Dead Girls Never Say No escrita por Hikari Ouji


Capítulo 7
Desespero


Notas iniciais do capítulo

Suellen e Sharon já não tem noção de quanto tempo estão sendo feitas reféns pela quadrilha. A tentativa de fuga fora frustrada por Rafael, mas a coragem das meninas consegue ser superior a violência do rapaz. Agora cabe a elas chegarem à liberdade... Ou não.



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— Eu nunca que ia imaginar que duas garotas tão charmosinhas iam ter coragem de nos enfrentar – riu Rafael passando por cima de Robinho que tentava estancar o sangue da panturrilha com um pano de prato –, mas chega dessa palhaçada e voltem para o quarto se não eu atiro – ameaçou apontando a arma na direção de Suellen.

O pânico de Sharon aumentava igual a dor do ferimento no braço esquerdo que começava a arder insuportavelmente. A bala atingiu de raspão, e mesmo que superficial foi suficiente para lhe retirar sangue que agora já escorria pelo cotovelo. Nervosa, pegou um pano que estava jogado em cima da mesa e assim como Robinho tentou estancar o ferimento. No mesmo momento o som de celular começou a tocar. Logo André sacou-o do bolso da calça, e ao ver o nome no visor fez uma cara de assustado e o entregou a Rafael.

— Aí... – chamou André – É o gringo no celular.

Depois de cochichar um “porra”, Rafael atendeu o celular, mas continuou com a arma apontada na direção das garotas que tinham certeza de que se tentassem fugir seriam atingidas antes que pudessem chegar ao quintal da casa. Para a surpresa delas, Rafael começou a falar um inglês impecável com alguém no outro lado da linha. Ambas se olharam, pois nunca suspeitariam que o cara fosse tão bom em inglês. Suellen nunca fora boa em nenhuma língua que fora forçada a estudar na escola e lembrou que seus namorados sequer falavam o próprio idioma de forma culta. Agora se perguntavam quais outros mistérios eles escondiam. André, que estava de pé encostado na entrada da porta, se aproximou das duas puxou uma cadeira e se sentou. Com o canto dos olhos Sharon pode ver que ele tinha uma arma na parte de trás da bermuda, por dentro de sua cueca Calvin Klein falsa de cor branca enquanto Robinho aguardava o término da ligação pra saber por que o gringo parecia estar tão nervoso. Mesmo longe todos podiam escutar que do outro lado da linha ele parecia quase berrar. Sharon, aproveitando-se das aulas de inglês que fez em um curso, tentou focar nas palavras que Rafael pronunciava aos berros e entendeu mais ou menos o que conversavam:

“Sim, já filmamos a primeira parte. Vamos te entregar amanhã de manhã... Eu sei... Eu sei, mas tivemos um problema... Cara, eu vou te entregar a porra do filme amanhã sem falta... Não! Não dá pra hoje. Ainda falta o final... Sim ela ainda tá viva... Merda, eu sei que matar é fácil... Tá. Vou fazer agora... OK, OK... Até mais.”.

— Esse filho da puta! – resmungou Rafael jogando o celular para Robinho que o pegou no ar e o guardou no bolso traseiro da calça – Ele quer o filme pra amanhã – riu tentando esconder o nervosismo enquanto acendia um cigarro. Sharon percebeu que as mãos dele estavam tremendo, e imaginou que o gringo poderia ser uma pessoa muito perigosa.

— Tá. Então vamos acabar logo com isso? - disse Robinho.

— Vamos. André pega a câmera.

André concordou, levantou-se da cadeira e passou sem olhar para as meninas que estavam sentadas a poucos passos da saída rodeadas de cacos de vidro. O vento gélido da noite soprou por entre suas pernas e as fizeram se arrepiar. Foi quando tudo aconteceu rapidamente. Quando Sharon deu por si sentiu um puxão no braço esquerdo e no minuto seguinte estava fora da casa, correndo pelo chão de terra batida e com o som de tiros metros atrás. Suellen corria ofegante a puxando, ignorando as pedras do terreno irregular, as árvores e os cacos de vidro que fincaram a sola do pé enquanto corriam para o mais longe possível de Rafael e seus cúmplices. Durante o tempo em que ficaram quietas no chão da cozinha, Suellen percebeu que o único armado no momento era Rafael que já quase havia descarregado a arma. André havia saído em busca da câmera que pelo que se lembrava estava jogada em algum canto da casa, e quanto a Robinho com certeza não tinha uma arma na hora. Como suspeitavam, os tiros cessaram e ninguém foi atrás delas. Suellen soltou a mão da amiga e parou por alguns minutos enquanto caminhavam apressadas por uma estrada de terra que no meio da noite era semelhante às de cenas de filme de terror - um verdadeiro breu. O vento batia nas árvores e faziam os galhos se quebrarem e reproduzirem sons estranhos e pelo pouco que podiam ver com a ajuda da luz da lua, tudo ao redor era uma mata fechada com uma estrada de terra precária que não tinham noção para onde ia.

— Amiga, desculpa, mas algo tinha de ser feito – disse Suellen esbaforida.

— Temos que continuar fugindo!

A ideia de seguir pela estrada foi trocada pela de se esquivar por entre as árvores da mata que cercava o local. Agora que estavam finalmente livres era só correr para o mais longe possível e depois encontrar alguém que as levassem para a delegacia mais próxima.

 - Sharon, e seu braço? - sussurrava no meio da escuridão.

— Está doendo, mas dá pra aguentar. Estamos livres!

Ambas ignoravam a dor nos pés causados pelo relevo desnivelado da região da mata que agora enfrentavam. Pedras, galhos, lama e alguns insetos eram alguns empecilhos que tinham que enfrentar. A pouca luz que podia guia-las por entre o labirinto de árvores vinha da lua cheia que impregnava por entre os galhos e folhas nas copas das árvores formando filetes de raios luminosos que se perdiam no solo. Metros atrás, em algum lugar, era possível escutar bem baixo os xingamentos de Rafael para André e Robinho;

— Vocês são um bando de idiotas! Tô me segurando pra não dá um tiro em vocês!

Sharon se perguntava há quanto tempo eles faziam isso. Pelo que escutava e via nas incansáveis reportagens de televisão, geralmente os sequestradores eram frios e quando as decisões já estavam prontas em suas mentes diabólicas, não esperavam para aniquilar ou saciar seus desejos. Logo pensou em três possibilidades: Ou eles eram novos nesse tipo de crime, ou o gringo havia feito alguma ameaça e eles acabaram baixando a guarda, ou eram tontos de mais para pôr isso em prática.

Enquanto Sharon e Suellen se esgueiravam por entre a mata, Rafael, além de estar sendo pressionado pelo cliente, agora tinha que dar conta da fuga de Sharon. Suellen poderia descartá-la, já que a considerava um brinde. Tipo pague um, leve dois. Ele conhecia muita coisa sobre ela, logo caso o denunciasse à polícia, teria prazer em destruir sua vida. Sharon era o maior problema, já que não sabia quase nada sobre ela, nem mesmo André a conhecia por completo. Ele tinha de encontrá-la de todas as formas, pois não queria estar próximo da morte novamente. Há dois anos, num sequestro parecido com esse em outro estado, uma garota conseguiu fugir e encontrou um policial no meio da estrada. Para o azar da quadrilha, o policial do carro era o cliente que esperava pela encomenda que agora estava ali suplicando por ajuda. A garota agradeceu pela ajuda e entrou no carro sem suspeitar que por trás do sorriso do policial, sua fúria era crescente. A viagem para a delegacia para onde ela acreditava estar sendo levada tomou um caminho diferente minutos depois. O policial virou numa rua deserta e para o pânico da garota, a levou de volta para o cativeiro de onde havia fugido, surpreendendo Rafael e o chefe da quadrilha na época, quando ele chegou. Logo depois chegaram André e Robinho, que tinham entrado há pouco tempo no grupo, e outros dois que voltavam de uma busca mal sucedida.

— O que vocês pensam que estão fazendo? - disse o policial trazendo a garota e jogando-a aos pés do chefe da quadrilha.

— Foi mal... Ela escapou – desculpou o chefe que atendia pelo nome de Pardo.

— Sabe o que deve fazer quando alguém foge, filho? - perguntou o policial sacando a arma do coldre e apontando para Rafael.

— Não... Senhor – respondeu Rafael com medo de ser morto naquele momento. A arma que estava em suas costas não seria rápida o suficiente se fosse usá-la para se defender.

— Você atira na merda da perna!

POW!

O estampido pode ser ouvido por alguns metros quando atingiu a coxa de Rafael que com o impacto caiu de joelhos. Se a bala tivesse atingido um palmo mais a baixo não teria uma perna agora. Enquanto isso, a garota chorava e desesperada correu na tentativa de mais uma fuga.

— E se mesmo assim não der certo – continuou o policial com a arma em punho – Atire para matar.

POW!

Mais um tiro foi ouvido e dessa vez o alvo foi a garota. Mais precisamente a nuca da garota que com o impacto projetou-se para frente e caiu de cara no chão levantando poeira. Nunca mais viram o policial novamente. Alguns diziam que havia virado delegado no interior e a denúncia da qual ele fora acusado na época – exploração sexual contra jovens – nunca foi resolvida e logo a denúncia foi abafada e jogada em algum arquivo, ou quem sabe nem exista mais. Desde então Rafael se prontificou que iria fazer seu trabalho de forma perfeita e caso acontecesse aquilo de novo ele ia fazer o mesmo que o policial.

E agora estava na mesma situação de anos atrás. Ao lembrar-se disso, sacou a arma do cós da bermuda de André e atirou a ermo na escuridão não importando onde a garota estaria. Se a matasse sem ser filmada iria simplesmente arrastá-la de volta para o cativeiro enquanto a filmassem. O gringo não saberia se ela estaria morta ou não e para terminar tacaria fogo ao corpo. Nesses tipos de filmagem não era possível usar photoshop ou fazer montagens. O tempo era curto e o prazo tinha que ser cumprido.

Sharon e Suellen se arrastavam pelo chão de terra enquanto rezavam para fugir da morte. Agora que estavam livres poderiam fugir até a estrada mais próxima e pedir carona para a delegacia. Embora Suellen fosse quem tomou a decisão de escapar naquele momento, agora ela parecia uma menina de dez anos. Sharon sentia a mão da amiga tremer enquanto engoliam o choro e se escondiam por de trás de árvores de troncos largos. Do nada, de algum lugar a metros de distância, o estampido dos disparos começou as alertou.

— Sharon... Eu não quero morrer... Eu nem sei como consegui fugir.

— Acho que é isso que dizem que é instinto de sobrevivência. Logo estaremos salvas.

Mesmo na tentativa de acalmar a amiga, Sharon percebeu que ainda tinha algo errado com ela. Enquanto caminhavam pelo meio do mato evitando que se machucassem com os galhos, pedras e insetos, Sharon imaginava se Suellen tinha passado pelo mesmo inferno que ela. Depois de mais alguns minutos de caminhada, ela percebeu que a amiga chegou a um ponto em que não aguentou mais e começou a chorar mais alto, e sem entender Sharon somente a abraçou.

— Calma. Nós estamos chegando. Tá vendo lá – disse apontando para minúsculos pontos brancos que brilhavam por entre as árvores no meio da escuridão. Possivelmente era alguma rodovia, embora não tivesse ideia de onde poderiam estar.

— Temos que ir nessa direção.

Metros atrás, Suellen pôde ver lanternas se movimentando por entre as árvores e aquilo a fez tremer. Tinham que fugir logo, pois não queria voltar para o sofrimento por mais que Rafael tivesse prometido que não a mataria e que iria soltá-la dentro de alguns dias já que o objetivo deles com ela já havia sido feito. O cliente dela não queria morte, somente sexo explícito e espancamento. Mas além de tudo aquilo ela se lembrou de algo que estava guardando há algum tempo. Um segredo que agora se arrependia amargamente. Enquanto caminhavam as pressas em direção à rodovia, Suellen se descuidou e escorregou no limo e sentiu o pé virar. Pedia para que fosse só impressão, mas sabia que poderia ter torcido o pé direito. O grito de dor ecoou por entre as árvores e embora a luz das lanternas do trio não pudessem mais ser vistas, elas temiam que eles a tivessem ouvido e deduzido sua posição. Sharon a ajudou apoiando-a com o ombro, o que as fizeram andar muito mais devagar enquanto ignoravam o grito do trio que cismava em chamá-las mesmo sabendo que elas não iriam fazer o que pediam.

— Sharon... Eu queria morrer sabe, enquanto eles faziam aquilo comigo.

— Eu sei. Eu também – disse tentando acalma-la – Mas eu acho que essa não é a solução. Se conseguirmos fugir é por que não é a nossa hora.

— Mas e se eles forem atrás da gente? - perguntou com a voz embargada.

— Nós vamos a policia e eles vão encontrá-los. Eles vão ser presos e apodrecerão na cadeia.

— Será?

— Tenho certeza – Disse forçando um sorriso sabendo que a justiça brasileira era fraca. Sharon não tinha tanta certeza por trás da eficiência da polícia. Todos sabem que a polícia do país é uma droga e que a lei nem sempre dava certo. Mas e se realmente eles fossem atrás dela? E se eles se vingassem? Sharon não sabia como iria se proteger, mas agora iria lutar por isso.

— O pé ainda está doendo muito? – perguntou Sharon deixando-a encostada em uma árvore.

— Sim – a voz tremida de Suellen indicava que ainda tinha algo de errado.

— Nós vamos dar um jeito nisso. Vamos ser levadas a um hospital – confortou Sharon.

— Sharon... – Suellen começou a chorar novamente. Sharon pensou que fosse por causa das dores em seu corpo – Eu não vou aguentar isso.

— Calma. Nós vamos ser socorridas.

— Não é isso – disse com lágrimas escorrendo pelo rosto enquanto sua mão repousava na barriga – Eu estou grávida.

  O silêncio só não era total por causa dos barulhos dos morcegos e de galhos se quebrando ao longe com o vento, além do choro baixo de Suellen. Sharon ficou quieta sem saber o que falar. Sua cabeça agora doía violentamente.

— Eu descobri há alguns dias atrás. Eu fui ao médico por que passei mal e ele disse que estou no primeiro mês de gestação.

— E o pai é... - Sharon engoliu em seco já sabendo da resposta.

— Sim é do Rafael.

  Suellen chorava escondendo o rosto entre as mãos. Sharon não sabia o que fazer e somente a abraçou.

— Estou grávida de um bandido. Se eu soubesse que isso ia acontecer... Se eu tivesse a oportunidade... Eu não sei o que fazer... – terminou, caindo em lágrimas envergonhada por seu descuido.

 Demorou alguns minutos para que ela se recuperasse e voltassem a caminhar em direção a rodovia. Sharon não imaginava como a amiga deveria estar. Ser sequestrada e passar por todos aqueles abusos pela pessoa que mais confiava e amava, deveria ser de cortar o coração. E, além disso, estava grávida. Sharon sentia que a cabeça ia explodir.

Ninguém sabia quanto tempo se passou. A perseguição do trio pareceu ter cessado e não se ouvia mais o farfalhar ou xingamentos deles. Não tão longe, pares de faróis de carros e caminhões passavam com intervalos irregulares. Faltava pouco para alcançá-los e sair daquele pesadelo. O relevo aos poucos foi mudando dando espaço para um gramado encoberto pela escuridão. A rodovia passava dois metros acima de uma elevação que foi complicado de subir com uma pessoa cujo pé estava torcido. Ao alcançar a rodovia de péssima iluminação rezou para que algum carro aparecesse naquela escuridão.

— Falta pouco Suellen! Já vamos ser salvas.

— E eles? – perguntou fazendo uma careta ao tentar se apoiar no pé dolorido.

— Não sei. Sumiram. Devem ter se perdido. Olha! Um carro!

 Sharon se alegrou com a ideia de estarem próximos da salvação. O par de faróis surgiu de uma curva sinuosa e aos poucos ia ficando maior.

— Sharon! Estamos salvas!

— Sim

Sharon correu para o meio da estrada sem deixar Suellen de lado. Ambas balançavam os braços enquanto lágrimas de alívio corriam pelas maçãs do rosto. O carro preto vinha com os faróis piscando e se aproximando, aproximando cada vez mais, buzinando várias vezes e por alguma razão o cara no banco do passageiro estava com uma filmadora. O pânico havia voltado. Elas sabiam que não era a salvação e sabiam que o carro não ia parar. O veículo preto buzinou e o farol brilhou ainda mais antes de uma freada brusca e a sensação de voar vir à mente das garotas. Segundos atrás, antes de atingi-las, o motorista virou o volante e acionou o freio de mão fazendo o carro girar 180° e a parte lateral esquerda as atingiu em cheio. Suellen sumiu na escuridão da noite rolando relevo abaixo na grama alta. Sharon sentiu o impacto na cintura e o vento soprar os cabelos antes de cair no asfalto que a arranhou o rosto. Por um momento pensou estar morta, pois não sentia as extremidades do corpo, mas quando sentiu o peso dos pés de alguém em suas costas sentiu que ainda estava no pesadelo.

— Filmou isso? - perguntou aquela voz com entonações de raiva.

— Sim Rafa. Dá pra pedir um dinheiro a mais pro gringo – riu André.

— E a outra? - perguntou Rafael a Robinho.

— Sumiu – disse ao retornar mancando da beira da estrada – Deve estar morta no meio do mato.

— Que se foda. Vambora – disse tirando o pé das costas de Sharon – São três da manhã e essa vagabunda ainda não tá morta – disse cuspindo sobre o corpo de Sharon que se movimentava com os soluços do choro – Tá na hora de acabar com essa merda.

...continua...

(^_^)v

By Hikari Ouji


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