas de isopor e atacar qualquer um que mostrasse o menor sinal de melancolia.

Matheus não ia desistir de seu cigarro, portanto continuou fumando enquanto andava. Esther ia ao seu lado, a uma distância desnecessariamente grande. Um garoto baixo, magro, loiro e com duas manchas azuis no rosto chegou perto dos dois. Ele estava ofegando, e tinha uma espada de isopor na mão. Seus olhos azuis brilhavam de tanta animação.

–- Oi, eu sou Pedro, filho de Hermes – ele jogou as palavras em cima de Matheus e de Esther. Matheus ficou sem entender. – Vocês vão jogar?

–- Jogar? –Matheus perguntou.

–- Captura a bandeira – Esther explicou. – Eu vou, sim.

–- Ótimo! – Pedro pulou de alegria. – Time vermelho ou azul?

–- Filha de Hécate.

–- Time azul. E você? – Pedro virou-se para Matheus.

–- Ele é filho de Hades – Esther apressou-se em dizer.

–- Time vermelho – Pedro completou.

–- Eu não vou jog... – Matheus começou.

–- Vai, sim – Esther interrompeu.

Matheus ficou olhando de Pedro para Esther. Não estava nem um pouco a fim de ficar fugindo de adolescentes com espadas de plástico. Porém, por fim, apagou o cigarro numa árvore e jogou a bituca no chão. Esther fez cara feia, mas não disse nada. Pedro tirou de uma mochila em suas costas dois potes de tinta: um vermelho e um azul.

Esther inclinou-se, e Pedro fez, com o dedo, duas linhas azuis nas bochechas de Esther. Matheus esquivou-se quando Pedro ia fazer duas linhas vermelhas nele.

–- É parte do jogo – Pedro disse.

–- Ah, qual é, Matheus – Esther irritou-se. – É legal.

Matheus grunhiu e deixou Pedro, que era da metade de sua altura, tentar pular inutilmente para pintar seu rosto. Esther bufou e levantou Pedro pela cintura, até ficar da altura de Matheus. Pedro fez dois riscos no rosto de Matheus, depois fugiu para outro grupo.

–- Como eu estou? – Esther perguntou.

–- Continua ruiva – Matheus disse.

Esther se virou e foi até uma longa fila de pessoas com manchas azuis no rosto. Matheus concluiu que deveria ir para a outra fila, a de pessoas com manchas vermelhas. Sua irmã, Tati, estava na frente dele.

–- Você nem gosta de Percy – ela disse.

–- A ruiva me obrigou – Matheus grunhiu. – Disse alguma coisa sobre eu ser filho de Hades.

–- Haha. Ótimo. Somos completamente irmãos, então.

Matheus estava achando toda aquela esquisitice muito entediante. Pegou um cigarro e acendeu. Alguns adolescentes o olharam como se quisessem dilacerá-lo, mas ele ignorou. Não iam fazer nada com espadas de isopor.

–- Mamãe vem me buscar – Tatiana disse. – As 17:00.

–- Não era eu que ia te levar? – Matheus indagou.

–- Ah. Pois é. Eu menti.

Matheus a fitou, incrédulo.

–- Vocês precisam se falar. Ah, falando nisso, como foi o almoço? – Tatiana perguntou.

–- Uma merda. Mamãe queria me levar pra Inglaterra – Matheus grunhiu, tragando novamente.

–- Levar você? – Tatiana estranhou.

–- Não só eu. Ela queria a porra de uma viagenzinha em família.

–- Mas... Quem faz viagens em família é a Gabi.

–- Foi o que eu disse pra ela – Matheus exalou a fumaça.

–- E nós vamos?

–- Eu sei lá. Mamãe ficou irritadinha quando eu rejeitei a Esther. Ela disse: “Você não é sociável, Mat” – Matheus riu. – Aliás, eu nem teria almoçado com a Esther se mamãe não tivesse marcado da gente se encontrar.

–- Viu só porque você precisa ver mais a mamãe?

–- Ah, Tati, não enche – Matheus inalou mais fumaça. – a Esther só veio e se sentou à mesa depois que a mamãe foi embora.

–- Mamãe sabe?

–- Não. E você não vai contar, senão ela vai ficar: “Ai, porque você tem que ir pra Inglaterra, engatar um namoro com ela, parar de fumar, blá-blá-blá” – Matheus imitou o falsete da mãe.

–- Hum. Ah, mas engatar um namoro até que seria legal e...

–- Tati!

–- Eu quero sobrinhos ruivos!

–- Porra, Tati, eu conheci ela há três horas.

–- Eu gostei dela. Você gostou dela também.

–- Ela não gostou de mim.

–- Então porque ela empurrou você pra cá?

–- Porque ela é maluca.

–- Todas as garotas são, Matheus. Isso não justifica nada.

Matheus estava prestes a falar alguma coisa, mas uma voz interrompeu todas as outras. Era uma adolescente alta, um pouco gordinha, que tinha cabelos castanho-escuros oleosos, e soltos.

–- Escuta, gente – ela disse, apitando um apito pendurado no pescoço dela. – Esse é o Kleber – ela apontou para um garoto magro, baixo, com uma cabeleira preta. Ele tinha olhos saltados e um sorriso de orelha a orelha, fora duas manchas vermelhas nas bochechas. – Ele é o supervisor do time vermelho.

Ah, ótimo, Matheus pensou. Vamos ser supervisionados por alguém com a metade da altura da Tatiana.

–- E essa é a Isis – a garota gordinha apontou para uma menina negra, que devia ter uns 16 anos, e tinha cabelos pretos cacheados e longos. A menina estava com duas manchas azuis no rosto. – Ela supervisiona o time azul.

Porra, ela ficou com a melhor, Matheus pensou.

–- E eu – a menina gordinha apontou pra si mesma. – Eu supervisiono a porra toda. Eu não quero que vocês se mutilem nem se decapitem. Não quero ninguém morrendo de hemorragia externa...

–- Interna pode? – uma voz perguntou.

–- Não. Também não quero ninguém se socando. E eu não quero filhos de Poseidon se achando pra cima dos filhos de Ares – ela lançou um olhar feio para Isis. – E eu quero saber quem são os filhos de Hades.

Tatiana e Matheus – e outros dezenove adolescentes – levantaram as mãos.

–- Eu não quero que vocês convoquem os mortos, tá bom? É contra as regras.

–- Mas é a minha única arma! – Tatiana interviu.

–- Já disse que não pode. Alguma pergunta? Não? Ótimo. Cinco minutos pra montar estratégia.

Matheus se sentiu tentado a levantar a mão, mas preferiu esperar os murmúrios recomeçarem.

–- O que é pra fazer? – ele perguntou baixinho para Tatiana.

–- Você é do time vermelho, e você tenta pegar a bandeira do time azul, enquanto protege a do seu time.

–- E como eu faço essa porra?

–- Presta a atenção na estratégia.

Tatiana puxou Matheus para um grupo de adolescentes do time vermelho, e Matheus tentou prestar a atenção.

–-... Daí o Maicom vai pelo canto, e golpeia a guria ruiva.

–- Por que eu?

–- Você é pequeno e invisível.

–- Eu sou filho de Ares. Eu tinha que tá na linha de frente.

–- Tinha nada.

–- E como você sabe que a garota ruiva vai ficar perto da bandeira?

–- Por que eu sei.

–- Eles não iam deixar ela sozinha lá. Ela tá sem espada – Tatiana interviu.

–- Tem razão. Ok, então o Maicom e... Você – a garota que estava falando apontou para Matheus.

–- Ele tá sem espada – Tatiana interviu.

–- Ok. Maicom, você dá sua espada pra ele.

–- Por que eu? – Maicom repetiu a pergunta.

–- Porque ele vai te defender enquanto você pega a bandeira.

–- Mas só em dois é arriscado – outro garoto interviu.

–- Então você pode ir junto. Você e Maicom vão pelo canto. Ele é só uma distração.

–- Eu tenho nome – Matheus interviu.

–- Tá, tá. Qual seu nome?

–- Matheus.

–- Matheus, você vai ser uma distração.

–- E se não der certo? – Tatiana perguntou.

–- Daí você pode ir com ele. Você pode ficar de guarda com uma das minhas espadas, já que eu tenho duas. Você vai pelo canto também, mais atrás do Maicom.

–- E quem vai ficar aqui?

–- Eu, Gabriela, Yolanda, Rafinha, Ângela. O resto vai matando quem ver pelo caminho.

–- E se tiver mais gente perto da bandeira deles? – Patrícia perguntou.

–- Não acho que vai ter. Mas se tiver vocês podem usar um chamado.

–- Chamado?

–- É, tipo... “Crááááá”.

–- Você é filha de Atena. Deveria ser uma coruja, não uma gralha.

–- Não enche. Se algum de vocês tiver com a bandeira e estiver prestes a ser morto, vocês gritam pra gente. Tá?

–- Tá.

O grupo se dispersou, e Matheus de repente estava com uma espada de um metro na mão. A garota gordinha apitou novamente, e os adolescentes começaram a correr feito loucos. Matheus concluiu que o jogo havia começado.

Saiu golpeando as pessoas quase cegamente. Alguns caíam no chão, outros cambaleavam. Matheus corria em direção a bandeira, desviando golpes de isopor. Quando chegou ao território “inimigo”, ele se viu cercado por adolescentes com manchas azuis no rosto.

Ele bateu em todas que podia, depois correu para perto da bandeira. Estava menos de um metro dele, e não havia ninguém por perto. Ele estendeu a mão, pronto para pegar a bandeira e correr, mas sentiu um grande bastão em suas costas. Cambaleou e caiu no chão.

Virou a cabeça e ali estava Esther, de cabelo preso, com uma espada de isopor na mão. Matheus viu Maicom chegando, pelo canto do olho, mas Esther não percebeu.

–- Você é muito, muito ruim nisso – ela disse.

–- Você nem percebeu – Matheus riu.

De repente, a bandeira não estava mais fincada no chão, como devia estar. Estava na mão de Maicom, que corria desesperadamente, desviando das pessoas. Esther praguejou e começou a correr atrás de Maicom. Matheus pegou sua espada de volta e se levantou, golpeando Pedro, o garoto que havia pintado sua cara.

Viu Esther golpeando Maicom no braço. Maicom caiu de joelhos, e Esther tomou a bandeira dele. Ela deu risada e voltou correndo para o caminho de Matheus, onde a bandeira estava antes.

Matheus se escondeu atrás de uma árvore antes que Esther pudesse vê-lo. Enquanto ela passava, ele golpeou sua perna e pegou a bandeira. Ele começou a correr na direção de Maicom, mas, de repente, Isis surgiu em seu caminho, como se tivesse se materializado ali. Ela tinha uma garota e um garoto ao seu lado. Eles avançaram por Matheus.

Matheus gritou. Gritou o chamado que eles haviam combinado.

–- Crááááá!

Tatiana simplesmente veio correndo, derrubando a garota ao lado de Isis. Yolanda veio por trás de Isis, e gritou:

–- Eu sou a Hazel!

Matheus não entendeu, mas golpeou o garoto que estava aturdido a sua frente. O menino caiu e Matheus começou a correr. Ouviu Tatiana praguejar baixinho atrás de si, mas ignorou.

De repente, um grande peso caiu sobre as costas de Matheus. Matheus caiu, deixando a bandeira cair de sua mão, e sentiu sua cara na grama.

–- Morra, filho de Hades! -- Era a voz de Esther. Matheus começou a dar risada, sem saber o que era tão engraçado, enquanto fios alaranjados do cabelo de Esther misturavam-se em sua visão. Ela bateu a espada nele algumas vezes, e então parou, e caiu ao seu lado, ofegando e rindo. – Você está morto, pronto.

–- Eu tenho reforços – Matheus disse, rindo também.

Viu que a bandeira não estava mais ali. Estava na mão de Patrícia, a amiga de Tatiana. Patrícia corria mais rápido do que todos ali juntos, e conseguiu desviar da espada de um garoto que media 1,90.

Esther se ajoelhou.

–- Merda – ela disse. Ouviram-se gritinhos do time azul, e eles levantaram Patrícia. Matheus gritou também. Esther colocou a mão na boca dele. – Cale a boca, porra.

Ela não parecia irritada. Seu cabelo ruivo agora estava preso num rabo de cavalo prestes a cair. Ela parecia sem ar e, branca do jeito que era, estava com o rosto todo vermelho. Matheus continuou dando risada.


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Notas finais do capítulo

Pra quem gosta de Percy Jackson :v