Colby Haynes

Parecia que eu tinha acabado de vivenciar Interestelar: num minuto eu era eu e no outro eu tinha ficado bem mais velho.

Minha cabeça latejava de perguntas sobre o que eu iria fazer. Mesmo que eu pudesse cuidar de mim mesmo, a lei não me deixaria cuidar dos meus irmãozinhos, eu não era ainda maior de idade.

Charlotte olhava para mim com uma preocupação. Eu não podia deixar de reparar que eu gostava disso: o quanto ela parecia se preocupar comigo, afinal todos sabemos que Charlie não é a pessoa mais afetuosa do mundo.

Eu olhei para o lado e percebi que James tinha saído do quarto sem dizer nada. Provavelmente querendo deixar comigo a decisão de contar tudo para Charlie ou não.

— Ele foi buscar mais cookies — Charlie respondeu percebendo o que eu estava procurando. Ou melhor, quem.

— Tudo bem — eu suspirei.

— O que vai acontecer se você não conseguir a guarda dos seus irmãos?

— Simples — dei de ombros, derrotado. — Meus irmãos vão ter que morar com a minha mãe. O que não vai ser bom para nenhum dos três porque... bem, você sabe todo o rolo da minha mãe. Eu duvido que ela seja sã o suficiente para parar de pensar em seu luto por um momento para cuidar dos seus próprios filhos.

Eu me arrependi logo depois de ter falado aquilo. Não era toda verdade, e minha mãe também não tinha toda a culpa. Era apenas uma situação complicada e ruim, eu não deveria sair julgando.

Charlotte pegou minha mão e me puxou para fora da casa de James.

— Hey, James — ela gritou quando já estávamos na rua. — Vou pegar seu companheiro emprestado um pouquinho.

James deu risada da porta da casa e fechou logo depois.

— Aonde estamos indo?

— Para a minha casa.

— Por quê? — eu perguntei confuso.

Ela virou-se para olhar para mim com um sorriso irônico no rosto.

— Não se preocupe, querido. Eu prometo que não vou vender seus órgãos para o mercado negro...

— Ótimo.

—... Por enquanto.

Eu revirei os olhos e deixei Charlie me levar para sua casa que ficava no final da rua.

***

— Hey pai — ela disse quando ela entrou. — Tio Allan?

— Recebeu uma ligação de emergência de Dylan. Parece que Nathan torceu a perna então Allan preferiu voltar.

Charlie assentiu.

— Pai, Colby pode dormir aqui?

Jake DarkShadow virou-se para olhar para mim, surpreso.

— Colby! Eu não tinha te visto, rapaz. Como está?

— Estou ótimo, Jake.

— Então, pai, ele pode?

— Pergunta pra sua mãe. Por mim, tudo bem.

— Onde ela está?

— No porão. Disse que queria tentar pintar um quadro de um cachorro.

Descemos as escadinhas para o porão da casa de Charlie. Eu lembro que quando nós três éramos crianças, e ficávamos fingindo que havia milhares de monstros lá embaixo.

— Mãe, Colby pode dormir aqui em casa hoje?

Angeles DarkShadow estava coberta de tinta com dois pincéis na mão esquerda e um na mão direita.

— Sim, filha, claro. Oi Colby!

— Oi, Angeles — eu sorri. Aquela mulher era doidinha e muito legal.

Charlie andou até a sua mãe para olhar o quadro que ela estava pintando.

— Mãe, seu quadro não parece um cachorro e sim um antílope com dor de barriga.

— Charlotte querida, você quer dormir na sua cama hoje?

— Sim, por quê?

— Porque se você disser mais alguma coisa sobre esse quadro, você vai dormir no jardim.

— Eu sempre adorei flores.

— Saiam vocês dois daqui — Angeles disse enquanto apontava um pincel na nossa direção como se fosse uma arma muito potente.

Eu e Charlotte rimos quando chegamos no quarto dela.

***

Fazia um tempo que eu tinha entrado no quarto de Charlotte. Então eu acabei olhando tudo para ver se alguma coisa tinha mudado.

— Por que você me chamou até aqui?

— Porque na casa de James você ia ficar se martirizando por causa da situação com sua mãe, aqui pelo menos nós podemos fazer alguma coisa legal — ela deu de ombros.

— Como o quê? — eu perguntei olhando a prateleira dela com todas as temporadas de Supernatural.

— Eu tenho uma ideia — ela disse.

A grande ideia de Charlie foi nós ficarmos deitados na cama de casal dela assistindo “Batman Animated Series” enquanto comíamos pipoca doce e tomávamos garrafas e garrafas de coca-cola.

Eu coloquei meus óculos para enxergar melhor. Miopia era uma merda.

— Você nunca usa óculos — Charlotte disse olhando para a TV.

— Eu uso só quando está de noite e eu quero enxergar algo longe — eu disse.

— Eu sei disso — ela revirou os olhos. — Eu sei quase tudo sobre você, Colby. Eu só estou dizendo que você nunca usa o óculos e eu acho que seria legal você usar mais, pelo menos faz parecer que você é inteligente.

— Fato — eu disse ironicamente, mas com uma cara séria.

Charlotte riu.

— Você sabe que eu só brinco com as pessoas que eu amo — ela disse.

Eu congelei no lugar. Não sabia o porquê, mas quando ela disse aquilo, meu sangue pareceu correr para as minhas bochechas e meu coração começou a bater mais rápido.

Só me faltava eu estar tendo uma arritmia cardíaca.

— Não gosto do Batman — Charlie disse enquanto tomava outro gole da sua bebida, acordando-me de minha brisa. — Ou melhor, eu não gosto do Bruce.

— Por quê? — eu perguntei sorrindo.

— Porque ele é muito sem sal. Nada de especial. Sei lá, heróis precisam ser como... como o Homem-Aranha.

Revirei os olhos diante da concepção dela.

— Você só diz isso porque você adora os vilões do Batman mais do que o próprio Batman.

— Essa é a graça da DC: fazer muitos vilões legais e heróis chatos.

— Puxa-saco da Marvel — eu disse cantarolando.

Ela revirou os olhos.

— Mas ainda sim, Batman é um dos melhores heróis da DC — ela disse lambendo os beiços da pipoca doce. — Eu o prefiro ao Superman.

Assenti, concordando. Quase ninguém gostava do Superman.

— Qual o seu personagem favorito do Batman? — eu perguntei.

— Poison Ivy — ela disse olhando para mim com um sorriso. — E você?

— Eu iria dizer Joker, mas eu tenho quase certeza que você iria me bater se eu fizesse isso — eu disse sorrindo.

Ela riu.

— Sim, provavelmente. Até porque quase todo mundo adora ele. Sem ser ele, quem?

Olhei para a tela do desenho e virei para ela.

— Acho que o Nygma.

Ela sorriu concordando.

— Obrigado — eu disse depois que o silêncio predominou no quarto. — Por fazer isso por mim.

Ela apenas sorriu para mim.

— Sempre — ela deu risada depois de dizer a frase mais clichê desde que Harry Potter lançou.

Eu olhei atentamente para ela e não pude deixar de notar como Charlotte estava bonita mesmo com o cabelo todo bagunçado e a boca suja de pipoca doce. Eu senti uma súbita vontade de beijar aqueles lábios.

Levantando apressadamente, eu sai da cama.

— Hey, o episódio ainda não acabou! — Charlotte disse. — E aonde você vai?

— Banheiro — eu disse antes de fechar a porta atrás de mim.

Olhei para o meu reflexo e percebi o rubor nas minhas bochechas e eu não conseguia fazer meu coração parar de bater.

— Você só pode estar brincando — eu disse depois de respirar mais calmamente.

Eu não estava...

Eu não estava...

Eu não...

Eu...

Eu estava apaixonado por Charlotte DarkShadow.

(Para quem não entendeu muito bem as referências de Batman, clique aqui! para visualizar uma imagem)