Jovens do Novo Mundo escrita por VicKWicK


Capítulo 3
Dia da entrevista (parte 2)


Notas iniciais do capítulo

Mais um cap glr, espero que gostem.
PS: escute Power Trip do J. Cole (old but gold)



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Anne já estava em sua segunda aula, pensando na possibilidade de que ela tinha cochilado e tudo aquilo fora um sonho, o emprego de seu pai e a conversa com a diretora, que havia se passado em uns poucos momentos de inconsciência, quando houve uma batida na porta. Todos se calaram e observaram com um misto de curiosidade e ansiedade, os colegas sabiam do que aquela interrupção se tratava e alguns mantinham esperanças de serem entrevistados em seu último ano letivo. O professor abriu a porta e deixou um homem alto, branco e careca entrar. Ele parecia musculoso, do tipo que faz papel de agente secreto em filmes de ação, ele era, de fato, um agente, mas da OGP. O homem estava vestindo uma camisa com um o símbolo da organização, um globo sendo segurado por duas mãos, uma branca e uma preta, e segurava uma prancheta, na qual ele olhou por alguns segundos antes de pronunciar alto:

—Anne Niara Santiago e Sara Oliveira, podem me acompanhar até o auditório, por favor. – A voz dele era grave e séria, com um pouco de um sotaque esquisito, voz de a gente secreto sem dúvidas.

Enquanto Anne se levantava, tentando não tremer, percebeu Malu tentando fazer contato visual com ela, a garota estava visivelmente confusa e Anne não teve coragem de olhar para ela. Seguiu a passos controlados até a porta, juntamente com Sara. A colega era uma baixinha, com os cabelos pretos cortados bem curtos e usava óculos redondos que, apesar de serem antiquados, pareciam bem descolados nela. Elas não se conheciam bem, a garota era nova na escola e nunca parecia muito interessada em se enturmar com os outros, alguns a achavam arrogante, mas Anne pensou que talvez ela fosse apenas reservada ou tímida. As duas andaram lado a lado, sempre um passo atrás do Senhor Alto, olhando para as costas dele a jovem pensou em Dwayne Johnson, um ator que fez sucesso muito tempo atrás. Anne achava incrível como a humanidade fazia questão de conservar antigas referências de cultura pop, porém não se preocupou em conservar o planeta em que vivia, mesmo sendo o único disponível. Apesar das previsões futurísticas feitas anteriormente à Guerra, essa coisa de viver no espaço e colonizar Marte não vingou, em outras palavras “o rolê flopou”.

Quando chegaram à porta do auditório, o agente anunciou que as entrevistas seriam feitas em ordem alfabética, então Sara ficou esperando em um dos bancos próximos enquanto Anne o acompanhou. A garota sempre esteve feliz com seu nome, pois, começando com “A”, ela acabava no começo de listas em ordem alfabética. Naquele momento, contudo, seu nome parecia uma maldição, imaginou que poderia tentar alegar que era apenas Niara, mas o “N” vem antes do “S”, então ela continuaria a ser a primeira entrevistava, só que com um nome a menos, o que não a ajudaria em muita coisa.

Dentro do auditório, havia uma longa mesa com três cadeiras atrás, duas das quais já estavam ocupadas e um terceiro lugar que deveria pertencer ao homem alto, além de uma cadeira solitária, um pouco à frente da mesa, à qual ela se dirigiu. Com o homem alto acomodado, Anne voltou sua atenção aos outros componentes da mesa avaliadora. Os dois eram homens também, um deles deveria estar na casa dos 40 anos, com a barba e os cabelos pretos salpicados de branco e um olhar inteligente, mas simpático. O último deles era bem jovem, uns 20 anos talvez, negro com o cabelo curto dos lados e mais cumprido no topo. Bonito, ela pensou antes que pudesse evitar e se esforçou para focar no senhor simpático sentado no meio.

—Bom dia Anne, eu sou o professor Wellington e vou conduzir sua entrevista. Você já conheceu o Mike King e esse aqui é o senhor Costa, ele é veterano no programa e está aqui para observar o funcionamento das seleções. – Mike King era definitivamente um nome de agente secreto, e senhor Costa era, de fato, jovem como ela imaginara.

Anne respondeu apenas com um “bom dia”, sem saber se deveria dizer mais alguma coisa. Ela tentou manter uma expressão neutra, mas agradável, algo que demonstrasse que ela estava calma, mas não desinteressada pela situação. A garota não tinha certeza se estava funcionando, talvez ela estivesse apenas parecendo esquisita, esperava que não.

—O processo é bem simples, eu vou fazer algumas perguntas e a senhorita pode ficar à vontade para responde-las como quiser, tudo bem? – Ele esperou que ela fizesse um sinal com a cabeça antes de continuar. – Vamos começar então. O seu histórico mostra que você boas notas em diferentes áreas do conhecimento, a senhorita tem preferência por alguma matéria?

—Acho que sou o que as pessoas consideram “de humanas”. – Ela fez aspas na expressão, ao menos essa pergunta era fácil. – Prefiro História, Sociologia e Filosofia, mas acho que nenhuma ciência é algo isolado, o conhecimento se dá em redes, não em blocos.

Anne achou que aquela havia sido uma boa resposta, e tentou buscar alguma reação nos integrantes da banca, mas a expressão deles parecia a mesma. Talvez devesse ter explicado mais? Seu nervosismo estava aflorando novamente e ela lutou para não mexer os pés, aquilo a denunciaria e sua tentativa de parecer calma seria jogada no lixo.

—Muito bem. Porque não fala um pouco sobre o que você gosta de fazer no seu tempo livre, senhorita Anne? Você deve ter algum hobbie.

—Bom, ­­– Anne pensou no que pareceria interessante de se dizer, ela poderia dizer que tocava algum instrumento ou algo do tipo, mas teve medo de que a mentira transparecesse, afinal eles não mandariam uma pessoa desatenta para fazer trabalho da OGP, acabou optando pela verdade – eu costumo ler bastante ficção, romances policias e terror em sua maioria, mas leio muita coisa sobre tópicos variados da História. Aos finais de semana geralmente jogo vôlei e faço caminhadas, mas não sou atleta. Além disso, gosto de documentários, sobre vida animal principalmente, o que destoa um pouco de outros interesses, mas acho que a natureza é fascinante. – Anne não sabia se essa era uma informação relevante, ou favorável para ela, no entanto ela não estava totalmente controlada e, sem pensar muito, acabou adicionando uma última coisa. – Eu também escrevo em um blog, crônicas, resenhas e artigos de opinião.

—Muito interessante, senhorita. – Wellington deu um sorriso simpático e isso a acalmou um pouco, talvez ela estivesse indo bem afinal. – Você gosta de lidar com pessoas? Como é sua relação com seus colegas?

Anne ficou aliviada, essa era uma pergunta que ela poderia responder sem ter que pensar em mentir. As pessoas geralmente a achavam simpática e acessível e ela gostava de conversar e interagir.

—Eu gosto muito de estar entre muitas pessoas e de conversar. Sou bem extrovertida e raramente tenho qualquer problema de convivência, seja com meus colegas ou qualquer outra pessoa. Tento ser compreensiva e respeitar a individualidade de cada um, sempre pensando na questão da alteridade.

—Ok, agora esta será nossa última pergunta e você estará liberada. O que a senhorita acha da Estratégia de Saúde da Família como modelo de assistência à saúde?

Por um momento a pergunta a sobressaltou, não porque não entendesse do assunto tratado, mas pela mudança brusca no conteúdo. Eles provavelmente queriam saber se ela conhecia um pouco da legislação de seu país e do funcionamento dos serviços públicos. Não era nada muito complicado, mas ela pensou um pouco antes de responder.

—Eu acredito que a Estratégia de Saúde da Família é uma forma eficiente e eficaz de manter o sistema se saúde focada na atenção básica, uma vez que grande parte dos agravos de saúde podem ser resolvidos no nível primário, sem a necessidade de especialidades médicas. Além disso, a ESF permite o investimento em prevenção, o que também otimiza o sistema e reduz a superlotação nos níveis de média e alta complexidade que são mais dispendiosos. Os únicos problemas estão ligados à sua implantação, pois ela exige gestão e pessoas qualificadas para compor a equipe multiprofissional. Esses profissionais qualificados se concentram em regiões como a Capital e outros centros urbanos, assim poucos tem interesse de trabalhar no interior e em regiões mais vulneráveis. Acredito que para resolver esse problema seria preciso interiorizar as universidades ou promover um maior acesso de jovens dessas localidades ao ensino superior, a fim de que voltem para suas comunidades e exerçam esses serviços.

­–Muito bem, senhorita Anna Niara Santiago, – O professor leu seu nome completo de uma ficha estava sobre a mesa. –Sua entrevista já acabou, você pode voltar para a sala de aula agora. Caso for selecionada, uma carta de convocação para a segunda fase chegará em sua casa em um período de 5 dias. Boa sorte.

Anne se levantou, pensando em sair correndo dali, mas achou que valia a pena tentar deixar uma boa impressão, então ela se dirigiu à mesa e estendeu a mão para cumprimentar a banca avaliadora. Primeiro o agente secreto Mike, que não alterou sua expressão durante toda a entrevista e assim continuou enquanto Anne apertava sua mão, depois o professor Wellington, que sorriu de forma simpática e por último, mas não menos importante, o “senhor Costa”. Ele era ainda mais bonito de perto e deu um sorriso pequeno e charmoso para Anne, que teve que se esforçar para se afastar dele e caminhar para até a saída sem tropeçar.

A garota passou por Sara e a avisou que logo a chamariam, a colega apenas assentiu sem dizer nada e Anne continuou seu caminho. Enquanto cobria a distância pequena entre o auditório e a sala, Anne torceu para que fosse escolhida, então torceu para que fracassasse miseravelmente e nunca mais precisasse pensar sobre o programa Jovens do Novo Mundo. No entanto, a entrevista já estava feita e se estressar com aquilo não aumentaria nem reduziria suas chances, então ela tentaria fingir normalidade até o fim do período de 5 dias e o depois ficaria para depois disso.


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