Túmulo das sete almas ~Hiatus~ escrita por Sol


Capítulo 11
Capitulo 11




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Segundo dia
11h 37min


  Eu ainda podia sentir o sangue espesso sujar as minhas mãos, tudo acontecendo lentamente.
Cain se jogou em cima de mim, eu podia ver o seu sorriso de dor, “feche os olhos Luc”, ele pediu ao me abraçar e correr para me levar até o banheiro do estacionamento.
Eu ainda podia ouvir o som dos passos pesados e lentos do nosso perseguidor.
“Vai ficar tudo bem!”, ele sussurrou enquanto eu chorava, os passos se aproximavam mais e logo estávamos escondidos dentro de uma das cabines do banheiro, Cain me abraçava com força, sempre tentando me acalmar. Sempre protetor.
A porta repentinamente se abriu e o sorriso do assassino foi tudo o que eu vi antes do sangue jorrar.
Cain gritou de dor e prosseguiu gritando, seu corpo caído a minha frente, ele arfava, buscando uma respiração que parecia não vir, suas mãos seguravam as minhas, eu tremia.
Cada vez mais ele perdia as forças, cada vez que o homem erguia a faca, eu tapava os olhos, mas o choro de Cain me dava a sensação de estar vendo tudo. Ele arfava cada vez mais desesperado e gritava até não ter mais voz.
Ainda conseguia me lembrar do sangue sujando os meus joelhos, de minhas mãos envolvendo o corpo ensanguentado dele e do seu coração perdendo o ritmo aos poucos. Enquanto eu soluçava e tremia, sentindo minhas pernas adormecerem.
O assassino ria como se assistisse uma grande comédia enquanto eu o encarava com incompreensão, pavor e ódio.
Cain gemeu de dor e me olhou nos olhos, “seja forte”, ele me disse enquanto sua respiração ficava mais lenta e pesada “não me deixe”, implorei com lágrimas nos olhos e ele sorriu, ainda olhando em meus olhos, ao dizer suas ultimas palavras: “Nunca”.
Na hora eu não entendi que ele havia morrido.

Minha mãe ainda me abraçava, chorando um pouco menos que antes, eu tentei puxar o ar de todas as formas, mas parecia impossível, minha visão estava ficando turva e minha mente já não conseguia processar aquele turbilhão de informações, todas as fotos, Cain...
O seu sorriso ao me ouvir contar histórias bobas sobre a escola, enquanto me cobria e bagunçava o meu cabelo. Sua voz cantando para me fazer dormir...
Eu lutei tanto para parar de ouvir o choro e os gritos dele toda vez que fechava os olhos...
Seus braços me envolvendo em um doce abraço protetor ao me acordar.
Eu lutei tanto para parar de chama-lo de manhã...
Todas as vezes em que me repreendia por jogar bola dentro de casa, ou por brigar com alguns dos meus amigos, “Seja um bom menino Luc!” é o que sempre me dizia.
Eu lutei tanto para parar de procura-lo todo dia... Esperando em frente à porta de seu quarto, meus pezinhos sempre se movendo ansiosos, eu só parava quando minha mãe me puxava para seu colo e me explicava pela milésima vez: Ele não vai voltar. Então eu apenas chorava e no dia seguinte tudo se repetia.
Eu lutei para seguir em frente e ser forte, e estava conseguindo, estava conseguindo Cain! Eu consegui um ótimo amigo e uma namorada incrível.
Mas agora tudo pareceu ir por água abaixo.
Quem poderia ser tão cruel a esse ponto?
— Tudo bem amor, estou aqui! – Minha mãe me abraçou mais forte, o que me deu uma sensação de calor e paz, não o suficiente para me fazer esquecer tudo, mas o bastante para me fazer parar de tremer e regular um pouco da respiração.
— Santo Deus! – Alguém exclamou ao entrar, eu encarei a pessoa, ainda agarrado a minha mãe.
Era o detetive e mais um jovem policial, ele passou por Charles, que até agora só observava tudo completamente chocado e provavelmente assustado, eu sabia disso porque suas mãos estavam tampando a boca, ele estava encostado a parede e parecia tentar se equilibrar.
Meu pai andou até os homens e os cumprimentou, o diretor fez o mesmo. O detetive me encarou por um segundo, pude ver um pouco de compreensão em seus olhos, ele sorriu tristemente.
— Preciso entender como alguém teve acesso a isso, essas fotos estavam com a polícia, como alguém conseguiu isso? – Meu pai parecia furioso e indignado, suas mãos estavam inquietas e ele parecia se controlar para não sair chutando tudo até sumir do mapa.
— É o que vou investigar, meu parceiro irá tirar algumas fotos se não se importar.
— Claro, fique a vontade. – O diretor se pronunciou um pouco mais ansioso que o normal, ou seria desespero?
Minha mãe chamou Charles, ele correu até ela como uma criança que estava perdida, ela segurou-lhe a mão com firmeza.
— Com licença, preciso tirar os meninos daqui, tudo isso é demais para os dois. – Ela comunicou de forma firme e decidida, sem deixar espaços para objeções, e os homens nos encararam sem dizer nada, meu pai me olhou nos olhos, mas logo os desviou, o que me deixou extremamente mal.
Minha mãe saiu nos puxando para dentro da escola, onde tudo estava mais tranquilo, ela nos sentou lado a lado em um banco no corredor mais quieto.
— Santa teimosia viu. Quando adultos dizem para não ir a tal lugar vocês não vão, ouviram? – Ela resmungou séria, porém logo suspirou e beijou minha bochecha. — Um Luc sem teimosia não é um Luc não é mesmo? Rebelde o tempo todo, sinceramente eu já deveria ter me acostumado.
Baixei os olhos e ela sorriu, acariciando minha bochecha e permaneceu olhando para a parede por um tempo, enquanto o silêncio parecia preencher cada fresta daquele lugar.
— Com licença! – O detetive tornou a surgir, ainda sorrindo levemente e se aproximou mais de nós três. — Será que posso falar com o garoto?
Olhei nos olhos da minha mãe, inseguro, o ultimo interrogatório acabou mal, só faltava ele me acusar de ter matado Cain também.
Minha mãe o encarou sem sorrir, ainda muito séria.
— Isso é mesmo necessário? Meu filho acabou de relembrar algo horrível.
— Será bem rápido. – Ele garantiu e ela me encarou uma ultima vez. — Eu prometo.
Ela segurou o braço de Charles e o puxou para segui-la, o envolvendo em um abraço e andando com ele para longe de nós, meu amigo havia se tornado um segundo filho para ela a muito tempo, é sempre assim, se ela não pode me consolar, ela grudava nele.
O detetive se sentou ao meu lado e ajeitou os óculos. — Luc não é?
— Sim. – Era obvio que ele já sabia.
— Você amava muito seu irmão mais velho não é mesmo?
Eu o encarei em dúvidas, que tipo de pergunta era aquela? Não era para ele estar me acusando? Ou perguntando o que eu estava fazendo na hora do ocorrido?
— Sim. – Respondi por fim, olhando para o fim vazio do corredor, se fosse outro dia normal estaria cheio de pessoas falantes e agitadas. Minha sala estaria lotada de pessoas divertidas e escandalosas, das quais eu não conseguiria me aproximar facilmente. Não, eu não os odiava, pelo contrário do que se possa esperar eu passei a gostar dos meus colegas, eu só me sentia mal porque não conseguiria criar coragem para fazer por eles o que eles fizeram por mim.
— Seu pai me disse que Cain era bem tranquilo de lidar, um pouco teimoso e ansioso, mas um bom menino.
Eu sorri, sim, meu irmão era a pessoa mais doce do mundo, mesmo que as vezes ficasse sério e inconformado com a vida, na escola ele era muito amado, aonde ia deixava um pouco do encanto, evitava machucar as pessoas e por ironia sofreu tanto ao morrer.
— Luc, pode me dizer exatamente o que aconteceu?
Respirei fundo, e ergui a cabeça, estava demorando a chegarmos a esse ponto não é?
— Nós nos perdemos, na verdade foi culpa minha, estávamos no estacionamento do shopping, minha mãe conversava com um homem que trabalhava lá e me deixou com meu irmão, eu ouvi alguém me chamar e corri para ver quem de quem se tratava, Cain veio atrás de mim, tentando me alcançar e me levar de volta, quando ele conseguiu me parar já estávamos longe de mais, eu não faço a mínima ideia de como corri tanto, mas a pessoa não parava de me chamar, eu sempre fui curioso e meio louco.
— Quem era essa pessoa? Você descobriu?
— Não. Só sei que havia muitos carros e nada da minha mãe, eu fiquei com medo, mas Cain se manteve calmo. Ficamos olhando os carros para tentar achar a minha mãe, mas nada. O silencio era tenebroso. Até que um homem surgiu, eu não me lembro da voz dele, quero dizer, faz tempo que não a ouço, então, acho que apaguei da minha mente. Mas eu sei que estava um pouco sufocada pela mascara toda negra.
— Mascara? Estranho. – O detetive ajeitou os óculos novamente, olhando para mim fixamente e anotando tudo em um bloco de notas, sua mente parecia associar alguma coisa, exatamente como Charles fazia quando começava a raciocinar demais. — O que aconteceu depois?
— Ele pediu para irmos até ele. Ele disse que nos levaria para casa. Cain se apavorou ao ver a faca na mão dele e me puxou, assim nós começamos a correr. O homem apenas repetia a mesma coisa sempre, que nos levaria para casa, ele não corria, ele andava, pisando firme no chão e apenas repetindo a mesma coisa e às vezes chamava por Cain. – Ouvi os passos de meu pai a se aproximar, ele parou a minha frente e senti meus olhos marejarem, mas tinha que me controlar e me concentrar só em contar o que havia ocorrido, ou pelo menos tentar. — Eu sabia que ele estava com medo, sabia que Cain estava apavorado, mas ele não chorava e nem reclamava, apenas me puxava. Nós corremos até o banheiro e nos escondemos em uma cabine, mas ele nos achou, ele... – As lágrimas começaram a ganhar força, tentei secá-las, mas elas não paravam. — Ele abriu a porta com um chute, eu me escondi atrás de Cain... Mas o homem o puxou e o jogou no chão. Eu... Tentei ajudar o Cain a... A levantar... Mas o homem me empurrou e eu cai... E continuei no chão, com medo. Cain tentou se levantar e agarrou a minha mão, engatinhei até ele e novamente tentei ajuda-lo, mas eu não tinha forças... E aquele maldito se ajoelhou e começou a bater nele e em mim, eu estava com tanto medo! – Admiti, sentindo que minhas mãos perderam um pouco da força. — O homem usava a força para não deixar Cain se levantar e então ele apontou a faca e... - Levei as mãos ao rosto, sentindo o choro me dominar, aquela cena, aqueles gritos na minha cabeça.
— Acho que já chega! – Meu pai se pronunciou enquanto eu ainda chorava, minha visão completamente embaçada por causa das lágrimas e minha garganta parecia seca, estranha... — Luc, calma! – Ele se aproximou e tocou em meu ombro. — Ei filho! – Eu o encarei, meus olhos suplicaram por um consolo que ele nunca me deu.
— A culpa foi minha, por isso você me odeia... –Admiti, tanto para ele como para mim mesmo, ele estagnou, me encarando enquanto eu me acabava de chorar. — Você me odeia, porque o Cain morreu e eu to vivo.
— É isso que parece? Luc? – Ele se ajoelhou a minha frente e tocou meu rosto, eu o encarei. — É isso que parece? Que eu te odeio? Meu Deus Luc, eu te amo meu filho! - Ele me puxou enquanto se levantava e me abraçou com força. — Eu não te odeio Luc! Eu nunca te odiei, eu não consigo nem pensar nessa hipótese. Eu nunca te culpei meu anjinho. Olhe pra mim, eu sou péssimo com você porque eu não sei lidar com tudo isso, mas eu te amo Luc, te amo e você é o único motivo que eu tenho para acordar todos os dias e seguir em frente.
Eu o encarei entre lágrimas e ele beijou minha testa, nos sentamos no bando enquanto ele secava meu rosto com a manga da camisa, era bom tê-lo tão perto de mim, tão carinhoso e tão atencioso, eu nunca pensei que ele seria capaz de ser tão doce comigo, não depois da morte de Cain.
Meu celular tocou, mas não quis atender, apenas o peguei e o encarei, era de uma das minhas colegas de classe, Esther. Meu pai pegou meu celular e atendeu, eu não me importei, apenas fiquei parado, com a cabeça encostada no ombro dele.
— Olá, o Luc não pode atender agora, aqui é o pai dele. – Meu pai esperou paciente enquanto Esther falava, ela sempre foi muito faladeira. — O que? Como assim? – Eu o encarei preocupado ele ainda ouviu a menina falar. — Sim estou aqui agora mesmo... Meu Deus... Tudo bem, eu vou passar pra ele.
Peguei o telefone e o atendi a contra gosto. — Alô?
“Luc? Meu Deus nós estamos surtando por sua causa”
— O que foi?
“Um monte de fotos foram postadas na internet, nos grupos da escola, nas paginas também, fotos do seu irmão cara. Estou horrorizada, todos estão, estamos apagando tudo. Mas ficamos preocupados quando soubemos que isso está na escola, você está ai? Meu Deus você deve estar mal.”
Senti um arrepio instantâneo, ao menos estavam apagando tudo, mas depois dessa sem dúvidas era óbvio que Max estava tentando me expor.
Sem duvidas ele sabia... - Como sabia? - Que ser exposto era meio maior medo.
Se havia algo a agradecer, eram os anos de turma que tínhamos, pois isso nos uniu, todos os meus colegas se importavam uns com os outros, mesmo que eu e Charles fossemos mais afastados eles nunca deixariam de nos ajudar e nos apoiar, a prova disso foi quando não fizeram perguntas sobre Jessie ou até mesmo, a anos atrás, sobre Cain.
— Como assim? O que está dizendo?
“Ai Luc, você é lerdo ou que? Certo, desculpa, estou nervosa queria o que? É isso que ouviu e... Ah, merda! Minha mãe chegou... Até amanhã, fique bem!”
Fim de chamada.
— O que ela disse Luc? – Meu pai quis saber, enquanto eu me jogava em seu abraço de novo.
— Que vai me encher de pipoca! – Respondi e ele riu, a ultima coisa que eu queria era falar, respirar, viver.
— Seus colegas seriam bons amigos se os deixasse se aproximar de você.
— Sabe que eu não conseguiria pai. Charles e Jessie são especiais. – Eu sorri ao me lembrar do dia curioso em que nos conhecemos. Começou com brigas e terminou com risadas.
— Eu entendo. Vem, vamos para casa, ficar aqui só irá piorar o nosso ânimo.
— Só se prometer não ficar brigando com a mamãe. – Pedi manhoso, retrocedendo as manias infantis, e ele sorriu minimamente. — Tudo bem então.


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Notas finais do capítulo

Perdoem qualquer errinho eheh



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