Sétima Lua escrita por Pamela S


Capítulo 6
Segredos


Notas iniciais do capítulo

Dois meses de Sétima Lua!
Eu estou muito feliz, e espero que vocês estejam também.
Boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/593969/chapter/6

—Já que está aqui sozinho... Não há possibilidades de que Tio Barnabas venha em nosso encontro, estou errada? —indagou a feiticeira, tentando agarrar-se á sua ultima esperança. Suas intenções sendo quebradas quando o lobisomem sacudiu a cabeça negativamente.

—Você está fedendo... como um maldito vampiro... —balbuciou Petros contra o pescoço de Elina enquanto ela o apoiava contra seu corpo.

—Estou...? Será que ele também tem meu cheiro? –a feiticeira indagou. Os contornos de um plano aparentemente suicida formaram-se em sua mente.

—Não... vampiros tem... o fedor da morte... Pouca coisa se sobrepõe... ao cheiro que possuem. —o lobisomem ofegava enquanto falava, seu corpo suava frio, e estremecia levemente. —Você tem o cheiro dele... mas ele não tem o seu.

—Ótimo... Tente não se mexer. Volto em um instante. —ela o apoiou com cuidado contra o chão de pedra e então se afastou, parando ao lado do vampiro caído. —Orud omoc ardep. —ela disse com a mão estendida na direção do morto-vivo. Estava enfraquecida, precisava direcionar o feitiço para que ele tivesse o efeito desejado.

—Vamos ver o que você esconde... —ela ajoelhou-se em frente á cabeça de Dorian, que jazia inerte sob o solo frio, tão rígido quanto as pedras abaixo de si. Suas mãos ladearam o crânio do vampiro sem tocá-lo e então ela voltou á recitar seus feitiços, concentrando-se no que queria saber. —Elever sues soderges...

Seus olhos se fecharam e as imagens foram se formando, com rapidez. Era como se ela estivesse se tornando o vampiro. Sentiu a dor de Dorian ao ser transformado, a sensação de parar de respirar, o coração não mais batendo, seu corpo rejeitando a vida.

Depois o gosto do sangue da virgem sacerdotisa do templo de Gaia, sua primeira vitima, o coração voltando á bater, sua imagem não mais refletida em superfície alguma...

Anos passaram em frente á seus olhos em segundos, o ritmo acelerado não interrompendo sua percepção dos fatos. Ela compreendia tudo como se fosse sua aquela vida.

Século após século, o sangue de cada vítima fluindo por suas veias, os gritos de horror de cada um que tentou fugir, sua incapacidade de sentir remorso. Nada tinha importância, mas o que poderia importar para uma criatura sem alma?

O prazer em cada morte era sublime, mas logo o sabor do sangue era esquecido. Não precisava de mais do que uma ou duas vítimas por mês para manter sua condição, mas seu vício não era o sangue, e sim o prazer que atingia ao matar. Uma ou duas vítimas? Não... Ele não queria sangue, ele queria vidas. E assim matou centenas, milhares...

Foi então que a maldição foi lançada, sua alma restaurada. Sentimentos travando batalha em seu peito. E por todas as mortes que causou, ele sentiu.

Sentiu na alma a dor de cada mãe que perdeu o filho, da jovem esposa sem o marido, do menino de quem o pai foi tomado... Suportar aquela dor era impossível. Talvez o sol fosse a solução, queimando-o e transformando sua dor em pó.

Ele estava decidido á por fim em sua vida, acabar com a dor era tudo o que desejava, foi então que ela surgiu, e mudou os rumos do destino.

Irina.

Bela como um presente dos céus, doce como uma criança, uma aura de bondade emanava de seu ser. Irina o ajudou á superar. Á seu lado ele esqueceu o monstro e reviveu o homem. Estava enfeitiçado, tê-la era como voltar á viva.

Até que ela se foi... sua vida tomada de maneira cruel. Loucura e raiva tomando conta de seu coração, congelando sentimentos, acordando o velho ódio. Logo ele soube que um vampiro com alma também é capaz de cometer atrocidades.

Voltou á matar indiscriminadamente tudo em seu caminho por meio século, deixando sua dor manifestar-se livremente, sem importar-se com a dor alheia.

Mas então Bóreas apareceu. Um necromante, um ouvinte dos mortos. Com ele veio a esperança...

Tudo o que tinha de fazer era trazer-lhe a feiticeira. Aquela que em um corpo habita duas almas, a escolhida. Ela seria sua moeda de troca. E então ele teria Irina novamente.

—Você e Zéfiro tem a mesma missão... —comentou a feiticeira pendendo a cabeça para o lado direito, seu olhar vago e os gestos lentos, faziam com que parecesse entorpecida.

Ela abaixou-se um pouco mais e sussurrou algo que só o vampiro conseguiu ouvir, gesticulando algumas vezes com as mãos ainda ladeando a cabeça de Dorian.

Petros mantinha seus olhos fechados, respirava com dificuldade e o corte produzido pelo athame de Elina ardia intensamente, ele estava muito fraco, e só abriu os olhos ao ouvir dois pares de pegadas aproximando-se.

—Não se preocupe. Está enfeitiçado, não pode se voltar contra nós. —ela explicou quando ele deixou escapar uma imprecação ao notar o vampiro parado á alguns passos da feiticeira. —Tire suas roupas e ajude o lobisomem á vestir sua calça. —ela ordenou ao vampiro, que sem vontade própria á obedecia cegamente.

—O que você está fazendo... é loucura, feiticeira. —protestou Petros colocando as calças que o vampiro usava instantes antes.

Elina pegou sua camisa ensanguentada e a jogou no chão, recitando novamente: — Ogof! —a camisa ateou fogo e logo não passava de um punhado de cinzas sendo levado pelo vento.

—Deveria matar... o maldito morto-vivo e depois cavalgar para... o mais longe que pudesse. —Petros opinou com sua fala ofegante, enquanto á olhava amarrar os cordões da camisa de Dorian, que agora cobria seu busto.

—Confie em mim. Tenho um plano. —ela disse aproximando-se e tocando o corte novamente, a feiticeira fechou os olhos e entoou uma cantilena que o lobisomem não conseguiu entender. O corte desapareceu, mas a dor ainda estava lá. —Pronto. Assim ninguém vai ver o seu corte.

Andaram em silêncio por alguns minutos, Dorian ajudou Elina á apoiar o lobisomem, que se mostrou desgostoso pelo contato. Ele sabia que o cheiro do vampiro, embora insuportável para seu olfato apurado, serviria como camuflagem já que o berserk seguia seu rastro, então se calou e deixou que a feiticeira prosseguisse com seu plano nebuloso e totalmente improvisado.

—Logo os guerreiros Berserk estarão em Gaterion... é melhor que seu plano envolva... alguma rota de fuga. Ou estaremos encurralados... —comentou Petros quando dobraram em uma esquina, ele não tirava os olhos de Dorian, esperando que o vampiro saísse do transe e os atacasse. —Acha que as pessoas não irão notar um vampiro em roupas de baixo?

—Não precisaremos fugir, apenas nos esconder. E não, não acho que as pessoas o notarão. Pelo menos não no lugar para o qual estamos indo... — ela levantou uma sobrancelha, depois balançou a cabeça, Petros não entendeu o que ela quis dizer com aquilo.

Quando dobraram novamente o lobisomem pôde ver a rua que ficava atrás da estalagem, de onde estavam eles podiam ver a janela do quarto com ligação que dividiram. Ele estava prestes á protestar novamente, mas Elina o deteve.

—Não vamos ficar na estalagem. —ela apontou para o lupanar do outro lado da rua.

—Que os deuses nos protejam... Porque você está... completamente louca, feiticeira...

—Ânimo lobisomem. Vai dar tudo certo. —Elina incentivou-o quando já estavam dentro do quarto. Ela o havia ajudado á deitar-se na cama e agora espiava pelo vão da porta. Estavam no segundo andar, a feiticeira havia convencido uma meretriz á ajuda-los, influenciando-a com magia, e depois ordenou que Dorian buscasse o livro de seu pai no quarto da estalagem. Com sua velocidade vampírica ele logo estaria de volta, entregaria o livro á meretriz e então serviria de distração, caso Zéfiro aparecesse...

Petros debateu-se sobre a cama, sua mão direita pressionando o ferimento no lado esquerdo do peito, chamando atenção da feiticeira. Gemidos fracos escaparam de seus lábios, seu corpo tremia violentamente, ele estava pálido como uma folha de pergaminho.

—Voltou á sangrar... —comentou Elina ajudando-o á sentar-se. Ela o recostou contra uma das colunas da cama e então retirou sua própria camisa, virando-se de costas para ele e desenrolando a faixa sobre o busto. Quando terminou colocou os cabelos para frente do corpo, revelando a pele morena de suas costas.

—O que são... os símbolos...? —indagou o lobisomem, apontando para os contornos escuros e de traços esculpidos que cobriam parte de suas costas, seguindo a linha da coluna, iniciando em sua nuca e tendo fim na altura dos quadris.

—É magia antiga. Ela me faz ser quem eu sou.

—E quem você é?

Ela virou-se parcialmente, pegando a camisa de sobre a mesa e colocando-a novamente.

—Quer mesmo saber? —apesar de toda a tensão ela sorriu ao fazer a pergunta, amarrou os cordões da camisa e pegou a faixa novamente.

—Para mim... você é a encarnação... do Paraíso. Não preciso... de outras definições. —ela sorriu novamente, rasgou alguns pedaços da faixa e molhou com a água de um jarro sobre a pequena mesa no centro do quarto, algumas garrafas ladeavam o jarro de barro, mas nenhum daqueles líquidos se assemelhava á água. Recitou um encantamento e então o corte reapareceu em sua pele, ela o limpou cuidadosamente com um pedaço do tecido, e colocou outro sobre sua testa, procurando conter a febre.

—Pronto. Não posso fazer mais do que isso enquanto Dorian não trouxer meu livro.

—Como conseguiu... Enfeitiçá-lo daquela forma? —Petros expôs a pergunta que ela havia evitado fazer á si mesma.

—Esse poder não é meu... Eu não deveria usá-lo. Nunca... —uma batida á porta interrompeu a conversa. Elina abriu e deu de cara com a meretriz de cabelos grisalhos que os levara até o quarto, ela segurava o livro em uma mão e uma garrafa aberta na outra. A feiticeira pegou o livro e então sussurrou algo para a mulher, que se retirou sem dizer palavra. —Ela vai fazer companhia ao nosso amigo morto-vivo. —explicou fechando a porta atrás de si.

Ela folheou o livro até achar o que procurava e então tocou o umbral com a mão direita, o livro de seu pai em mãos, aberto em um encantamento de proteção...

—Como se sente? —indagou a feiticeira após terminar de recitar o feitiço oral. Aquilo deveria mantê-los protegidos se não saíssem do quarto.

—Boca seca... Calafrios... —Petros parecia tão morto quanto Dorian naquele momento, Elina folheou o livro novamente, em busca de algo que pudesse ser útil antes de partir para o trabalho complicado que seria produzir o contraveneno.

Ela pegou uma garrafa de hidromel de cima da mesa e recitou um encantamento, girando a garrafa no sentido anti-horário, enquanto suas palavras soavam cadenciadas e incompreensíveis. Seu corpo estremeceu. Não se sentia fraca como antes, na verdade a magia parecia fluir de algum lugar além de seu ser.

O líquido mudou de tonalidade duas ou três vezes, passando do marrom claro para o terracota e então atingindo um tom vibrante de castanho-dourado. Ela analisou o liquido satisfeita e então colocou a garrafa próxima aos lábios do lobisomem.

—Beba tudo. Vai ajudar. —assim que sorveu o líquido Petros sentiu sua garganta queimar, seu corpo aqueceu e a dor diminuiu consideravelmente, conseguiu mover o braço esquerdo novamente, sentindo uma dor suportável. —Uma forma adaptada de feitiço do tempo. Não vai retirar o veneno do seu sangue, mas congela o efeito da prata. —ela explicou ao notar a pergunta implícita nos olhos dele.

—Quanto tempo?

—Três noites no máximo. Depois o veneno se espalha. —Elina deixou a garrafa sobre a mesa novamente e então analisou o corte quase cicatrizado. Correu os dedos pelo peito dele, desceu pelo estômago e então encontrou os dedos da mão esquerda, que jazia sobre seu tórax. Ela entrelaçou seus dedos nos dele, sentindo seu coração apertado no peito. —Não preciso de três noites para preparar um contraveneno. Você vai ficar bem.

Elina desvencilhou-se dos dedos de Petros e pegou o livro de seu pai, folheando-o apressadamente.

—Poções de amor... Bolos de sabat, feitiços de proteção, rituais de prosperidade... Nomes de ervas que curam... Aqui! Triaga universal. —ela leu apressadamente a receita do contraveneno, a maioria das receitas era simples ou poderia ser modificada, mas aquela... —Não, não pode ser... —ela sussurrou fechando os olhos, inconformada.

—Seu antídoto... Não vai dar certo, não é? —Petros indagou com voz mais forte dessa vez, o feitiço de Elina havia lhe devolvido o fôlego, e ele já não estava tão pálido. Mas algo em seu olhar disse á Elina que ele já sabia a resposta...

—Preciso da raiz de uma planta que só nasce na selva ignomínia, conheço um boticário que vende plantas exóticas retiradas do coração da floresta, mas ele reside nos arredores de Antera... Estamos á duas semanas á cavalo de Antera, porém se usar magia, talvez em dois dias eu tenha o que é preciso.

—Alessa... Partir rumo á Antera seria como entregar sua vida nas mãos dos guerreiros de Zéfiro. E mesmo que você conseguisse passar por eles sem ser percebida, meu tempo estará esgotado antes que você retorne...

Ela jogou o livro sobre a cama, ao lado da perna direita dele e se ajoelhou sobre o chão de terra batida na beira da cama, ela o envolveu pela cintura com o braço direito e apoiou sua cabeça contra os músculos de seu abdome molhado e levemente frio.

—Vou encontrar uma forma de salvá-lo. Confie em mim. —ela disse desenhando os músculos salientes com as pontas dos dedos.

—Não importa o que aconteça, Elina... Quero que saiba que te amei logo depois daquele beijo na caverna sob a cachoeira. —disse Petros acariciando os cabelos da feiticeira, sua voz não passava de um murmúrio rouco.

—Você me chamou de Elina...? —o corpo da feiticeira ficou tenso.

Como ele poderia saber de seu nome se não havia encontrado seu tio Barnabas?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Gostou do capítulo?
Acha que algo pode ser melhorado?
Quer me mandar um beijo? XD
Vou adorar receber um comentário seu!
Beijos!