Certa noite, quando o grupo de Shane, a dupla Dixon e o grupo de July já estavam mais enturmados, Dale propôs que fizessem uma fogueira juntos. Havia outras pessoas no acampamento, estavam por conta própria, não queriam se envolver com eles.

Marie se sentou ao lado de seus amigos, do outro lado onde Daryl e Merle estavam.

Já fazia, talvez, um mês que estavam ali e não tinham noticias de nada ainda. Glenn ia e voltava de Atlanta, sempre dizendo que estava piorando a situação, mas que por ali estava tudo bem. O garoto era bom, e estava cada vez mais confiante de ir lá.

Agora, sentados em torno do fogo crepitante, ele contava suas experiências, as pessoas ficavam impressionadas, outras encantadas e outras, três em particular -Ed, marido de Carol, Merle e Daryl- não demonstravam nada.

Daryl percebe logo o quão encantada Marie esta e ele não sabe se aquilo o incomoda, ou o deixa tranquilo, ele não havia se aproximado de ninguém desse grupo direito, a não ser ela e só veio pra essa estúpida roda de fogueira depois dela insistir enquanto caçavam, sem trocar mais de quinze palavras, algum animal rápido de se preparar.

Ele também conseguia sentir o tédio de Merle fluir ao seu lado, e não era pra menos, fazia quase uma hora e meia que estavam ouvindo o Japa Ligeiro falar. O cara do seu lado direito se levantou, é Ed. Carol tenta fazer ele ficar ali, mas ele puxa o braço tão bruscamente que quase a machuca. Passa bufando pelos Dixon.

– Carol, você vem comigo.

– Mas, Ed…

– Vem logo, Sophia, você também.

Sophia, sem discutir se levanta e abaixa a cabeça. Todos olham aquele ato de machismo ridículo. A menina olha para Daryl antes de ir e ele lhe dá um leve sorriso, depois se volta para Marie, a imagem que ele tem dela pequena é Sophia, Marie devia ser igual a ela quando pequena, não de aparência, mas de jeito, meiga e madura.

Marie olhava aquilo tudo com um ar triste, pensando em como na sociedade atual ainda exista homens assim. “Sociedade… A sociedade tá morta, nós somos a sociedade, este pequeno acampamento”

– Fico imaginando… - diz Glenn para completar sua história - Que qualquer um daqueles errantes poderia estar com a gente, ou que nós poderíamos ser eles.

Todos ficam quietos.

– Tudo isso me lembra a vez que eu vi um chupacabra - diz Daryl, muito sério.

Ele já havia contado isso ao Dale, então o velho só balançou a cabeça. O grupo se concentrou para não rir, exceto Marie e Merle. Daryl ficou bravo olhando os dois - Eu to falando sério!

Merle toca o ombro dele e diz extremamente sarcástico - E eu acredito com todas as minhas forças em você, Daryl!

Marie termina a risada com um prolongado “ai, ai…”, olhando Merle. Eles sorriem um pro outro - Gosto dessa garota - Merle diz - Olha… Vocês são legais… Até demais e eu não aguento mais. Até loguinho!

Ele caminha até o acampamento e se joga dentro da barraca. Marie também se levanta, fazendo os tornozelos e as costas estalarem - Hoje a vigia é do T, vou deitar também. Glenn, nada contra suas histórias, ou seu chupacabra, Daryl. Tô cansada mesmo.

Daryl se levanta e vai atrás dela. Ana dá um soquinho no braço da July, elas riem e Drake revira os olhos para a reação bem infantil delas. Daryl teve que chama-la para ela perceber ele - Se fosse um errante, já teria te atacado - ele diz quando ela se vira sorrindo.

– Não, você ia, com certeza, me salvar.

– Eu não saio por ai salvando donzelas em perigo.

– Veio aqui me dar patada?

– Não.

– Veio falar de chupacabra? - ela diz rindo - Desculpa.

– Não, só… Boa noite.

– Obrigada, boa noite também.

Daryl desce para seu acampamento e enquanto tirava a roupa atrás de um arbusto, pôde ver a silhueta de Marie, dentro da barraca, tirando sua camiseta. A curva das costas formando a cintura… A curva dos seios médios acabando para dar lugar a uma barriguinha retinha. Ela é de fato, muito gostosa. A lanterna se apaga e Marie desaparece, Daryl entra em sua barraca para dormir.

***************

Marie acorda com o sol entrando forte na barraca, ela sua de calor, suas costas estão ensopadas, e nessa noite ela dormiu apenas de lingerie, ela se veste com uma bermuda e uma regata e sai com sua bolsinha pessoal na mão. Dale está no teto do trailer olhando em volta.

– Acordou tarde!

Ela sorri para ele, colocando a mão sobre o rosto para tampar o sol, depois de talvez dois meses de convivência no acampamento, ela e Dale começaram a se dar bem - Eu estava realmente cansada. Não sei de que! Posso usar seu banheiro?

– Claro, fique à vontade.

Ela entra no trailer e vai para o pequeno banheiro com cheiro de água sanitária. Faz suas necessidades, lava o rosto, as axilas e molha bem o cabelo, deixando pingar nas costas para refrescar, depois prende num coque alto, deixando seu rosto bem a mostra. Passa desodorante e borrifa água no rosto e no peito, até o decote da regata. Amarra firme seu all star, já sujo e surrado e sai.

Sophia vem em sua direção correndo com um sanduíche de pão fatiado para ela - Glenn conseguiu da outra vez!

– E só abriram agora? Obrigada! - o pão estava frito e seco, sem manteiga ou nada, mas tinha um gosto de sal e estava bom.

O rádio de Shane chiou, e um voz masculina começou a falar, pedia que sobreviventes se manifestassem. Amy correu para ele e respondeu, mas o cara do outro lado da linha não ouviu e continuou repetindo:

“... Se alguém estiver me ouvindo, por favor responda”

Shane pega o rádio - Aqui é o policial Walsh para desconhecido, e estiver ouvindo, responda! Alô! - Shane se vira - Perdemos ele.

Lori também aparece ali - Pelo menos não somos os únicos

Marie vai ajeitar sua barraca e vê Ana sentada encostada no carro, abraçando os joelhos - Que foi?

– Ai, eu quero morrer.

Ela se abaixa na frente da amiga, se apoiando nos joelhos dela - Meu Deus, o que houve?

– É que… Desceu pra mim hoje, mês passado já tinha acabado e eu não tenho um chuveiro pra tomar banho. Eu quero morrer.

Marie sorri - É sério? As mulheres das cavernas não tinham nada pra se cuidar, as da Idade Média usavam panos, nós pelo menos temos absorventes. Glenn não vai trazer?

– Não precisa, a July pegou bastante naquele primeiro dia.

– Então…

– Eu to falando de banho, Marie. Eu não sou uma Neanderthal.

– Eu vou com você até o lago se quiser, aí pode tomar seu banho.

– É, dá pra ser.

– Tá bom, deixa eu organizar minhas coisas aqui e a gente já vai. Vai pegar sua roupa.

Ana se levanta cuidadosa, Marie dá risada vendo ela andar com as pernas juntas se apoiando no carro, ela já havia passado por essa situação, bom… não exatamente esta, de estar no meio de um catástrofe, mas passou.

Cinco anos antes, Marie engravidou inesperadamente de um namorado da época, os dois se abalaram mas resolveram criar a criança. Marie já estava gostando da ideia de ser mãe, quando começaram a surgir complicações enquanto o bebê se desenvolvia, Marie sentia dores insuportáveis e cada vez que a criança se mexia parecia rasgar um pedaço dela. Descobriram então, que ela não poderia gerar aquela criança e que logo seu filho morreria dentro de si. Seu útero não tinha o tamanho adequado para gera-lo, nunca teria. Mas teimosa que é, resolveu levar adiante, os médicos não falharam e aos quatro meses de gestação o bebê morreu e fizeram o aborto nela.

Marie optou por tirar seu útero. “Pra que ter algo dentro de mim que não cumpre com a função”, ela pensava. Agora, já recuperada do trauma, Marie já não sabe mais o que é cólica, ou medicamentos contraceptivos ou absorventes e nunca se arrependeu.

**************

Ana resolveu que tomaria “banho de potinho” - Não quero sujar a água toda e impossibilitar os outros de bebe-la.

Marie só fez uma careta enquanto a amiga enchia seu balde. Depois do banho, ao voltarem para o acampamento, ela percebeu que Daryl ainda não tinha voltado de sua caçada. Já fazia um dia. E Merle ainda estava na cidade com Glenn, T-Dog, Andrea, Jacqui e Morales. Glenn insistiu para não ir com um grupo, mas Shane quis assim. O tempo começou a fechar e foi aí que receberam um rádio de T-Dog.

“Alô, acampamento! Estamos presos… Loja de departamentos… Muitos errantes em volta e…”

E aí o sinal caiu.

– Loja de departamentos - repete Lori.

– Precisamos ir lá, mandar alguém. Não sei! Não podemos deixa-los! - fala Amy desesperada.

Shane se levanta - você ouviu, eles estão presos.

– Não interessa, a minha irmã tá lá. Ela se ofereceu para isso.

– É, ela se ofereceu e sabia dos riscos. Ela está morta.

– Ela é minha irmão seu filho da puta - com isso ela sai batendo o pé.

– Deixa que eu falo com ela - Lori suspira e corre atrás dela - Amy!

Marie está muito irritada agora com Shane e para na frente dele em sua pose de super herói, as pernas afastadas e os punhos fechados na cintura. July se aproxima antes que a prima faça alguma merda, como dar um soco no nariz torto dele.

– Shane - ela diz - Eu posso ir lá se quiser. Vejo como estão as coisas e dou um jeito de ajudar eles. Marie vai comigo.

Marie diz que sim com a cabeça e Shane que não. - Ninguém vai sair mais - ele diz e dá as costas a elas.

– Daryl vai querer matar ele se Merle não voltar

Marie arregala os olhos - Caralho, o Merle tá lá. Não quero nem ver quando o Daryl voltar - ela se vira para Dale - Dale! Cadê o Daryl?

– Não vi! Não deve ter voltado ainda.

Marie passa a mão nos cabelos, ajeitando alguns fios que se soltam com o vento e sente um pingo de chuva caindo em seu nariz - Ele vai ficar muito puto.

Mais afastado do trailer está Carl, prestes a chorar. Havia sonhado com seu pai, durante a noite. Ele só fazia um sinal para que ele ficasse em silêncio, Usava uma camisa branca e uma bermuda de algodão, que era como ele ficava nos domingos em casa para ver jogo na TV com o filho, em determinado momento, seu pai lhe disse “Carl, vamos sair para jogar futebol?”

Mas seu pai está morto.