Mal preguei os olhos a noite toda, meus nervos estavam a flor da pele, imagens invadiam minha mente mostrando as diversas formas que o Darren poderia aprontar comigo. Estava ficando paranoica, ficar nessa casa acabaria me enlouquecendo. Adormeci sem perceber um pouco antes de amanhecer, fui vencida pelo cansaço. Sobrevivi a primeira noite sem ter o cabelo cortado ou a shampoo trocado por cola tudo.

Acordei no dia seguinte com a Bree pulando na minha cama. 
— Bree, eu quero dormir. - resmunguei.
— Nada disso, o papai só toma café quando todos estão na mesa. 
Abri os olhos aos poucos me acostumando com a claridade. Ainda Não estava processando informações, estava lenta.
— Todo mundo na mesa? 
— Siiiim, todo mundo. - Bree falou em câmera lenta. - E ele fica bem bravo quando alguém se atrasa. 
Era só o que faltava, ter que tomar café com a família real.
— Tudo bem, acordei, pode parar de pular em cima de mim.
Bree pulou para o chão e saiu correndo. 
Levantei da cama com muito esforço, o espelho na porta do closet refletia uma descabelada com cara inchada. Meu humor estava péssimo, eu não queria tomar café da manhã, eu queria dormir até o almoço. Nem me preocupei em trocar de roupa, desci com meu pijama de unicórnios rosa e chinelo. 
O café foi servido na sala de jantar, na mesa para doze, havia pães, ovos mexidos, bacon crocante, panquecas, um pote de vidro com cereais coloridos, duas jarras de suco, de laranja e de uva, outra jarra com leite, um bolo de aveia e uma cesta com frutas. Tudo parecia estar realmente muito bom.

Somente eu ainda usava pijama, os outros pareceram notar isso.

— Morrison, que cara horrível e belo pijama. – Darren tirou uma foto com seu celular.

— Meu Deus, ainda é de madrugada, estou de férias. – Reclamei.

Dei a volta na mesa e sentei do lado da minha mãe de frente para o Darren.

— Summer de agora em diante você vai tomar café da manhã junto com o resto da família. Espero que não se atrase de novo. - Jeremy avisou, seu tom de voz era autoritário. 
— Vou tentar. –Respondi desanimada.
Peguei algumas panquecas e enchi a boca. Foi como provar um pedaço do Paraíso, uma das vantagens de ser rico é ter alguém realmente muito bom na cozinha. Eu estava acostumada com cereais e suco de garrafa cheio de corante, comer algo feito na hora era uma evolução e tanto.

Quase parecíamos uma família tomando café da manhã juntos. Minha mãe e Jeremy ouviam com atenção como seria o dia de Bree no novo estúdio de balé, ela estava realmente orgulhosa por ter passado na seleção de alunos. Vi ela dançar no recital de Natal do ano passado, uma bailarina nata, um dia entraria para o Bolshoi. 
— Eu fiquei em segundo lugar, mesmo assim foi perfeito. - Bree disse animada.

—Se treinar mais na próxima ficará em primeiro. – Naquele momento não achei Jeremy não tão legal.

O sorriso de Bree morreu um pouquinho.
— Parabéns querida, para mim você é uma vencedora. - Minha mãe colocou sua mão sobre a de Bree.

Eu deveria ficar com ciúmes, mas Bree tinha perdido a mãe antes mesmo de aprender a falar, eu ficava feliz em ver a pequena bailarina sorrindo. 
— Kate. Você pode ir comprar um collant novo comigo?. - Bree pediu.
Minha mãe sorriu.
— Eu adoraria. 
— Fico feliz em ver que vocês estão se dando bem. - Jeremy passou a mão pelo cabelo de Bree e deu um beijo rápido na minha mãe. 
Darren revirou os olhos e bufou. 
— O que não me deixou feliz foi o diretor da academia Buckston ter ligado e dito que você, Darren, não compareceu em nenhuma atividade de férias nas quais você se inscreveu. Me diga onde você vai todos os dias se não é para a escola?

O clima ficou pesado, todos se calaram, Jeremy olhava de forma inquisitória para o filho. Darren mastigou com calma a maçã que estava em sua mão. A serenidade dele deixava Jeremy ainda mais irritado.
— São apenas atividades extras. Não vou ser reprovado por isso, e foi você quem quis que eu me inscrevesse.
— Você quase não tem créditos pra faculdade, qualquer atividade extra é bem vinda. - Jeremy aumentou seu tom de voz. 
— Talvez eu não queira ir para a faculdade.

— O que? – Jeremy explodiu.

Darren se levantou e saiu da mesa.
— Darren volte. Darren! – Jeremey passou a mão nervosamente pelo bem penteado cabelo loiro.

— Dê um tempo para ele. – Minha mãe ponderou e Jeremy se acalmou.

Eu não entendia o Darren, ele tinha tudo que um garoto de dezessete anos poderia querer, porém nunca estava satisfeito, nunca o vi sorrir sem ser por deboche, nada era o suficiente para ele. A presença dele deixava as coisas difíceis, nem mesmo a Bree gostava da companhia do irmão.

Jeremy deixou a mesa, a raiva exalava de cada poro dele, pelo jeito ir para faculdade era uma prioridade na família Ferris. Para mim e minha mãe seria uma dádiva eu ir para a faculdade, vivíamos bem com o salário da mamãe, entretanto a universidade parecia um luxo distante. Eu me esforçava por isso desde que entrei na escola, minha mãe guardava todo dinheiro que conseguia, minha professora de literatura disse que com as minhas notas talvez conseguisse uma bolsa, isso era bom, muito bom.

—Falando em escola... Bem, eu irei te transferir para Academia Buckston. – Minha mãe falou tão rápido que quase não entendi sua frase.

Parei meu garfo no meio do caminho e fiquei com a boca aberta olhando para minha mãe.

— Querida é uma ótima escola, é sua grande chance de ir pra faculdade e... – Mamãe se apressou em dizer. Ela continuou falando sem parar, levei alguns segundos para ligar os pontos, eu ainda devia estar dormindo, eu não queria acreditar que ela tinha dito que eu iria para outra escola.

— Academia Buckston? Que diabos está acontecendo Kate? – Bree arregalou os olhos quando eu disse diabos.

— Primeiro é mãe para você e segundo olha como fala. - Ela parecia brava. Ótimo, era o dia dos pais revoltados. - Eu e o Jeremy achamos que você precisa de uma escola melhor, a academia Buckston pode ser uma boa opção. Você é tão inteligente, se sairia muito bem.

— Eu estudo em uma boa escola, é a melhor escola pública do estado. – Argumentei.

— A academia Buckston é uma das melhores do país.

Finalmente me toquei o motivo daquele nome me incomodar tanto, Buckston era a escola do Darren.

— Eu não vou estudar na mesma escola que o Darren, nem pensar. Ele vai fazer da minha vida um inferno e você sabe disso. – Nós duas sabíamos disso.

— Vocês são de anos diferentes, vocês não vão estudar juntos. Não jogue fora uma grande oportunidade fora por orgulho bobo.

Cruzei os braços e me afundei na cadeira, infantil, eu sei.

— Você sequer pensou em perguntar se eu queria mudar de escola? – Ela estava sendo controladora como o Jeremy.

— Estou pensando no seu bem. Vamos Bree, eu vou te levar ao balé hoje.

As duas se levantaram da mesa e saíram. Tentei continuar comendo, depois da noticia da minha mãe as maravilhosas panquecas ficaram rançosas e sem graça, perdi a fome. Não era justo que minha vida fosse decidida sem que eu pudesse dar minha opinião, eu gostava da minha escola e dos amigos que eu tinha lá. Me senti traída. Eu conhecia pouco a academia Buckston, sabia apenas que eles deram um banho no nosso time de futebol americano no ano passado e que era uma escola de gente muito rica.

Voltei para o meu quarto a tempo de ouvir meu celular tocando, era o Eric. Fiquei surpresa, ele me mandava mensagens quase todos os dias desde que nos conhecemos, mas nunca ligou. Nós conversamos coisas banais e sem importância, e ficávamos sem assunto logo por causa da minha incapacidade de ser interessante.

Atendi o telefone antes que ele desligasse.

— Oi, Eric. – Cumprimentei animada demais, droga.

— Hey, você tem planos para hoje? – Ele perguntou.

Ele iria me convidar pra sair?

— Não, não tenho. – Tentei soar indiferente.

— Que tal viver uma ventura nesse belo dia ensolarado?

Saltei feito uma idiota sobre a minha cama, ele realmente estava me convidando pra sair, melhor ainda, viver uma aventura com ele. Recobrei minha calma e respondi.

— Eu adoraria.

— Que alivio Morrison, achei que você tinha me deixado falando sozinho. – Ele riu do outro lado da linha, não ri junto, Eric havia me chamado do mesmo modo que o Darren. – Me mande seu endereço por mensagem, te pego em uma hora.

— Claro. Até mais.

— Tchau.

Desliguei o telefone e me joguei na cama de novo, eu devia estar sonhando.