Preces de Braun escrita por hwon keith


Capítulo 7
Apostando péssimas ocorrências




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Exausto. Cada partícula ínfima do meu corpo contraía-se em desgosto, visando minha incapacidade momentânea de tirar um cochilo.

Se eu soubesse que a vida de caçador era tão cansativa, teria arranjado um trampo qualquer com Cleitin.

Corri meus olhos por esse último. Parecia extremamente de bom humor, rindo leve de poucos em poucos minutos, algumas vezes explodindo numa risada alta. Realmente a morte do bando rival de demônios deu um belíssimo up na sua autoestima. Se no lugar deles fosse o principal outro grupo de lobisomens, ah, Clei estaria em êxtase. Mas não se pode ter tudo.

Eu jazia sentado meio dolorido numa cadeira de madeira dura. Cleitin conversava com seus colegas na minha frente em alto bom tom, de modo que eu tentava em vão anular aqueles guinchos que pareciam vir da conversa. Havia um lobisomem do qual sua voz era particularmente insuportável. Sempre escondi o desejo de recomendá-lo a um fonoaudiólogo, mas sustaria sua ira e eu queria me privar de mais problemas desnecessários. Já estava cheio deles (leem-se Noka e companhia).

Embora distraído com espetáculo belíssimo de bate papo, fui o primeiro a perceber alguém aproximando-se daquela mesa de xadrez ou damas que velhos usam nos finais de semana, onde agora estávamos postos, no meio do parque. Inconscientemente semicerrei os olhos. Talvez estivesse na hora de trocar o grau dos meus óculos.

Cleitin virou-se logo para o estranho. Ainda sustentava na boca um sorriso surpreso, avaliando a face que provavelmente para nós todos era desconhecida. Cumprimentou-o com um aperto de mão. Era desnecessariamente cortês. Entretanto, o desconhecido pareceu apreciar. Encarei-o mais. Se eu possuí-se um aparelho que reagisse a caras que possivelmente atrairiam o péssimo gosto da família Braun, certamente ele estaria demonstrando funcionamento.

Todavia, sorri entretido com a desgraça que parecia eminente, assim que o homem, agora intitulado Dong (inesperadamente apropriado para o cargo), apresentou-se como policial.

Noka teria muitos mais problemas do que eu. Muito obrigado.

No quarto degrau da escada, a desconfiança pintando um quadro excepcionalmente nítido em sua mente, tendo recebido pinceladas fortes ao escutar o grito fino vindo do andar de cima, Noka sentiu o Poder avisando-a de que estava longe a existência da paz momentânea que sentira naquela tarde estranha e nublada tarde.

Conectou-se com o irmão por uma linha fina e invisível, apenas sentida. Recebeu a percepção. Estacou na escada, os dedos firmando-se no corrimão. Medo escorreu para toda sua espinha, uma poça gélida.

Não soube como chegara no quarto, apenas entrou nesse. Caído no chão sujo de uma gosma suspeitosamente carmesim encontrava-se Nick, os olhos abertos e inundados de pavor, gritando para a garota uma súplica por salvação. Cada milímetro do rosto magro residia esbranquiçado, tal como as veias por de baixo tendo ausentado sua existência.

Contornou o cômodo bagunçado e percebeu o homem de pé, as mãos nos bolsos da calça preta fina, um sorriso contemplativo nos lábios cheios e certo brilho nos olhos avermelhados. Piscou para Noka. Essa agora prestou atenção no livro que lhe pertencia largado entre linhas grossas de um feitiço que jamais ensinara o irmão a realizar.

Como reação espontânea à catástrofe que sabia que o irmão desconhecia no seu teor necessário, captou a faca esquecida no chão, já manchada de vermelho, e puxou o cabo com a lâmina rapidamente cortando a pele clara do pulso, verticalmente. Sangue explodiu da veia superficial, escorrendo com rapidez nauseante contra o chão sujo.

Agachou-se no círculo demoníaco e espalmou a mão molhada, os dedos tocando a madeira num giro anti-horário.

– Banindo – tal palavra saiu num arquejo doloroso.

As linhas escuras brilharam ao receber o pagamento. Uma luz levemente inclinada para o cinza escureceu no ar, subindo do círculo como fumaça. Entretanto, o feitiço esmaeceu e apagou-se com facilidade.

– Esperto – pronunciou-se primeiramente o homem invocado, sinceramente tocado. Noka encarou-o, o horror da sabedoria do que acontecera ali preenchendo-a – Mas era pra uma bruxa ter sentido que não sou um demônio simples.

Soltando um curto som de desprezo, voltou-se para o loiro, esse último ainda contra o piso.

– Mas bem melhor que aquele acéfalo – sorriu, cada simples linha e músculo mexidas no gesto demonstrando perigo.

O xingamento morreu na mente de Nick como se nunca houvesse existido. Tragado no susto ainda real que sentira, aumentado consideravelmente ao visualizar a faceta aterrorizada da irmã que jamais havia conhecido, seus lábios finos e banidos de cor formaram uma indagação que o homem de algum modo captou.

– Eu? – riu levemente, embora o som não houvesse alegria nem interesse – Eu sou o diabo.

E dentro de cada milímetro do rosto masculino, nos lábios cheios e puxados num sorriso carregado de cólera, nos olhos que lembravam remotamente um vidro afiado, no cabelo escuro meticulosamente arrumado por pontas negras, não havia algum sinal de dúvida ao pronunciar aquilo.

Num clique metafórico a consciência de Nick Braun apagou-se, assim como iniciou o crescer de estalos facilmente reconhecidos por chamas.

Incendiando-se consideravelmente, a casa dos Braun envolveu-se na fumaça escura que subia em direção ao céu azul, contrastando em desgraça para a límpida beleza acima.

Arrastando o irmão no concreto quente, Noka expirava dificultosamente, a traqueia dominada por fuligem e os outros membros do sistema respiratório contraindo-se em desagrado.

Encarou Jamie que lhe observava atenta. A mulher havia juntado ao grupo da depressão há pouco, atraída pelo cortejo de dor alheia que demônios facilmente captavam. Fechou lentamente os olhos para a amiga, mandando-lhe a mensagem que com ela estava tudo nos conformes. Indicou com um movimento da cabeça Nick, o qual permanecia desacordado pelo que pareciam horas, embora houvessem saído da mansão há consideráveis pouquíssimos minutos.

O homem misterioso que auto intitulara-se Diabo desvaneceu entre as colunas escurecidas da fumaça antes que Noka tivesse tido a chance de contestar sua afirmação.

Porque era ridiculamente improvável que a bosta do Satan em pessoa fosse invocado por um bruxo descuidado qualquer. Perdão a Nick.

Entrementes, a visão plana da situação consistia-se em a mulher de cabelos rosados cuidando do irmão e de si própria, enquanto Jamie ocupava-se em ligar para os bombeiros e fingir qualquer bosta de desculpa para o súbito e inesperado fogo.

Porém, antes que terminasse o discurso falsamente choroso, captou nas ondas sonoras de algo próximo o farfalhar de folhas mortas pisadas e o poder facilmente reconhecível de outro demônio espreitando.

Com alguma surpresa, lembrou-se do mesmo poder em outra data. Conseguindo puxar de volta da maré de lembranças confusas (algo que sua amada melhor amiga jamais conseguiria fazer), soube de onde conhecia-o.

Do dia que Satoru surgira, onde a demônio havia corrido e enfiado as garras no tórax alheio.

Prestes a repetir o ato com a máxima empolgação possível, ateu-se na cena que desenrolava-se ali e agora, onde sua melhor amiga caía com um baque surdo em direção ao chão, exausta. Socorrendo-a, deixou deslizar a captura do outro da mesma espécie e ignorou o senso de perigo.

Amigos primeiro, membros suspeitos do submundo após.

Sentiu-o desaparecendo, mas sinceramente não ligou. Algo dentro de si dizia que não havia o que temer.

Jamais desejou estar tão certa. E também quis parar de repetir tantas vezes mentalmente o verbo “captar”.

– Certo, diabo.

– Exato.

Gabriel soltou um risinho debochado. Noka rolou os olhos, sua exasperação nítida.

– Tu realmente acha que demônios ficam andando e matando por aí de boa, sem um chefe, meu amado amigo Gah? – Noka acomodou-se melhor no sofá, virando o rosto incrédula para o amigo que agora ocupava-se em manter um sorriso especialmente irritante na face – Não seja ingênuo, meu amore.

O homem permaneceu sorrindo, inclinando uma positiva. Momentos após retomou a fala, alternando o caminho da conversa.

– Tudo bem, fingiremos que ele existe – desconsiderou o tédio crescente nos olhos da outra vinda daquela afirmação – Por que diabos – parou e riu na coincidência. Soube que Noka desejava agora esganá-lo – Desculpe. Por que diabos satan apareceria em pessoa pra bruxos que nem vocês?

Percebendo o menosprezo, a bruxa chutou-o no calcanhar, vendo-o afastar a perna.

– Como se tu fosse grande bosta – desprezou-o, realmente contrariada. Afundou no pano macio do sofá cinza da casa de Jamie.

Encerrando o papo porque ouvira o chiado das cordas vocais ainda delicadas da aspiração de gás carbônico de outrora, Gabriel calou-se. Catou o controle remoto de algum lugar inimaginável do universo do qual Noka não tinha nenhuma vontade de descobrir, apertando as teclas e procurando um canal que lhe interessasse.

Naquele momento, Nick adentrou no cômodo com uma calculada expressão enojada.

– Acabou a transa sentimental de vocês?

Não recebeu resposta, apenas um silêncio entediado. Suspirando num contragosto claro, caminhou lentamente até a cozinha extremamente limpa. Jamie era aficionada por limpeza e considerando que desde criança fora praticamente obrigada a limpar a casa todo santo final de semana, não era surpreendente.

Agora tendo a melhor amiga e o irmão encosto dela como morados provisórios na residência, Nick não pode deixar de relevar a irritação leve que sustentava por todos os olhares feios e xingamentos furiosos que recebia da demônio, estes gerados simplesmente por deixar uma mínima marquinha de lama no chão perfeitamente encerado.

Puta merda, eram só 3cm de sujeira, não um homicídio.

Todavia, algum dia retribuiria no consideravelmente aumento da catsaridafobia da moça – largando um punhado de baratas na casa, vingança belíssima. Mas enquanto permanecia de favor naquela casa, pois visualmente não poderia voltar para o conforto de suas poções e cristais enquanto houvesse resquícios de policiais investigando a fonte do incêndio aleatório, manteria para si suas malvadas aspirações.

E todo aquele desconforto porque se fudera no ritual atrás de um homem. Parabéns, Nick.

Mas até que o Diabo piromaníaco filho da puta não era de se jogar fora.

Não percebeu-se sorrindo nem seu estranho risinho até que Gabriel surgira na cozinha, encarando-o interessado.

– Noka, teu irmão ta pensando em rola de novo.

Da irmã apenas viera o breve comentário “feliz 2005”, prontamente ignorado pela dupla de homens.

Caro leitor, talvez você tenha sido pego em devaneios reflexivos sobre a atual localização de um personagem que surgira misteriosamente e mantinha tal mistério (ou provável desconfiança por mudanças bruscas de narração nesse capítulo, talvez sim). Sim, palmas, Satoru. Onde estaria? Sua presença não fora confirmada entre a coluna de louça suja que Nick Braun limpava com desgosto excepcional, nem na mudança de canais que Noka fazia com alegria, muito menos no tédio de Gah observando a lista de lobisomens que irritavam Cleitin e do qual o caçador fora mandando dar um jeito – lê-se livrar-se, nem remotamente na raiva de Jamie passando o rodo pela trigésima sétima vez na semana. Onde estaria? Aonde teria ido? Oh, tanta indagações, um enigma divagando sua resposta.

E como mistérios perdem o ar tão interessante que sustentavam assim que sua resposta é levada ao mundo, como rastros de fumaça escapando de um capô de um carro destruído quando havia a ínfima esperança de não dano, não trago-lhe o que deseja.

A dúvida restará.

O que você deve manter em mente é o seguinte – Mas por que os irmãos e os amigos deles não importavam-se com a ausência?

Oh. Explosão.

E no dia seguinte, no fim de semana que sustentou-se por Noka e Jamie saindo pra uma balada dos membros do submundo do qual voltaram risonhas e com os cabelos grudentos de suor (obviamente Nick soltou uma piada deploravelmente irônica sobre o fato), na segunda que iniciou-se por cansaço e preguiça momentâneas (nem tanto por parte de uma pessoa reconhecidamente preguiçosa), na semana que decorreu calma aquém dos surtos irritadiços de uma Jamie raivosa por qualquer bosta, restou certa desconfiança mínima nos mais variados segundos e gestos que cercavam os Braun.

Esperavam algo que nem mesmo explanavam como, simplesmente mantando sabedoria que viria subitamente, sem escapatória.

Foi na manhã clara de sexta, no mesmo dia que Nick enfim saiu do apartamento cheiroso e limpo atrás de dinheiro, numa consulta rápida com um cara que vergonhosamente só queria saber se seu time esportivo sairia da crise que há tempos residia, onde o bruxo mentiu qualquer coisa para arrancar as notas belas de grana, que Noka estacou na rua, especificamente no meio dela, largando com calma as sacolas transparentes do mercado mais próximo, lotadas de ingredientes culinários necessários para enchê-los por mais tempo de vida.

E por apenas desejar encerrar uma fome matinal incomodativa, Noka irritou-se.

Um descaso excepcionalmente periculoso inundou até a raiz rosa desbotada da bruxa. Expirando irritável, deslizou a visão entediada para um par de pernas finas que aproximava-se com odiosa despreocupação.

O ser masculino sustentava um sorriso fácil nos lábios finos, julgando as ações da outra como engraçadas. Ao chegar perto o suficiente, surpreendeu-se com a baixa estatura da moça, considerando que si mesmo não era muito dos altos. Agradou-o. Desde a pele macia até a ponta dos dedos avermelhados, considerou-a absurdamente fraca, gostando da ideia que qualquer movimento mais agressivo poderia quebrá-la por inteiro.

Com tantos pensamentos subestimados, chocou-o o modo que as sobrancelhas dela moveram-se com calculado desprezo.

– É isso que mandaram? – indagou, rindo com nojo para si mesma. O demônio abriu os lábios na surpresa, observando-a de olhos arregalados. A garota riu verdadeiramente – Diabo realmente me acha pouca bosta.

Noka pendeu o pescoço para um lado, estreitando os olhos enquanto mantinha um sorriso pequeno na boca. Tê-lo ali não era algo que já não suspeitava que pudesse acontecer. Obviamente não invocava-se o talvez dono dos terrenos ardidos e subterrâneos sem pagar-se uma terrível penitência. Ocorreu-lhe um pensamento deveras agradável.

– Que tal uma aposta, demônio? – perguntou-lhe, voltando com a cabeça na posição correta e aproximando-se sem qualquer pestanejar, mesmo que o homem agora estivesse com um brilho de aviso nos olhos pretos – Das boas – prometeu, a voz suave.

Recebeu um silêncio levemente interessado. Sorriu mais ainda.

Algo lhe dizia que provavelmente em pouco tempo arrepender-se-ia daquilo até a última gota de sua alma. Entretanto, de alguma maneira trágica, desconsiderou o Poder interno que apitava nas bostas que estava prestes a fazer. Encarnaria no osso.

Mostraria para aquele pedaço de escroto que dizia ser um demônio o que significava subestimá-la.

Assim, aproximou-se, ficando na ponta dos pés, para poder alcançar o vão do pescoço do outro, suspirando no pé do ouvido antes de profetar a pior sugestão que suas cordas vocais já houveram sido capazes de ditar. Pois era pateticamente clichê.

Ao fim da sugestão, riu baixinho, percebendo os pelos da nuca do homem eriçando-se.

Afastou-se, os olhos escuros dele seguindo-a, um sorriso malicioso delineando os lábios.

– Porque quero as informações que você totalmente tem – respondeu para a silenciosa indagação que ele mantinha nos orbes, dando de ombros.

Ele riu, apreciando o jogo. Noka viu-o aprumar-se, e sabendo totalmente que as chances de sair dali inteira e viva eram escassas, porém totalmente confiante que derrubaria aquele merdinha, simplesmente puxou a manga cinza da camisa para cima.

Já havia apanhado diversas vezes de uma Jamie totalmente cega pela TPM. Não seria um pirocudo egocêntrico que o faria.

E quando ela permaneceu por baixo, os lábios machucados permitindo o sangue que enchia a boca sair por rastros grossos por, os lábios mornos dele rindo e sussurrando com o a voz entrecortada pelo esforço, mas ainda sim rouca de provocação, um risonho “eu vou te foder a noite toda”, Noka levou os dedos finos e trêmulos até o pescoço alheio, uma onda imensa de Poder inundando o corpo do demônio, ele agora caindo para trás em espasmos, os olhos perplexos e a sombra do sorriso esvaecendo.

Noka sentou-se sobre o colo alheio, sorrindo de acabar, porém tendo certo controle, pois os lábios doíam. Kim ainda sofria certas convulsões, batendo a nuca no concreto sujo, fixando seu olhar no dela como se não fosse capaz de acreditar no que lhe ocorria.

A bruxa apenas retribuiu-lhe com um olhar carregado de súbita diversão.

Pobre demoniozinho, foderia ele a noite todinha.

E em outro plano, atribuído também por duas pessoas encarando-se, um rastro de desconfortável clima, Nick cerrou o grito que insistia em subir e rasgar-lhe a garganta.

Porque o Diabo residia sentado no sofá da casa de Jamie, sorrindo-lhe uma promessa cruel.


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