O dia amanheceu frio, nublado e chuvoso. Um clima bastante peculiar para um dia tão importante como esse. Miranda (e creio que todas as garotas do ano dela) estava com uma forte e atacada crise que eu, carinhosamente, apelidei como TPB ou, se você preferir: Tensão Pré Baile. É quase como uma TPM, mas muito, muito mais dramática. Apesar de não poder julga-la, até mesmo porque eu tive o mesmo tipo de crise a alguns anos atrás, minha irmã está virada no avesso. Definitivamente essa não é a Miranda.
QUEM É VOCÊ E O QUE FEZ COM A MINHA BAIXINHA? EM?

O tempo está passando rápido como uma águia e tenho certeza de que que cortaram algumas horas do dia. Ouço passinhos rápidos pequenos pelo corredor e em questão de segundos Miranda já está arrancando as dobradiças da minha porta de forma hilária. Algumas mechas de seu cabelo estavam enroladas em bobs e as que não estavam podiam facilmente abrigar uma família de ratazanas mutantes. Ela segurava dois vestidos totalmente iguais como se sua vida dependesse daquilo.

– Qual eu uso Kay?

–Hããn, o... vermelho?

–Vermelho? Onde você está vendo vermelho aqui?? Isso – Ela apontou para uma caneta que estava parada solitariamente em cima de minha escrivaninha. – é vermelho. Isso – ela levantou um dos vestidos. – é carmim e isso – Miranda apontou para o vestido que restava – é cornalina.

–Pra mim continuam vermelhos.

–Arre Katie, você continua não tendo estilo.

–E isso continua não mudando nada na minha vida.

–Você não tem jeito mesmo. Mas olha aqui, qual tom você acha que combina mais com a minha pele?

–O vermelho. – Respondi e caí na risada, fazendo Miranda sair do quarto batendo os pés.

Ouvi counting stars começar a tocar, mas, infelizmente, não era uma trilha sonora da minha vida. Na realidade, era o toque do meu celular abafado pelo travesseiro. Atravessei o deserto do Saara em uma corrida de obstáculos até chegar na minha cama, ou simplesmente andei da escrivaninha até ela. Pelo jeito quem está me ligando é bem paciente. A música já estava pela metade quando eu finalmente consegui atender o celular, sem nem ao menos checar o contato.

–Já está pronta pro seu sequestro Kay? – me perguntou a voz que, mesmo em uma tentativa biruta de ser disfarçada, consegui reconhecer.

–É Solace, você falhou novamente.

–Ah, qual é? Será que eu nunca vou conseguir te passar um trote?

–Tenho quase certeza de que um delinquente não me chamaria de Kay.

–Okay, okay. Vou tentar ser mais original da próxima.

–Você é mesmo o menino mais rebelde que já conheci... só que ao contrário.

–Certo, bela zueira, mas e aí? Já se aprontou pro Baile?

– Eu estou de pijamas e meu cabelo está parecendo um ninho de vespas arquitetas. Isso conta como um estou pronta?

–Definitivamente não. – e logo depois dessa resposta veio a segunda melhor gargalhada da face da terra.

A vontade de chorar me invadiu e meus olhos se encheram de lágrimas espessas quando lembrei da primeira melhor gargalhada. Uma gargalhada travessa e sincera. A gargalhada dele... simplesmente a gargalhada de Travis Sttol.

–Kay? Ainda tá aí?

Eu havia me esquecido que Will ainda estava na linha.

–Ah, sim, sim, claro... ainda estou aqui. – soltei um suspiro longo e demorado.

–Você ainda não conseguiu né? Ainda não esqueceu ele? Fale a verdade pra mim. Você sabe que além de sermos namorados ainda somos bons amigos.

–Namorados?

–Namorados, ficantes, sei lá o que, mas não mude de assunto, você ouviu a minha pergunta.

A incrível capacidade de Will de continuar com uma voz extremamente calma e aconchegante mesmo nervoso me irritava profundamente.

–Não! Não consegui Will. Era isso que você queria? Queria mesmo que eu lembrasse de tudo? Queria que eu chorasse como estou chorando agora? É, você conseguiu.

Vários segundos de silencio simplesmente me ensurdeceram.

–Kay, não me leve a mal. Eu só estou irritado comigo mesmo por ter falhado na minha missão de te ajudar. Nunca conseguiria ficar bravo com você, muito menos queria te fazer chorar ou se lembrar de momentos ruins. Eu só... fui idiota de achar que conseguiria.

A esse ponto já quase não ouvia a voz de Will, ele falava em sussurros embargados pela beira do choro.

–Eu não vou mentir pra você Will, eu nunca faria isso. Mas, eu não acho viável te iludir com ideias falsas criadas pela minha imaginação. É melhor pararmos de fingir que podemos ter alguma relação avançada, sabemos que somos só bom amigos.

–Olha, não é isso que eu sinto Kay, do fundo do meu coração. Eu sou como um viciado em café que só sobrevive por isso, é você é a minha Starbucks e mesmo que você já esteja ocupada com outros cliente, acho que posso me contentar com um café um pouco demorado e menos atencioso não é mesmo?

–Você acabou de me comparar com uma cafeteria, mas gostei da metáfora... e então? Amigos?

–Amigos...

–E o baile? Ainda vai comigo?

–Para mim a definição de casal ainda é uma pessoa de sexo feminino e uma de sexo masculino juntos. isso não nos obriga a ter uma relação.

–Okay dicionário ambulante.

–Ei, não sou tão CDF como você.

Caímos na risada juntos, afinal eu e ele éramos assim. Eu e ele. Ele eu. Iguais. E a sua alma gêmea sempre é um amigo não é mesmo?

–Will, agora que já nos resolvemos, posso te fazer uma pergunta?

–Sempre...

–Você é o T.S não é?

–Hããn... acho que não. O que é isso mesmo?

–Eu. Não. Acredito.

–Eu ainda estou boiando.

–Primeiro: Você não conhece o maior e melhor grafiteiro de todo o Brooklyn e segundo: se não é você, só resta uma pessoa aqui que tenha essas iniciais. E eu me recuso a acreditar que seja ela.

–Eer, Will começa com T?

–Shhiu. Deixa a minha imaginação fértil em paz okay?

–Okay. – E novamente a segunda melhor gargalha da face da terra invadiu os meus ouvidos.