Eu visto uma saia preta, uma blusa nude de manga comprida e calço um salto “bafônico”, como a Reagan diria, que Claire e eu compramos no final de semana. Faço uma maquiagem leve e prendo algumas mechas para trás com um prendedor incrustado de joias que a Claire me deu. Desço as escadas e me junto ao Mike, ao Tim e à Claire.

Amber: TIM! Você voltou!

Eu o abraço.

Amber: Senti saudades.

Tim: Também senti saudades.

Eu o solto.

Tim: Eu fiz waffles!

Mike e Amber: Êba!

Nós nos sentamos à mesa e tomamos café.

Mike: E aí? Como foi lá em Londres?

Tim: Foi normal, nada de diferente... Eu trouxe presentes!

Mike: Êba!

Claire e Amber: Não precisava.

Tim: Eu sei, mas eu quis trazer do mesmo jeito.

Ele pega uma sacola e entrega para a Claire.

Tim: Esse é o seu, querida.

Claire: Obrigada, amor.

Ela abre a sacola.

Claire: UM ESTOJO DE PINCÉIS! Como você sabia?

Tim: Eu te conheço, querida.

Claire: Obrigada.

Ele entrega uma sacola para o Mike.

Tim: Esse é o seu, Mike.

Mike: Valeu, pai.

Ele abre.

Mike: Uma bola de basquete autografada! Obrigada, pai.

Tim: De nada, filho.

Tim me entrega uma sacola.

Amber: Pra mim também?

Tim: Claro! Você é parte da família agora.

Eu sorrio.

Amber: Obrigada, Tim.

Tim: Abra.

Eu abro a sacola.

Amber: É um globo ne deve! Que lindo... Eu sempre quis um globo de neve.

Tim: E tem mais.

Ele gira uma engrenagem dourada que estala a cada vez que é girada. Depois de três voltas, ele para e o som do estalo dá lugar à uma música antiga que eu reconheço como...

Amber: La Vie And Rose! Do Louis Armstrong!

Tim: É. É essa mesma. Eu não achei que você conhecia...

Amber: Eu amo essa música. Obrigada, Tim.

Ele sorri.

Tim: De nada, Amber.

Eu subo as escadas cuidadosamente para não derrubar o globo de neve. Vou até o meu quarto e deixo o globo sobre a cômoda. Saio do quarto e paro à porta. Olho para o globo mais uma vez e saio do quarto. Vou até o banheiro do corredor e escovo os meus dentes. O meu banheiro está quase pronto. Até lá, eu usarei esse. Desço as escadas e vou junto com Mike até o carro. Mike e Tim ocupam os bancos da frente. Cliques são ouvidos ao abotoarmos os cintos e Tim liga o carro.

***

Professor Oscar: Bom dia, classe. Hoje temos um aluno novo. Cadê ele?

Um garoto de olhos e cabelos castanhos se levanta timidamente.

Professor Oscar: Apresente-se, garoto.

Ele se vira para os alunos. Ele me é familiar...

Garoto: Meu nome é...

Amber: Kyle?

Garoto: É. Esse é o meu nome. Como você sa... AMBER!

Eu ne levanto e nós nos abraçamos.

Kyle: Quanto tempo!

Amber: Kyle, que saudade!

Professor Oscar: Vejo que já tem uma amiga. Que bom. Mas deixem para conversar no intervalo.

Professor Oscar: Anotem o que eu disser no caderno.

Todos abrem os cadernos e deixam os lápis e caneta à postos.

Professor Oscar: O assunto é o capítulo um. Vale vinte pontos. O trabalho será apresentado na terça-feira da semana que vem.

Professor Oscar: O trabalho será em grupo. Mas eu escolherei os grupos.

Ouvem-se murmúrios na sala em desaprovação.

O professor vai ditando os integrantes dos grupos e eu espero até ele chamar o meu nome.

Professor Oscar: Alexander, Amber, Deborah, Kyle e Reagan.

Droga! Tinha que por o estrupício no meu grupo!

***

Reagan: Ok. Como todos estarão ocupados esse final de semana e segunda-feira temos que entregar a atividade de matemática, poderíamos ficar até mais tarde hoje aqui na escola para fazer o trabalho.

Amber: Eu posso.

Alex: Hoje eu não tenho treino então também posso.

Kyle: To dentro.

Reagan: Só falta você, Deborah.

Kyle: Mas você não disse se pode.

Reagan: Eu que tive a idéia, é claro que posso.

Amber: Pega leve, re.

Reagan: Haja paciência.

Alex: Garoto, você é lerdo mesmo.

Amber: Não liga, Kyle. Ela só ta estressada. Já esse aí...

Alex: Eu o que?

Amber: Esse aí não tem jeito, é um mapa mesmo.

Alex: Ei, ei, ei. Quanta violência! Assim você machuca o meu coraçãozinho.

Amber: Qual? O que você não tem?

Alex: Ui! Doeu.

Ele leva a mão ao peito e faz biquinho.

Deborah: Por mim já chega. Estou perdendo o meu tempo.

Reagan: Mas você ainda não disse se vai ficar até mais tarde...

Deborah: Aonde encontro vocês?

Reagan sorri.

Reagan: Biblioteca. Assim que o sinal tocar.

Deborah: Ta bom, tanto faz.

***

Reagan: Já falaram com os pais? Os meus deixaram.

Kyle: Os meus também.

Deborah: Se eu pedisse pra ir para a China comprar um picolé, meus pais não só deixavam, mas me arranjavam um jatinho pra ne levar.

Kyle: Que legal! Os meus são bem tranquilos. Deixaram na boa.

Alex: Meus pais ficaram até felizes de eu estar estudando.

Amber: Claire e Tim estão viajando e só voltam amanhã. Então eu vou embora com a Reagan, já marcamos.

Kyle: São seus pais, Amber?

Amber: Sim.

Alex: Seu amigo não conhece seus pais?

Kyle: Eu não cheguei a conhecê-los porque...

Eu o interrompo.

Amber: Ele é meu amigo do internato. Ele não chegou a ver os meus pais por isso.

Alex: Ahh.

Kyle me olha confuso.

Amber: Te explico depois.

Eu cochicho para ele.

Kyle: Verdade, ele se parece com aquele garoto.

Ele tenta disfarçar.

Alex: Que garoto?

Kyle: Humm, o... O Peter!

Tinha que ser...

Amber: É... O Peter...

Eu encaro Kyle.

Kyle: Desculpa.

Alex o olha confuso.

Kyle:... Mas é verdade.

Reagan: Que seja, estamos perdendo o intervalo. Vamos?

Amber: Vamos. Kyle, você vem conosco.

Reagan revira os olhos e eu a dou uma cotovelada.

Reagan: Ai!

Amber: Dê uma chance a ele.

Ela o olha.

Reagan: Uma chance. Só uma.

Kyle: Obrigado.

Reagan: Agora vamos.

***

O sinal toca e a manada de adolescentes sai correndo corredores afora.

Quando a multidão se dissipa, nós cinco saímos da sala e andamos pelos corredores até a biblioteca.

Chegando lá, Reagan com "seus poderes persuasivos" - como ela diz- convence a Senhora H a nos deixar estudar na biblioteca até mais tarde.

Senhora H: Eu ainda tenho coisas para encaixotar, livros para etiquetar, então vou ficar mais um pouco... Mas quando eu terminar vocês vão ter que desocupar a biblioteca.

Reagan: Obrigada, Senhora H.

Nós entramos em uma das cabines para estudo, fechamos a porta e nos sentamos à mesa redonda com exatas cinco cadeiras.

Todos pegamos os cadernos. Abrimos os livros no capítulo um e a Reagan pega alguns livros da biblioteca sobre o assunto. Deborah começa a lixar as unhas enquanto Reagan explica o assunto. O resto de nós presta atenção e eu rabisco algumas anotações em um caderno. Quando terminamos o trabalho comemos alguns salgadinhos e conversamos até que o assunto acaba e o silêncio prevalece.

Amber: Estão ouvindo isso?

Deborah: A sua respiração de ogra? Sim, eu estou.

Amber: Está quieto... Muito quieto...

Reagan: Senhora H?

Nenhuma resposta.

Reagan: Senhora H, você está aí?

Novamente não há resposta.

Reagan: Eu vou procurá-la.

Ela sai do compartimento.

Alex: Que horas são?

Deborah olha no celular.

Deborah: 23h19min.

Kyle: Meus pais devem estar preocupados...

Alex: São só onze horas, ainda é cedo.

Reagan chega.

Reagan: Más notícias.

Deborah: O que foi agora?

Reagan: A Senhora H não está aqui... Na verdade... Não tem mais ninguém aqui.

Kyle: Estamos sozinhos?

Alex: Grade coisa... Vai me dizer que está com medo?!

Kyle: A gente deveria ir embora...

Reagan: Estamos trancados.

Kyle: E agora?! Como vamos sair?

Deborah: Eh... Parece que não vamos.

Alex: Moleza. Meninas, alguém aí tem um grampo?

Reagan, Deborah e Amber: Não.

Deborah: Quem usa essas coisas!?

Kyle: A minha avó usa...

Deborah: Não perguntei, idiota.

Kyle: Mas... Você...

Amber: Não liga não, Kyle. Ela é mal humorada assim mesmo.

Alex: Sem grampo... E clipe de papel? Alguém tem?

Kyle, Deborah, Amber e Reagan: Não.

Alex: Isso é uma escola, deve ter em algum lugar...

Reagan: Já sei. Vamos nos dividir para procurar.

Alex: Se nos separarmos, agiremos mais rápido.

Kyle: Não é boa idéia, separar não é boa idéia. Temos que ficar juntos.

Alex: Ah, é? Por quê?

Kyle: Nos filmes sempre que os adolescentes se separam todos morrem...

Reagan: Mas isso não é um filme, Kyle. E estamos em uma escola, não em um labirinto ou um cemitério.

Amber: É, Kyle. Ninguém vai morrer.

Kyle: Humm... Ta bom.

Reagan: Então vamos tirar na sorte.

Ela rasga algumas tirinhas de papel e escreve os nossos nomes um em cada tirinha e as dobra ao terminar. Ela chacoalha os pedacinhos de papel nas mãos e estende para o Kyle. Ele pega um e desdobra.

Kyle: Deborah.

Reagan: Então vocês vão juntos. Não quero saber de reclamações.

Ela pega um pedacinho de papel.

Reagan: Kyle. Então somos um trio. Amber, você vai com o Alex.

Amber: É sério isso?

Reagan: Sim, é sério. Sem reclamações.

Eu reviro os olhos.

Reagan: Nós vamos procurar no Grêmio estudantil e em algumas outras salas. Vocês procurem na sala do diretor e depois na secretaria.

Alex: Por mim tudo bem.

Reagan: Então vamos logo, estamos perdendo tempo.

Reagan, Kyle e Deborah saem apressados para o Grêmio.

Alex: Vamos?

Amber: Vamos. E eu agradeceria se você não enchesse o saco.

Alex: Quem, eu? Eu sou um anjo.

Amber: Ah é? E onde está a sua auréola?

Alex: Bem aqui.

Ele aponta para a cabeça e pisca um daqueles olhos azuis e sorri.

Eu reviro os olhos.

Amber: Era só o que me faltava...

Ele ri. Nós saímos da biblioteca e sigo-o pelos corredores até entrarmos em uma sala pequena com uma placa em cima da porta diz: Sala do Diretor.

Amber: Me lembro da última vez que eu vim aqui... Foi no primeiro dia de aula...

Essa lembrança me faz rir.

Amber: Eu estava ensopada...

Ele ri.

Alex: "Você foi iniciada!"

Eu rio com sua imitação dos garotos que me jogaram na fonte.

Eu vasculho as gavetas à procura de um clipe de papel e ele procura na mesa do diretor. Ele se senta na poltrona do diretor e volta seus olhos azuis claros a uma gaveta, a qual ele abre... Foco, Amber. Foco.

Eu volto a atenção às gavetas, mas tudo o que encontro é papelada. Papel, papel e mais papel...

Amber: Achou algum...

Eu olho para ele. Ele está mexendo em um arquivo.

Amber: O que você está fazendo?

Alex: Lendo, não é óbvio?

Ele diz sem desviar o olhar da papelada.

Amber: O que é isso?

Eu pego o arquivo das suas mãos.

Alex: Ei, ei, ei. Me devolve isso.

Amber: Alexander Pierce.

Eu leio o nome escrito no arquivo.

Amber: Isso por acaso não seria a sua ficha, seria?

Eu digo sorrindo.

Alex: É sim, agora me devolve.

Amber: Ah, claro.

Eu estendo a ficha para ele e quando ele estica o braço para pegá-la, eu a puxo de volta.

Alex: Amber, não brinque com isso.

Amber: Ah, e porque não?

Alex: Me devolva a minha ficha.

Amber: Vem pegar.

Eu me abano com a ficha, irritando-o. Ele sorri maliciosamente.

Alex: Eu te dou 3 segundos para me entregar isso.

Eu sorrio e me sento em uma das cadeiras à frente da mesa do diretor.

Alex: Um.

Eu examino as minhas unhas.

Alex: Dois.

Eu reviro os olhos, fingindo tédio.

Alex: Três.

Me levanto, saio da sala e fecho a porta. Saio correndo pelo corredor e ouço-o abrindo a porta e vindo atrás de mim.

Alex: Você está ferrada, Amber Rose Thomas.

Eu rio.

Amber: Vem, Alex, vem pegar.

Eu viro à direita. Continuo correndo pelos corredores vazios aonde o único som que se ouve é o som dos meus passos apressados e os do Alex que vem logo atrás.

Alex: Eu vou te pegar.

Viro à direita novamente e agora os armários são substituídos por portas para as salas. Continuo correndo e ele vem atrás. Chego a uma bifurcação e viro à esquerda, chegando à biblioteca. Eu entro e ele me segue. Passo entre as prateleiras de livros e por entre os livros eu o vejo na seção ao lado. Eu continuo correndo e ao chegar ao fim da seção viro ao lado oposto a ele. Saio da biblioteca e corro em direção à piscina de natação. Corro em volta da piscina e ele vem atrás. Volto aos corredores e viro a esquerda novamente, chegando no refeitório e ele continua atrás de mim. Passo pela fonte e vou em direção ao jardim. Minhas pernas estão doendo e eu estou cansada, mas ele parece continuar a todo vapor. Corremos pela grama verde até que ele me alcança e nós caímos no chão. Estico a ficha o mais longe que posso para ele não pegar. Ele está sobre mim, uma das suas mãos segura meu braço no chão e a outra se estica para alcançar a ficha. Consigo inverter as posições e nós rolamos pela grama nessa luta pela papelada e ele vence. Ele pega o arquivo e se deita ao meu lado na grama macia. Não trocamos uma única palavra, o som da nossa respiração descompassada prevalece.

Alex: Ta vendo aquela constelação?

Ele aponta para as estrelas.

Amber: Sim.

Alex: Eu não faço idéia de qual é.

Nós rimos.

Alex: A única coisa que dá pra ter certeza é que são bonitas...

Amber: É verdade...

Eu olho pra ele. Aqueles olhos azuis calmos olham no fundo dos meus. Gentilmente ele ajeita uma mecha do meu cabelo atrás da orelha. Ele se aproxima lentamente, sinto sua respiração suave, sua mão no meu ombro e...

Deborah: O QUE VOCÊS ESTÃO FAZENDO?