Rosaceae escrita por Nina


Capítulo 5
Anjos que queimam ao sol


Notas iniciais do capítulo

Olá seres perfeitamente normais mentalmente!
Eu não tenho muito para falar hoje nas notas... O que eu posso dizer? Eu escrevi o capítulo escutando três músicas: "Muse - Time Is Running Out", "Fall Out Boy - The Phoenix" e "Fall Out Boy - Just One Yesterday". Se quiserem escutar, super recomendo. Enfim, era isso.

E o capítulo começa em 3, 2, 1...



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Haviam se passado três dias desde o encontro com Peter. Eu me sentia tão mal, tão acabada, tão culpada. Não saí de casa durante os três dias, não saí de meu quarto. Eu estava definhando, cavando minha própria sepultura.

E o telefone não parava de tocar a vibrar. Era ele na maioria das vezes, e ele se sentia culpado, dizia nas mensagens que queria me encontrar novamente, que iriamos ser apenas amigos. Eu sabia que era mentira. Na metade do segundo dia comecei a ignorar as chamas e apagar todas as mensagens do celular e das redes sociais sem ao menos lê-las.

Eu não queria me levantar, eu não queria continuar a viver. Era engraçado, eu não poderia começar a gostar de ninguém, mas acabei começando a gostar do primeiro cara que apareceu em minha frente.

Hilário isso, a vida é hilária. Até parece que ela disse quando eu nasci: “essa menina vai sofrer por amor quando menos puder amar” e então ela deve ter rido. Vida, sua desgraçada.

Minha mãe vinha brigando comigo desde o segundo dia, mas ela não entendia. Ninguém entendia. Por que todos podiam se casar apaixonados e eu não? Isso era injusto. Injusto comigo, injusto com Peter e injusto com quem quer que eu casasse.

O telefone parou de tocar depois de um tempo. Talvez ele tivesse desistido. Melhor assim.

Horas se passaram até que novamente escurecesse e eu ficasse sozinha enrolada nas cobertas. Até Bob tinha desistido de me animar, eu estava horrível. Me encolhi ainda mais de baixo das cobertas e comecei a chorar.

Sabe o porquê de o choro e a dor aparecerem no escuro? Sabe o por que as pessoas fazem as coisas erradas no escuro? Sabe por que todos se escondem no escuro? O porquê de elas terem medo do escuro? É porque é lá que se escondem os monstros e medos da humanidade. Era por isso que eu preferia me encolher no escuro. Eu era um monstro.

Era madrugada quando o meu celular vibrou novamente. Ele não poderia estar ainda tentando falar comigo, ele tinha que ter desistido.

Eu resolvi ver o que a mensagem dizia e para a minha surpresa não era de Peter. Ela simplesmente dizia “Atenda esse telefone ou eu vou invadir a sua casa. Com amor, Jack”. Ele devia estar louco. O que ele queria comigo? Eu não tinha nada a dizer, para ninguém!

E então o telefone do lado de minha cama tocou. Se eu não atendesse corria o risco de ele realmente invadir minha casa, e esse não era um risco que eu gostaria de enfrentar. Atendi o telefone na metade do segundo toque.

– Olá rosa da noite. Tem passado bem? – Ele devia estar mesmo brincando. Eu, bem?

– Oi Jack. O que você quer?

– Apenas te agradecer por partir o coração de meu irmão em apenas um dia. Isso foi um recorde.

– Vá se danar. Você nem ao menos havia me dito seu nome aquele dia! Você não tem o direito de me ligar e agradecer por nada.

– O que foi rosa da noite? Ficou chateada pelo que fez? Está se remoendo desde aquele dia? Está trancada dentro de seu quarto?

– Não me chame assim! – Eu gritei com ele. – E se eu estiver? Você nunca se sentiu mal por alguma coisa? Eu acabei com as esperanças de seu irmão. Eu sou um poço de desespero e desgraça, eu sugo toda a energia positiva, a luz e a felicidade dos outros! Você não entende.

– Eu não entendo? Não entendo? – Agora era ele que gritava comigo. – Rosie, eu sou a desgraça da família, todos me odeiam. Eu só faço coisa errada! Eu fui colocado para fora de casa. Meu pai chegou um dia e simplesmente me disse que eu deveria arrumar minhas coisas e nunca mais voltar. Rosie, a sua vida ainda é boa comparada a minha. E você diz que eu não entendo? Eu entendo muito. Eu disse que éramos parecidos e não foi só no quesito revolucionário de ser. Nossas vidas são umas drogas. Eu fiquei feliz quando soube que meu irmão se interessou por você, realmente achei que vocês se dariam bem... – Ele parou e respirou fundo. – E o que você fez Rosie? Pegou o amor dele e o rejeitou.

– Eu precisava fazer aquilo. – Eu quase sussurro.

– Precisava? Rosie, você nunca fez o que te mandaram. Imaginei que não seria agora que faria.

– Você não acha que sabe de mais sobre mim e nós nos conhecemos a apenas alguns dias?

– Rosie, eu te conheço a mais tempo do que você imagina. – O que? O que ele estava dizendo? Não pode ser verdade! Esse cara é maluco, é impossível nos conhecermos a mais tempo, eu nunca vi ele! – Pense em mim como seu anjo da guarda. Sempre ao seu lado e sempre invisível, até o momento que não precisava mais ficar na escuridão.

– E porque você resolveu sair da escuridão justo agora? – Pergunto ainda incrédula com o que ele disse.

– Porque por algumas pessoas vale a pena queimar ao sol.

E com isso me calei. Eu sei, era estranho. Ele era estranho, eu era estranha. Mas a sensação de familiaridade era tanta... Tudo era tão simples ao falar com ele, tudo era real e ao mesmo tempo irreal. Tudo era tão natural.

– Jack? – E é a partir desse momento que a maior besteira da minha vida podia começar.

– Sim?

– Onde você está?

– Onde eu estou? Estou onde sempre estive. Próximo àqueles que precisam. – Tá, essa resposta não ajudava muito.

– Eu preciso de você. É sério, onde você está? Preciso te encontrar.

– Me encontre no banco que fica no fim do jardim. Aquele perto do lago. Estarei lá te esperando.

Ótimo, ele sabia até onde queria me encontrar dentro da minha própria casa. Ótimo. Provavelmente era verdade sua ameaça de invadir minha casa. Ótimo. E eu estava com medo de encontrar uma cara no meio da madrugada? Não. Eu estava ansiosa, eu queria vê-lo. E isso era maior do que minha razão, era maior do que a dor que estava sentindo antes. O porquê disso ninguém sabia.

Coloquei minhas pantufas e um roupão por cima da camisola que estava vestindo. Eu precisava sair do meu quarto, mas não poderia usar a porta, iria fazer muito barulho esperar a passagem secreta se abrir. Outro meio de sair: pela sacada.

Talvez eu estivesse um pouco louca, mas pular de uma altura de cinco metros não era uma das coisas que estavam na minha lista de coisas que queria fazer antes de morrer. Eu tinha duas opções: ou eu pulava no arbusto e me enxia de folhas e levaria uma bronca de minha mãe no dia seguinte, ou eu pulava na piscina e molhava tudo e ficava encharcada.

Minha escolha era o arbusto. Ele iria amortecer minha queda e poderia ser plantado novamente. A água era um recurso muito caro e estava acabando no planeta. Pronto, a escolha certa era o arbusto.

E eu pulei em cima dele. Senti meu tornozelo torcer quando atingiu o arbusto esmagado pelo meu peso e cai no chão. A dor era lancinante e percorria todo o meu corpo desde a ponta de meu dedo até a minha cabeça. Mas a dor precisava ser ignorada, eu não podia gritar e acordar todo mundo.

Me levantei fazendo o maior silêncio possível e me apoiei em outro dos arbustos que tinha no jardim. Eu já tinha torcido meu pé várias outras vezes, não era agora que iria me deixar vencer por uma dorzinha.

Tentei caminhar e a dor foi terrível. Comecei a ver pontos pretos em minha frente. Talvez eu não tivesse somente torcido meu pé, talvez eu tivesse feito algo pior. Mas eu precisava chegar até o banco e encontrar Jack, então fui dando um passo de cada vez e tentando ignorar a dor que sentia.

Eu provavelmente levei mais de dez minutos para chegar até o banco pois Jack parecia impaciente e andava de um lado para o outro. Quando ele me viu mancando veio me ajudar e me carregou até o banco.

– O que você fez? Tropeçou em uma raiz? – Me perguntou com seu sarcasmo típico.

– Na verdade eu pulei da minha sacada, isso deve dar uns cinco metros.

E então o sorriso sarcástico sumiu de seu rosto. Ele ficou me encarando e medindo as minhas palavras para ver se aquilo era verdade.

– Você pulou mesmo da sua sacada? – Ele ainda estava duvidando!

– Sim, eu pulei.

– Você é louca.

– Pensei que já soubesse disso.

E então ele sentou ao meu lado e puxou minhas pernas para cima de seu colo e começou a apertar meu tornozelo.

– O que você está fazendo? Você está louco? Ai! – E nesse momento empurrei ele e para longe de minhas pernas. E comecei a gritar e brigar com ele, novamente. – Você acha que pode ficar pegando na perna de garotas indefesas desse jeito?

– Eu só estava vendo como estava seu tornozelo e eu tenho más notícias, ele está quebrado.

– Obrigado por me dizer isso, eu não tinha percebido. Eu achei que ele estava totalmente normal!

– Por que você sempre grita comigo? – Agora era ele quem gritava. – Por que não pode ser um simples “é bom te ver também Jack” ou “obrigado por ver meu tornozelo Jack”?

– Eu não sei! Talvez porque você me irrita o tempo todo com esse seu jeito.

– Não é como se você também fosse a melhor pessoa do mundo.

Eu sabia que não era a melhor pessoa do mundo e isso era ruim, mas escutar ele falando aquilo? Isso era pior, bem pior. Acho que eu queria ao menos uma vez me dar bem com alguma pessoa que tivesse alguma coisa parecida comigo. E ele tinha a sua vida horrível.

– Olha, me desculpe. – Digo a ele. – Eu só estou mal e o meu jeito de ser é horrível também.

– Sinto muito também. – Ele estendeu uma de suas mãos. – Amigos?

– Mal nos conhecemos, mas... – Aperto sua mão. – Amigos estranhos que brigam durante a madrugada. – Paro de falar durante um tempo e penso um pouco no que falar. – Jack, posso te perguntar uma coisa?

– Claro.

– Por que você foi expulso de casa?

– Este é um assunto que não merece ser discutido hoje. Irá estragar a noite.

– E mais uma vez segredos. Mas tudo bem, não preciso ficar sabendo se sua desgraça hoje. Eu posso esperar.

– É, mas o seu tornozelo não. Rosie, acho que você tem que voltar para casa e colocar gelo nesse seu pé e esperar alguém acordar e leva-la até o hospital. – Ele começou a se levantar e eu o puxei de volta.

– Não, por favor. Você é a única pessoa com a qual falo nos últimos quatro dias. Não vá em bora agora. Por favor.

– Mas e o seu tornozelo?

– Vai continuar quebrado de qualquer maneira. E não é como se a dor fosse insuportável, é só não mexe-lo.

Ele passou a mão em seus cabelos e voltou a sentar ao meu lado. Parecia preocupado mas tentou esconder isto de mim.

– Uma pena que você tenha que ficar com o gesso durante um tempo. Vou sentir falta dessas suas belas pernas.

– Ei! – E eu empurrei ele. – Pare de olhar para minhas pernas seu pervertido.

– Eu não consigo, é mais forte do que você imagina. – Começamos a rir. – Estava com saudades do seu sorriso.

– Como você pode estar com saudades de algo que nunca viu?

– Rosie, minha rosa da noite, eu já te disse que te conheço a mais tempo do que imagina.

– Então me explique como você me conhece a mais tempo do que eu me lembro. Pelo que eu saiba não tenho nenhuma doença neurodegenerativa que faça com que perca minhas lembranças.

– A primeira vez que te vi foi na sua festa de aniversário de cinco anos. Você estava com aquele vestido rosa pink, lembra-se?

– É claro que me lembro, foi a maior festa que meu avô fez para mim. Ele tinha convidado todos os nobres e todas as crianças que eu conhecia. Foi o melhor aniversário que tive.

– Eu fui um dos nobres convidados, ou uma das crianças convidadas. Eu lembro de ter ficado o tempo todo ao lado de meu pai pois achava que aquelas crianças eram muito chatas. E fiquei lá até você aparecer e brigar comigo e me desafiar a te achar na floresta.

– Tá, você me conheceu quando eu era criança. Mas isso não explica o fato de saber tudo da minha vida e ser um chato. – Revirei os olhos.

– Se você deixar eu terminar de contar, talvez entenda. – E ele fez uma careta e eu retribuí com outra. Quantos anos nós tínhamos? Oito? – Eu me senti horrível naquela hora. Eu tinha que vencer você no seu próprio jogo, então o babaca aqui foi atrás de você na floresta que tinha na propriedade. E você foi se esconder em cima da árvore mais alta que tinha na propriedade. Eu passei horas te procurando até o momento em que desisti e sentei no chão encostado em uma árvore. E adivinhe que árvore era?

– A árvore onde eu estava.

– Sim. Agora deixe eu terminar. – Grosso como sempre. – Então eu comecei a escutar sua risada e descobri onde estava. Você disse que eu era muito ruim e muito lento, mas que tinha sido divertido brincar comigo. Então você escorregou do galho em que estava e caiu.

– Deixe-me adivinhar. Você me salvou.

– Sim e não. Você caiu em cima de mim, então eu só servi para amortecer a sua queda. Então estávamos eu e você caídos no chão, você em cima de mim me olhando com um sorriso.

– Pelo amor de Deus, me diga que não nos beijamos.

– É claro que não fizemos isso. Éramos crianças e inocentes. Você só pegou suas mãozinhas e colocou em meu rosto e disse “obrigada por me salvar anjo da guarda”. E então você voltou saltitante para a festa.

– Eu não acredito que fui eu que te dei esse apelido. Credo. Minha criatividade era horrível.

– Era horrível. Mas anjos da guarda protegem seus guardados, e eu era o seu.

– Então você virou um maníaco que persegue pessoas por culpa minha?

– Que AJUDA as pessoas. E sim, a culpa é sua.

– Essa é a pior explicação que já recebi em minha vida. Não faz sentido nenhum!

– As coisas não precisam ter sentido para serem reais. – Ele pegou seu celular e olhou o horário. Eram quatro e cinquenta e três. – Está tarde Rosie, é bom você voltar antes que seu avô acorde e surte.

– Não. Eu não quero voltar.

– Não quer, mas precisa. Eu venho te ver outras vezes, é só deixar a porta aberta de seu quarto ou de sua sacada.

– Claro, porque a primeira coisa que eu quero é um maníaco no meu quarto.

– Eu sei que você quer. Se não quisesse não teria pulado de sua sacada. – Ele levantou e me pegou no colo. – Eu realmente amo essas pernas. Uma pena ter que carrega-las e ter que olhar o caminho.

– Jack, chega de falar de minhas pernas. E eu posso muito bem andar sozinha.

– Claro que pode. E também tem asas para voar. Agora cale a boca e me escute. – Eu iria calar a boca? Mas é claro que não! Tá, talvez dessa vez eu ficasse quieta para ver o que ele iria me falar. – Não diga a ninguém que me viu aqui. Ninguém pode saber que voltei para Londres. E você deve inventar alguma história de como quebrou seu tornozelo. Quando puder me ligue que irei vir vê-la. Meu número está salvo em seu celular, procure que você irá achar.

Ele se aproximou da porta e tirou algo de seu bolso. Era uma chave a qual ele colocou na fechadura e abriu a porta. Que maravilha, ele tinha a chave de casa.

Ele me carregou até a sala e me colocou no sofá, depois foi até a cozinha e pegou uma compressa de gelo para pôr em meu tornozelo. Ele se abaixou e aproximou-se de mim.

– Lembre-se que eu sempre estarei por perto quando precisar. – Ele beijou minha testa e saiu fechando a porta sem fazer um barulho sequer.

O dia seguinte seria longo e eu provavelmente levaria uma bronca de minha mãe por quebrar meu pé e seu arbusto. Mas não importava, agora eu estava bem melhor do que horas antes. Adormeci pensando eu qual nome ele havia colocado na lista de contatos. Com certeza deveria ter ser algo parecido com anjo.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler!
Saudações e até logo.
Marina



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