Eram 13:40 quando acordei.

Fui até o banheiro, para lavar o rosto e levei um susto. Meu reflexo no espelho... eu estava muito diferente.
Minha pele agora era muito mais pálida que o normal. As partes rosadas das minhas bochechas haviam desaparecido se tornando quase totalmente brancas, e eu estava com olheiras muito escuras sob os olhos. Mas o que mais me impressionou foram meus olhos. Tinham um olhar vazio e quase doentio. Nem acreditei que aquela era eu.
Saí do chalé atordoada. Cheguei no campo de esgrima e Jhon, Mark e Nico estavam lá. Além de outros três que eu não conhecia, dois garotos e uma garota.

O que parecia o mais velho era mais ou menos da minha altura, era robusto e tinha cabelos castanho-escuros. Seus olhos foram o que mais me chamou a atenção, o direito era verde-claro e o esquerdo tinha um tom alaranjado. Parecia um cara sério, e obviamente não gostava da luz do sol, porque era quase tão pálido quanto Nico. Mas seu tom de pele era de uma cor mais rosada.

O outro garoto era mais baixo e tinha a pele amendoada, e era meio magricela. O cabelo rebelde não era curto, mas também não batia nos ombros. Os olhos eram castanho-escuros e parecia ser um pouco tímido.

A garota era também da minha altura, era esbelta e sua pele era clara. Os cabelos eram escuros e sedosos, amarrados num rabo de cavalo trançado. E tinha olhos negros intensos.

–Oi, pessoal -falei, ainda encarando de relance aqueles três.

–Ela chegou -anunciou Jhon -Essa aqui é a Lia, pessoal. Lia, esses são Paul -ele fez um gesto para o garoto menor -Andy -depois para a garota -e Erick -e, por fim, o mais velho.

–Então você é a Lia -falou Andy, sorrindo -Andy Schade, filha de Nêmesis.

–Eu sou Paul Hammer... -ele subitamente ficou muito interessado nos próprios pés -cheguei ontem...

–Erick Mohan –ele disse, ríspido –Filho de Hécate.

–Lia Hunter... –eu disse.

–A garota de Hades –completou Erick.

–Mais ou menos isso –sorri.

–Tá, gente –Mark disse, agitado –Menos conversa, mais treino!

–Sem essa, garoto-espada –disse Erick –Vamos checar nossas habilidades individuais hoje.

–Aaah não –Mark reclamou –Nem vem. Você quer treinar essa droga porque quer se mostrar porque é filho de Hécate.

–O sujo falando do mal lavado –resmungou Andy –Você quer lutar porque é filho de Ares e se dá bem com armas.

Mark bufou e fechou a cara.

–Ei –manifestou-se Paul –Por que não lutamos mesmo? Não sei nem quem é meu pai ainda. Acho que me dou melhor se lutar com espadas.

–Viram só? –Mark puxou Paul pela camisa e afagou seu cabelo –Tenham dó do Paul. O que acham pessoal? –ele se virou para nós.

–Por mim, não tem problema –disse Andy –Me dou bem nos dois.

–Nem eu –disse Jhon.

–Idem –falou Nico.

–Sei lá... tanto faz –apoiei os meninos.

–Saco –murmurou Erick –Beleza, mas depois quero treinar meus poderes.

–Tá, tá... senta aí e espera –zombou Mark.

–Não enche, Armstrong –Erick tirou um baralho do bolso, num tom de ameaça.

–Hmph –Mark bufou –Não tenho medo de você, Mohan.

–Mas deveria –Erick o encarou, sombrio, tirando uma das cartas do baralho, a carta tinha um tigre siberiano rugindo.

–Já deu, meninos –disse Andy, encarando os dois –Treinar, né?

–Ok –Erick guardou o baralho.

Todos preparamos nossas espadas. Paul era o único que tinha um machado (bem grande, por sinal), Erick e Andy tinham espadas personalizadas, Erick poderia transformar sua espada em qualquer tipo de arma que ele quisesse. Andy tinha uma espada escura, muito parecida com a de Nico e a minha.

–Ei, Andy –sussurrei, ficando do lado dela –De que é feita a sua espada?

–Ferro estígio –ela deu de ombros –Por que?

–Pensava que só os filhos de Hades usassem o ferro estígio.

–Bem, não exatamente –ela passou o peso de um pé pro outro –As crianças de Hades podem usar o ferro estígio pra finalidades mais específicas. Eu só uso essa aqui porquê minha mãe me deu.

–Ei meninas –chamou Mark - , que tal vocês conversarem depois do treinamento, hm?

–Cala a boca, Mark –Andy se irritou.

–Tanto faz –ele resmungou –Lia contra Erick.

–Ué, mas já? –falei.

Erick se levantou e preparou sua espada. Fiquei de frente para ele e Mark deu o sinal para começarmos.
Erick era muito rápido, avançou na minha direção como um raio e bateu na minha espada com a dele. Minha espada voou para a direita, Erick apontou sua espada contra meu pescoço.

–Já acabou? -Andy arregalou os olhos.

–Pensava que ela era melhor que isso... –escutei a voz de Mark, quase sussurrando.

Rolei para a direita e peguei a espada antes de levantar. Ataquei Erick com as duas mãos na espada. Ele se desviou, como se fosse brincadeira de criança. Ataquei de novo, e ele se defendeu rapidamente. De repente, ele transformou a espada em uma lança enquanto atacava, cortando meu ombro antes que eu pudesse pensar em me defender.
Eu não ia perder daquele jeito. Pensei em chamar meus esqueletos, mas achei que seria muita injustiça.

Ataque as pernas dele, jovem ama. Escutei a voz de Serj ao meu lado.

–O que? –perguntei, não parando a luta.

–O que o que? –Erick pareceu confuso.

–Nada –falei, nossas armas estavam encostadas uma na outra, Erick e eu forçando o máximo que podíamos. Esperando que algum de nós cedesse.
A lança de Erick se transformou em um bastão grosso de bronze celestial e ficou mais difícil aguentar o peso da nova arma.

Recue. Escutei a voz de Serj novamente. Recue e desvie.

Dei alguns passos rápidos para trás e Erick atacou na lateral com o bastão. Me abaixei rapidamente, ouvindo as instruções de Serj.
O peso exagerado da arma de Erick foi uma vantagem para mim. Depois que me desviei, ele se retardou um pouco para parar o bastão e aproveitei para lhe atacar. Mas Erick foi mais rápido, transformou o bastão em espada de novo e em um movimento súbito, jogou minha espada para longe. A espada dele apontava para mim de novo.

Não tinha como pegá-la agora. Ergui as mãos, num gesto de rendição e ele saiu da posição de ataque. Pegou minha espada do chão e me devolveu.

–Erick venceu –anunciou Mark, fazendo careta, como se não gostasse do que havia falado.

–Você é boa –disse Erick, indo comigo até a arquibancada –Só precisa treinar mais e.... bom, dar um upgrade nos seus reflexos.

–Cara, você é incrível –falei, cobrindo o ferimento do ombro com a mão –Nem consegui encostar em você!

–Prática –ele deu de ombros –Muita prática. Tem ambrosia aí pra você?

–Tenho néctar, obrigada –falei, tirando um pequeno frasco do bolso e mostrando pra ele.

Bebi todo o conteúdo do frasco, e quando me dei conta, o ferimento tinha sumido.
A próxima luta foi Andy e Paul. Eles ficaram um de frente para o outro e depois que Mark deu o sinal, começaram a lutar.
Mark manejava muito bem o machado, mesmo parecendo ser duas vezes o peso dele. Ele girava a arma de uma mão para a outra e atacava de um jeito selvagem. O garoto era realmente bom.
Mas Andy com certeza tinha mais experiência, ela bloqueava, desviava e atacava com uma precisão de dar inveja. Ela mantinha o foco nos olhos de Paul, como se quisesse atordoá-lo só com o olhar. Não sei se ela conseguia fazer isso, mas não duvidei da ideia.

Depois de uns três minutos de queixo caído. Andy desarmou e derrubou Paul no chão e a luta acabou.

–Incrível –falei, enquanto Andy ajudava Paul a se levantar.

–Você não viu nada –disse Jhon –Deveria ver quando ela luta contra monstros. Aquilo é incrível.

–E então... –disse Mark –Jhon e Nico?

–É... pode ser –Nico se levantou e preparou a espada.

A luta dos dois não demorou muito. Nos primeiros dois minutos Nico conseguiu desarmar Jhon e a luta acabou.

–Ótimo –Erick ficava impaciente a cada minuto –Podemos treinar nossas habilidades agora?

–Eu vou treinar com a espada –anunciou Mark –Paul, vem comigo?

–É... acho que sim –ele seguiu Mark –Boa sorte aí, pessoal.

–Quem vocês acham que é o pai dele? –perguntei quando os dois se afastaram.

–Eu apostei Hefesto –falou Jhon, dando pulinhos para começar o aquecimento.

–Hefesto? Por que? –perguntou Andy.

–Sabe aquele machado que ele usou?

–O que tem? –ela começou a se alongar também.

–Ele que fez.

–Sério? –perguntei –Apoio o Jhon.

–Ele parece mesmo um filho de Hefesto –Nico olhou para Paul, alongando os braços.

–Vamos esperar pra ver, então –Erick embainhou a espada e ficou na frente de todos nós –Vamos começar.

–Eu e Lia começamos –disse Nico indo para o lado de Erick –Vem, Lia.

–Ok –eu o segui e ficamos um do lado do outro. Ele pôs a mão na frente do corpo e um esqueleto se levantou da terra.

–Sua vez, Lia –disse Erick.

Fechei os olhos e me imaginei estando atrás de Erick. As sombras me obedeceram e em menos de um minuto, eu estava onde queria. Depois pedi para as sombras me levarem para onde eu estava. Apareci lá e Andy bateu palmas

–Show! –disse ela, sorrindo.

–Minha vez –disse Erick, eu e Nico nos juntamos a Andy e Jhon.

Erick tirou um baralho do bolso e mostrou a carta que eu tinha visto antes, um tigre siberiano.
Ele colocou a carta no chão e fez um movimento com as duas mãos, um tigre de verdade pulou da carta, rugindo. Todos nos sobressaltamos com o susto. O tigre nos rondeou e foi até Erick, depois sentou a seu lado como um cachorro adestrado.

–Ele é uma ilusão? –perguntei.

–Venha aqui e descubra –Erick sorriu, malicioso.

Fui até o tigre e aproximei minha mão, e o animal rosnou. Puxei minha mão para perto do corpo institivamente. O tigre se levantou e me rondeou, fixando seus olhos amarelos em mim. Ele se encostou em mim e senti sua pelagem macia. Não era uma ilusão.

–Entendi –falei. Erick acenou e o tigre desapareceu. Ele pegou a carta do chão, limpou a areia dela e a juntou com o resto do baralho. Me perguntei o que mais teria naquelas cartas.

–Agora sou eu –disse Jhon, indo para o lado de Erick –Quem eu coloco pra dormir?

Todos nos entreolhamos. Andy apontou para o lado.

–O Mark –opinou ela, rindo.

–Beleza –Jhon sorriu e apontou para Mark, que estava do outro lado do campo de treinamento. Estava mostrando um golpe para Paul, quando de um minuto pro outro, simplesmente caiu de cara no chão. Paul levou um susto o olhou para nós com os olhos arregalados. Erick acenou para ele, como quem não quer nada. Todos começamos a rir.

–Você viu a cara dele? –Disse Andy para mim, rindo descontroladamente.

–Tipo: “Ai meu Zeus!” –Jhon imitou Paul, dando um pulo de susto, enquanto ria também.

–Vocês são loucos?! –gritou Paul, vindo até nós, com um sorriso relutante. Rimos ainda mais alto.