O meu despertador toca um berro bem alto e insuportável. Eu olho em volta com os olhos semicerrados e murmuro um xingamento. Não suporto acordar cedo. Me levanto da cama lentamente e vou tomar um banho rápido. A água quente ajuda para me acordar e acalmar. Coloco minha camisa branca com mangas, calças jeans e um tênis all star preto. Meus cabelos não conseguem se controlar e ficam bagunçados naturalmente. É... Lá vamos nós.
Desço as escadas pulando em cada degrau. Avisto minha mãe que logo me dá um beijo na bochecha e me entrega uma maçã.
_ Boa aula querido! Te amo. - ela diz com sua voz doce -
_ Também te amo mãe. - eu retribuo o carinho -
Meu pai aparece na sala com o seu terno preto impecável e seu olhar frio. Ele acena levemente com a cabeça para mim e eu faço o mesmo, mesmo que uma pequena parte de mim queira abraçá-lo.
_ Bons estudos. - ele diz com sua voz fria -
_ Obrigado. - murmuro -
Vou até o meu carro e girando as chaves na minha mão. A lembrança do dia anterior invade minha mente por um instante. Ontem foi legal e eu sempre me sinto calmo e protegido quando estou com a Mônica. Mas ainda sim, ela continua sendo a nerd que não posso ultrapassar muito os limites dessa amizade. E ontem, por mais que eu odeie admitir, eu quis realmente beijá-la, tanto que fiz. Merda! Não, não Cebola! Você é Cebola Menezes, não se apaixona e muito menos por uma nerd.
Ligo o carro e a música "Sex on fire " invade o carro. Uma das minhas músicas favoritas do King of lion. Vou o caminho inteiro para a escola cantando e não conseguindo tirar a imagem minha e da Mônica no seu quarto. Balanço a cabeça para afastar esses pensamentos de mim e finalmente, chego à escola. Estaciono o carro em qualquer vaga disponível e assim que fecho a porta do carro, dou de cara com Carmem. Levo um pequeno susto, porém tento disfarçar soltando o meu melhor sorriso. Ela pisca de uma forma sedutora pra mim e me abraça.
_ Oi! Que saudades de você! Não te vi o dia inteiro ontem. - ela diz com uma voz manhosa -
Por máximo que a Carmem seja a garota mais bonita e popular do colégio, odeio o jeito como fala comigo. Na verdade, eu sei que não a suporto.
_ Pois é... Andei estudando muito ontem. - minto -
_ Hum... Que inteligente! - ela diz com uma voz sedutora -
Caralho, não sei como ela cai nessa. Carmem tenta me beijar e eu recuo um pouco sem ela desconfiar. Cascão aparece com um sorriso triunfante e levantando a mão pra mim.
_ E ai mano! Vamos lá pro Campos ?
O olho interrogativamente, enquanto ele me lança um olhar cúmplice. Entendo logo o que quer dizer.
_ Claro! Hã... Tchau Carmem. Nos vemos no intervalo.
Ela faz beicinho e eu me viro sem olhar para trás. Assim que tomamos uma distância, suspiro como se um peso tivesse sido tirado de mim. Cascão me olha e parece se divertir com isso.
_ Pareceu que estava precisando de ajuda. - Cascão me provoca -
Eu tento ignorá-lo, mas sei que ele é o meu melhor amigo e esse filho da mãe me conhece bem.
_ Não estou aguentando ela. - solto com um pouco de raiva na voz -
_ Então por que não termina ?
Eu paro e o olho um pouco irritado.
_ Você sabe o que vai acontecer com a minha reputação se eu terminar com ela ? - eu quase grito -
Cascão concorda e levanta as mãos em um ato de rendição.
_ Relaxa mano. Eu sei como é difícil pra você.
Eu apenas assinto e continuamos andando até a sala de aula. Me sento em alguma carteira do fundo e olho distraidamente para a janela. O dia está nublado pela primeira vez em dias. Ouço um arranco vindo da porta da sala, como se um carro tivesse freiado. Olho diretamente para a direção da porta e dois pares de olhos castanhos escuros estão me olhando arregalados. Fico sem reação também ao ver Mônica parada na porta me encarando. Suas bochechas começam a ficar coradas e sei que está com vergonha. Ela entra rapidamente na sala olhando para baixo e se sentando na primeira cadeira. Tento me controlar para não levantar e ir conversar com ela, mas é quase impossível. Quando vejo, já estou caminhando em sua direção. Paro na sua frente e percebo que todos estão olhando e cochichando. Mônica levanta o olhar e suas bochechas ficam mais coradas, porém agora lhe dão um certo charme. O que eu estou dizendo ?!
_ Oi. - eu digo sorrindo para ela e a mesma cora mais -
_ Oi... - ela diz em um sussurro -
Sinto alguém me puxar pela gola da camisa e quando vejo, Carmem está me beijando. Fico um pouco estático e irritado ao mesmo tempo. Porém não consigo dizer nada, apenas olho de relance para Mônica que está de boca aberta. Ai não, isso não é bom.
_ É... Tchau. - eu digo um pouco sem graça -
Mônica não me diz nada, apenas continua me encarando como se tivesse visto um fantasma. Carmem me puxa até minha carteira que está ao lado da sua e me beija novamente rápido.
_ O que estava fazendo conversando com ela ? - Carmem me pergunta de forma ameaçadora -
_ Falando sobre o trabalho que terminamos ontem. - murmuro -
_ Que bom que finalmente acabaram.
Não digo nada, pois logo o professor entra na sala. Não consigo prestar atenção, apenas fico repetindo várias cenas na minha mente. Primeiro, a dança na pizzaria, depois o meu beijo com a Mônica e logo a Carmem que me beijou na frente dela. Por que isso me incomoda ?
Olho para Mônica e ela parece bem focada na aula. Desvio o olhar para Carmem que está lixando sua unha discretamente na aula. Não consigo evitar fazer uma careta. De qualquer forma, ainda estou tentando entender porque fui atrás da Mônica ontem à noite. E a pergunta mais importante do dia: " Por que a beijei ?! " Ela só está aqui há um mês, não vou deixar que atrapalhe minha reputação. Eu preciso disso. Pode ser difícil, mas se for para agradar meu pai, eu farei.
O sinal toca avisando que é o intervalo. Caminho até o refeitório com Cascão e nos sentamos na mesa do resto do time de futebol. Todos estão conversando sobre bobagens e coisas inúteis, e pela primeira vez, isso me cansa. É, eu não estou suportando continuar aqui. O que está acontecendo comigo ?
_ Vou andar um pouco. - falo para Cascão -
_ Ok. - ele diz dando uns tapinhas nas minhas costas -
Vou até o pátio da escola e fico observando o jardim verde que tem por lá. Começo a reparar nas pessoas, no tempo e novamente minha mente se desvia para ontem. Por que não tiro esse dia da minha cabeça ?! Será que é tão difícil esquecer assim ? " Foi só um momento... Só um momento... " Repito mentalmente para mim mesmo.
Apoio minha cabeça nas minha duas mãos que estão apoiadas em meus joelhos. Fecho os olhos por alguns instantes e fico sentindo o ar frio bater contra o meu rosto. Ouço uma risada familiar e levanto a cabeça para olhar. É a Mônica. Com o DC. Desde quando eles estão tão próximos ? Amigos não deviam sair por aí rindo juntos. Ele está perto dela cinco centímetros a mais do que devia estar. Por que porra ele tá se aproximando dela ? E por que ela está parada ? E essa mão no rosto e na cintura dela ? Isso não devia estar aí.
De repente, um sentimento de raiva e possessivo toma conta de mim. Me levanto rapidamente da bancada onde estava e caminho rapidamente até eles. Antes que DC se aproxime mais da Mônica, eu passo o meu braço esquerdo ao redor dela dando alguns passos para trás, a levando junto comigo.
_ E ai gente ? O que estavam fazendo ? - pergunto inocentemente -
Mônica está me olhando incrédula e Do Contra como se quisesse me matar.
_ Nada que te interesse. - ele me responde com tom cortante -
Dou uma risada debochada e Mônica olha para DC como se estivesse pedindo desculpas.
_ Desculpa Do Contra, depois nos vemos.
O dou um sorriso vitorioso e fico sozinho com a Mônica. Ela cruza os braços pra mim me olhando irritada. Talvez ele devesse ter ficado.
_ Por que fez isso ?
Fico em silêncio tentando fazer minha expressão mais ingênua possível.
_ Fiz o quê ?
_ Arg! Você sabe Cebola! - ela diz irritada -
_ Desculpa se te salvei de um psicopata Emo que parecia querer colocar alguns piercings e mechas em você pra ter converter. - eu fico irritado -
Mônica cruza novamente os braços me olhando de boca aberta. E de repente ela começa a rir. Sim. Eu não sou o único doido por aqui. O universo feminino é algo que nunca vou compreender.
_ Por que está rindo ? - pergunto confuso -
_ Por que o DC não estava tentando me beijar. - ela explica - Tinha um cílios no meu olho.
Ok. Talvez eu esteja me sentindo um pouquinho idiota. Só um pouquinho. Mas ainda sim, eu sei que ele estava querendo se aproveitar da situação.
_ Sua ingenuidade me impressiona. - murmuro -
_ Ingenuidade ? - ela pergunta com um tom sarcástico -
Eu sei o que ela está se referindo. Ao beijo de ontem. Porém ainda sim, não pode se repetir. Não é só minha reputação que está em jogo... Eu só sei que não posso ser o que ela quer.
_ Mônica, eu sei que o que aconteceu ontem foi... - eu tento procurar uma palavra - Íntimo. Mas não podemos fazer isso de novo.
Mônica me olha como se tivesse levado um soco. É, talvez essa seja a palavra. Tento manter a minha vontade de abraçá-la.
_ Olha... - eu pego sua mão - Eu quero mesmo que sejamos amigos. Por favor.
Ela me olha com incerteza e como se estivesse processando minhas palavras. Eu me esforço para não puxá-la e beijá-la com esses olhos castanhos me encarando. O que eu estou dizendo ?
_ Acho que nunca deixamos de ser. - ela diz com um sorriso fraco -
Tento sorrir largamente para Mônica e a puxo para um abraço. É bom senti-la em meus braços, sinto que quero protegê-la de alguma forma. Nos separamos e continuamos bem próximos nos olhando, até que o sinal toca novamente.
_ Temos aula. - ela sussurra -
_ Temos. - concordo suspirando -
Nos separamos e vamos para a aula. O resto da tarde foi chata e tediante, porém me senti melhor depois de ter conversado com a Mônica. Apesar de que essa conversa continua me incomodando de alguma forma que não sei explicar.
Assim que a aula acaba, vou até o meu carro e vejo a Mônica conversando com o Do Contra no estacionamento. Ele parece estar perguntando algo à ela e ela parece que está tentando responder. Nossos olhares se cruzam por um instante e eu sei que uma pontada me atinge quando isso acontece. Nossa, isso soou bem gay.
Mônica desvia o olhar e parece concordar com DC. Ele fica feliz e eu evito ver o resto da cena. Olho atentamente para a chave do meu carro e um borrão loiro parece ao meu lado.
_ Oi gato.
Lá vamos nós.
_ Oi Car. - eu tento soar normal -
_ Eu nunca fiz isso, mas...
É impressão minha ou ela parecia nervosa e tímida ?
_ Quer ir ao baile comigo ?
Fico totalmente surpreso com sua pergunta e me sinto idiota por não ter perguntado para ela. Apesar de que não tenho tanta certeza se realmente quero ir com... Espera. Será que a Mônica aceitou ir com o DC ?
Fico com raiva da possibilidade e logo faço minha decisão.
_ Claro.
Carmem sorri e me abraça. Vejo pelo seu ombro que Mônica está nos observando, mas logo desvia o olhar. Entro no carro e aceno para Estive, meu motorista. Ele assente com a cabeça e depois dá partida. Observo os carros ficando para trás enquanto passamos. Suspiro lentamente pensando em quantas coisas aconteceram hoje. Muitas coisas, com certeza.
Chegamos finalmente em casa e avisto minha mãe que logo chega para me abraçar.
_ Foi boa a aula ? - ela pergunta -
_ Foi. - digo tentando fazer minha melhor voz -
_ Tudo bem, suba, vá tomar um banho e desce para jantar. - ela me diz dando um beijo no topo da minha cabeça -
Sou totalmente apaixonado por essa mulher. Apesar de não ser minha mãe biológica, eu a considero como se fosse.
Subo as escadas lentamente e vou até o meu quarto. Tiro minha roupa e entro no chuveiro. Tomo um banho com água quente e me permito relaxar um pouco. Fecho os olhos passando as mãos pelos meus cabelos. É, eu estava precisando disso.
Saio do banho e coloco minha calça moletom cinza e minha blusa regata cor vinho. Apenas passo rapidamente a mão nos meus cabelos. Desço para jantar e todos estão na mesa. Meu pai continua com seu jeito frio de sempre, minha mãe parece tranquila.
_ Estudou muito hoje ? - meu pai pergunta com sua voz fria -
_ Sim. - respondo sem vontade -
_ Que bom, se quiser comandar minha empresa algum dia, vai precisar estudar muito.
_ Claro. - respondo automaticamente -
_ Porque para o mundo dos negócios você...
_ Perdi a fome. - digo o interrompendo -
Me levanto da mesa e meu pai me olha com seu olhar mortal.
_ Não terminei de falar com você. - ele diz -
_ Pra mim já acabou há muito tempo. - eu digo me sentindo corajoso -
Subo para meu quarto e tranco a porta. Parece que tem alguma coisa me sufocando e eu logo pego meu celular e dígito uma mensagem.
" Oi. O que está fazendo ? "
Espero alguns segundos e logo a resposta vem.
" Oi. Estou no ensaio da minha banda. E você ? "
De repente estou muito melhor, até me lembrar que o Do Contra também faz parte da banda.
" Nada... E como tá o ensaio ? "
Alguns segundos depois vem a resposta.
" Legal. "
Digito a resposta.
" Ah. Então bom ensaio. "
" Obrigada... Está tudo bem ? "
" Sim, por que não estaria ? "
" Você nunca me manda mensagem. "
" Estou agora. "
" Tudo bem, vou precisar ir ensaiar. Depois nos falamos. Tchau. XO "
" Prefiro o X. "
Sorrio, porém não há mais respostas. Tento me distrair com tudo que vejo na minha frente. Primeiro o travesseiro, depois o livro de história. Tá, desde quando estudar me distrai ? O lápis em cima da mesa. Ah, esse lápis! Lembro muito bem que me fez passar uma noite inteira escovando os dentes. E por causa dela. Por que tudo me faz lembrar a Mônica ? Vou acabar precisando de um hobbie. Cara, estou ficando gay.
Apenas decido que é melhor dormir para poder ver se o dia seguinte me ajuda a esquecer os problemas.