Menina Veneno escrita por DreamsOfASummerNight


Capítulo 9
Capítulo 8




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Eu estava na esteira havia uns bons cinco minutos, a atenção fixa na porta. Mary estava em algum lugar por ali. Com certeza na lanchonete, tentando encontrar algo calórico.

A impaciência começou a me dominar. Francamente, se discute tanto os direitos humanos e ninguém nunca pensou em criar um artigo que proibisse as pessoas de saírem da cama antes das 10h da manhã? É cruel, desumano! Não me espanta que tanta gente - pessoas como você, meu bem - seja tão mal humorada, acordando ainda de madrugada.

Senti as primeiras gotas de suor surgirem em minha nuca quando David enfim apareceu com seu andar estilo "dono do pedaço". Ele vestia uma regata branca e bermuda escura, os cabelos louros ocultos sob o boné. Seus olhos, como que capturados pelo canto de uma sereia, se voltaram em minha direção. O reconhecimento foi imediato.

Não era de se admirar. Apesar do rabo de cavalo despojado e da regata soltinha, o short curto deixava minhas pernas completamente a mostra, e a maquiagem a prova d'água cumpria seu papel.

Um sorriso preguiçoso esticou seus lábios enquanto ele se aproximava.

–Regina. - Meu nome soou como uma carícia em sua boca.

–David, que surpresa. Pensei que nunca mais fosse te ver de novo. - Diminuí a velocidade da esteira. - Eu chamaria isso de uma feliz coincidência.

– E eu chamaria de uma segunda chance. Fiquei tão mortificado pelo que te fiz anteontem que não consegui pensar direito e acabei deixando você escapar. Pensei que teria que acertar sua a cabeça de muita gente para conseguir te encontrar de novo.

Sorri. Ele pensara em mim.

– Você tem o hábito de bater nas pessoas com a porta, é? - brinquei.

– Apenas nas muitos especiais. - Ele sorriu em resposta.

As muitos especiais. Seria fácil.

– O que você mais gosta de fazer com as muito especiais? - Baixei a voz até que ela se tornasse um ronronar sexy.

– Isso é segredo. Você só vai descobri se aceitar...

Um som estridente atingiu meus ouvidos e eu me encolhi em completo horror. David também ouviu o berro, e procurou ao redor pelo animal agonizante. Encontrou Mary Margaret em um dos aparelhos, puxando a alavanca da máquina, os fones acoplados aos ouvidos.

Você é meu vício, meu ma-aaal... - cantarolava ela.

– Se eu aceitar...? - instiguei, mas David não ouviu. Sua atenção estava na coisinha sem graça fazendo caretas enquanto cantava de olhos fechados.

Tipo uma heroína que me entorpece a cabeçaaaaa-aa..

– David? - chamei.

– Preciso cair fora da sua vidaaaaaa-aa...

– David, você está me ouvindo?

– Antes que eu me afunde nessa merda federal. Fedeeeeral. Al. Al. Al. Fedeeeraa-al...

– David! - berrei, impaciente.

Isso o trouxe de volta. Bom, mais ou menos, Sua expressão continha prazer e deslumbramento, e eu sabia que não era por minha causa.

– Essa música é minha. Fui eu quem compus! - contou ele.

– Qual?

– A que a princesinha tá cantando. Nunca ouvi alguém cantar uma de minhas letras. - Ele voltou a encarar Mary. - Ainda mais uma menina tão bonita.

Seus olhos se voltaram na minha direção no mesmo instante.

– Você conhece ela?

– É minha... irmã. Ela sofre de um transtorno muito raro. Se chama... Transtorno de Semnoçãozice.

A testa dele enrugou.

– É mesmo? Nunca ouvi falar, mas ela parece tão normal, tão... maravilhosa, na verdade. Você precisa me dizer nome dela.

– Você não estava prestes a me propor alguma coisa? - Fiz o meu melhor para não soar irritada.

– Eu não sei. Eu... - Ele voltou a admirar Mary. - Essa menina me fez esquecer todos os meus pensamentos.

David passou as mãos nos cabelos. Alisou a camiseta, endireitou os ombros e, como se eu não fosse nada além de um bebedouro de água sem importância, me deu as costas e se adiantou em direção a Mary.

Eu observei ele se aproximar do aparelho onde estava a garota, descansar os braços no apoio de metal e sorrir para ela. Levou um tempo para que a lerda da Mary o notasse, e aquele olhar entediado pareceu fasciná-lo. Quanto menos interesse ela demonstrava, mais ele se esforçava para atrair sua atenção. Até que, por fim, funcionou. Eu sei disso porque ela removeu os fones de ouvido.

Queimando de raiva, soquei os botões da esteira e desci da máquina, saindo da academia sem falar com ninguém. Robin estava no volante do Cadillac, jogando Candy Crush no celular, quando entrei e bati a porta. Ele se sobressaltou, deixando o telefone cair.

–Não esperava que fosse sair tão cedo. - Ele se abaixou para pegar o celular no chão do carro.

–Só me tira daqui, Robin. Agora.

Ele me analisou por apenas um segundo.

–Você está irritada. O que aconteceu?

Balancei a cabeça.

–Só me leva para qualquer lugar antes que eu mate alguém.

Robin deu partida sem perguntar mais nada. Ele me conhecia bem o suficiente para saber quando eu estava prestes a fazer uma loucura.

Prestei pouca atenção em onde estávamos indo. Eu confiava no Robin. Fiz de tudo para manter afastada a imagem da expressão patética de David enquanto ele se debruçava e tentava seduzir a menina, me ignorando totalmente. Mas não fui capaz. As imagens daquela manhã se misturaram com a dos dias anteriores, quando fui chutada da campanha do perfume. Trocada por Mary Margart. Duas vezes. Minha respiração acelerou, o ar parecia não chegar aos pulmões, um leve tremor me sacudia.

Aquela garota estava começando a me irritar de verdade - se eu pudesse arrancava fora o coração daquela peste, e transformava em pó.

O carro parou, e eu olhei para a janela, saindo dos meus devaneios. Estávamos em frente a uma das minha lojas preferidas. Agradeci ao universo pelo presente que era Robin.

Desci do carro antes que ele pudesse dar a volta para abrir a porta para mim. As vendedoras ainda estavam arrumando a vitrine quando eu entrei e me olharam com cara de espanto. Provavelmente porque eu nunca:

a) saía na rua em roupas esportiva, e;

b) aparecia em público antes do meio-dia.

–Regina! Meu Deus, que delícia te ver logo cedo! - A gerente da loja correu ao meu encontro. - Como posso ajudá-la, querida?

–Preciso de algumas coisinhas. Algo atraente.

–Tudo fica atraente em você. - Ela sorriu de um jeito meio maternal.

E é por isso que eu gosto tanto de fazer compras.

Duas horas mais tarde eu saí da loja com 18 sacolas grandes.

Não faça essa cara, cada um lida com a rejeição da sua maneira. Essa é a minha. Roupas e sapatos novos foram um ótimo antídoto para o que eu estava sentindo.

Robin estava encostado no carro, as pernas cruzadas na altura do tornozelos, as mãos apoiadas tamborilando o capô. Ele se endireitou logo que me viu passar pela porta.

–Tem mais alguma coisa? - Pegou as sacolas.

–Não só essas.

Ele relanceou minhas compras e sorriu de leve.

–Então não está tão ruim assim - zombou. - Dezoito não é um bom número pra você.

Era uma droga conviver com o Robin, às vezes.

–Você não sabe de nada, Robin - retruquei.

–Vão na mala ou...

–Comigo. Quero tudo perto de mim.

Acomodei-me ao lado das minhas novas aquisições, acariciando as pontas de papel de seda que escapavam das sacolas, e suspirei.

–Mais calma? - perguntou Robin, dando partida e me olhando pelo espelho retrovisor.

–Não muito.

–Quer falar sobre o que aconteceu?

–Não nessa vida.

–E Mary? Por que ela não veio com você?

–Por que está preocupado com ela, Robin? - perguntei, irritada. - Por acaso você também tem uma queda por ela? Porque vou logo avisando que você seria preso por pedofilia caso se envolvesse com aquela pestinha sem graça menor de idade.

Ás vezes você é tão absurda - respondeu ele com frieza.

Imagino que você ainda não tenha entendido minha relação com o Robin. Sinto muito, mas não posso te ajudar nisso. Eu mesma ainda não compreendi completamente, mas abordarei o assunto mais para frente. Juro. Sei que você está curioso, mas realmente preciso segui a história porque o pior ainda está por vir.

Ah, sim, existia algo muito pior que aquela coisinha ridícula chamada Mary Margaret roubar uma campanha que era minha e ganhar o coração do homem que eu decidi que seria meu.

Algo que transformou aquilo numa guerra pessoal.


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