Incondicional escrita por Selena West


Capítulo 56
De onde menos se espera


Notas iniciais do capítulo

Oi, oi, não me odeiem, não consegui postar antes, tive uns contratempos pra conseguir arrumar umas coisinhas.



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Dois pares de olhos idênticos aos meus me encaravam assustados do outro lado da sala, eram meus meio irmãos, se a madrasta havia sido um choque, os irmãos eram o golpe final para a tragédia ser completa. Foi Amélia que os apresentou a mim, Josh e Blake, tinham apenas cinco anos e não entendiam como tinham uma irmã que não era filha da mesma mãe, não me ofendi, eu mesma não conseguia os considerar meus irmãos.

Desprendi-me do olhar das crianças e circulei pela sala onde algumas pessoas lamentavam a morte de Gregory, aparentemente ele havia sido um bom homem, quase não havia membros de sua família. Amélia contou que seus pais morreram há muitos anos e que sobrara apenas uma tia e poucos primos que moravam no Texas.

Os desconhecidos amigos de meu pai não faziam ideia de quem eu era, porque pedi a Amélia e Helen que não me apresentasse como filha de Gregory, minha madrasta concordou imediatamente e disse que também preferia que a imagem do marido não fosse manchada por um erro do passado. Eu deveria me sentir atingida por aquele comentário visivelmente maldoso, no entanto não queria julgar uma mulher em luto por seu marido falecido, era óbvio que não era bem vinda na casa de Helen, ela me olhava da mesma forma que a Amanda, com rancor e raiva, a diferença era que Amanda não era minha madrasta.

Deixei meu copo de suco sobre a mesa e caminhei até o canto da sala onde Darren olhava os retratos expostos em cima de uma lareira, eram todas fotos de uma família feliz, fragmentos da vida do meu pai.

— Os gêmeos se parecem muito com você. – Darren pegou uma foto onde meu pai segurava os dois meninos no colo dentro de uma piscina.

— Um pouco. – Era horrível admitir qualquer semelhança, eles tiveram um pai, o meu pai, aquilo nos faria diferente para sempre.

— A Helen parece bem chateada por você estar aqui.

Darren pegou uma foto onde Helen estava apoiada no capô de um carro antigo e colocou quase encostada na ponta do meu nariz.

 – Bastarda, veio roubar a alma do meu marido. – Disse tentado imitar a voz de fina de uma mulher.

— Você está tentando ser desprezível como sempre ou essa é sua forma estranha de dizer “sinto muito pelo seu pai”? – Estava incomodada com a forma como Darren estava agindo.

— Sinto muito, só acho que esse velório não é seu... Não, claro que não... Quero dizer o luto.

Como alguém conseguia ser tão insensível?

— Darren, não me faça te odiar mais. – Meu companheiro de viagem deu as costas e foi para o outro lado da sala.

Todas aquelas fotos montavam a história dos oito anos que fiquei longe do meu pai, Gregory e Hellen alguns anos mais jovens deitados na grama sorrindo um para o outro, o casal no dia do casamento, Hellen com uma barriga enorme na porta da casa, os gêmeos na maternidade, a foto deles com o nosso pai na piscina e mais um monte de outros momentos como esse onde todos sorriam.

Não odiava a vida que levei com a minha mãe, amava Kate mais do que qualquer outra pessoa no mundo, no entanto a ideia de uma família como aquela dos retratos me seduzia, era como imaginei durantes os primeiros anos em que meu pai nos deixou.  Os gêmeos puderam ter o que eu sonhei, mas agora sofria por seu pai ter partido cedo demais, seria duro para eles, assim como foi para mim.

—----------

O céu chorava sobre nós suas lágrimas geladas, aos poucos as pessoas que acompanhavam o cortejo fúnebre abriram seus guarda-chuvas, apenas Hellen seguia sem nenhuma proteção, seus cabelos ruivos colavam no rosto, mas ela parecia nem se importar.

Chegamos ao local onde o caixão seria enterrado, um pastor falou poucas palavras sobre a trajetória de um homem, a cada elogio sobre a vida em família de Gregory mais eu tinha vontade de gritar e dizer que ele era uma farsa. Hellen não quis dizer nada, Amélia falou sobre a infância dela e do irmão em uma cidade pequena sem muito luxo, outras pessoas que eu não conhecia falaram sobre coisas que eu desconhecia. Depois que todos terminaram suas homenagens, os homens baixaram o caixão e jogaram a terra por cima, era isso, acabou.

A chuva aumentou, as pessoas se despediram antese de seguir para seus carros.

— Hellen, vamos para casa, os gêmeos precisam descansar. – Amélia pediu a cunhada.

— Não só eles. – Hellen deu um suspiro pesaroso.

— Summer, você precisa de carona? – Amélia perguntou.

— Não, Darren foi pegar o carro.

— Nos vemos mais tarde. Vamos Hellen. – Amélia devia ser uma mulher forte, sempre cuidando de todos a sua volta, nunca cedia à tristeza ou ao cansaço.

Todos se foram, fiquei sozinha com o túmulo do meu pai, não havia mais um Gregory Morrison. Incrível que nas duas últimas vezes que o vi não era possível ter uma conversa, expor a verdade e o que realmente aconteceu nesses oito anos. Minha mãe estava certa não era bom revirar histórias do passado, feridas velhas devem ficar fechadas.

— Hey, parece que tem muitas pessoas nessa cidade que não sabem quem você realmente foi. – olhei para o buquê de flores que ainda segurava. – Todos tão comovidos com o grande pai de família. Você contou a eles que largou sua filha de oito anos? Contou a eles que nunca deu nenhum sinal de que estava vivo e bem? Claro que não, é difícil acreditar que você tenha sido um bom pai quando pra mim não passa de um fantasma. Eu o odiei tanto, durante tanto tempo, acho que ainda odeio.

Bati com o buquê que segurava na lápide.

— Por que você nunca voltou para me ver seu grande babaca de merda? – destruí as flores com a raiva que guardava. – Preferiu morrer a me contar algo, não foi? Espero que aqueles garotos tenham lembranças melhores do que as minhas, seu cretino, viver uma vida feliz e plena enquanto eu vivia pensando no que fiz para você não me querer mais.

Minhas palavras foram substituídas por gritos, destruí todas as flores que estavam no túmulo as jogando contra a lápide que ironicamente dizia “Em memória de Gregory Edward Morrison, pai e marido dedicado”. Eu me sentia traída, machucada e perdida.

— Summer! Pare com isso! – Darren me abraçou prendendo meus braços, chorei em sua camiseta que começa a ficar encharcada por causa da chuva.

— Ele... Meu pai, foi... – Não consegui formar uma frase coerente.

— Ele foi um babaca, eu sei. – Darren afastou meus cabelos molhados. – Eu disse que esse luto não era seu.

— O que eu fiz? Por que não me amava como aqueles garotos? – Os olhos verdes de Darren estavam tão escuros que poderiam ser negros.

Darren se aproximou, estava tão perto que senti seu hálito quente contra meu rosto, nossos olhos se encontraram. Um raio caiu a poucos metros iluminando tudo ao redor, pude ver os olhos verdes de Darren, tão densos, então algo que nunca imaginei que aconteceria se tornou real, Darren me beijou, o toque de seus lábios era suave e ao mesmo tempo intenso, um turbilhão de sentimentos passou pela minha mente, o beijo causou um transe momentâneo.

As mãos de Darren estavam em minhas costas fazendo com que nos aproximássemos mais, minhas mãos foram em direção a sua nuca, assim que toquei seu cabelo molhado uma luz de alerta se acendeu, foram apenas alguns segundos, mas eram o suficiente para arruinar ainda mais a situação.

— O que você acha que está fazendo? – Disse quase histérica.

— Desculpa, eu... – Darren tentou.

Sai correndo em direção ao carro, o caminho era irregular e a chuva atrapalhava a minha visão, acabei caindo em uma poça de lama, senti a minha calça ficar ainda mais encharcada, desisti de fugir, apenas chorei, as lágrimas quentes e salgadas se misturaram com a água fria da chuva. Estava tão cansada de tudo ser tão difícil.


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Notas finais do capítulo

- Sei que não foi um primeiro beijo romântico, mas convenhamos que esse não é um casal muito convencional.

Beijos.
S.W.