O Herdeiro do Titã escrita por Rodrigo Kira


Capítulo 28
Quebrar um Nariz é uma Boa Compensação (P.O.V: Lucy Honesun)


Notas iniciais do capítulo

E temos maaaaais um capítulo para vocês! É isso aí! Não vou ficar enrolando pra vocês, então... Nos vemos lá embaixo! Hahahaha! Aproveitem a leitura!



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Meus amigos tentaram me convencer de que a morte de David não havia sido culpa minha.

Eu lhes expliquei tudo o que havia acontecido no salão onde estava o Núcleo de Cronos. Contei até os mínimos detalhes sobre como o ar parecia diferente, a decisão que David tomou, os seus sentimentos e as últimas palavras. E quando eu atirei.

O silêncio que se formou entre nós era tão pesado como se estivéssemos segurando o Monumento Washington nos ombros (e, pelas histórias que ouvi por aí, Percy e Annabeth tinham certa experiência com esse tipo de sensação desagradável). Era como se tudo estivesse congelado ao nosso redor.

Me perguntei se era assim que David se sentia quando usava o seu poder (e pensar nisso só me fez sentir pior). O único som que eu ouvia eram os soluços chorosos de Annabeth e Piper, que escondiam os rostos nos ombros dos namorados. Mesmo abafados, eram a única coisa que consegui ouvir... Como se todo o resto da cidade tivesse se transformado em cinema mudo.

E apesar do Sol a pino sobre nós, fazendo o obelisco brilhar com um reflexo branco intenso, sentia calafrios, esperando as represálias dos meus amigos.

“Como pôde fazer isso?”, ”Você matou o David!”, “Sua arqueira de quinta!”, “Nunca fez nada e quando faz, mata um de nós!”. Fechei os olhos com força e baixei o rosto, esperando as palavras duras choverem sobre mim. Mas o que veio acabou sendo pior. Bem pior.

— Não foi culpa sua, Lucy. – disse Percy. – David sabia o que estava fazendo.

— Ele se sacrificou pela gente... Pelo mundo inteiro. – completou Jason.

— Eu morri uma vez e voltei. – falou Leo, tentando melhorar a situação. – Talvez David tenha dado um jeito também!

— David não tinha um remédio mágico que cura até a morte. – retrucou Piper, entre soluços.

— Ele fez... Fez o que tinha que ser feito... – Annabeth disse em voz baixa.

Estavam todos querendo fazer eu me sentir melhor, como se a morte de David não fosse minha responsabilidade. Mas era eu que estava com ele naquela sala. Eu que aceitei aquele plano suicida de David. E fui eu que disparei a flecha. A culpa era minha por ele estar morto agora.

*****

A volta para o Acampamento Meio-Sangue foi silenciosa e triste, ainda que tivéssemos a suposta “boa sorte” de não encontrar nenhum monstro ou inimigo no caminho. Eron, que de começo se negara a vir conosco, acabou sendo convencido já que ele não tinha para onde voltar e poderia ficar no acampamento até decidir o que fazer.

Ainda assim, mesmo sendo, provavelmente, um dos retornos mais seguros para o Acampamento Meio-Sangue de toda a história, foi com toda a certeza a pior de todas elas também. Nem parecia que tínhamos ficado fora por míseros sete dias, o cansaço e tristeza que nos assolaram eram tão intensos que senti como se tivéssemos deixado Long Island por sete longos meses. Não estávamos no ânimo que deveria marcar uma “missão bem-sucedida”... Se bem que pelas histórias que outros campistas contam, dificilmente se volta com esse tipo de sentimento.

Deixamos Washington de trem, da mesma forma que saímos de Nova York. Dessa vez, Leo foi voando com Festus para dar cobertura e garantir que nenhum homem-cachorro maluco ou qualquer outra coisa tentasse nos atacar (Eron jurara pelo Estige que não teríamos problemas, mas ainda assim não nos permitimos baixar totalmente a guarda).

Quando menos percebi, já tínhamos feito toda a viagem de volta para a Colina Meio-Sangue. Leo nos esperava na base do pequeno morro, Festus brilhando ao seu lado. Ele deve ter dado um polimento no dragão de bronze, esperando que voltássemos.

Lentamente subimos até o Pinheiro de Thalia, onde o Velocino de Ouro reluzia aos raios do Sol. O drakon enrolado na base da árvore nos avistou e soltou uma baforada de fumaça. Acho que podia ser interpretado como um “bem-vindos”, embora um “sumam da minha frente” não estivesse totalmente fora de cogitação. Passamos o pinheiro e começamos a descer a colina pelo outro lado. Alguns campistas nos avistaram e, sem nem parar pra pensar, começaram a exclamar animados, comemorando e vindo em nossa direção. Nenhum “vocês estão bem?”, ou “o que aconteceu?”, muito menos “onde está o David?”.

A repentina falta de empatia dos demais campistas estava fazendo meu sangue ferver. Eu muito provavelmente iria dar um chute onde dói mais nos garotos e dar uma destruída nas garotas, se não fosse por Quíron e Nico que vinham ao nosso encontro, passando pela multidão de adolescentes eufóricos.

— Chega, chega! Voltem aos seus afazeres! – disse o centauro, falando para todos, mas sem tirar os olhos de nosso grupo. Diferente dos demais, ele pareceu ter notado a falta de David e a presença de Eron. – Venham até a Casa Grande.

*****

Estávamos todos à volta da mesa de pingue-pongue que fazia vez para uma mesa de reuniões. Apenas eu e Eron não éramos líderes de chalé, mas todos explicamos nossas partes da história. Falar sobre a morte de David foi sem dúvida a parte mais difícil.

— E foi assim que voltamos ao acampamento. – Percy fechou a história.

— E como Eron não pode ficar aqui, pensei que ele poderia ir para o Acampamento Júpiter, viver em Nova Roma e ajudar nos treinamentos com lanças. – explicou Jason. – Ele é muito bom nisso.

Por alguns instantes, ninguém disse uma palavra.

De repente, Clarisse se fez ouvir. Ela tinha que azedar ainda mais a situação.

— Então, o cria de titã morreu? Que maravilha, uma ameaça a menos! Mandou bem, Honesun! E não teremos que ficar com esse magrelo amiguinho dele também!

E foi o estopim. Me levantei subitamente, uma raiva descontrolada crescendo dentro de mim. Annabeth e Piper tiveram que me segurar pra que eu não pulasse sobre a mesa de pingue-pongue pra estrangular Clarisse.

— Cale essa maldita boca! – exclamei para ela. – Você não sabe de nada! David era nosso amigo! Ele se sacrificou pra salvar todos nós, incluindo esse seu traseiro gordo e fedorento!

— Lucy, acalme-se! – falou Piper. Acho que ela estava tentando usar seu charme pra me convencer, mas de nada adiantou. Eu sabia que ela estava tão furiosa quanto eu. – Não vale a pena!

— Eu não disse nenhuma mentira! Aquela cria de titã era uma ameaça e se morreu então o Hades que o carregue! Divirta-se no Tártaro! – Clarisse retrucou, mas tinha ido longe demais.

Jason, Nico e Percy se levantaram cada um sacando sua própria espada. O ar ficou mais quente, e me perguntei se Leo não estava para incendiar as próprias mãos. Os irmãos Stoll também não estavam com as melhores caras, e aposto que estavam armados com alguma arapuca que deixaria a filha de Ares com um cheiro muito ruim ou amarrada como um animal de rodeio. A força de Piper e Annabeth em meus braços pareceu ter afrouxado um pouco, como se estivessem pensando em estrangular Clarisse também..

— É melhor parar por aí. – falou Percy com voz fria. – Antes que a minha espada escorregue no seu pescoço.

Pra quem já viu o filme "Capitão América: Guerra Civil", aquela sala estava dez vezes mais tensa. Como sempre acontece nessas horas, Quíron fez a ordem voltar, batendo seu casco com força no chão.

— Basta! Esta reunião está encerrada. – ele ordenou, embora eu jurasse que ele queria dar um grande sermão em Clarisse.

Saí da Casa Grande com Percy e os outros, nenhum de nós muito satisfeito com o rumo que a conversa tomou no fim.

— Honesun! – ouvi a voz de Clarisse me chamando da varanda da Casa Grande e a encarei por cima do ombro com a expressão mais fechada que consegui fazer.

— O que é que você quer?

— Melhor que não se engane! Aquele cara era um monstro e você fez muito bem em dar cabo dele!

Me perguntei se não teria sido melhor jogar Clarisse no núcleo de Cronos e transformá-la em pó. Voltei para junto de meus amigos antes que eu fizesse alguma loucura.

*****

Já fazia uma semana desde que tínhamos voltado ao Acampamento. Uma semana desde que completamos a missão. Uma semana desde a morte de David. Pensamos em fazer um rito funerário para ele, mas não tínhamos mortalhas com o símbolo de Cronos, sem contar que os deuses não iriam gostar nada.

Então, na noite anterior pegamos o cesto de dormir que David teria usado quando era bebê e ateamos fogo. Poucas pessoas compareceram. Além do nosso grupo, Nico, Ress (o sátiro que havia trazido David ao Acampamento), os irmãos Stoll e Quíron foram prestar suas homenagens. Ajudei meu irmão, Will Solace, com a parte das cerimônias e mal consegui dormir à noite.

Estava me sentindo péssima quando saí do Chalé de Apolo para tomar o café da manhã. Foi a pior semana de toda a minha vida, eu estava o tempo todo cabisbaixa, de luto, sem vontade de fazer qualquer coisa. Percy e os outros tentavam me animar ou se distrair com outras coisas, mas nenhum deles conseguia muita coisa, não importando o que fosse.

Percy e Jason já não conseguiam se focar no treinamento. Os projetos arquitetônicos de Annabeth mais pareciam desenhos de uma criança de três anos. As geringonças e dispositivos malucos de Leo se desmontavam sozinhos. Piper ficava o tempo todo olhando para sua adaga, como se buscasse uma resposta no metal polido. Nico e Will passavam bastante tempo juntos, mas nenhum deles andava muito entusiasmado.

Decidi andar até o campo de arquearia. Quem sabe eu não conseguia praticar um pouco e levantar meu ânimo?

Claro que não. Minha mira estava péssima e eu estava acertando muito mais a grama do que os anéis externos dos alvos. Que frustrante! Não conseguia fazer absolutamente nada sem me sentir mal pela morte de David!

— Ainda de luto pela cria de titã? – falou a voz de Clarisse atrás de mim. Tudo o que eu precisava para melhorar meu dia.

— Cale a boca e suma daqui. – falei entredentes.

— Pelos deuses, Honesun! Você matou aquela coisa e nos livrou de um grande problema! Deveria estar feliz por essa vitória!

Olhei rapidamente ao redor. Nenhum de nossos amigos estava por perto pra me impedir ou tirar aquela chance de mim. Sorri internamente e me virei subitamente para Clarisse, dando um soco direto no nariz dela e fazendo-a cair de traseiro no chão. Acho que senti um tlec no momento do impacto. Ainda estava frustrada e triste. Mas quebrar o nariz de Clarisse me fez sentir um pouco melhor.

— Quer falar mais alguma coisa? – perguntei, olhando seu rosto, sujo de sangue que escorria das narinas. – Posso te bater mais vezes, se quiser.

Por um momento, Clarisse pareceu confusa, e depois furiosa. Ela se levantou de um salto, pronta para me dar uma surra. A essa altura também, alguns curiosos já se juntavam ao nosso redor.

Eu sabia que ia dar nisso, mas não me arrependi nem um pouco. Fechei os olhos esperando os primeiros golpes de Clarisse. Mas uma voz nos interrompeu.

— Ei! Que diabos está acontecendo aqui?

Abri os olhos, sem acreditar no que ouvi. Não tinha como ser... Tinha? Virei lentamente a cabeça na direção da voz, assim como todos os demais campistas. Ali, descendo a Colina Meio-Sangue a passos mancos, um garoto alto se aproximava. O cabelo castanho estava todo sujo e bagunçado. Os olhos verdes escuros mostravam a exaustão do corpo, que parecia não ver um bom banho havia dias. O braço esquerdo estava coberto de sangue seco e era amparado pelo direito, como se ele temesse que o braço caísse do ombro.

Ele estava pior do que nunca. Mesmo assim, minha boca ficou levemente escancarada pela surpresa e acho que nunca me senti tão aliviada e feliz.

— Oi, pessoal. Sentiram saudades? – perguntou com aquele meio-sorriso idiota.

David estava vivo.


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Notas finais do capítulo

E o que acharam dessa reviravolta, hein? Bem, estou sem ideias para dizer aqui, então só vou pedir aqueles comentários e esperar vocês no próximo capítulo! =D



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