O som de saltos batendo contra o piso de mármore já envelhecido era bem comum naquele prédio residencial. O som de “toc, toc, toc” apressado subindo treze andares de escadas podia ser ouvido varias vezes durante a semana, restando aos moradores a única opção de se conformar com a onomatopeia.

Mas isso não significa que todos iriam aprender a gostar de ouvi-lo as seis e meia da manhã de quinta feira, quanto mais quando se tem 89 de idade e amargura nas costas.

–-GAROTA! Tem gente querendo dormir nesse prédio!

Koala brecou subitamente, perdendo o equilíbrio e quase indo ao chão.

–-A senhora esta acordada dona Asnésia.

–-Mas Fufi quer dormir.- A senhorinha apontou para a massa de pelos de cor e forma indefinidas deitada sobre a almofada roxa- Ele precisa dessas horas de sono a mais pra ficar saudável.

–-Então tá né...- A mais jovem olhou para o pulso- Ai caramba eu to atrasada! Até mais doa Asnésia!- Ela voltou a correr escada a acima

–-Ei! Você não esta usando relógio!

_________________________________________________________________________-

Koala destrancava a porta do amigo enquanto inspirava profundamente, soltando com força logo em seguida:

–-SAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA....

–-Fica quieta. Já te ouvi.- O garoto chegava a cozinha, esfregando os olhos com a aparência de quem havia acabado de acordar e um mau humor visível no rosto, obtendo como resposta dois dedos levantados em sinal de pedido de tempo.

–-AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAABOOOOoooo Ela finalizava o chamado das selvas com um grande arfo em busca de ar engatado com uma serie de engasgos -(arf,cof cof,) Bom (cof, arf arf) dia.

–-O que diabos foi isso?

–-Não vai dar bom dia primeiro?

–-Responde.- O rosto carrancudo indicava que ele realmente não queria dar bom dia a ninguém, o que era aceitável visto que nenhuma pessoa normal estaria acordada e bem disposta as seis e meia da manhã, quanto mais um adolescente de férias.

Mas Koala não era uma pessoa normal.

–-Treinamento (arf arf) de fôlego. Até que (cof, arf) foi bom pra quem (gasp, cof) acabou de subir (aaaarf) 13 andares de escada.

–-E pra que fazer isso?

–-Estou pensando em voltar a nadar no ano que vem.

–-Porque AQUI?

Ela levantou dois dedos em sinal:

–-Primeiro: te irrita. Segundo: incomoda a Dona Asnésia do andar de baixo.

–- É a senhora que parece ter sido a babá de George Washington e tem um poodle que mais parece um estofamento de sofá atropelado?

–-Uhun.

–-Ta então eu te perdoo.- Ele se jogou na cadeira da bancada- Mas so porque eu detesto aquela bruxa. ELA ME DEDUROU PRO SÍNDICO!- Sabo fez uma expressão emburrada típica de uma criança de cinco anos, coisa que parecia madura para sua idade mental de quatro.

Koala ria divertida, apertando as bochechas do melhor amigo.

–-Deixa eu adivinhar, o bebê estava fazendo pipoquinha as duas da manhã di novo num é?- Ela fazia bico pra falar- E o Bebezinho esqueceu que não sabia fazer pipoca num é? E deixou o prédio inteiro fedendo a fumaça num é?

Ele se limitou a inflar as bochechas para afastar as mãos da amiga, dando de ombros.

–-Eu não controlo minha fome.- O loiro puxou a caixa de cereais para mais perto, soltando um bocejo digno de hipopótamos.

–-Você precisa escovar os dentes.- Ela balançava a mão na frente do nariz.

–-Eu to comendo!

–-Urgh, bafo!

Ele simplesmente jogou cereais secos pra dentro da boca

–-Eu teria escovado os dentes se não tivesse sido acordado as sete e meia da manhã!

–-Seis. O horário de verão já acabou.

–-E você tirou minha hora extra de sono? Que tipo de monstro você é?

–-Uhn... Não sei. Garotas adolescentes obsessivas por pontualidade se encaixam na sua definição de “monstro”?

Sabo levou mais uma colher da tigela para a boca.

–-Você devia ser mais (mastiga) como os outros coalas.

–-Porque? Não sou fofa o suficiente?- Ela piscou os olhos como um bichinho de desenho animado, roubando um pouco do café da manhã do amigo.

–-Não. Dormir 22 horas por dia.- Ele bateu com a colher na mão que tentava roubar mais cereal- Comer eucalipto pra deixar a comida do amigo em paz...

Ela mostrou a língua.

–-Esse cereal ta seco. Precisa de leite.

–-Eu gosto dele assim!

–-Tá. Agora a verdade.

–-O leite azedou...

–-Vamos, a gente para pra tomar café na estrada.

–-Ahn? Aonde a gente vai?

O olhar de incredulidade da garota respondia por si só que o fato esquecido era realmente importante para um ou ambos os lados daquela conversa.

–-VOCÊ ESQUECEU?!- Essa era uma das frases que, quando ditas pelo sexo oposto, simplesmente congelam o sangue masculino dento das veias.- PRA QUE ACHA QUE EU VIM AQUI AS SEIS E MEIA DA MANHÃ?

–-Fazer meu café da manhã?

Nesse momento a garota fazia força para não bater o rosto contra a parede.

–-Hoje é dia 23 de dezembro. O presente do Luffy está embrulhado em cima da bancada junto com as chaves do carro. Isso significa que...?

–-O NATAL TÁ CHEGANDO!- O mais velho jogou os braços pra cima com força- COMIDA PRA CARAMBA SEM NECESSIDADE!!!

Koala soprou a franja de cima dos olhos.

–-Nós combinamos de ir pra Goa hoje lembra? Foi você que sugeriu!

–-Ah, beleza.- Sabo se levantou pegando o molho de chaves- Vambora!

–-Tá, espera só um minuto.- Ela se dirigiu a parte interna do apartamento

–-Vai ao banheiro?

–-Não. Fazer a SUA mala.

–- Você não tinha mandado eu fazer ela a uns dias atrás?

–- Você lembra que eu mandei você fazer a mala mas não lembra pra que?

–-É a lógica masculina. Não discuta.

Ela bateu no próprio rosto.

–-Você separou alguma roupa?

–-Pra que? Eu já to usando uma calça jeans e eu posso assaltar as camisetas do armário do Ace! Ele não usa mesmo!

–-Não vem ao caso. Nós vamos pra Austrália direto de Fuusha, a cidade vizinha de Goa e logo no dia 2! Não dá tempo de voltar pra buscar roupa!

–-Ahn... Eu vou precisar de outra calça então...

A morena revirou os olhos.

–-E o bastão de treinamento?

–-Ahn...

–-O kimono-uniforme?

–-Éééééhhh...

–-Equipamento de proteção?

–-Bããhh...

–-Você lembrou de pegar ALGUMA COISA como eu te disse pra fazer?

–-Sim!

Aquilo era realmente novidade. Se o garoto lembrara de pegar alguma coisa ou ela realmente era importante ou explosiva/incendiária. A segunda opção era a mais provável visto de quem se tratava.

–-Tenho até medo de perguntar mas o que?

–-Meu xampu de camomila!

–-Xam...pu?

–-Como acha que eu consigo manter esse cabelo loiro natural?- Ele passou a mão pelos cabelos.- Requer cuidados!

–- Na verdade eu achei que você usava xampu de laranja.

–-Ué? Por que?

–-Porque seu cabelo ta um bagaço. Agora senta aí e fica quieto.

E com isso a discussão novamente se encerrava com Koala mantendo o percentual perfeito e inquebrável de 100% de vitórias consecutivas, interruptas e esmagadoras sobre o melhor amigo. Coisa facilmente explicável através do gênero feminino ao qual a vencedora pertence.