The hanging tree escrita por Carolina Rondelli, Felipe Valentim


Capítulo 4
When I told you to run so we'd both be free


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal, esse capítulo vai ser como uma explicação. Lemos a "fuga" de Jacques e Lucy pela perspectiva dessa última, mas os detalhes e preparativos da fuga não foram contados, e serão agora.
Espero que gostem!



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POV Autor

Jacques não conseguira tirar a ideia da fuga de sua cabeça desde a conversa com Lucy. O pescador já não podia suportar todo aquele desrespeito que ele e sua amada sofriam.

Por trabalhar no porto, Jacques estava acostumado com comentários sobre todos os habitantes da vila, mas, desde a morte dos pais, o assunto principal na cidade era Lucy. Pessoas chamavam-na de prostituta, e alguns até insinuavam que ela teria organizado o assassinato dos pais. Mas Jacques não se incomodava apenas com Lucy. Garth, seu patrão, vivia explorando-o e o último ocorrido havia sido a gota d'agua.

Jacques saiu da casa de Lucy logo após o jantar, para não gerar suspeitas no restante dos moradores da vila, com destino ao porto. Fugir pelo mar era a solução perfeita para o casal, mas ele precisava de um barco e sabia a pessoa ideal para o serviço.

— Stevan! — gritou Jacques ao chegar ao porto. O segundo pescador se assustou, mas respondeu o amigo.

— Jacques, o que faz aqui a essa hora? — Stevan sempre ficava até tarde no porto no intuito de separar uma parte da leva de peixes do dia para venda na feira da cidade.

— Eu vim vê-lo. Preciso de ajuda.

— Se estiver ao meu alcance — disse Stevan com um sorriso cínico estampado no rosto.

— Eu sei que você sempre fica aqui à noite separando os peixes e eu queria saber se você pode fazer algo por mim.

— Desembucha logo, Jack.

— Eu preciso de um barco. Um que comporte bem duas pessoas. Quero fugir.

O sorriso desapareceu do rosto de Stevan.

— Não sei, cara. Uma coisa é acobertar seu relacionamento com a Lucy, mas roubar um barco para te fazer fugir... Posso ser morto por isso.

— Então venha com a gente! Você pode nos levar para longe desse lugar. Eu me contento em ficar em uma vila próxima e estabelecer uma vida nova ao lado de Lucy. Você pode ficar com o barco e viajar para onde quiser.

Stevan fez uma pausa, como se estivesse pensando na possibilidade.

— Dia 23 de Dezembro.

— Como?

— O dia antes da noite de Natal é um dia morto. Todos na vila vão estar ocupados com os preparativos para a ceia de Natal e ninguém vai ver vocês fugindo.

— Isso é um sim?

— Quando eu te neguei um favor?

— Você é demais! — disse Jacques abraçando o amigo.

— Tá bom cara, chega — disse Stevan afastando Jacques. — Guarde todo esse amor para Lucy.

Stevan nem precisava pedir. Jacques mal podia esperar para ficar junto de Lucy e poder amá-la sem preocupações.

— Eu tenho um mapa em casa e tenho meios para conseguir uma bússola — prosseguiu Stevan. — Vá para casa, eu vou providenciar os detalhes. Se você for pego no porto a essa hora, podem começar a desconfiar. Além disso, eu preciso terminar de pegar esses peixes antes que alguém veja.

— Vou contar o plano para Lucy. Cara, não sei como te agradecer.

— Não me faça ser morto — disse Stevan, voltando a pegar os peixes e colocando-os na sacola de pesca.

Jacques abriu um sorriso e correu para casa de Lucy. Ao chegar em seu destino, bateu várias vezes na porta para acordar a menina.

— Lucy, Lucy, sou eu, abra — Jacques meio gritava, meio sussurrava na porta da casa dela.

Depois de alguns minutos a porta se abriu, revelando uma garota com os cabelos negros bagunçados e uma camisola branca, simples. Mas, mesmo com a cara de sono e os diversos bocejos seguidos, Lucy ainda era linda aos olhos de Jacques.

— Um dia antes da noite de Natal. Grave essa data — disse ele.

— Explique, por favor — disse ela em meio a um bocejo.

— É quando seremos livres.

***

Jacques terminou de explicar o plano para Lucy e, finalmente, partiu para sua casa.

O relógio marcava 3h. Jacques precisava acordar às 6h para trabalhar, mas isso não mais importava. No momento tudo o que ele pensava era em fugir, e esse foi seu último pensamento antes de cair no sono.

O mês se passou rapidamente e, para alívio do pescador, o grande dia chegou. Jacques foi à casa de Lucy logo cedo e foi recebido por um longo abraço.

— É hoje — ele disse, com um ar nervoso e eufórico.

— É hoje — Lucy concordou.

Eles se afastaram com um beijo e Lucy deixou a curiosidade falar mais alto:

— E então, qual é o plano?

— Quem estava ansioso demais? — Jacques brincou.

— Cale a boca e conte logo.

— Preste bastante atenção — ele pegou nas mãos dela —, a cidade vai estar vazia, mas não impede que você aviste uma ou duas pessoas indo ao poço ou coisa assim. Preciso que tome muito cuidado para não chamar atenção ou ser seguida. Se for, volte para cá e saia depois. Entendeu?

— Entendi.

— Nossas vidas dependem da nossa discrição.

— Eu sei, não torne mais difícil do que já é.

— Só estou preocupado com você.

— Se preocupe um pouco consigo mesmo.

Jacques sabia que Lucy tinha razão. Ele estava sempre colocando ela à frente de tudo, mas dessa vez era necessário que ele também cuidasse de si mesmo. O que eles estavam prestes a fazer poderia lhes dar uma vida nova... ou tirar-lhes a que tinham.

Após alguns poucos minutos conversando, Jacques partiu para o porto. Um barco branco estava atracado no cais, assim como Stevan havia lhe dito. Jacques foi até o barco para depositar a bolsa de pesca que continha as suas roupas e as de Lucy. Mas, antes de pudesse terminar de organizar suas coisas, alguém o interrompeu.

— Hey! O que você está fazendo aí? — gritou um guarda que se aproximava.

— E-eu não...

— Eu sei que você está tentando fugir, Jacques.

— Como você sabe meu nome? — disse Jacques, confuso.

— Fui avisado do seu plano — o guarda apontou um revólver calibre 38 para o pescador. — Venha comigo de boa vontade e nós permitiremos um julgamento justo para você.

Jacques estava apavorado, mas não podia demonstrar medo. Após um minuto de hesitação, ele resolveu obedecer ao guarda e foi andando lentamente com as mãos sobre a cabeça na sua direção. Se ele obedecesse ao guarda, talvez Lucy ainda pudesse fugir e viver uma vida digna.

— Isso, agora me leve até a casa de Lucy, ela também vai precisar ser julgada.

Um estalo se deu na mente de Jacques. Uma traição de grande porte havia ocorrido, e ele sabia muito bem quem estava por trás disso. Jacques não podia deixar Lucy ser incriminada junto com ele.

O pescador golpeou o punho do guarda, que deixou a arma cair. Jacques acertou um soco no homem, fazendo-o cair no chão. O guarda acertou um chute no rosto de Jacques e ganhou tempo para pegar a arma de volta. Jacques estava novamente na mira do 38, mas dessa vez apenas centímetros os separavam.

— Acabou para você, pescador — disse o guarda enquanto ficava de pé. — Se entregue ou morra aqui mesmo, como indigente.

Jacques, em um momento de coragem, empurrou a mão do guarda e a arma disparou. O pescador ficou sem saber ao certo o que havia acontecido e o guarda, que havia sido atingido por um tiro na barriga, caiu no mar.

— Não! — gritou Jacques. Ele tentou salvar o homem, mas a correnteza estava o levando para longe e o fato do guarda estar desmaiado não ajudava.

A arma havia ficado nas mãos de Jacques. Instintivamente, o pescador jogou o revólver no mar para se perder para sempre junto ao corpo do guarda. O pescador ficou parado olhando para o horizonte, em estado de choque, até se lembrar de que Lucy estava a caminho. Jacques correu de volta para a casa dela, mas foi surpreendido por Garth que estava indo para o porto. Ele se escondeu atrás de um arbusto próximo ao porto. Olhando para outra direção ele pôde ver Lucy, que também estava indo para o mesmo destino. Ele precisava impedir. A garota foi a primeira a chegar ao porto e foi possível ver o seu rosto surpreso por não encontrar Jacques.

— O que está fazendo aí, menina? — disse Garth quando viu Lucy em pé sozinha no porto.

Lucy ficou apavorada. Ele podia ser forte, mas não estava preparada para tal situação.

— Está com aquele ladrão, não é? Vamos, responda! — gritou o velho.

Jacques precisava fazer alguma coisa para ajuda-la. Ele encontrou um pedaço de madeira que estava próximo e caminhou na direção de Garth. Seus olhos se encontraram com o de Lucy e ele fez um sinal com a mão livre pedindo para que ela não se alarmasse.

— Eu só estava... hã... observando, senhor — a menina respondeu tentando ganhar tempo, mas antes que Garth pudesse retrucar, Jacques o acertou na cabeça.

— Ah, meu Deus, você quer me matar do coração? — Lucy disse. — Não falou que ele estaria em casa?

— Foi o que supus, mas ele sabia do plano de roubar o barco, aquele traidor nojento!

— O quê? Do que está falando?

— Não importa, o barco é aquele — ele apontou para um barco branco, não muito grande, mas que comportava duas pessoas tranquilamente.

Jacques entrou no barco e ergueu as mãos para que Lucy se juntasse a ele. Mas, quando a garota estava se aproximando, as mãos gordas de Garth a puxaram para chão.

Lucy ficou com alguns ferimentos leves, mas isso não importou para Jacques. O pescador saltou do barco sobre Garth e o desferiu diversos socos. O homem, apesar de receber a maioria dos golpes, não sofreu muitos danos. O velho era grande e gordo, o que o fazia ser mais forte, mas a maioria dos seus ataques falhavam, pois Jacques era bem mais rápido e conseguia escapar facilmente. Mas, apesar de ser esguio, Garth conseguiu segurar o pescador e o lançar no mar. O velho avançou novamente na direção de Lucy, e Jacques estava muito longe para impedir.

Garth começou a enforcar a garota. Jacques nadou desesperadamente para a terra firme. Ele podia ver a vida se esvaindo de Lucy. O pescador subiu no cais e pegou uma pedra do tamanho de uma maçã que estava no chão. Ele atingiu a têmpora do velho com a pedra e ele caiu, já morto, no chão. Lucy caiu junto com ele, mas por sorte ela ainda estava bem.

A garota se encolheu, assustada. Jacques colocou os dedos no pescoço de Garth para confirmar que ele estava morto. Ao ter a resposta, balançou a cabeça negativamente para Lucy.

Jacques pôde ver as lágrimas escorrendo pelo rosto da menina. Mas ele não podia culpa-la, era o segundo homem que ele havia matado em um dia. A vontade que o pescador tinha era de se esconder e surtar, mas ele precisava se mostrar forte. Jacques secou as lágrimas do rosto de Lucy, levemente.

— Se eu não tivesse feito aquilo, ele teria matado você, me desculpe. Eu não poderia deixar ele te machucar.

Lucy tremia.

— Volte para casa — ele continuou. — Vou limpar isso, quero que limpe os ferimentos e se recomponha, ainda vamos fugir hoje. Certo, Lucy?

Ela ainda não conseguia responder.

— Lucy? Fale comigo.

— C-certo — ela sussurrou.

— Encontre-me à meia-noite, não aqui, na árvore-forca. É perto o suficiente, e caso descubram sobre isso, não terá ido direto para o local do crime.

Lucy apenas acenou com a cabeça.

— Meia-noite, na árvore-forca, tome o mesmo cuidado. Eu te amo.

Lucy saiu em disparada para a sua casa, e Jacques só podia torcer para que ela não se deparasse com ninguém. O pescador olhou para o corpo sem vida de seu antigo patrão. Ele não podia deixa-lo ali, era muito perigoso. Jacques arrastou o corpo com dificuldade até uma área de floresta próxima ao porto. Ele podia ser um monstro, mas ainda assim merecia um funeral digno, jogá-lo ao mar era muita crueldade. Jacques buscou uma pá e começou a cavar um buraco para colocar o velho. Assim que ele terminou o "enterro", uma voz conhecida o surpreendeu.

— Isso era o Garth? — Stevan perguntou ironicamente. — Ou será que era o guarda?

— Traidor desgraçado! — Jacques se alterou. — Por sua causa eu me tornei um assassino.

— Desculpe-me por isso. Mas o velho me prometeu um cargo de confiança ao seu lado e eu não resisti.

— Você é a escória, Stevan!

— Você é um tolo! Você achou mesmo que eu iria fugir com vocês? De que eu viveria?

— Nós iríamos achar algo. Eu também não tenho nada garantido, mas nem por isso resolvi continuar vivendo essa vida miserável.

— Sua vida é miserável, Jack! Eu tenho os meus clientes para quem vendo os peixes que pegava de Garth e agora com essa promoção tudo iria melhorar. Eu sou sozinho nesse mundo, você mal ou bem ainda tem aquela sua ninfetinha...

— Lave sua boca para falar de Lucy!

— Eu estou mentindo? Todo mundo sabe que não é só você que tem acesso àquela ali.

— Cale a boca! — Jacques avançou para cima de Stevan e o atingiu no rosto com a pá.

— Isso, Jacques, me mate também! Os guardas estão chegando, é só questão de tempo até que você esteja naquele colar de corda.

Jacques tentou atingir Stevan novamente, mas o outro foi mais rápido e conseguiu tirar a pá da mão do pescador.

— Você me subestima demais — disse Stevan que acertou um soco no rosto de Jacques.

Os dois homens se atracaram e eles se viram novamente no porto. Jacques estava caído, tateando o chão ao seu redor em busca de algo que pudesse ser usado como arma. Stevan avançou ainda de pé e desferiu diversos chutes no pescador. Jacques pegou uma pedra e a lançou em Stevan, ganhando tempo para se levantar. Mas, infelizmente, seu oponente também conseguiu uma arma. Stevan pegou uma rede de pesca que estava próxima e a usou para estrangular Jacques.

O pescador começou a sentir sua respiração enfraquecer e sabia que se não fizesse nada, morreria em poucos segundos. Jacques colocou o peso de seu estrangulador sobre os ombros e o lançou ao mar. Com a própria rede de pesca, Jacques envolveu Stevan e o segurou até que ele parasse de se debater. Ele havia matado mais um homem.

Mas, diferente das outras vezes, ele não sentiu culpa ou remorso. Dessa vez Jacques matou porque quis e não por não ter opção.

Ele ainda estava absorto em seus pensamentos quando a tropa chegou. Uma dúzia de guardas armados chegaram apontando seus revólveres para Jacques.

— Parado aí! — gritou o guarda que liderava a tropa. — Você vai ser levado para forca sob acusação de fuga e assassinato de três homens.

Jacques ergueu as mãos e foi andando na direção dos guardas que o prenderam.

— Vocês disseram que eu matei três homens, que provas você tem?

— Boa tentativa, parceiro, mas nós tínhamos um homem infiltrado no porto. O homem que você acabou de matar!

A ambição de um homem estava levando Jacques à morte e lhe tirando o que mais importava: Lucy. O homem seguiu os guardas sem reagir, até porque estava em uma enorme desvantagem.

Já estava bem tarde quando eles chegaram à árvore forca. O povo já havia sido avisado da execução e os arredores da árvore estavam lotados. Jacques foi levado para a árvore e obrigado a subir na banqueta. Em seu pescoço foi colocado o colar de corda e o evento começou de fato.

— Este homem, Jacques Hall, é o assassino de três homens — o guarda que levou Jacques começou — Um guarda do cais, seu colega de trabalho pescador e seu chefe Senhor Garth.

A multidão gritava "assassino" e "morra" diversas vezes.

— Segundo as nossas leis, ele deve ser executado no exato momento da captura. O povo deseja que seja assim?

— Sim! — gritou a multidão. Mais pessoas gritaram "morra".

Jacques estava à beira da morte, mas uma imagem o consolou. Enfim ele havia encontrado Lucy em meio à multidão. A menina estava com os olhos marejados. Jacques precisava de um sinal para avisar a ela que o barco ainda estava atracado e que ela ainda podia fugir. Quando seus olhos finalmente se encontraram, Jacques desenhou uma palavra com os lábios:

"Fuja", ou se junte à mim, pensou só para si.

— Última chance, senhor Hall — insistiu o homem — Quem o ajudou a praticar tais hediondos crimes?

— Ninguém, senhor — Jacques ainda fixava os olhos em Lucy. Se existia um jeito perfeito de morrer, era podendo olhar para ela.

E foi então que aconteceu. O guarda, desistindo de arrancar uma resposta de Jacques, chutou a banqueta e a corda se esticou. Eu te amo, era tudo que podia pensar, e torcer para que Lucy não duvidasse nunca disso. De uma forma ou de outra, ele estava livre, muito mais do que Lucy poderia ser no momento.

A vida se esvaiu de seu corpo, mas seus olhos permaneceram na garota que desviou os olhos para o relógio. Eles deviam estar fugindo à essa altura.

Era meia-noite, na árvore forca.


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Notas finais do capítulo

E aí, gente? Acham que a Lucy vai fugir sem o Jacques? Já que a música não nos conta isso claramente, podemos ter ideias. Se ela fugir, para onde? Será que ela pode ser feliz sem ele? Comentem!
O último capítulo de "The hanging tree" vai ser postado na véspera de Natal, dia 24/14, no mesmo dia que aconteceu nosso prólogo, se vocês se lembram.
Até lá, xoxo!



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