Eu abro os olhos, ele continua dormindo, com a respiração profunda, seu sono é pesado. Levanto-me, com certeza preciso de um banho. A figura no espelho se parece comigo, mas estou tão diferente, além disso, meus cabelos estão maiores, o que não me agrada. Gosto deles curtos me dão mais mobilidade. Tento corta-lo com uma tesoura cega que encontro na primeira gaveta, em vão, ela só o mastiga, preciso de um dia de garotas com Christina, mas só pensar em deixa-lo faz doer meu coração.Saio do banho vestindo uma enorme camiseta preta surrada de Tobias e uma bermuda que ultrapassa meu joelho. Prendo meus cabelos num rabo de cavalo. Não tem como me sentir bonita desse jeito. Mas ele sempre me ensinou a ser confiante.

Passo pela cama e me deito atrás dele, dando pequenas mordidas em suas costas, ele se move, saindo do seu estado e me percebendo, tomando meu corpo, ganhando vida. De repente ele me puxa com força, mantendo-me sentada sobre sua barriga. Enquanto me abaixo para beija-lo, ele aperta minha cintura por baixo da camiseta, subindo vagarosamente em direção aos meus seios, com a força necessária pra me fazer arfar.

E então ouvimos murros na porta, nos transportando de volta a realidade.

– Abram esta porta agora – Grita alguém – Ou eu mesmo vou derruba-la.

Tobias se levanta, rindo, indo em direção a porta que continua a ser esmurrada.

– Já pode parar, Zeke, já estou indo

– Então abra.

Zeke entra no apartamento, olhando tudo ao redor. Todas as roupas jogadas pelo chão da sala, a pia cheia de louça, panelas em cima do fogão.

– O que vocês pensam que estão fazendo aqui? Diz ele a Tobias enquanto eu me aproximo timidamente, com minha melhor cara de menina inocente.

– Que é isso, Zeke? Calma cara.

– Olha só pra você, está destruído e tire esse sorriso do rosto, tem três dias que vocês estão trancados nesse apartamento.

– Eu pedi uns dias de folga a Johanna – responde Tobias um tanto consternado

– Vocês sabem que horas são?

Eu mantenho minha cabeça baixa e os olhos levantados em sinal de vergonha e desculpas.

– São quase duas horas da tarde – completa ele – E, pelo que vejo, vocês acabaram de acordar. Três dias – repete jogando as mãos na testa. - Vocês têm certeza que são humanos?

Tobias esboça um sorriso e eu faço o mesmo, mas Zeke continua.

– Caleb não sabe mais o que fazer, Tris, você tinha que ir ao hospital fazer exames todos os dias lembra?

Oh, me lembro, sim, acabo de me lembrar, mas continuo sem falar nada.

– Eu não acredito que tive que vir até aqui pra dar sermão em dois marmanjos, vocês acham que têm o que, quinze anos?

– Ok, Zeke, nós já entendemos, desculpe – responde Tobias, se virando para mim – Acho que vamos ter que deixar nossos planos pra depois, Tris – ele pisca um olho, mantendo um sorriso safado no rosto – Você precisa ir ao hospital fazer exames.

Eu suspiro profundamente enquanto os dois me encaram

– Você vai voltar pro hospital, Zeke – Digo

– Sim, Shauna irá começar o tratamento agora a tarde, quero estar presente.

– Então eu vou com você.

Tobias me encara com aqueles enormes olhos.

– Você não quer que eu vá – diz ele com os olhos fixos em mim

– Bem, querer eu quero, mas você já se olhou no espelho? Ta precisando descansar. – ouço Zeke rir - Acho que nós dois precisamos de um tempo nosso. Olhe pra mim, não tenho nem roupa pra vestir.

Ele concorda, mas continua contrariado.

Caminhamos eu e Zeke, conversamos sobre tudo e nada ao mesmo tempo, me impressiono com a capacidade que algumas pessoas têm de falar pelos cotovelos. Zeke é uma delas, pouco abaixo de Christina. No Centro de pesquisas, Caleb está completamente emburrado. Cara o ajuda a preparar o equipamento enquanto ele coloca os eletrodos em mim.

– Caleb, desculpa, prometo que isso não se repetirá, prometo que virei todos os dias – Hoje estou me esforçando muito pra parecer uma garotinha, aprendi a usar minha aparência frágil a meu favor durante a iniciação na Audácia, logo depois de quase ser jogada do abismo.

– Você sabe que eu não caio nessa, não é Tris? Te conheço muito bem pra saber que você está tentando me enrolar.- Diz Caleb seriamente - Você sabe que precisamos monitora-la, você ficou quase um ano em imersão.

– Onde eu estava antes disso?

– A mantivemos viva ligada a aparelhos enquanto concluíamos as pesquisas

– Eu era como um vegetal?

– Sim, você e Uriah.

– Uriah! Posso vê-lo? Você poderia me explicar novamente todo o funcionamento dessa experiência, ainda não o compreendi totalmente. - Caleb esboça um sorriso, tentando disfarçar, se o conheço bem, ele vai adorar me explicar tudo de novo e eu terei que aguentar ouvir tudo, de novo.

– Depois, agora fique calma e relaxe, o exame dura cerca de 20 minutos

Faço exatamente o que ele manda, não quero arrumar mais problemas, mas minha curiosidade está me matando. Quero ver Uriah, ver como ele está, como eu estava.

Após o exame, Caleb me leva até um corredor nos fundos, no canto esquerdo da sala, o muito próximo da sala onde fiz a ressonância magnética dias atrás. Caleb abre a última porta e então eu vejo. Uriah flutua num líquido amarelo, ele não está nu, graças a Deus, mas também não está completamente vestido. Sinto meu rosto corar, não devia estar aqui. A curiosidade foi mais forte.

Ele parece sem vida alguma, é uma imagem assustadora.

– Nada bonito, não é – ouço Zeke atrás de mim

– Realmente não – digo – Só não conte pra ele quando acordar que eu não o achei bonito, pode ferir seus sentimentos.

Zeke ri e me dá um soco leve no ombro.

– Também senti sua falta, Careta.

– Duvido, você jamais sentiria falta de uma pessoa com a mira melhor que a sua. - respondo

– Do que vocês dois estão rindo – Ouço Shauna pela primeira vez

Aproximo-me, guiada pelo som da sua voz. Ela está deitada numa maca, a agulhas em seus braços, por elas está recebendo o mesmo líquido amarelo. Devo ter feito cara de interrogação, pois ouço Caleb me dando explicações.

– Shauna receberá um tratamento diferente do seu, a lesão dela foi especifica e não generalizada como a sua e de Uriah. Poderemos monitorar seu quadro, mas pela nossa experiência com você, acreditamos que ela ficará aqui por 20 dias.

– Tudo isso? Ela exclama

– Sim, e depois virá diariamente por mais quinze dias para o acompanhamento.

– Por que Shauna só virá quinze dias pra monitoramento enquanto eu preciso vir trinta? Pergunto a Caleb

– Simplesmente, Beatrice, porque Shauna não passou quase um ano em imersão depois de quatro anos em coma, igual a você. – diz ele num tom sério

Eu faço uma careta mostrando a língua.

– Muito maduro da sua parte, senhorita Prior

Mas eu respondo fazendo a mesma careta e mostrando a língua novamente.

– Valerá a pena, diz Shauna!.

Eu concordo com a cabeça.

Então ouço Zeke.

– Se você sair daqui com tanta energia igual a Tris, não sei se vou aguentar.

Sinto-me corar imediatamente. Zeke não sabe manter a boca fechada. No entanto, os últimos três dias foram os melhores da minha vida.

Agora preciso realmente encontrar Christina.