Preces de Braun escrita por hwon keith


Capítulo 5
Fitando mudanças grotescas


Notas iniciais do capítulo

Outro capítulo do qual escrevo sendo liderada por meu licorzinho. Desculpem.



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Refletindo na janela distorcida pelas ondas de calor do cômodo seus olhos puxados dançavam. Outrora permanecia ali, engolido em devaneios.

Em minhas mãos esbranquiçadas fitei o copo quase bebericado. Gélido agora. O silêncio corria em nossa volta como uma cortina pesada. Eu poderia tocar até a desaprovação vinda para meu encontro.

Sem respondê-lo, parei na janela oposta, como se o tráfego suave e iniciante das seis horas da manhã pudesse levar de carona minha culpa.

Ateei-me a certo conjunto de vestes largas e fios despenteados. O garoto parara no meio da rua, visualmente ignorando os pedidos até agora calmos e surpresos dos motoristas. Lentamente seu rosto e o meu moveram-se em sincronia quando parecendo perplexo, o menino pregou sua atenção inteira na minha face, um fato impossível, pois os vidros desse local escureciam para os transeuntes lá fora.

Algo passou raspando de minha medula até a primeira vértebra. Porém, o garoto já fora, correndo antes que fosse atropelado. Sumiu numa curva de esquina.

A afobação de Nick caracterizava-se por um misto de horror puro com toques suaves de desespero. Havia jogando-se na mesa dura de madeira, os fios loiros levemente úmidos pela neblina. Escorregando seus dedos finos pelo rosto tenso, qualquer resquício da lembrança de outrora apagara-se, mergulhando numa sombra esguia.

Descolorindo o brilho dos olhos, estes tornaram-se enevoados e o garoto levantou-se de súbito, analisando sua fisionomia pálida no espelho sujo. Seus membros endurecidos giraram contra a soleira da escada, observando mais acima e pegando no ar resquícios de vozes ultrajadas.

Não se importou. Dirigiu-se ao sofá gasto, atirou-se nele e pregou sua atenção na parede desbotada. Sorriu levemente, sem saber ao certo porquê. Sua memória e mente giravam como um oceano transtornado por uma tempestade, as gotas indo e vindo para quaisquer direções. O Poder que mantinha afundava, não conseguindo captá-lo nem segurá-lo.

Mudando sua atenção para a parenta que corria da escada para a porta de entrada, ignorando-o e saindo logo em seguida, girou o rosto para o homem que devagar descia as escadas, olhando-o de soslaio, um pouco impressionado pela estável postura do garoto.

– Não vai socorrer sua irmã? – indagou este, ainda vindo ao seu encontro.

Nick apenas levantou seu rosto para fita-lo.

Os olhos de Satoru abriram-se ainda mais, a surpresa estampada visivelmente. Seus lábios torceram-se em desagrado e em poucos passos rápidos terminou o espaço que havia entre eles.

Então, de modo calmo, levantou-se, subiu as escadas, trancou-se em seu quarto e ignorou qualquer protesto e pedido de resposta vindo para si.

Noka corria desajeitada. Amaldiçoando Satoru em todas as línguas que era fluente, digiriu-se odiosa para um café suburbano e mal limpo. Batendo a porta com desnecessária força, recebendo um olhar repreensivo que abertamente desconsiderou, jogou-se numa mesa bem longe das janelas e com a voz pingando raiva pediu o maior mocaccino que conseguiria pagar na data. Suspirou, fechando os olhos que doíam.

Nem prestara atenção em Nick antes de sair. Provavelmente o irmão continuava chateado pelo dia anterior, claro que com certeza. Quase morrera estrangulado pelo próprio chicote. Não seria uma morte muito agradável.

Relembrando distraída a madrugada que passara, recebeu de braços abertos o café. Bebericando-o um pouco, pois com certeza queimaria a língua pela quentura, visualizou com um pouco de esforço (sua memória já estava esquecendo) o Barrete Vermelho que sumira inconclusivo. Claro que proclamar uma citação bíblia era a única forma de afastá-lo, mas continuava inexplicado o porquê. Se fosse pelo fato de ser uma criatura vinda das mais profundas labaredas do inferno, seria chato de tão previsível.

Perdida nas possiblidades que sua mente elaborava com tanto carinho, querendo afastar a briga feia que tivera com o crush maldito do irmão, perdeu a imagem do homem que salvara o dito cujo sentando-se defronte a ela.

Noka pregou seus olhos nele, os lábios entreabertos de modo imbecil e a mão com o café no meio caminho para eles.

O homem de uns vinte e poucos anos sorriu. Noka com desgosto fechou a boca, expirando.

– Esse é o momento que agradeço por salvar meu irmão e ofereço um cafezinho? – começou, largando a taça na mesa e apoiando o rosto numa mão – Teremos que deixar pra próxima. Só consigo pagar o meu.

Ko negou com um mínimo movimento. Noka perdeu-se nas linhas do pescoço levemente a mostra pela camisa social e gravata. Ela era tarada por eles e ombros masculinos.

– Quero só ter notícias atualizadas de Satoru – respondeu o homem, a voz grossa denotando simpatia.

O Poder de Noka dançou em volta dele. Analisando e preenchendo as lacunas mentais, veio a tona que o homem tão gentil de ontem, onde afastara o monstro e com habilidade levara o irmão para dentro de casa era simples e resumidamente um caçador, assim como Gabriel.

Noka fitou-o com seriedade.

– Você sabe que somos bruxos.

Ko confirmou.

Noka suspirou. Ele realmente era atrativo. E levando em conta que impedira com devido esforço a tentativa da garota de aprofundar-se em suas memórias, ela teve que aceitar que era suficientemente forte.

– Nem adianta dizer que não vai comentar como conhece Satoru – pronunciou o nome do outro com desgosto. Os olhos azuis do outro gelaram-se. A garota riu – E que não vai permitir que eu tente descobrir - Ko sorriu de lado – De qualquer modo... – a garota foi um pouco pra frente, afastando os cabelos rosados do rosto – Conhece o Gah?

Ko riu. Sua risada era gostosa, assim como seu corpo. Controlando os impulsos loucos de agarrá-lo, Noka bebeu um pouco mais de seu café enquanto ele terminava seu surto e afastava também os fios rebeldes e espetados da testa.

– Vejo que a fama dele é extensa, se até bruxos o conhecem – Ele comentou, recebendo pela garçonete um copo de whisky. Agradeceu para ela, a mulher corando na visão agraciada da beleza dele.

Noka sorriu. Ko observou-a afastar a taça.

– Ele é meu melhor amigo – surpreendeu-o.

– Que péssimo amigo você tem – respondeu.

Ela girou uma mão fina, vendo os olhos dele acompanharem o gesto.

– Se eu faço uma redação ou ajudo-o em algo que ele é horrível ele me paga cinema e pipoca. Não tenho o que reclamar – comentou, indo para trás na cadeira confortável – Claro que isso não o impede dos comentários babacas e as piadas horrendas. Mas acho que já provei o suficiente que apesar disso o aguento, então ele não se controla pra piorar a situação.

O homem alto apenas olhou-a, tragando a bebida alcoolica. Seus braços eram musculosos e com certeza possuía um abdômen bem avantajado, se me entende. O terno preto era levemente gasto, a camisa social aberta nos primeiros botões e a gravata escura desleixada. Os cabelos pretos espetados em todas as direções, os olhos estreitos e azulados. Ele parecia vir de um anime, levando em consideração que obviamente era asiático.

– Não posso impedir os amigos de Satoru, mas não pretenda ficar na nossa casa – Noka alertou-o.

Ko respondeu que não interessava-se em morar lá. Agradecida, Noka não comentou.

O barulho do toque do celular de Noka interrompeu o silêncio que brotara entre os dois. Atendendo-o após sorrir levemente para a tela de chamada, visualizando o nome do dito cujo do qual fofocara momentos atrás, colou o aparelho na orelha. A voz de Gabriel levantou numa rápida fala, gelando Noka.

Girando os olhos para o homem parado na sua frente, a expressão indagadora, Noka ouviu o término da conversa num bipe que fluiu para longe de sua mente quando pulou da mesa, arrastando com dificuldade o pulso de Ko, tentando puxá-lo para cima.

Contou do acontecido. O caçador pôs-se de pé, arrastando a garota agora pelo pulso dela, deixando para trás os gritos indignados do dono do café do qual não pagara a conta. Ignorando tudo aquilo, Ko virou-se para Noka, os olhos intensos e um sorriso perigoso nos lábios.

Então ela soube que entrariam numa briga. Sorrindo levemente, ela deixou-se ser puxada e liderada, o poder dançando em volta deles e mostrando-os o caminho. Assim como ele animava-se na perspectiva de lutar com ajuda de uma bruxa, ela divagou do que um caçador era capaz.

Porque as habilidades de Gah nem devem entrar na conversa, convenhamos.

Satoru havia minutos que com empenho tentava arrombar a porta do irmão Braun.

Algo terrivelmente perigoso e estranho alastrava-se em Nick, como um verme parasita. Aquela postura não pertencia ao garoto de nenhum modo. Sendo pego de guarda baixa, Satoru elevou hipóteses se aquilo viera das consequências de ontem.

Por fim destruíra o objeto que limitava o contato dos dois. Nervoso de algum modo, Satoru observou Nick sentado na cama, olhando-o impassível. Correndo para ele, o mais alto estranhamente sentia-se levado a encerrar aquela conduta.

– O que houve? – perguntou, abaixando-se até estar na linha de visão do loiro.

Nick girou seu rosto para outro lado, o pescoço pendendo para trás, os olhos escuros tediosos, sendo cercado em sua totalidade por uma estável nuvem catatônica, esta visada na passividade.

Então riu.

– Pretende estender até onde seu teatrinho tedioso de preocupação? – jogou acidamente, os lábios puxados num esgar. Satoru perdeu o equilíbrio dos calcanhares e caiu sentado no carpete, perplexo.

Sendo levado por algo incontrolável, Nick inclinou-se para o homem, os lábios perigosamente perto, o riso desaparecendo do rosto e os olhos enevoados em periculosidade.

– Você acha que confio em você? – levantou a questão, afastando-se um pouco, os braços indo para cada lado do seu corpo, fechando os orbes e elevando a voz num ódio descontrolado – A partir do momento que surgiu aqui morrendo, ou quando pensou que fossemos retardados o suficiente para acreditar que não sabia sobre que porra tinha feito para um grupo de demônios estar na sua cola. Não minta para nós – sibilou – Eu sei devidamente distinguir uma gota de molho de tomate para uma de sangue.

Permaneceu um silêncio.

Em resposta, Satoru chutou-o no peito. Nick ofegou. O homem de cabelos presos puxou o Braun pelo pulso sem nenhum carinho, o garoto caindo no chão com um ruído feio de osso batido, o mais alto por cima de suas pernas, impedindo-o de levantar. Terminaria ali o aleatório surto do loiro, iniciado do nada e sem motivo aparente.

Apesar da mudança considerável das circunstâncias, o olhar de Nick permanecia calmo. Com uma mão fechada no pescoço recém reconstruído do caído, Satoru indagou-o.

– Quem é você?

Os lábios de Nick mexeram-se numa tortura lenta, toda e qualquer atenção de Satoru sendo tragada para dentro do buraco negro de seu olhar estacado, como se não houvesse vida por baixo, em suas veias, artérias e átrios.

– E você? – por fim manifestou-se.

Abandonando a postura construída com vigor, decidindo terminar com a impassibilidade confusa de outrem, de tal modo também incapacidade de agir corretamente, abaixou seu rosto consideravelmente e com todos seus glóbulos sanguíneos berrando uma negativa, Satoru acabou beijando-o.

O tempo parou.

Cada percepção, memória, toque ou pensamento de Satoru desmanchou-se agradavelmente, arrastadas e pegas pelos braços por algo maior, grotesco e inominável. Tudo resumiu-se. Uma bolha quente explodiu no seu corpo, os dedos formigando, os braços tremendo e as pupilas fechando. Engasgou-se, em vão tentando livrar-se. Agitando-se incontrolável, o que impedia-o de quebrar em centenas de pedaços afiados eram os lábios de Nick.

Em contrapartida, Nick acordou horrorizado do torpor e sonho onde de algum modo caíra desde a manhã, de onde voltara da padaria.

Pela porta quebrada Nick viu a irmã entrando, estacando perplexa na visão. Satoru pulou para longe do garoto, caindo de costas na cama, revelando um olhar doloroso pela batida.

Pela soleira viera também Ko. Seu rosto estava pintado por gotículas de sangue. O homem e a garota permaneciam calados, até que a última moveu com dificuldade estonteante a notícia de traziam.

– Mataram o bando de demônios que protegiam Satoru.

Se esperavam uma resposta, frustraram-se. Pois Satoru apenas ficou parado na surpresa e Nick estava cego a tudo.

Permaneceu deitado, cada ponto de sua mente agora sendo invadida pela visão de um garoto de pé, olhando para si, os olhos grandes arregalados e os lábios em forma de coração abertos na surpresa do choque. No mesmo local havia o irmão, mais alto e esguio, indo até o outro e indagando-o o que ocorrera.

Soo, ele chamara.


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