Música, Sangue e Eternidade escrita por Countess Dracula


Capítulo 7
Capítulo 7: Velório


Notas iniciais do capítulo

Só para lembrar: Não esperem o ritual estadunidense para velórios, lembrem-se que não especifiquei o país onde a fic se passa.
Capítulo não betado.



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No exato momento em que Edna faleceu, sua mãe despertou com o coração apertado. Era como se instintivamente ela soubesse que o laço entre as duas fora cortado.  O dia amanheceu chuvoso. Uma chuva triste, pesada.

 Assustada, levantou- se e foi ao quarto da filha. Tudo parecia em ordem, exceto a cortina e a janela – ambas abertas. Maura sabia perfeitamente bem que Edna não costumava deixá-las aberta à noite. Um calafrio percorreu-lhe o corpo, o medo gelando seu coração. Andou lentamente em direção à filha, que não se moveu quando foi sacudida, nem respondeu aos chamados da mãe. Como que entendendo sua dor, a chuva aumentou quando Maura começou a gritar.

- Então nosso rapaz conseguiu?- perguntou Charles sentado em uma poltrona, confortável em seu terno marrom, uma taça de champanhe nas mãos. Às vezes permitia-se brindar como os humanos faziam. Esse hábito o divertia imensamente, mesmo não sabendo o porquê. Olhava atentamente para a esposa vestida com o longo casaco de veludo branco forrado de vison.

- Sim, sua primeira vítima está morta. A cidade toda irá para o velório.

-Então você deve ir também, belezinha.- Disse ele levantando-se.

A notícia surpreendeu a esposa de forma quase cômica aos seus olhos.

-Mas porquê? Detesto velórios!

O marido aproximou-se dela, acariciando-lhe os ombros por cima do casaco.

- Eu sei. Mas provavelmente nossos vizinhos detestáveis irão também e você precisa ficar de olhos neles, belezinha.

-Eu? Mas você irá comigo, não é, Chas?

Charles reconheceu o tom de voz manhoso com o qual ela falou e escondeu um sorrisinho. Dessa vez não poderia ceder. A situação era séria.

- Não. Irei buscar nossos amigos das trevas, nossos queridos morcegos. – Abaixando a cabeça, sussurrou no ouvido dela. - Creio que em breve precisaremos da ajuda deles, meu bem.Convide nosso violinista. Talvez ele aprecie rever sua vítima mais uma vez.

Marion sorriu, enquanto o marido tirava-lhe o pesado casaco.

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O dia continuava frio e chuvoso. Pessoas chegavam em pequenos grupos à casa da família Miller para o velório, outros saíam. Marion chegou acompanhada do assassino insuspeito, ambos de preto. A saleta onde o corpo era velado estava cheia e o perfume das velas era forte, misturando-se ao das flores já murchas.

Em um canto, a mãe da garota chorava sem fazer som algum. Perto dela o marido, muito pálido, o rosto confuso. Em frente ao caixão – colocado em cima de um cavalete, adornado com rosas brancas e crisântemos- uma mulher idosa puxava o terço, respondido e repetido em coro, de forma mecânica e monótona, como uma cantilena sem fim. Marion escondeu um bocejo, Andrei apenas olhava fixamente o caixão. No final da dezena mulher idosa recitou em um latim fluente, fazendo Marion revirar os olhos de tédio:

-Requiem aeternam dona eis, Domine.*

Sendo respondida imediatamente pelo coro, com exceção do pai da garota e dos vampiros:

- Et lux perpetua luceat eis.*

Reiniciou-se então cantilena do terço novamente. A vampira apenas suspirou, fingindo tristeza. Abaixou a cabeça, fingindo estar acompanhando as orações. Andrei por outro lado ouvia o terço com atenção, como que fascinado, perdido nas lembranças do passado – um passado do qual não sentia falta. Não importava-se em ter perdido ou não sua suposta humanidade. Ainda tinha a música e isso era o importante. Enquanto o violinista mergulhava em lembranças, uma carruagem parou em frente à residência.

Os passageiros, uma jovem de estatura mediana e longos cabelos lisos e loiros e um casal – a senhora uma versão mais velha da garota loura que os acompanhava, um senhor alto e de ombros largos. Ambas as mulheres usavam véu preto sobre o rosto. Desceram da carruagem sem muito alarde, mas chamaram a atenção da vampira. Um movimento junto à porta da sala atraiu seu olhar e ela os viu, se muita surpresa. Era justamente quem ela esperava – a família Levy enfim aparecia.

A única coisa que a surpreendia - e ela tinha a certeza de que Charles também iria perceber - era a silhueta alta e familiar do homem. Era idêntico a Caspar Levy. Certamente era algo a mais para o marido levar para o lado pessoal. Não conseguiu deixar de sorrir consigo mesma. Adorava quando ele ficava feroz.

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Usando um chapéu e uma capa de cetim negra por cima do terno marrom, Charles adentrou a floresta. Seus passos eram seguros e firmes, sabendo exatamente para onde iria. No coração da mata estava o destino de seus passos: Lá estava a caverna escura que procurava. Os morcegos lá dentro agitaram-se, guinchando. Reconheceram os passos e atenderiam o chamado. Fosse ele qual fosse.

Aproximando-se deles, Remarque tirou as luvas pretas que usavam e acariciou o maior do bando. O animalzinho gostou, Charles ficou satisfeito. Parou o carinho, movimentando as mãos, dando as ordens de para onde eles deveriam partir, a pedra vermelha em sua aliança prateada reluzindo forte.

Obedecendo ao mestre, os morcegos agitaram e abriram as asas, saindo da caverna em uma revoada, sem, no entanto guinchar. Se o mestre precisava de seu silêncio e proteção, era isso o que teria.

O vampiro desvaneceu-se da caverna, materializando na cripta subterrânea de sua mansão para recepcionar os pequenos amigos. Lá eles acomodaram-se a seu bel-prazer pelo teto antigo e escuro.

Charles Remarque olhou gratificado e satisfeito para suas crianças da noite.

Agora era só esperar a hora certa.

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Na casa dos Miller, Michelle Levy aproximou-se lenta e delicadamente do caixão, o rosto triste. Crescera brincando com Edna, mas não sentia-se de fato triste. Gostava da garota – ou o mais próximo que fosse desse sentimento. Passou a mão no rosto da amiga, sentindo a pele fria. Ah, como gostava dessa sensação!

Não sabia explicar nem para si mesma, mas gostava da beleza da morte. Com um suspiro tão convincente que quase sentiu realmente a dor que fingia a si mesma sentir, afagou os cabelos dela. Estava ainda mais fascinada em saber que a causa do óbito era desconhecida.

Do outro lado da sala, Andrei ergueu os olhos do caixão e fitou-a. Para todos os outros naquela sala a garota loura parecia estar perdida em tristeza infinita pela morta à qual acariciava, mas ele reconheceu aquele olhar. Sabia que ela estava encantada por algo. Mas pelo quê?

“Ela está encantada pela morte, meu amigo” sussurrou a voz de Marion dentro de sua cabeça e ele compreendeu então que não era o único a observá-la. Discretamente, a vampira retirou-se da sala do velório. Não pretendia influenciar nada por ora, mas estava gostando do rumo que as coisas tomavam.

De súbito, Michelle sentiu-se observada. Discretamente, levantou a cabeça na direção de Andrei. Ao vê-lo, sorriu. Num impulso que não saberia explicar, abaixou novamente os olhos, deu meia-volta e abraçou Maura, dando-lhe os pêsames outra vez. A mulher começou a chorar, para desespero interno da garota, que não soube o que fazer. Nunca soubera muito bem como consolar alguém.

Do lado de fora da casa, Marion viu um morcego solitário voando em círculos, para em seguida voltar-se na direção da Mansão Remarque. Sabia ser esse o sinal de que deveriam voltar para casa. Movendo-se com uma rapidez fantasmal, voltou-se em direção a casa dos Miller e então controlou-se. Deveria agir como humana. Empertigou-se e caminhou em direção à sala do velório, procurou calmamente Andrei. Foi até ele e calmamente, colocando as mãos em seu ombro sussurrou um “vamos, temos que ir”, ao qual ele respondeu com um aceno afirmativo de cabeça.

Nenhum dos dois percebeu Michelle Levy olhando-os sair. Tampouco tinham como saber que o rosto da Sra. Remarque ficara bem gravado em sua mente.

Continua...

 

 


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Notas finais do capítulo

Do latim:"Dá-lhes Senhor, o descanso eterno e a luz perpétua os ilumine". É parte do ritual católico de defuntos, lembro de quando criança ter presenciado velórios assim. Mas faz tempo que não vejo esse ritual.
Agradeço a Thammy por procurar o livro de orações antigos e me passar o ritual. =)
Demorei pq tive 3 provas - e terei muuuuuuuitos trabalhos pra fazer, então n sei qdo volto. =/ ;***



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