Efeito Dominó escrita por Snowflake


Capítulo 14
Capítulo XIV




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POV Jude

 A caminhada até o encontro do tio de Dominique pareceu mais longa do que era. Cada passo adiante reforçava a minha maior dúvida: o que diabos eu fui fazer com a minha vida? E tinha que ser justamente a DiNozzo? Não sei onde estava com a cabeça quando propus este maldito teatro, mas posso garantir que nunca me arrependi tanto de algo. Parecia uma ideia genial no primeiro momento. Infalível, na verdade. No entanto, como o Universo possui inúmeras cartas na manga, minha família tem me atormentado ainda mais, além de agora também ter todo o clã dos DiNozzo trabalhando arduamente contra mim, não só Dominique. Apesar disso, ficar dizendo para mim mesmo que eu era uma ameba não ajudava em nada, ainda que isso fosse verdade. Logo, considerei mais prudente colocar um falso sorriso no rosto e cumprimentar o homem peculiar que estava parado na minha frente, que já mantinha a mão estendida para que eu apertasse-a. Educadamente, apresentei-me.

— É um prazer, garoto – Ele sorriu gentilmente. – Pode me chamar de Clive, sem formalidades. Senhor Paddington faz parecer que sou muito velho – Com uma risadinha forçada, parei para analisar o sujeito. Tinha a estatura mediana e cabelos muito claros, além do forte sotaque britânico. Logo, voltei-me para Dominique.

Durante meio segundo, parei para refletir sobre da onde diabos tinha surgido a criança no colo da loira. Juro por tudo o que há de sagrado que ela não estava ali antes. Analisando melhor, aquele projeto de gente era praticamente um clone da Dominique. Longos cabelos claríssimos, olhos azuis e uma carinha de sapeca. Exatamente como ela era quando a conheci.

Contudo, até aonde eu sei, DiNozzo não tem tato nenhum com adultos, quem diria com crianças. Apesar disso, parecia se dar muito bem com aquela garotinha. Observa-las levou meus lábios a se configurarem em um sorriso, descoberto e repreendido pela minha ex-porém-atual-falsa-namorada.

— É esse o menino, Domi? Aquele de quem a vovó estava falando? – Em uma tentativa fracassada de sussurrar, a criança no colo de Dominique arrancou-me algumas risadas enquanto caminhávamos até o carro de Clive. Sem graça, DiNozzo fez que sim com a cabeça. Incorporando o cavalheiro como fui criado, segurei a mão da garotinha.

— Pode me chamar de Jude, mademoiselle— Ela sorriu. – Como devo chama-la?

— Emma – Respondeu-me um tanto envergonhada, já com os pés no chão.

Abri a porta traseira do automóvel para que as duas entrassem, recebendo um olhar gelado de Dominique, que sibilou um nada simpático "Pare com isso". Acomodei-me no banco do passageiro, admirando a paisagem inglesa.

Cerca de dois quilômetros escutando a rádio local depois, estacionamos em frente a uma modesta casa, de estilo clássico e com um belo e trabalhado jardim próximo à entrada. Já com as malas em mãos, adentramos o recinto e dei de cara com um ambiente ainda mais aconchegante do que a fachada anunciava. Entretanto, o excepcional aroma de café recém passado invadiu minhas narinas e tomou conta de mim, impedindo que eu continuasse a descrever o cômodo. Uma senhora de cabelos brancos e aparência simpática apareceu na porta, limpando as mãos no avental, sorridente.

— Por Deus! – Ela exclamou. – Parece que estou vendo Susan atravessar a minha sala!

Percebi um fundo de tristeza no sorriso de Dominique, mesmo que isso soe contraditório, e fiz uma nota mental para perguntar-lhe sobre quem era essa tal de Susan. De qualquer forma, quando aquela senhora se voltou para mim, seu semblante era ainda mais alegre. Cumprimentou-me tão gentilmente que quase perguntei se era mesmo parente de sangue da Dominique. Ainda muito radiante, pediu que minha nem tão querida "namorada" levasse-me até o quarto de hóspedes, que seria meu por duas noites.

— E onde você vai dormir? – Perguntei à loira assim que sentei-me sobre a cama, admirado com a maciez da colcha.

— No meu quarto – Respondeu como se eu tivesse perguntado se a Terra era, de fato, esférica. Arqueei as sobrancelhas, induzindo-a a ser mais específica. – Que era da minha mãe – Explicou – Escuta, estou exausta. Foram nove terríveis horas de voo e eu quero descansar. Qualquer coisa estarei no quarto ao lado, à direita. Pense duas vezes antes de ir me atormentar. 

— Ótimo, não aguento mais olhar para você – Alfinetei antes que ela fechasse a porta atrás de si.

 #####

 Acordei com um susto cerca de duas horas depois. Cambaleando, levantei da cama, demorando para lembrar onde é que eu estava. Sem ter outra opção, vesti um casaco e segui em direção ao quarto que Dominique tinha indicado. Logo que coloquei as mãos nos bolsos da jaqueta, toquei em algo curioso. Deparei-me com a pulseira prateada que DiNozzo tinha esquecido na minha casa Naquela Noite. Suspirando, bati na porta antes de abri-la.

— O que você quer? – Perguntou, tão amavelmente que cheguei a me comover, assim que entrei no quarto. 

— Te entregar isto – Joguei a pulseira para ela, que pegou-a ainda no ar. Sentei-me ao seu lado na cama, apoiando as costas na parede. – Estava na minha casa.

— Por que diabos estaria na... Ah – Dominique fez uma careta, lembrando-se do Acontecimento do Século. — Você precisava trazer esse assunto à tona, não é mesmo? – Indignado, levantei meus braços em sinal de rendição.

— Calma, Evil Queen. Só vim te devolver, você que ressuscitou o assunto – Aproximei-me um pouco mais. – Deixe-me adivinhar, está com saudades? – DiNozzo revirou os olhos, empurrando levemente o meu rosto. Esperava que ela viesse com uma de suas clássicas patadas, mas nada. Apenas ficou quieta, denunciando que não estava em seu estado costumeiro. Alfineta-la seria uma excelente opção se ela não estivesse assustadoramente silenciosa. — Preciso te perguntar algo: quem é aquela Susan que a sua avó mencionou? – Quebrei o silêncio que já me incomodava, obrigando a loira a fixar seus olhos em mim.

— Sua sogra, meu amor – Respondeu, e percebi que não devia ter perguntado. 

Dominique entregou-me um porta-retrato, com uma fotografia que mostrava um casal: uma mulher loira, que seria facilmente confundida com DiNozzo, e um homem de cabelos castanhos, com uns bons centímetros a mais de altura do que a acompanhante; ambos posando em frente à Torre Eiffel. Olhei da foto para minha adorável falsa namorada repetidamente, impressionado com os poderes da genética. 

— Ela morreu quando eu tinha sete anos, não sei se você se lembra – Explicou, como se soubesse o que eu estava prestes a perguntar, e apenas assenti com a cabeça, prestando atenção em suas palavras. – Costumava levar a mim e ao meu irmão ao cinema todo sábado de manhã. No entanto, naquele sábado... – Dominique fez uma pausa, respirando fundo. – Naquele sábado em especial ela não queria sair. Mesmo assim, eu insisti. Quando estávamos quase chegando, uma van atravessou a preferencial e bateu na porta do motorista. Tony e eu não nos machucamos muito, mas, depois da segunda semana na UTI, minha mãe não resistiu mais – Com a testa franzida, DiNozzo mantinha seus olhos fixos no horizonte, como se assistisse àquela cena novamente. – Se eu não fosse tão teimosa, nada...

— Ei – Interrompi. – Não faça isso consigo mesma. Você sabe que não tem culpa – Passei meu braço por cima dos ombros da loira, temendo que uma agressão física viesse como resposta. Contudo, Dominique apenas deitou a cabeça em meu ombro, aceitando meu abraço desajeitado.

— Detesto lembrar disso. Te detesto por ter me feito lembrar disso – Resmungou, arrancando-me uma leve risada.

— Já estava demorando.

Por mais incrível que possa soar, nós permanecemos naquela posição. É claro que, vez ou outra, trocamos tapas e nossas clássicas e características alfinetadas. Afinal, se não fosse assim, não seríamos nós. Quero dizer, Dominique e eu.

Conversamos sobre inúmeros assuntos antes da loira cair no sono, perto da uma hora da manhã. Ela tinha se aconchegado ao meu lado, dormindo desse jeito mesmo, apoiando a cabeça em mim. Se qualquer um a contasse como estava deitada, é possível que nunca acreditaria. Apenas por essa razão, estiquei o braço e alcancei meu celular, tirando uma foto onde ambos aparecíamos. Não mandei para ninguém, somente salvei para registros futuros. Com preguiça e sem coragem de sair dali, acabei adormecendo com DiNozzo em meus braços.

 #####

 A manhã seguinte foi um desastre. O relógio vermelho na parede ainda marcava seis horas e eu já estava acordado, além de sentir uma fome estonteante. Sem conseguir resistir mais, dei uma última olhada em Dominique, levantando a muito custo e acomodando a loira na cama. Antes de deixar o quarto, peguei uma coberta no armário e estendi por cima dela. 

Caminhei vagamente pelo corredor, torcendo para que não houvesse ninguém acordado a essa hora. Todavia, o cheiro de café fresco que senti assim que me aproximei da cozinha revelou-me o contrário. Cogitei dar meia volta e tentar dormir, mas a reclamação vinda do meu estômago foi demasiadamente forte para ser ignorada. Quando dei por mim, já estava pedindo licença à avó de Dominique para juntar-me a ela. 

— Claro, querido – Convidou-me. – Fique à vontade!

Antes mesmo que eu pudesse agradecer pela hospitalidade, sra. Paddington já me servia com uma bela xícara de café.

— Como passou a noite? Precisa de alguma coisa? – Perguntou-me gentilmente, e respondi da mesma maneira. – Sabe, você me lembra muito o Anthony. Me refiro à época em que o conheci – Consertou quando percebeu meus olhos levemente arregalados de espanto. – No período em que ele namorava minha filha, os dois eram muito parecidos com você e Dominique – Ficou poucos segundos quieta antes de lançar a pergunta que fez minha capacidade de raciocinar se ausentar por um tempo incalculável. – Diga-me, querido, você a ama? 

Juro que esperava por tudo, menos por esse maldito questionamento. Como supostamente eu deveria responder sem revelar toda a verdade? Afinal de contas, o que é o amor? Como é estar apaixonado? Nunca tinha provado tal sensação, e acredito fielmente que a primeira vez não será justamente com Dominique. No entanto, sabe-se lá Deus por que, parei para refletir sobre o assunto. Entregar-me inteiramente a alguém nunca foi do meu feitio, então não conseguia entender o que levava as pessoas a fazê-lo. Quero dizer, assim que me satisfazia, partia para outra e expulsava a última garota da minha cabeça em instantes. O estado de dependência que a paixão provoca não combina comigo, não faz o meu estilo. No final, como diabos eu saberia se me apaixonei por alguém ou não?

— Amo – Falei, quase com a consciência pesada por ter que mentir para aquela senhora tão amável. – Amo muito – Completei, reunindo todos os meus, até então desconhecidos, dons da dramaturgia para falar com o máximo de convicção possível. Tive um resultado extremamente positivo, uma vez que o sorriso que se estendeu no rosto da sra. Paddington foi tão largo que até me senti mal por tamanha inverdade. Aprofundando ainda mais minha atuação, ofereci-lhe um meio sorriso.

— Tenho certeza de que é recíproco – Falou, ainda muito contente. Segurei-me para não desmentir, confessando que, se algo era mútuo entre eu e DiNozzo, era o percentual negativo de afeição entre nós dois. – O que vou dizer pode parecer bobagem, mas minha intuição feminina, principalmente a materna, tem enfatizado a ideia há semanas – Ela pigarreou antes de dar início à sua sentença, e já me preparei para o pior. – Antes da morte de Sue, Dominique era muito diferente. Assim como a mãe, era radiante. Sempre estava animada, pensava positivo, o que contagiava todos ao seu redor. Contudo, quando Susan se foi, parece que Dominique se fechou para o mundo, como se fosse outra pessoa completamente diferente. Extremamente séria, às vezes até amarga. Mesmo assim, ainda tenho esperanças de que ela derrube esta fortaleza que impede que nos aproximemos. Acredito que você será responsável por isso, Jude. Você despertará aquilo que Dominique tem de melhor e que insiste em esconder de todos.

Minha primeira reação foi uma vontade absurda de gargalhar. Radiante? Otimista? Realmente estávamos falando da mesma pessoa? Seria a idade alcançando aquela pobre senhora? Fiz um esforço imensurável para não deixar a risada escapar. Incapaz de imaginar que, alguma vez nesses 20 anos de vida, DiNozzo já tenha sido uma pessoa, no mínimo, agradável. Em todo caso, se algum dia essa Dominique Fictícia desse as caras, com certeza não seria por influência da minha parte. Sejamos francos, se eu despertasse algo naquela loira, seria precisamente o contrário. Desgosto, como a própria diria. Quase despejei toda a verdade na senhora simpática sentada na minha frente, mas ela não merecia saber que a neta nunca seria da maneira como descreveu. E outra, despertar o que há de melhor nela? O que diabos isso significa? Que DiNozzo tem algo de bom além do corpo estonteante, da maneira como consegue ser uma companhia incrível nas raras vezes que quer (da mesma maneira como conseguia ser pateticamente insuportável), daquele jeito singular que ela... Ah, deixe para lá. Apenas sorri, assentindo com a cabeça, sem conseguir imaginar um Universo Alternativo onde Dominique era assim como sua avó relatara. Afinal, se fosse assim, ela não seria a minha ex-porém-atual-falsa-namorada. Não seria Dominique DiNozzo, a única que brinca com a minha sanidade.


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