A Livraria Yakuza escrita por Arquivo


Capítulo 3
Seja Bem Vindo




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/575907/chapter/3

Ela estava primeiramente organizando as prateleiras dos livros, quando a velha senhora japonesa, dona da livraria passou e lhe deu um leve toque no ombro.

—Bom dia senhora Keita, como está se sentindo?

—Dor no peito...

—Eu devo chamar um médico?

A jovem de cabelos negros seguiu a senhora, entrelaçando seu braço ao dela para lhe servir de bengala e lhe guiando até um dos sofás da sala de leitura.

—Meu filho, ligou?

—Não, minha senhora.

—Eu já esperava, ele sabe que estou morrendo, mas não me liga porque tem medo de eu nunca perdoa-lo.

A jovem mulher sentou-se ao lado da senhora, enquanto esta tossia muito e massageava seu peito. A senhora olhava a sua volta para a elegância de sua livraria, com paredes de painéis de madeira delicadamente pintada com figuras orientais (perfeitamente conectadas como uma história) e o lustroso chão que também era de madeira. A enorme fileira de estantes só possuía uma diferente, a última, que ficava bem ao lado do balcão de vendas; numa placa estava escrito: “Estes livros não estão à venda. Disponíveis apenas para pesquisa requisitada com antecipação”. A jovem levantou-se e foi até o balcão, mesmo que bonita, aquela livraria não recebia muitas pessoas por dia, pois vendia apenas livros clássicos ou importados por serem antigos. A maioria dos clientes eram professores de universidade, ou pessoas idosas que procuram seu livro favorito que sumiu de circulação anos atrás.

A pequena TV no balcão apresentava as notícias do meio dia, a jovem se posicionou em sua cadeira e dava pequenas olhadas nas notícias em intervalos de tempo que organizava varias papeladas das gavetas, que geralmente se resumiam a solicitações de livros, cheques que o filho da senhora mandava para ela e para a jovem, etc. Foi quando algo chamou sua atenção.

“Assassinato de criança comove cidadãos de San Francisco. O corpo de uma menina de 10 anos foi encontrado em um terreno baldio, coberto de marcas de agressão e indícios de violência sexual. É o segundo caso esta semana e o terceiro de fatalidades parecidas desde o começo do mês, a policia suspeita da ação de um serial killer, uma vez que ambas as três meninas possuíam uma aparência incrivelmente semelhante. Caucasianas de cabelos escuros e olhos azuis...”

A jovem recepcionista segurou a mini TV com suas duas mãos e a jogou no chão, fazendo com que ela se partisse e deixando algumas peças separadas, chamando a atenção de todos que estavam a sua volta. Seu rosto paralisado estava tenso e os poucos clientes que lá estavam se aproximaram dela, para oferecer um pouco d’água ou perguntar se ela precisava de um médico. Suas mãos tremiam e seus lábios também. Mas não importava o quanto eles tentavam falar com ela, depois daquilo ela nada fazia e nada falava, como se o fantasma de um demônio a tivesse encarado; a velha senhora dona da livraria pediu com toda sua educação que as pessoas se afastassem e a deixassem em paz para respirar, que estava na hora de fechar o estabelecimento.

Elas foram para o segundo andar da livraria, onde residia a senhora e a jovem em uma pequena, porem elegante kitnet.

—Hebi-chan, o que foi aquilo lá embaixo?

—Ele voltou... como eu não fui informada antes?

—Hum... você andou bastante desligada das notícias, precisa estar sempre atualizada e sempre preparada... eu pensei que havia lhe treinado para ser impassível ao seus alvos. Nenhum informante é perfeito e aquele homem sumiu por bastante tempo, não acha? – A velha senhora foi até a geladeira e trouxe um copo de chá gelado para a jovem. – Tome isso. Sua raiva esta escapando pelos poros da sua pele, isso fede.

—Sinto muito. – Ela começou a beber do chá em grandes e rápidos goles, como se tomasse um remédio.

—Ainda não sente, vá para o dojô pensar em como resolver isso. Vou ligar para o nosso contato, ver o que ele sabe sobre isso, ele chegará em breve.

—Sim senhora. – Com o copo já vazio em suas mãos, ela foi até a pia da cozinha e o limpou.

A jovem voltou para o andar de baixo, onde havia uma porta, que ficava nos fundos do estabelecimento. Ela possuía um molho de chaves no bolço de seu avental, cinco chaves ao todo, para a coleção de trancas e cadeados que aquela estranha porta de ferro tinha. Ainda tinha a escadaria que lavava a um porão reformado e adequado para treino e o “sistema de segurança”, seu piso era revestido com uma camada de borracha e havia alguns equipamentos como saco de areia, pesos, barras de ferro, uma espada de bamboo, cordas para pular e em uma parede reservada havia o “sistema de segurança” e seu boneco de teste. Uma estante com arcos e flechas, alguns modelos de facas de arremesso, pistolas, silenciadores, etc. Era sem dúvidas um bom sistema de segurança, ela sabia manejar perfeitamente qualquer um de seus atributos, mesmo que ainda precisasse praticar seu arco e flecha.

A jovem colocou sobre o último degrau o molho de chaves, tirou seu avental e suéter, ficando apenas com shorts de exercício. Ela precisava se aquecer, os alongamentos tratavam-se basicamente de alguns movimentos de yoga, em seguida ela foi para a barra de ferro, onde flexionava seus braços, seu exercício favorito depois de treinar no saco de areia. Seu suor fazia um caminho reto e perfeito em suas costas sem o sutiã para atrapalha-lo, deixando sua pele brilhando diante da luz artificial e exibindo as vértebras da cobra que estava sobre sua própria coluna junto de seu novo colete de tatuagens. Os demônios azuis temendo os ossos da cobra, com detalhes para representar as nuvens e montanhas verdes e vermelhas.

Depois de uns quinze minutos ela ouviu passos, mais de uma pessoa descendo a escada, mas ela apenas continuou direcionando sua concentração nas barras.

—Meu... Deus... – Uma voz estranha. Então passos um tanto arrastados, familiares, se aproximaram.

—Susie. – Aquela voz feliz, era a de Ben.

Ela soltou a barra e olhou para o agente de cabelos grisalhos ao seu lado, ele tinha um meigo sorriso, mas que ela detestava, pois sabia que ele sempre sorria daquele jeito porque sempre a veria como uma pequena criança que sorriria de volta ao ver uma face como aquela. “Não temos tempo pra essa merda, Ben” pensou ela.

Atrás dele outro homem de provavelmente seus 28 anos, bem distante e petrificado ao olhar para ela a distancia na escada. Ele era Norman Brown, parceiro de Benedict Michaelson a mais ou menos um ano, Ben havia assumido o lugar de Trevor como esperado e confiava bastante em Norman para leva-lo até aquele lugar... mas talvez Norman estivesse para receber um grande impacto de informação.

—Como vai Ben, vejo que você trouxe alguém que não deveria estar aqui. Você sabe que eu odeio ter que fazer queima de arquivo.

—E você sabe que eu também odeio quando você faz isso. E por todos os santos no céu, vista uma camisa!

—Homens se exercitam e correm em lugares públicos sem camisa, por que eu não posso fazer isso pelo menos na MINHA casa? – Ela virou-se de costas para ele e foi até uma camisa que estava pendurada na parede, ela não era exatamente branca, mas era de um tom de cinza claro. O que destacou o suor em seu corpo. O agente Norman estava nos limites da seriedade de seu trabalho. “Onde eu estava todo esse tempo quando ainda não a tinha visto?”, ele repetia para si mesmo em sua cabeça.

—Não vamos começar essa conversa de novo, você sabe que esse não é seu caso, Susie.

—Eu não respondo mais por esse nome. Não sei por que você sempre insiste.

—Você sempre será Susie para mim, se não gostar me dê um tiro. – Ben deu uma gargalhada, mas a jovem mulher a sua frente apenas o encarava friamente. – Foi... uma piada, você sabe disso!

—Claro que sei.

Ela olhou para o agente Norman e fez um movimento com sua mão para que ele entrasse no dojô, acredita-se que ele nem tenha visto que era um dojô até que a jovem colocou sua camisa.

—Eu já tenho uma ideia do por que você me chamou. Chegou à hora, ele passou 14 anos desaparecido. Se apareceu somente agora, então é por que ele sabe que estamos atrás dele, está chamando nossa atenção. Deve ter informantes do mesmo jeito que você, cuidado para não ficar igual a ele. – Ele se sentou no chão e seu jovem parceiro fez o mesmo.

—Eu nunca ficaria...! – A jovem mulher se exaltou, mas se lembrou dos ensinamentos da senhora, ser impassível. Respirou bem fundo. – O importante é que eu estou pronta.

—E eu estou pronto para seguir você aonde quer que você vá.

—E eu faço o que? Nem sei por que eu estou aqui? – Norman falou como um moleque.

—Primeira resposta: Você faz o que eu digo, segunda resposta: Você esta aqui para me ajudar a matar um filho da puta.

—Jesus, que tipo de lugar é esse, você por acaso anda fazendo bicos pra máfia, chefe?

—Em parte.

—O que?!

O jovem agente se levantou e começou a andar de um lado para o outro completamente desorientado, a mão em sua testa e praguejando em tom baixo.

—Se ele falar alguma coisa sobre a senhora Keita...

—Ele não vai. – Ben se levantou e o agarrou pelos ombros, dando pequenos tapinhas nas costas da jovem.

—Como nos metemos nisso?! Merda, quer dizer que esse tempo todo a Livraria do Sol Poente é controlada pela máfia?

—Esta livraria não trabalha com a morte de pessoas. Apenas com informação. – Disse a jovem se levantando e caminhando elegantemente até o agente que estava angustiado. – Nossos informantes nos dão conteúdo, nós guardamos esse conteúdo e os clientes vêm atrás de compra-los. Sejam policiais, agentes, assassinos, não nos importa, um cliente é um cliente e nossas informações são caras, por isso podemos manter seu anonimato. Aqueles que realmente conhecem esta livraria a chamam de A Livraria Yakuza.

O rosto de Norman empalideceu, ele apenas se sentou novamente.

—Puta merda, você é uma?

—Se quiser se referir a mim, deve me chamar de Hebi, o H tem som de R e o E se pronuncia Ê, se me chamar por outra coisa não dirigirei minha palavra a você. Eu sou uma pessoa que treinou a vida toda para matar alguém, não me faça gastar isso com você, se não vai me ajudar, então é melhor sumir.

—Sim... – Disse o jovem agente, mas sua anfitriã apenas se calou e continuou a encara-lo com se este estivesse fazendo algo de errado. -... Hebi, foi mal.

Eles se levantaram e foram para cima, para loja, em direção à prateleira reservada.

—Você, sr. Brown, Existe alguém neste momento que o FBI esta procurando e não sabe onde está?

—Bem, sim, mas já estamos quase o dando por morto.

—Nome.

—... O que?

—Quero saber o nome dele.

—Logan Maxwell.

Ela puxou para perto um banquinho e então subiu nele enquanto procurava um livro no meio de todos aqueles de capa de couro.

—Aqui, letra M. – Ela abriu aquilo que no começo o jovem agente achava ser um velho livro, mas na verdade era uma caixa com várias fichas e papeis dentro, mas fechada era igual a um velho exemplar de Dom Quixote. – Agora vamos procurar Maxwell.

—Mas... que porra é essa, tá tão na cara dos clientes que eles nem suspeitam.

—Maxwell, Logan. Aqui está: Bronzeado, cabelos castanhos avermelhados, olhos castanhos. 37 anos de idade. Visto pela última vez em 12/03/2007. Desaparecido a mais de quatro anos. Preso pela primeira vez em 1998 e depois novamente em 2005 por trafico de armas e por matar 4 agentes do FBI, foragido desde 2006. O irmão dele mora em Connecticut e um de meus informantes o reconheceu em um trem que estava indo para lá. Ele pintou o cabelo e fez alguma coisa no nariz, mas uma foto que eu recebi mostra a mesma tatuagem no pescoço e as cicatrizes nos pulsos. Ele esta escondido na casa do irmão, pode confiar.

Ela entregou um papel com o endereço de residência e trabalho do irmão de Logan Maxwell.

—O caso do Maxwell foi abafado, como você conseguiu... quer dizer, Hebi como você conseguiu?

—Informantes, passarinhos, infiltrados... chame do que quiser.

—Incrivel.

—Seja bem vindo a Livraria Yakuza

Ela guardou o “livro” em seu devido lugar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Livraria Yakuza" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.