Neva no Coração escrita por Wendy


Capítulo 2
O universo contra nós.




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No capítulo anterior:

"Mãe Benta olhava para o teto enquanto rezava um terço que estava na mão, como hábito de todas as tardes. Estranhava a demora do filho que saiu apressado com o menino Tuim, ainda mais com o tempo horrível dos últimos dias. De repente, a porta abriu-se, revelando a figura imponente de seu filho com uma jovem nos braços. A professorinha. O coração da idosa apertou. Zelão finalmente tinha feito uma bestagem como vivia ameaçando.

– MEU FIO, EU NUM ACREDITO NISSO! "

– Capítulo II -

– Mas meo fio, ela tá feito gelo. Se ocê fez argum argo cum ela Zelão, ieu nunca vou lhe perdoar.

– A sôra acha, que ieu faria argum mal a ela? Eu amo ela mêa mãe, amo. Eu sou capaz de morrer por ela. - respirou, olhando a mãe, ela somente balançou a cabeça negativamente - Foi por isso que o Tuim me chamou, mêa mãe. Eles encontraram ela no bosque... – soluçou, engolindo seco. – Por favor, mêa mãe, salva ela.

– Meu fio, eu já vi isso acontecer com alguém em um inverno desse há muito tempo... precisamo aquecer a prefessorinha... pegue uns cobertor no armário, meia e uma camisola grossa minha.

O homem logo seguiu a ordem da Mãe. Escancarou o armário e começou a procurar desesperado. Enquanto isso, Benta despia Juliana de suas roupas molhadas. O capataz voltou logo em seguida com o que a mãe havia pedido. Posicionou na cama, mantendo os olhos fixos na moça que ainda estava inanimada.

– Vamos Zelão se vire! Ieu preciso tirar essas roupa apertada dela.

– Mar... - Mar nada! Ieu num vô tirar as roupas dela com ocê olhando.

– Mar mêa mãe.... - quase deixou escapar, que ele e Juliana já estiveram íntimos mas em respeito a mãe e para não complicar ainda mais a situação, virou-se. As costas tensas e a respiração pesada.

Benta trocou as roupas de Juliana por uma camisola velha e grossa. Ficava um pouco folgada no corpo da jovem mas não podia deixa-la nua. Chamou o filho novamente, e este auxiliou a colocar meias na jovem, e a cobrir a professorinha com vários cobertores.

– Ieu vou esquentar água e fazer um chá para ela meo fio. – Zelão concordou com a cabeça e voltou para perto de sua amada que estava na cama.

Aproximou-se e segurou a mão pequenina dela, em seguida, levou a mão até a testa dela, ainda estava gelada contra a palma dele quente. Calor. Só os cobertores não seriam suficientes. Em movimentos rápidos, Zelão retirou suas botas, e sentou na cama levantando os cobertores, com muito cuidado moveu o corpo da professorinha sobre o seu, a envolvendo como se o próprio fosse um cobertor. Ele a sentiu, tão pequena, frágil e vulnerável em seus braços. Então a abraçou forte, com todas as suas forças, não deixaria ela ir a lugar algum. Encostou o rosto sobre o topo da cabeça dela, inalando o perfume de flores inconfundível, e não aguentou. Desabou. Lágrimas escorriam de seus olhos. Zelão amaldiçoou a si mesmo por não estar lá antes do pior acontecer. Mas como ele saberia? Por que Juliana estava lá? Sozinha? Várias perguntas surgiam em sua cabeça, deixando-o tonto. O corpo de Zelão estremecia só em pensar na possibilidade de perder sua flor do campo. Ele olhava para os tetos e para as velas e para dentro de si mesmo, implorando a todas as forças da natureza que dessem vida a Juliana.

–x-

Mãe Benta voltava de perto de um fogareiro com as toalhas que havia aquecido com água quente. Então se deparou com uma cena, do filho com a jovem desfalecida nos braços, ele a abraçava, a embalava nos braços como se ela fosse uma boneca quebrada. Ela poderia gritar com o filho, repreendê-lo pela falta de decoro ou de pudor. Mas ao vê a expressão dolorosa no rosto dele, ela só pode sentir pena e o coração apertar pelo filho e pela jovem moça, tão jovem e bonita mas agora tão frágil também. Se dependesse dela, iria rezar para todos os santos, iria fazer mil preces, mil promessas, só para aquela moça, o amor da vida de seu filho, sobreviver. Ao aproximar-se do casal, viu Zelão voltar aos poucos a si, olhou a mãe nos olhos como se fizesse uma súplica silenciosa.

– Meu fio – ela levou a mão até o rosto dele, acariciando. – Me deixe cuidar dela só por enquanto, ieu sei que é difícil mas ieu preciso benzer ela agora.

Zelão, sem alternativa, acenou e com cuidado, se desvencilhou do corpo
de Juliana a deitando sobre a cama. Ao tocar o rosto de sua amada, triste por ter perdido o contato, por ainda sentir o pulso do coração dela bater, discreto, baixinho – percebeu que a temperatura dela havia subido levemente.

– Fio... – Benta chamou, baixo.

– Me adescurpe, me adescurpe... – ele sussurrava. A idosa não sabia se para ela, se para Juliana, ou se para ambas.

Bruscamente, ele se afastou das duas e foi em direção à porta, saiu rapidamente, impedindo que as rajadas de vento entrassem e fechou a porta atrás de si.

–x-

Mãe, envolveu algumas toalhas quentes nos membros de Juliana e a última colocou sobre a testa. Percebeu durante o procedimento, o rosto da jovem voltar a corar, ainda que muito sutil, a palidez de antes não era tão evidente. Segurando alguns ramos, e envolta por velas acesas – que resistiam ao frio -, ergueu os braços ao teto, invocando as forças do desconhecido. A crença. A Fé. Era sua única sabedoria. Seu dom.
–x-

Ele não conseguia mais raciocinar nada coerente. A cabeça estava uma bagunça. Os olhos uma névoa sem fim. Caminhava sem direção certa. Em círculos, em zigue-zague. Formando desenhos na neve. Nem o vento gélido e cortante o detinham a força interior de seu corpo. Jogava a raiva. A Ira. O medo. A cada passo que dava. Olhou para cima, e finalmente, aliviando sua angústia soltou um urro. Um grito sofrido. Sentiu sua respiração acalmar. Sussurrava palavras incertas, levadas pelo vazio. Implorava ao universo pela vida de sua amada, e contraditoriamente, o acusava pelo crime de tentar roubar a vida dela.

–x-

Mãe usou de todas as suas forças vitais, fez todas as preces possíveis. Estava tão concentrada em seu estado de êxtase espiritual que mal percebia a jovem na cama se remexer e formar palavras incoerentes. Como um sopro fantasmagórico. As velas se apagaram, tirando a idosa de seu transe, ela sentou-se em uma banqueta, deixando os ramos caírem ao chão.

– Zelão... por favor... – as palavras saiam fracas, quase inexistentes da boca da jovem.

Mas o suficiente para chegarem aos ouvidos de Mãe Benta, que suspirou, deixando uma lágrima silenciosa cair de seus olhos.

– Amor... amor... amor... – ela dizia. – eu senti...

– Dona Juliana? – chamou baixinho. – Fala co eu. Ocê tá mê ouvindo?

– Zelão...

– Ocê quer falar com o Zelão? – segurou o pulso da jovem, que agora estava mais forte.

Ela não respondeu.

–x-

Juliana estava envolta por branco. Os pés dela estavam frios enquanto ela rodopiava. Ela podia sentir o tecido fino e macio envolver seu corpo, e girar e girar junto ao seus movimentos. Não havia nada na cabeça dela além do branco, dos flocos de neve, dos pés frios. E ao fundo, em meio a névoa, ela começou a ver os caules secos das árvores, a mata branca. Correu. Correu na direção das árvores retorcidas. Parou. Repentinamente. Pois avistou uma figura negra no meio do claro. Sorriu. E chamou por ele. A voz dela formando ecos. Deu mais alguns passos em direção ao homem de capa negra. Mas a cada passo, mais longe ele ficava. Tudo voltou a ficar branco novamente.

–x-

PREVIEW do próximo capítulo:

"Partiu o coração do capataz em ver que sua Juliana continuava imóvel sobre aquela cama, ele não sabia mais até quando iria aguentar ver essa imagem triste diante de seus olhos. Ele depositou os pedaços de madeira próximo ao fogareiro. Em seguida, voltou para o quarto da mãe, onde estava Serelepe, próximo a cama, os olhinhos tristes em direção a professorinha.

– Zelão... – começou a idosa.

– Que foi, mea mãe? "


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