Eu abro os olhos lentamente e eles acabam doendo com a claridade. Estou na minha cama encarando a parede. Cenas da noite passada repassam na minha mente e eu sorrio. Estico o braço pro meu lado esquerdo, mas não sinto nada. Me viro rapidamente e vejo apenas o lençol amaçado sem ninguém. Mônica deve ter ido pra escola mais cedo.
Desço e tomo um café reforçado. Coloco a primeira camiseta e calça jeans que vejo e vou direto para a escola. Avisto Cascão e o comprimento com um aperto de mão.
_ E aí cara ? - ele pergunta - Você sumiu.
_ É, tava resolvendo as coisas com a Mônica. - eu digo um pouco constrangido por estar falando sobre isso -
_ E como foi ? - ele pergunta esperançoso -
Eu coço atrás da cabeça um pouco sem jeito e não posso disfarçar minha felicidade.
_ Ela aceitou.
_ Parabéns cara! - ele diz batendo nas minhas costas - E vocês já... ?
Eu paro por um segundo, mas logo minha mente poluída ativa seus conhecimentos e eu coro. Dou um tapa forte na sua nuca e tento parecer normal com sua pergunta.
_ Ei! - eu digo o repreendendo - Não sei se estou muito afim de abrir sobre minha vida sexual com você. - eu digo irônico -
_ Foi mal... - Cascão diz envergonhado -
Vamos para a aula conversando e então percebo que a carteira da Mônica está vazia. Uma pequena preocupação bate no meu peito, contudo, eu ignoro. As vezes ela foi em casa e se atrasou, ou está passando mal.
Quando o sinal avisa que é hora do almoço, eu ligo para o seu celular. No início chama até cair e depois avisa que está desligado. Todas as piores possibilidades passam pela minha cabeça e tento não me desesperar, mesmo alguma coisa me falando que tem algo errado.
Procuro Magali no refeitório, mas ela não está por lá. Volto para assistir mais duas aulas sem parar de pensar na Mônica. Ela parecia estar tão feliz ontem, não faz sentido ela ter fugido de mim. Tem algo muito errado. Eu sei.
O sinal toca novamente e eu procuro Magali por todos os cantos. Há uma multidão de pessoas aglomeradas, porém minha altura me ajuda. Vejo Magali andando apressadamente até o portão. Saio empurrando todo mundo até chegar nela.
_ Magali! - eu grito e ela acelera - Magali!
Eu a alcanço e a seguro pelo pulso. Magali me lança um olhar surpreso e ela congela diante da minha expressão.
_ Eu quero saber o que está acontecendo. - eu digo firmemente -
Suspiro enquanto ela ainda me olha assustada.
_ Por favor. - suplico calmamente -
Magali solta um ar pesado pelo nariz e se solta de mim parecendo pronta para falar.
_ A Susana e a Carmem andaram implicando muito com a Mônica nesses meses, mas essa semana elas passaram dos limites. E parece que o pai da Mô não é muito esperto, então... - sua voz foi ficando fraca e pude ver lágrimas em seus olhos - Ela foi embora.
Parecia que eu tinha levado um soco forte no estômago, pois eu sabia que naquele momento estava difícil respirar. Eu fiquei estático por alguns segundos e fui embora em passos largos. Ela não podia ter ido embora. Não, isso não era verdade. Eu paro por um instante e vejo que Magali está se virando para ir embora.
_ Magali! - eu grito e ela se vira - A que horas sai o vôo ?!
_ E- eu não me lembro! - ela grita de volta - Acho que 18 horas!
Não a respondo de volta, apenas saio correndo para o meu carro. O meu coração está batendo forte no meu peito misturado com a adrenalina e o desespero. Eu dirijo o mais rápido que posso e olho no relógio. 17:30. Eu tenho que chegar a tempo!
Chego no aeroporto e desço do carro rapidamente. Há milhares de pessoas e eu corro até a recepcionista. Passo na frente de várias pessoas que começam a me olhar feio. Uma velhinha que estava atrás de mim começou a xingar e a reclamar.
_ A que horas sai o vôo para São Francisco ?! - eu pergunto tentando não parecer um louco -
_ Seis horas. - a mulher me responde entediada -
_ Mal educado! - velhinha grita pra mim -
A velhinha pega sua bengala e bate na minha cabeça com força. Primeiro acho que vou morrer e me controlo para não xingá-la, quando vejo Mônica com sua mala.
Parece que o tempo para, mas eu ainda estou ciente de que tenho pouco dele. Corro em sua direção e grito para pará-la.
_ Quando ia me contar ?!
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Olho para trás e fico paralisada. Cebola está a poucos metros de distância me encarando sem fôlego. Seus olhos mel parecem desesperados e fundos. Ele caminha se aproximando de mim e eu ainda não tenho reação. Meu coração estava dolorido há poucos minutos atrás e agora não para de bater freneticamente como se fosse explodir.
_ Por que não me contou ? - sua voz era triste -
_ Não sabia como. - digo em um sussurro -
Cê se aproxima e acaricia minha bochecha direita com sua mão levemente.
_ Não posso te deixar ir. - ele disse com um pingo de desespero na voz -
_ Mas eu tenho que ir. - eu disse com a voz tremida pela vontade de chorar -
Eu coloco minha mão direita em sua nuca e colo nossas testas. Sua respiração quente bate contra mim e eu coloco minha mão esquerda em seu coração.
_ Fica. - ele diz com lágrimas em seus olhos -
Fico surpresa por vê-lo chorar, já que só o vi assim quando falou de sua mãe biológica.
Dói vê-lo desse jeito e eu o beijo como se fosse o melhor remédio. Talvez não só pra ele, como para mim também.
_ Fica e mostra que a Susana e a Carmem não tem poder nenhum sobre você. - ele diz decidido - E mostre isso pro seu pai também.
Eu penso em suas palavras e a ideia me parece tentadora. Eu deveria me arriscar tanto ? Eu deveria fazer isso ? Deveria enfrentar assim ?
_ Eu...
_ Por favor. Por mim. - Cebola diz suplicante -
Ele coloca sua mão sobre a minha que ainda está no seu peito e eu a aperto forte. O que eu sinto por ele é muito forte. Além de que estou cansada de fugir e deixar os outros ganharam por mim. Eu sempre fui a insegura, a quieta, aquela que não dava palpite sobre nada porque achava que era melhor assim. E agora ? Tudo isso importou ? No final, só os forte sobrevivem e é isso que eu vou ser.
_ Eu fico.