Somente à noite escrita por Ys Wanderer


Capítulo 25
Delicada como uma motosserra




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Outro dia eu ouvi alguém falar que ninguém é feliz, mas que somente está feliz, pois a felicidade é apenas uma circunstância passageira a qual alguns tem sorte de viver mais tempo do que outros. Bom, eu confesso que até concordo com essa besteira toda, mas isso não significa apenas que temos sorte por termos mais felicidade. O que eu acho que acontece é que alguns constroem a sua felicidade com mais esforço e por isso são recompensados pela vida. E não, eu não estou falando de bens materiais – pois isso é algo que sinceramente eu não considero importante –, mas sim de espírito, compreensão, amizade, amor e doação. E, se a minha felicidade dependesse de todos esses fatores eu estava destinada a viver no paraíso...

Quando alguma coisa não dá certo, eu faço dar certo só para mostrar que posso.

— Sonhando acordada de novo? — vovó falou e eu sorri, surpreendida por ter sido pega em devaneios. A observei em seu vestido lilás longo e ela estava linda como sempre, se preparando para sair para trabalhar. Havia o carro para pagar, a casa para terminar de quitar, o salário do pessoal, tantas dívidas, queda no movimento, a crise... Nós estávamos tão duras que eu nem sabia por onde começar, mas ela jamais tirava o sorriso do rosto e se deixava abater. Conchito e Jeferson eram ainda mais fortes, havia o preconceito, o abandono, a vida dura... E no meio de tudo isso “eu” que, apesar de tudo o que passavam, era sempre colocada em primeiro lugar por eles.

— Estava pensando em você — levantei-me do sofá e fui até ela, abraçando-a com muita intensidade. — Na verdade estava pensando em todos vocês e no quanto tenho sorte por tê-los na minha vida.

— Xiii, enlouqueceu de vez essa daí, só pode! — Conchito suspendeu a escova de cabelo no ar e interrompeu a “escovação” da peruca nova para ofender. — Sabe o que me disseram uma vez? Que quando alguém sem coração começa a ficar bonzinho das duas uma: ou quer alguma coisa ou está pressentindo que logo, logo vai morrer.

— Vira essa boca para lá, urubu depenado! — vovó ralhou. — Será que você não consegue perceber que isso tudo aí é resultado de muito amor?  Veja como a Anna está ficando delicada... — ela me beijou no rosto, deixando uma enorme marca de batom vermelho, enquanto eu mostrava o meu dedo do meio para ele.

— É... delicada como uma motosserra — ele bufou ante o meu gesto “carinhoso”. — Massss, eu meio que vou concordar com você — deu uma risadinha. — No fundo, bem lá no fundo, nas profundezas do meu subconsciente, na cratera mais escura e isolada do meu cérebro, nos confins dos últimos neurônios que sobreviveram as garrafas de tequila eu até que amo vocês. Não muito, mas o suficiente para não as esganar quando dá vontade.  

— Aí, gente, isso é tão lindo! —Jeferson desceu as escadas saltitando e me imprensou entre o corpo dele e o de vovó, que aproveitou para beijar toda a minha cara. — Eu finalmente tenho uma família!

— Não. vai. ter. mais. se. esmagar. um. dos. membros! — falei entre dentes porque a pressão do abraço havia me deixado sem ar. — Credo, me larga! — o empurrei e ele beliscou minha bochecha com força. Passei a mão no rosto para tirar as marcas de batom e só as fiz se espalharem mais, deixando minha cara toda grudenta. — Ah, quer saber, já até me arrependi de ter falado isso para vocês! Urgh! Se eu pudesse trocaria todos os três por um par de porquinhos-da-índia adestrados e um mico leão dourado!

— Tá vendo? Não tô dizendo? Essa é a Anna trevosa de sempre — Conchito riu e eu fiz uma careta. — Contudo, é melhor continuar assim — me jogou um beijo. — Menos risco de morrer num acidente.

Vovó e Jeferson riram e eu respirei fundo. Conchito então cortou o assunto para falar mal do vestido de vovó e logo eles começaram a brigar. Jeferson teve que empurrá-los porta afora antes que se atrasassem; eles brigaram mais um pouco quando Conchito disse que ia “dar fim” no latão já que tinham um carro novo; vovó quase arremessou o sapato nele, Jeferson ficou impaciente e berrou que todo mundo precisava transar...

E, se família tradicional não fosse isso, então eu não gostaria de passar nem perto.

*

 Ficar sozinha em casa fez eu me lembrar que havia quietude suficiente para que eu terminasse de ler o livro de história e me preparasse para a prova do dia seguinte. Porém, quando eu já estava entendendo a diferença entre as civilizações Grega e Romana, meu celular tocou e rompeu toda a minha concentração. O nome de Davi na tela me fez esquecer ainda mais das coisas, me deixando com aquele arzinho idiota de protagonista de novela mexicana, e eu me perguntei se havia alguma pílula anti-trouxisse para a gente tomar toda a vez que o namorado ligar, mesmo que a gente já esteja esperando a ligação.

— Por sua causa amanhã vou dizer que quem descobriu o Brasil foi Júlio César! Tipo, o Júlio César ex-goleiro do Brasil, não o imperador.

— O quê? — ele indagou sem entender nada.

— Eu estava quase aprendendo alguma coisa quando a sua ligação me interrompeu — fingi irritação. — Agora não me lembro de mais nada. Satisfeito?

— Hummm, bom saber que tenho esse efeito sobre você — ele disse com uma voz grossa, tipo “Jornal Nacional”, e eu comecei a gargalhar. — Hei, isso era para ter sido sensual e suficientemente “seduzente” — reclamou.

— Bom, sensualidade não é o nosso forte. Quer dizer, a não ser que você esteja “bebaço” como daquela vez e fique dançando a Macarena como já fez. Sério, acho que nunca vou esquecer isso.

 Recentemente eu havia contado para ele sobre a pimenta peruana e o que havia rolado na boate assim que a gente se conheceu e ele pagou de dançarino lascivo. Logicamente ele não havia acreditado, mas Conchito, Jeferson e vovó contaram tudo cada um à sua maneira – com direito a vídeos no celular que eu nem sabia que existiam – e nesse dia Davi quase infartou.

Bem feito.

— Poxa, você tinha que me lembrar desse mico, Anna — ele resmungou.

— Vou te atazanar pelo resto da sua vida e pensar sempre em todas as suas “reboladinhas”...

— É, né, fazer o quê. Esse é o preço que se paga por confiar em você.

— Ah, qual é, nem é tão caro assim — brinquei. — Mas, mudando de assunto, amanhã é seu aniversário. Como se sente? — perguntei e ele respirou fundo do outro lado da linha.

— Me sinto esquisito. É um ano a mais de vida que completo, assim como é um ano a menos de vida também. Aniversários são muito deprimentes, por isso eu os odeio.

— Já eu costumo pensar que aniversários são como os prazos de validade dos produtos. Tem gente que acabou de ser fabricada, tem gente ainda boa para o uso e tem gente que já venceu há muito tempo — falei e Davi riu. Foi bom ouvi-lo rir. — Conheço uma velhinha que pelo cheiro a gente sabe o ano que morreu, mesmo que ela insista em sair andando por aí — continuei a piada.

— Sabe, Anna, você é o melhor remédio para qualquer tristeza — ele falou, sua voz risonha me deixando envaidecida. — Por isso sempre valerá a pena cruzar a cidade somente para te ver.

— Até parece, você só está vindo porque te emprestei meus livros e se você não devolvê-los no prazo vai ficar sem os dentes. Mas é bom mesmo que ande bastante, assim não corro o risco de ter um namorado sedentário. Mas e aí, falta muito?

— Quase lá — ele respondeu e nos despedimos. Desci para esperá-lo no portão e minutos depois o avistei. Além da mochila, ele carregava uma caixa de tamanho médio e eu tratei logo de tentar adivinhar o que havia dentro.

— O que é isso? — perguntei eufórica assim que ele chegou. — É alguma coisa de comer? Espero que sejam coxinhas...

— Oi? E aí? Como vai? Tudo bem? — Davi imitou a minha voz. — Está cansado? Quer um copo com água? Alguma coisa? — ele fez caso da minha falta de educação. — Lição número um de boas maneiras: é assim que se fala quando alguém chega na sua casa.

— Lição número um: deixa de frescura — eu me precipitei logo sobre a caixa, mas ele não me deixou tocá-la, protegendo-a com o corpo. Segurei a onda e o convidei para entrar praticamente o empurrando casa adentro.

— Poxa, Anna, não estrague a magia das coisas — ele falou compenetrado assim que entramos na sala da minha casa. — Isso aqui é um presente para você.

— Um presente? Mas por quê? Nem é meu aniversário. Aliás, eu é que te devo te dar alguma coisa.

— Não tem nada a ver com aniversários ou coisas do tipo. Mas tem a ver com algo importante.

— Tipo?

— Sabia que hoje é um dia muito especial?

Dia especial? — repeti a pergunta em minha cabeça. Forcei a memória de todas as maneiras, mas não consegui pensar em nada. Do que será que ele estava falando?

— É... mesmo? — franzi o cenho. — Hoje é dia do índio? Do livro? Da abdução nacional? Ah, já sei, é a celebração nacional dos padres e freiras do sagrado coração do criador pai eterno, acertei?

— Não, Anna — Davi sorriu, pacientemente, e pensei ter visto sua expressão ficar envergonhada. — É que hoje... — ele parou.

— Hoje?... — encorajei.

Dois segundos de silêncio.

— Hoje? ... — continuei.

Três segundos de silêncio.

— Davi!?... — comecei a ficar impaciente.

— É que hoje faz três meses desde aquele dia... aquele dia em... aquele dia em que eu comprei você no leilão.

A cena toda era muito bonitinha, com Davi todo envergonhado me estendendo a caixa. Mas como as palavras que ele disse não foram nada românticas, embora ele estivesse tentando ser, acabei rindo. Bem alto. Ele então me olhou meio magoado, meio confuso, e por isso o abracei bem forte.

— Me desculpe, mas comprar alguém em um leilão ainda é ilegal em nosso posso país — continuei a rir e ele revirou os olhos, chateado. — Mas eu entendi o que você quis dizer — o beijei e ele enfim sorriu. Retirei a caixa que estava sendo amassada entre nós e a coloquei no chão, e com isso eu pude “agarrá-lo” melhor.

Davi era realmente um espécime raro de garoto, pois provavelmente em outro universo seria eu quem deveria guardar a data do primeiro beijo e coisas do tipo. E eu ficava cada dia mais feliz com o desenrolar do nosso relacionamento porque parecia que o que faltava em mim havia de sobra nele, e o que faltava nele havia de sobra em mim.  Geralmente pensar em duas metades de uma laranja é algo cafona, sei disso, mas eu comecei a achar que eu e ele já havíamos alcançado esse patamar.

Nos completávamos.

E isso era cafonamente demais.

A “magia” – ou o calor – do momento foi quebrada quando a caixa começou a se mexer e de dentro dela saiu um barulho esquisito como o choro de uma criança pequena. Davi então largou a mochila no sofá, carregou a caixa, colocando-a a cima da mesinha de centro, e enfim tive permissão para abri-la.

— Não tem nenhum bebê aqui dentro, não é? — perguntei.

— Não, mas quase — Davi me auxiliou a abrir a caixa e de dentro dela saiu uma coisa preta.

— Um gato! — exclamei pondo o bicho no colo e ele miou alto, reclamando. Analisei-o melhor e vi que seus olhos eram amarelos, a cara dele parecendo desdenhar de tudo e de todos. O bicho não era bonito, na verdade era bem feio até, mas o lacinho no pescoço e o cheiro indicavam que ele havia sido levado a algum pet shop.

— Um gato não, uma gata — Davi esclareceu quando me viu virar o bichano de cabeça para baixo para conferir. — É uma menina. Ela foi abandonada perto da minha casa e achei que ela iria gostar de viver com vocês aqui — sorriu com orgulho. — Que nome você vai dar para ela?

A gata espichou a cabeça, desdenhosa, e pareceu lamentar a nova dona e a nova vida. Acho que se ela fosse humana provavelmente seria representada por uma daquelas peruas que ficam com cara de nojo enquanto serram as unhas. Então, olhei bem para ela e achei um nome perfeito.

— Vai se chamar Funerária — a ergui como fizeram com o Simbad no filme “O rei leão”. — Tá aí, é um belo nome.

— O quê!? — Davi berrou. — Você vai chamar de Funerária a gata que te dei de presente com todo o romantismo?

— Sim, não é legal? E a gente começou a namorar para valer mesmo dentro de um cemitério, então acho que combina. Qual é, ela gostou — falei e a gata bocejou sem ligar para nada. — Tá aí, seja bem vinda ao seu novo lar, Funerária!

— Fala sério... — ele suspirou, cansado.

— O que você esperava, Davi? De Princesa é que eu não ia chamá-la!

 — É impossível discutir com você. Fico só imaginando os nomes que você vai colocar nos nossos filhos — Davi resmungou e então parou. — Quer dizer, tipo, ter filhos não dá. Temos que tomar cuidado. Mas antes a gente teria que primeiro... Não, pera. Não que eu queira, bem... tipo... ai, meu Deus, não que eu tenha pensado nisso...

— Tá bom, cala a boca, eu já entendi — ri alto e ele meteu ambas as mãos nos bolsos do casaco, procurando um buraco negro para enfiar a cara e todo o resto. — Mas, como não vai ser hoje que você vai se dar bem — falei e ele ficou vermelho de vergonha —, é melhor você vir comigo.

— Para onde?

— Eu também quero te dar uma coisa...

— Que coisa? — senti uma nota de sarcasmo.

— Davi, seu tarado, deixa de pensar besteira que não é nada disso que você está imaginando — dei um tapa com força na cabeça dele e ele resmungou. — Espera um segundo.

Levei a funerária para o meu quarto e quando ela percebeu que eu ia deixá-la sozinha começou a berrar, só se acalmando depois que a coloquei em cima da minha cama junto com uma meia velha. Ela deu uma cheirada, fez cara de desgosto, mas por fim se conformou e ficou brincando com ela. Então fechei a porta, não sem antes pegar o embrulhinho que eu tinha ido buscar, e levei Davi até o lado de fora, onde nos sentamos na grama.

— Ah, obrigada pelo presente — encostei a cabeça no ombro dele. — Agora toda vez que eu olhar para ela vou ter que me lembrar de você.

— Era essa a intenção — ele fez carinho no meu braço. Aquele arrepio costumeiro que eu sentia sempre que ele me tocava me fez morder os lábios.

— Espero então que ela seja silenciosa — falei. — E que durma o dia todo.

— Que nada, essa aí mia pra valer, então... — rimos juntos e eu fiz um barulho de desaprovação. — Pois é... — senti que ele foi ficando tenso. — Amanhã a essa hora você provavelmente já vai estar na minha casa. Espero que seja legal. E que a minha mãe goste de você assim como eu.

— E se ela não gostar? — perguntei olhando bem dentro dos seus olhos.

— Acho que ela vai ter que se acostumar.

— Quer saber, estou com a sensação de que vai ser um completo desastre.

— Não se preocupe, ela não vai dizer nenhuma grosseria para você.

— Eu não estou preocupada com a probabilidade dela me dizer alguma grosseria, mas sim com o fato de as minhas respostas para as grosserias não serem as mais bonitas de alguém ouvir.

— Quer saber — ele pegou na minha mão. — Tá aí uma coisa que seria legal ver. Nunca encontrei alguém que pudesse desarmar a dona Sandra. Nem o meu pai faz isso.

— Você deve estar se divertindo com tudo isso, não é?

— Claro que não. Quer dizer, só um pouquinho.

Apenas balancei a cabeça e revirei os olhos, mas não resisti e comecei a imaginar como seria se rolasse alguma confusão. Mas, como Davi estava envolvido no todo e ele era a parte mais fraca da corda, prometi a mim mesma que seguraria a minha língua.

Mas não muito.

Delicada como uma motosserra...

— Então... — mudei logo de assunto. — Eu iria dar o seu presente só amanhã, mas como você veio até aqui achei que seria melhor agora, já que estamos a sós — tirei o embrulho do bolso e coloquei nas mãos dele. — Feliz aniversário adiantado.

Embora estivesse curioso, Davi fez mistério e ficou sacudindo o embrulho, tentando adivinhar. Como não conseguiu, ele enfim abriu e logo se surpreendeu quando viu o que havia dentro. Era uma corrente masculina com um pingente em formato de sol.

— Nossa... é muito bonito. E muito engraçado também — ele riu e fiquei feliz por ele ter gostado. — É o tipo de coisa que eu jamais esperava que alguém fosse me dar.

— Pois é, achei que seria legal você ter o seu próprio sol já que o de verdade não vai muito com a sua cara — eu tirei a corrente das suas mãos e a coloquei delicadamente em volta do seu pescoço. — Olha, Davi, eu não sabia como você reagiria a isso, mas eu queria te mostrar que a gente deve sempre rir das coisas ruins, fazer piada com elas, entende? E também eu fiquei pensando que não haveria nada que eu pudesse comprar para você, já que você tem tudo, então procurei algo que fizesse você se lembrar de mim. De nós.

Davi ficou olhando para o pingente e sorriu, um sorriso puro e cheio de sinceridade. Ele então me abraçou, me apertando tanto que eu podia sentir tudo o que ele sentia.

— Obrigado — sussurrou no meu ouvido. — Esse é o melhor presente que eu já ganhei em toda a minha vida. E você tem razão quando disse que não haveria nada que pudesse comprar para mim, pois o que eu preciso não tem preço e está bem na minha frente. Você é o meu sol, Anna, e eu não preciso de mais nada nesse mundo desde que eu tenha você.

Ouvir tudo aquilo foi a melhor coisa do mundo, pois fez eu me sentir parte de um mundo vivo. Era bom sentir todo aquele carinho, é bom ter alguém que não julgue o outro e o entenda. E embora eu não fizesse a mínima ideia de como seria o nosso futuro, o presente já era suficientemente bom para nós.

E valeria por toda uma eternidade.

— Sabia que eu dei o meu primeiro beijo aqui nesse jardim? — eu falei e logo comecei a rir. Davi me olhou feio, puto comigo por ter acabado com nosso momento, mas logo viu que era mais uma daquelas minhas bobagens que eu sempre falava quando os momentos ficavam tensos, constrangedores ou melosos demais.

— Sério isso? — Davi se ajeitou na grama.

— Sério. Eu tinha uns doze anos, acho.

— E como era o nome dele? — perguntou, entrando na brincadeira.

— Ruan Robervaldo. Mas todo mundo chamava ele de só Robinho.

— Sabe, eu até estava disposto a ficar com raiva dele por causa disso, mas acho que esse nome já é castigo mais do que suficiente.

— Nossa, como você é mau. Coitado do garoto.

— Coitado nada, ele beijou você.

— Beijou, mas não foi legal, já que ele usava aparelho e tinha gosto de brócolis — narrei e fiz uma careta ao lembrar de como havia sido horrível.

— Pois é, mas é uma pena que você jamais vá esquecê-lo, pois o primeiro beijo a gente nunca esquece... — por uns segundos Davi saiu do ar e ficou com uma cara satisfeita, provavelmente lembrando de algo bom. Torci para que esse algo bom fosse nós.

— Então não seja por isso — olhei bem dentro dos seus olhos. — Davi, apague essa lembrança e faça dela sua. Para sempre. Eu gostaria de dar o meu primeiro beijo para você.

Ele me fitou por uns instantes, provavelmente ponderando as coisas. Eu nunca havia sido muito romântica com ele e isso era o mais perto que eu poderia chegar de ser, mesmo que a ideia fosse um pouco idiota. Mas, o que importa é que ele riu e entrou no jogo.

— É como é que eu faço isso? — ele perguntou.

— Simples. É só me beijar como se fosse a primeira vez...

Foi muito engraçado, pois apesar de ser apenas uma brincadeira eu senti que Davi ficara realmente nervoso, assim como eu. Ele se aproximou lentamente, me olhando nos olhos e então acariciou de leve a minha bochecha. Sua respiração ficou acelerada e ele encostou os lábios levemente nos meus, sem fazer nenhuma pressão, apenas para mostrar sutilmente que estava ali.

Que estava ali.

Comigo desejando que fosse para sempre.

E depois disso todo o resto se apagou.





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