Garota Desastre escrita por Principessa V


Capítulo 5
Eu sei lidar com deficientes


Notas iniciais do capítulo

Ragazzas da minha vida, aí está o capítulo :3



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Nathan riu e Fábio virou o rosto envergonhado, lembrei que estava sem blusa, mas me recusei a ficar envergonhada na frente deles, então só caminhei até perto da minha mãe. Eu não lembrava a última vez que tinha olhado de verdade para Fábio, mas agora ele tinha o cabelo raspado. Pelo pouco que eu sabia ele tinha se separado da esposa, a loira, fazia uns dois anos.

E Nathan, bom... Dá ultima vez que me lembro de ter visto ele foi quando eu e os meninos estávamos voltando de uma sorveteria, então Nathan estava abraçando minha mãe, que tinha uma cara triste. Logo me animei, achei que a loira tinha morrido, mas era algo quase tão bom quanto: Nathan estava se mudando com ela para a Austrália. Ele, na época, era um garoto magrela, pouco maior que eu e esquisito, sabe? Daquele tipo educado, “bom dia”, “deixa que eu abro a porta pra você”, isso não existe mais. Ele sempre foi estranho.

— Filha, até que enfim chegou, Nathan estava contando pra gente que vocês se falaram na escola hoje, ele não está lindo? — Às vezes eu acho que o cérebro da minha mãe pifou em algum momento dos dramas que ela sofreu, é claro que não é pra menos.

— Para de usar drogas, mãe. — Todos riram e eu fiquei sem entender, não era uma piada. — Pois é, eu vi ele. — Mamãe sorriu.

— Me respeita, menina. — Mas ela sorriu. — Acho melhor você colocar uma blusa por que a gente vai sair pra almoçar. — Maya falou calmamente, naquele tom de voz que dizia “se você discutir comigo, nada de dança hoje”, enfim, tive de ir, subi as escadas batendo o pé e escutei a risada de Nathan. Ah, eu ainda esmurro esse garoto.

Sorri ao chegar no meu quarto, tirei a roupa, peguei uma toalha e fui tomar banho, o banheiro ficava do lado do meu quarto. Tentei ser rápida, o que não surtiu muitos efeitos, já que ficar embaixo da água ia me drogando devagar, não me pergunte por que. Saí e vesti uma regata verde e uma saia longa indiana. Desci as escadas fazendo uma trança no cabelo, com a minha mais agradável cara de quem queria morrer.

Nathan ficou me encarando um tempo, enquanto eu fazia minha trança – cabelo longo demais é ruim por isso, demora muito tempo pra fazer qualquer coisa com ele – e nossos respectivos pais se preparavam para sair, eu virei o rosto e fiquei encarando meus dedos trançando meu cabelo.

— Vamos crianças, acho que todo mundo está com fome aqui. — Fábio falou e eu revirei os olhos. — Estou com tanta fome que minha barriga nem está mais fazendo barulho.

— Como assim não está fazendo barulho? — Falei confusa e franzi o cenho.

— É que som não se propaga no vácuo. — Nathan e minha mãe começaram a rir, eu dei uma risadinha, mas consegui me controlar, não podia rir assim pro inimigo. Fábio era professor de física. — Vamos, vamos, vamos logo. — Ele falou, empurrando nós três porta afora.

Fui correndo e entrei primeiro no carro – dele, é claro, eu e minha mãe não tínhamos nem condições e nem habilidades para ter um carro. Minha mãe foi no banco do passageiro e Nathan se sentou do meu lado. Minha mãe e Fábio iam conversando na frente e eu olhava o infinito... Ou o caminho até o restaurante se você preferir.

— Então você decidiu estudar na mesma escola que eu? — Nathan perguntou e eu me virei para encara-lo, com uma sobrancelha erguida.

— Primeiramente, “eu decidi” não é a forma exata de colocar isso, “fui coagida” está mais de acordo com a realidade. Segundo, você é o novato na escola, eu não. — Ergui o segundo dedo e deu um sorrisinho mal-humorado.

— Eu sou como o filho pródigo, sabe... O bom filho a casa torna e tal. Estou apenas voltando. — Nathan riu, mas pelo menos se calou até chegarmos ao restaurante.

Mas que bosta, era o restaurante que os meninos sempre me levavam. Revirei os olhos. Azar? Azar. A culpa é do Fábio.

Lembro a primeira vez que Rafael me trouxe aqui. Eu estava com um vestido étnico e as pessoas pensavam que eu era namorada dele, Rafael só ria e passava o braço por mim, pra depois dizer que eu era a melhor amiga dele e que, se mexessem comigo, iriam apanhar. Foi um pouco antes de o meu pai morrer, eu ainda era uma menina pequena e fofa. Então ele me apresentou para o resto do pessoal. Foi um dia legal.

Todo mundo desceu do carro e eu continuei lá dentro, na esperança de que me esquecessem e eu pudesse secar por que gente, alguém liga pro Bola de Fogo, que o calor tá de matar. Fui pessimamente mal sucedida quando mamãe bateu na minha janela, desci a contragosto e Fábio trancou o carro. Eles entraram e eu fiquei parada na frente do restaurante. O carro dos meninos estava ali. Escutei a porta abrir, mas era só Nathan.

— Não vai entrar? — Ele perguntou, rindo. Qualquer dia desses eu ia cortar a boca dele até ele ficar que nem o coringa, aí nem se quisesse ele ia conseguir parar de rir. Sorri com esse pensamento e passei por ele, entrando direto.

Mas parei ao ver os meninos ali, eles não tinham me visto, ainda. Eu não ia naquele lugar desde que parei de falar com eles. Senti alguém parar do meu lado, era Nathan. Foi aí que eu tive uma ideia, sorri tanto que os cantos da minha boca só faltaram se grudar atrás da cabeça. Agarrei o braço de Nathan e ele estreitou os olhos, mas sorriu. Procurei nossos pais, que estavam do outro lado do restaurante. Se eu conseguisse abrir meu sorriso mais eu teria aberto. Eu e Nathan começamos a andar.

Vou te dizer uma coisa, mesmo depois que os meninos pararam de falar comigo, eles ainda “me protegiam”. O que significa que eles ficavam de olho pra ver se eu não ia me ferrar, ou pior, ferrar alguém. Fiquei sabendo que um garoto que ficou uma vez comigo, ficou tão amedrontado com uma conversinha que os meninos tiveram com ele, que nem quis mais me ver. Se eles me vissem com o Nathan e se ainda se importassem, talvez o filho do coringa parasse de me encher depois de uma conversinha também. Eu não sou brilhante?

Quando estávamos no meio do caminho eu senti olhares sobre mim. Virei o rosto e reparei que os meninos já tinham me visto. Sorri e até acenei pra eles, tinha certeza que meu rosto mostrava a felicidade que eu sentia, dois coelhos com uma... Eu nunca sabia falar a segunda parte, é o que afinal? Cajadada? Caixa d’água? Cacetada? Camarada? Balalaika? Mas enfim, vocês me entenderam.

Fui sentar e o almoço transcorreu em paz, ficava feliz cada vez que Nathan se mexia, desconfortável, sentindo os olhares de ódio lançados contra ele. Eu via os meninos olhando... Estava me sentindo bem.

Logo quando ia repetir pela quarta vez, e seria a última – tem que dar espaço pras sobremesas, obviamente –, escutei algo que me fez engasgar de tanto rir.

— Então, Nathan, arrumou alguma namoradinha na Austrália? — Mām̐ perguntou. Um pedaço de carne voltou de-sabe-se-lá-onde e caiu na mesa, tomei um suco pra tentar me acalmar.

O Nathan? O NaTan-tan? O garoto esquisito? Olhei pra ele... Ok, talvez nem tão esquisito assim agora. Lembro de quando ele se aproximava e minha barriga começava a dançar lambada, pra vomitar, obviamente. O menino ficou vermelho que nem roupa de papai noel.

Mām̐, que pergunta! — Minha mãe olhou e franziu o cenho. — Que garota ia querer ele? — Sorri compassiva, tentando ajudar a situação. Nathan riu e balançou a cabeça, o riso dele me irritava profundamente.

— Tive um casinho ou outro, mas minha cabeça só tinha lugar pra uma garota, sempre teve só uma, tia. — Ele sorriu, sonhador e eu voltei a comer, não com tanta fome quanto antes.

Estávamos saindo do restaurante, os meninos ainda estavam ali, e lançaram olhares terríveis para Nathan, eu apenas ri. Quando íamos chegando no carro, um cara estacionou na vaga para deficientes, novidade: ele não era deficiente.

— Ei, cara, essa vaga é pra deficientes. — Gritei, mas tentei ser educada.

— Garota, isso é besteira. — O homem gritou de volta, já saindo do carro.

— Ah, pera, você é deficiente, não é? — Percebi tarde demais, me aproximei dele, que fez uma cara de espanto.

— Como é que é? — Ele parecia surpreso, não sei por que.

— Sim, sim, como não percebi logo? Você sofre da “síndrome do idiota”, me desculpe. — Eu o abracei. — Dizem que essa não tem cura.

Ele ficou roxo e começou a berrar. — E sabe o que você é? Você é uma...

— Oi, desculpe, ela comeu muito e está sofrendo alucinações, desculpe senhor... — Nathan me puxou e me colocou dentro do carro.

— Você está louca, Nayana? O mundo está perigoso, não pode ofender as pessoas assim. — Minha mãe falou, séria.

Fábio começou a falar. — É, tem que tomar muito cuidado...

— Pra não morrer que nem meu pai? Não se preocupe, eu não seria tão estúpida. — Todo mundo se calou no carro e eu senti o clima pesar, minha mãe ficou triste e eu revirei os olhos pra mim mesma por fazer aquilo, tentei reverter. — Mas Nathan, poxa...

— O que foi? — Ele respondeu, pela primeira vez sem rir.

— Agora não vou saber o que o cara ia dizer que eu sou. — Ouvi algumas risadinhas e o clima melhorou. Dhaniwaad(obrigada).

***

Acabei de me arrumar e olhei minha imagem no espelho. Saia preta e longa, top prateado, cabelo devidamente trançado e decorado, pintura corporal pronta. Eu estava linda. Segundas eram apresentações da minha mãe, as minhas eram as sextas ou sábados. Minha mãe estava linda, sua roupa era azul, diferente da minha e da das outras meninas e o cabelo longo e castanho dela estava solto. Minha mãe era bonita demais para se uma mãe.

Afastei levemente os panos que nos separavam da plateia, as segundas, terças e quartas, a entrada era livre. Minha mãe preferia dançar pra quem não tinha como pagar, por isso ela que ia dançar. Eu não era tão legal assim. Tinha muita gente, estava lotado, admito que era bonito de ver o salão cheio. Uma menina, que era nova nas apresentações, no caso, era uma aluna da minha mãe promovida – por que sim, todas que dançavam ali eram alunas de mamãe – arregalou os olhos ao ver quantas pessoas tinham ali.

— Meu deus, olha essas pessoas. — Ela gemeu, acho que o nome dela era Carla.

— Você achava que iam se apresentar pra meia dúzia de doendes? — Falei pra ela e saí dali, era responsabilidade da minha mãe acalmar as alunas dela.

Cinco minutos depois, todas nós prontas, lindas e arrumadas, a dança começou, com minha mãe indo na frente. E então eu me senti instantaneamente bem. Parecia que nada no mundo poderia atrapalhar minha vida. Eu amo dançar, de verdade, com todo meu coração. Escutei a música animada começar e eu só conseguia dançar.

Mal percebi quando a plateia se levantou e começou a dançar junto com a gente, mal notei olhares em mim, ou os de admiração na minha mãe. Eu só queria dançar e esquecer.


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Notas finais do capítulo

Essa é a dança do capítulo pra quem não viu lá em cima: https://www.youtube.com/watch?v=tRAPPUEFa4k

Ragazzas, me digam, me digam, o que acharam? Tentei ser rápida dessa vez, me desculpem qualquer erro. Tia V ama vocês.
Ah, comentem, por favor, juro que o dedo de vocês não vai cair!



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