Assassin's Creed; Sombras escrita por P B Souza


Capítulo 22
Politicagem barata.


Notas iniciais do capítulo

A chegada de alguém inesperado! E não estou falando do templário.



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O Desgraça Holandesa entrava na baia de Guanabara com apenas metade de suas velas abertas, a outra metade estava ou presa, ou retirada embolada perto da ancora de proa. O casco tinha grande buracos, não grandes o bastante para atravessar a fuselagem interna, mas tinham rompido a madeira externa. O casco do Desgraça era composto por três complexas camadas, a externa de madeira simples como a de todos os navios, a do meio era uma chapa de aço, necessária devido ao motor, toda fundida com barras de aço entrelaçando—se por toda a estrutura garantindo uma rigidez extrema, e a cama interna de madeira fina, não tão resistente, mas nem precisava ser.

O embate com as duas Naus negreiras foi o único que teve, e só depois do embate, um dia e meio depois, que Ethan percebeu todos os danos sofridos.

— Kiã. — Chamou, o negro veio logo em seguida deixando a vassoura dentro de um balde após enxugar a poça d’água do convés. — Vou precisar providenciar algumas coisas antes de, bem, você descer em terra.

— Eu entendo senhor.

— O que você pretende fazer? — Dominik perguntou dando de ombros. — Só por curiosidade.

— Vou conversar com D. João, depois com Luís e ver o que eles podem fazer...

— D. João ainda não é Rei, Ethan, ele tem que seguir algumas regras. — Gus retorquiu.

— E o que querem que eu faça? Deixe os dois presos no navio?

Ethan olhou para o segundo homem negro no Desgraça, Xereu, ele estava lá na proa, rindo com outros homens, tinha se enturmado estranhamente rápido.

— Claro que não, eles revistarão o navio em breve!

— Vamos aportar primeiro. — Ethan concluiu por fim. — Por mais que eu não goste, na frente de todos você e Xereu serão meus escravos.

Ethan disse as palavras, e pareceu saírem da boca de outra pessoa, ele não acreditava ter dito aquilo.

— Estarão sempre comigo, me servindo e fazendo o que mandar, até conseguir os documentos de alforria. Então serão livres. De verdade. — Ethan disse com um aceno de cabeça para Kiã.

— Parece bom. — Foi a resposta de Kianyandaarwa.

Então o Desgraça Holandesa atracou, ancora desceu na água a tripulação desceu do navio, todos passaram por uma fiscalização pesada devido a segurança da corte, mas isso não durou muito, foi apenas o tempo do próprio D. João chegar e dizer que o Desgraça de Ethan era parte de sua frota original e tudo passou.

— Me encontre em duas horas no Largo do Paço.

E, no entanto, essas foram as únicas palavras de D. João para Ethan. O homem parecia mudado, em menos de dez dias sem se verem D. João parecia um estranho a ele.

Ethan terminou de ajeitar sua tripulação e seu navio, após deixar tudo em ordem chamou por Dominik, Gus e Kiã. Olhou para Kiã no processo, ele e Xereu tinham ficado no Desgraça, Xereu era outro negro só que sem família sem muitos amigos e sem ter onde ir.

— Me acompanhem. — Pediu ele, e os cinco foram para o tal Paço.

Não era difícil achar o lugar, todos falavam sobre.

— Já viu tantos negros? — Gus perguntou.

— É mais do que Salvador.

— Mais do que em alguns lugares da África. — Kiã disse com a voz grave e baixa sem querer chamar muita atenção.

Eles continuaram andando, as ruas do centro da cidade eram limpas e cheias de vida e aromas, lojas vendiam comida, outras vendiam flores, todos os negros ali usavam roupas em péssimo estado, mas ainda assim, melhores que as dos escravos em Salvador, era como se fossem apenas pobres. Alguns brancos em Suffolk se vestiam daquele jeito, não era uma situação tão vergonhosa de se olhar. Muito embora o preconceito ainda estivesse ali e visível, palpável.

Quando chegaram ao largo do paço o Príncipe Regente os aguardava junto de mais dez homens pelo menos. Continuaram conversando como se Ethan não estivesse ali, nem Ethan, nem Dominik Gus ou Kiã.

A conversa de D. João era acerca das casas e dos locais onde a corte habitaria, Ethan pode ouvir o nome Dom Marcos de Noronha, ou como era chamado pelos outros homens, o Vice-Rei.

Vinte e cinco minutos depois os homens se dispersavam.

Ethan olhou ao seu redor encarando o cenário, o mar de um lado com a água balançando lenta vinda de contramão nas paredes de rocha onde barcos balançavam aportados por cordas a uma profundidade de cinquenta centímetros de água até a areia fina encharcada. Então acima das paredes de rocha estava a praça com o chafariz logo a frente, o Largo do Paço virava então um campo de cimento sem nada além disto, sem árvores ou arbustos, apenas cimento formando um quadrado com o Dito Paço Do Vice-Rei. Ethan se confundia com aqueles nomes, a praça se chamava da mesma forma que a construção onde o Vice-Rei habitava. E agora, com D. João lá aquele lugar começaria a ser chamado Paço Real.

— De onde veio o escravo?

— Ele é livre. — Ethan assegurou em seguida após a pergunta de D. João.

— Maneire a língua. — Luís disse ao lado de D. João e de Ethan.

— Foi o que fez? Afundou os negreiros não foi?

— Sim. E tive meus motivos! — Foi a resposta de Ethan, D. João lançou um olhar para Kiã como se pudesse transformá-lo em pedra. — Não era um negreiro comum, trazia a bordo ilegalmente mais homens do que a lei de Vossa Majestade permiti e todos eles eram para pagar uma dívida, dívida a qual vim investigar.

— Então não veio aqui por minha companhia.

— Não parece me querer aqui de qualquer forma. — Ethan respondeu novamente rude, e Luís devolveu—lhe um olhar de repreensão.

— Ethan, sabe como aprecio sua presença e sua utilidade, mas tem sido piro que um animal selvagem nos últimos dias. Desde que chegamos, a única coisa que tem feito é causar problemas. Ontem mesmo uma escuna chegou com cartas, uma delas dizia que tu invadiste o quarto do Conde da Ponte e o atacou.

Ethan mordeu os lábios pensando em como foi imprudente em tardar sua viagem, claro que o Conde da Ponte tomaria suas previdências, claro que ele iria tratar de se vingar, de uma forma ou de outra, provavelmente pensou que D. João iria enfocar Ethan pelo ocorrido, tal coisa não aconteceu e nem aconteceria, disso ele sabia, mas também tinha conhecimento... algo tinha mudado.

— Foi como descobri o esquema de um homem, Alberto Baldocchi, ele e um outro que permanece oculto. Estes são os responsáveis por algo muito maior que não me cheira bom quão menos honesto.

— Sabe que deveria te pendurar por isso. E invés disto estou lhe dando o direito de uma moradia aqui, para ti e seus homens.

— Como? — Dominik perguntou, raramente ele ou Gus ou qualquer outro dirigia a palavra ao Príncipe Regente, então logo todos olharam para ele. — Vossa Majestade.

— Eu quem os convidei para cá, seria injusto mesmo depois de tudo que tens feito... — D. João lançou um olhar para Ethan. —... deixar que dormissem no navio a uma hora da terra todos os dias, ou no relento. Então já organizei os papeis com os responsáveis, a casa que desejarem, apenas a escolham e está casa será designada como P.R

— Como? — Ethan perguntou.

Luís quem respondeu.

— Para garantir que todos tenham onde ficar algumas moradias estão servindo de hospedagem para os membros da família Real. O P.R é de Príncipe Regente, todo edifício com essas iniciais estão disponíveis para serem ocupados pela comitiva de Nosso Príncipe.

Ethan flexionou o queixo várias vezes, então abriu a boca pronto para falar algo que, D. João novamente, não iria querer ver.

— E os moradores dessas casas? Suponho que exista algum, ou a cidade é abandonada?

Outro olhar indiscreto de Luís.

— Eles saem de bom grado e são realocados para outras casas. — Luís explicou. — São pessoas bondosas.

— Creio que sim, mas minha tripulação assim como eu acharemos uma estalagem onde a moeda pague por nossa estadia.

— Que seja. — D. João parecia ter chegado ao fim da conversa. — Preciso ir para o beija—mão, o primeiro aqui! Só não me faça mais nada estúpido Ethan. Se tornará impossível manter—te como um amigo quando seus atos são de um inimigo.

Assim a conversa acabou e eles permanecerão em silêncio por alguns instantes até que Dominik falasse.

— Vou ir atrás de algum lugar para dormir.

— Gus, Kiã. Voltem para a tripulação e os levem para a hospedagem, ou seja, lá o que Dominik encontrar. Dominik, encontre algo e então retorne até encontrar a tripulação. Nos encontraremos mais tarde.

Ethan disse se virando para a construção onde o Vice-Rei vivia, e onde o Príncipe Regente entrava junto de Luís para o Beija—mão, um costume português onde o Rei, no caso Príncipe, deixava que seus subordinados se ajoelhassem e lhe beijasse a mão, em troca o plebeu podia fazer um pedido, se o pedido fosse plausível e razoável o Rei, no caso Príncipe, até mesmo o realizava.

De uma porta lateral a do Paço—Real D. Pedro saia correndo com sua espada em punho.

Ethan sorriu para o garoto, tinha apenas dez anos e se mostrava habilidoso em combate, tão como em inteligência tendo capacidade de entender coisas que muitos daquela idade não entendiam.

— Bom dia Capitão. — Disse parando na frente de Ethan e olhando para cima com um sorriso bobo no rosto.

— Quer alguma coisa criança?

— Não... é, não. — Ele disse todo inseguro, então Ethan puxou a própria espada da bainha.

— Me mostre o que aprendeu.

A lamina de D. Pedro era seca e sem brilho, não possuía gume algum era apenas para treino e só era de ferro para que o garoto fortalecesse os braços finos.

Pedro ergueu sua lâmina encarando Ethan então correu dando pancadas contra a espada de Ethan, o som dos metais se chocando eram baixos para toda aquela praça, mas altos o bastante para fazer o ouvido deles arder.

Então de repente sem nenhum aviso após uma dúzia de golpes acima da cintura D. Pedro girou abaixando a lâmina sem gume, em seguida deslizou para o lado com um corte lateral e Ethan apressou—se em descer a própria espada para se defender e as laminas se chocaram desajeitadamente, D. Pedro desequilibrou—se é Ethan o segurou para que não caísse.

— Cuidado criança.

— Não me chame de criança.

— Nega sua idade?

— Não.

— Criança então. — Ethan retorquiu em um sorriso infantil.

— Sei de coisas que crianças não sabem. Fiz coisas que crianças não fazem. Não sou criança!

— E o que sabe de tão incrível? — Ethan perguntou, sabendo que na pergunta uma resposta inocente e desprovida de sigilo viria.

— Meu pai vai queimar os franceses por terem feito—nos fugir de casa.

— Você não deveria saber disso.

— Eu disse. — D. Pedro sorriu maliciosamente como uma criança que sabe mais que deveria saber, de uma criança que é mais esperta que a maioria. — E assim, não sou mais criança.

— Isso só te faz um curioso. — Ethan respondeu vendo a fúria no rosto de D. Pedro. — Seu pai falou mais alguma coisa sobre os franceses?

— Só que vai tirar eles da américa, para mostrar que continuamos fortes.

Ethan sorriu e se distanciou levantando a espada.

— Voltemos a treinar?

Continuaram ali por mais meia hora até que um dos tutores de D. Pedro veio nervoso mando—o retornar para dentro. Algumas dezenas de pessoas observavam eles. Ethan não olhou para elas enquanto embainhava a espada.

— Senhor, perdoe o garoto.

— Não há o que perdoar. — Ethan respondeu entrando no Paço—Real.

Continuou andando pelos corredores do Paço—Real até chegar em um salão amplo, um corredor alongado com vitrais para a praça no segundo andar, uma fila de mais de cinquenta pessoas estava à espera da oportunidade para beijar a mão de D. João.

Ethan se virou antes que D. João o notasse e se retirou continuando a vasculhar o edifício até encontrar uma sala onde dois guardas mantinham proteção, a sala que uma das empregadas tinha lhe dito ser o escritório privado de D. João onde os documentos e cartas provavelmente estariam sendo mantidos.

— Vossa Majestade pediu que pegasse documentos para...

— Ninguém entra. — O guarda respondeu e Ethan olhou para ambos.

— Então voltarei e direi para Vossa Majestade que mesmo atrasado devido ao Beija—mão ele precisará em pessoa vir até aqui só para descer lá em baixo novamente... é isso que querem?

Os guardas se entreolharam e então abriram espaço para Ethan.

— Não levarei muito.

Ethan empurrou a porta entrando no escritório, um pequeno escritório com três estantes, uma repleta de livros, outra de pergaminhos e folhas em branco com tinteiros e canetas—tinteiro com penas aos lados, a outra com caixas cheias de cartas e folhas escritas dividias em várias classes diferentes para pessoas diferentes.

Ethan não sabia o motivo, mas alguma coisa o empurrava para aquele lugar, com a certeza inerente que ali encontraria o que procurava, na mesa na quarta parede a direita da porta de entrada e da estante com cartas e pergaminhos já escritos Ethan viu uma carta escrita pela metade, rolou os olhos depressa pelas palavras.

— Guiana Francesa, tomada de todas as posses francesas como forma de fazer justiça por Lisboa... O que mais? — Ethan procurou por letras maiúsculas. — Ajuda de Jorge III?

Ethan deixou a carta tomando consciência que seu tempo era curto demais para enrolar, então pegou a peça metálica com o brasão de Portugal e em um envelope vazio derramou cera de vela azulada prensando a cera em seguida com a peça metálica deixando a marca do selo da casa real portuguesa.

Olhou em volta mais uma vez, agora para encontrar o que procurava. Teve um lampejo de esperança forçando a vista que escurecia em um azul marinho profundo onde sombras dançavam ao seu redor, nada se destacava. O que ele procurava? Se soubesse tinha certeza que seu alvo se destacaria... A letra... pensou subitamente se lembrando da carta para Alberto Baldocchi que nunca chegou a seu destino. “Como pediste para ocultar nomes, espero que minha caligrafia seja o bastante para comprovar que cumpri nosso acordo”.

Quando girou nos calcanhares viu na estante da parede da porta uma carta brilhante dourada entre todas as outras na sua visão escurecida quando aquele tipo de habilidade estranha se desfez como se nunca tivesse existido e ele agarrou a carta a enfiando entre o as roupas intimas e a pele, jogou as roupas por cima e pegou o envelope vazio que tinha selado com cera azulada, então parou na porta e respirou fundo se recompondo.

Saiu.

— Porque a demora?

— Estava selando a carta. — Ethan mostrou o envelope de cor branca com bege. — Ainda está quente se quiser ver.

— Vá logo.

Ethan se virou então deixando—os ali em sua ignorância completa.

Assim que se virou em outro corredor, este vazio, puxou a carta de sua virilha olhando para a caligrafia que de fato, servia para identificar o alvo. Os nomes eram claros, de e Para.

De; Albart Pryor

Para; D. João de Bragança.

Ethan enfiou a carta novamente entre a calça e a pele garantindo que ninguém a fosse ver. A letra era a mesma da carta que Wemusa carregava, o homem, o senhor de escravos da enorme “plantação escura” era Albart Pryor, o homem que tinha a tal dívida, que queria trocar milhares de negros e ouro por um relógio era Albart Pryor. Era ele que estava vindo rumo ao Rio de Janeiro para se encontrar com Baldocchi para trocarem o relógio, mas a troca não aconteceria mais... Ethan tinha destruído o plano de Pryor, afundado suas embarcações, matado Wemusa e seus homens, libertado os escravos e afundados milhares de Libras no oceano, se Ethan não tinha porque perseguir Pryor, Pryor por outro lado tinha muitos motivos para ir atrás de Ethan.

***

Diário de bordo, 14 de outubro de 1808: Há dois dias o Príncipe Regente assinou mais um alvará. Agora para abrir o que será chamado, Banco do Brasil. A ideia principal do Príncipe é diminuir os preços para importar dos ingleses e aumentar o de exportação, uma ideia infeliz e trágica depois da suspensão do alvará de 1785. Agora que indústrias podem ser criadas o Brasil tem a chance de crescer economicamente, isso não se dá porem devido a Grã—Bretanha que está passo à frente na corrida produzindo muito mais em suas enormes fábricas que os Brasil em suas pacatas fazendas, meu País de origem produz com maquinas e homens sendo pagos em dinheiro pelo trabalho, isso os faz produzir mais, aqui as coisas são diferentes, escravos trabalham pouco dando o máximo, produzem com menos qualidade e produzem mais lentamente, então o banco é aberto para diminuir os preços aqui, mas se quer saber minha opinião, Portugal jamais terá o mesmo poder que as terras de meu Rei, jamais, porque D. João se ajoelhou para o Rei Jorge, Portugal se fez vassalo da Grã—Bretanha e assim será para sempre, não importa se agora chamam Brasil.

Por fim, disse a D. João que isso colocaria o Brasil acima do nível das demais colônias, D. João debochou e falou que esta terra jamais será como as treze colônias, não posso dizer que concordo, mas após tudo que vi se torna difícil discordar.

O Príncipe também começou várias obras para melhorar sua vida aqui, desde um jardim botânico, a imprensa régia e planos para uma academia militar e uma biblioteca, além da reforma pelas ruas onde a rainha gosta de passear ao amanhecer.

A tripulação do Desgraça está alojada em uma única estalagem, ocupamos todos os quartos, e alguns quartos com três camas, não ficamos na parte mais nobre do Rio de Janeiro, o que não é problema algum já que depois que D. João deu falta da carta do tal Albart e eu disse que fui eu, já que negar era impossível com os guardas de sentinela como testemunhas de minha entrada no escritório, nosso relacionamento se tornou menor e pouco nos falamos. Acredito que D. João em breve não vai mais tolerar minhas ações, e eu não pretendo parar.

***

A porta foi escancarada no quarto e Ethan abaixou a caneta—tinteiro sobre a folha pela metade do seu diário de bordo. Era Xereu.

— Gus está chamando. — Xereu era atarracado, falava bem português e inglês e claro sua língua natal. — Navios chegaram hoje. Vão desembarcar.

Ethan olhou para o diário fechando—o e prendendo a caneta ao lado na capa, então enfiou—o na mochila e se levantou deixando aquilo para depois. Em seguida descia as escadas da estalagem prendendo a espada e a adaga junto da pistola e as facas de arremesso.

Minutos depois estavam ele Dominik Gus Xereu e Kiã junto da multidão, era como em Salvador, apenas tinha invertido o papel, agora outros desciam do navio, não Ethan.

— Olhem. — Ethan apontou para um navio, uma galé enorme, um Nau com vinte canhões de cada lado, um aríete cor de chumbo e bronze, velas brancas contornadas com fios dourados e uma elegante cruz vermelho—sangue bordada no centro revelando o que aquele navio era. — Albart Pryor.

— Templários. — Indagou Gus, a vista era bonita e assustadora. As pontes de madeira estendidas da borda do casco até as paredes de concreto do caís estavam vazias até então. — Um navio desses...

— Forte o bastante para destruir Rio de Janeiro, e olhem. — Dominik apontou para o convés onde dezenas de homens se preparavam para descer, então começaram a marchar.

Os templários do navio usavam capas vermelhas, coletes de couro com outro colete de escama de ferro por cima onde o vermelho—bordo predominava com uma cruz branca pintada, as calças eram cobertas pela extensão do colete que se apertava na cintura aberto na esquerda para a bainha da espada. Todos seguiam os mesmos padrões.

Assim que a maioria desceu eles formaram um amplo corredor fazendo paredes de guardas protegendo alguém que ainda nem mesmo tinha mostrado a cara. Então Ethan olhou para o navio, mais poucos homens desciam e estes estavam vestidos de outras formas, cada um com uma roupa diferente, todos pareciam nobres, mas um deles se destacava pelo uso de preto, cor que nenhum outro usava, este usava um sobretudo justo ao peito que se alargava após a cintura, não portava espada ou arma alguma, o cabelo penteado para trás, rosto limpo e sempre erguido, na cintura o cinto de couro negro tinha uma fita de tecido branco solta ao lado com a cruz vermelha bordada no tecido e uma de suas mãos possuía um anel dourado, que Ethan não podia ver, mas sabia bem o desenho que o anel trazia.

— Pryor. — Ethan olhou em volta, ainda não tinha recebido notícias sobre a chegada de Baldocchi.

— E ele o senhorio. — Kiã disse olhando para o homem, Ethan sabia que os escravos não tinham conhecimento do nome dele, mas já tinham o visto. — Ele.

Então no meio de toda a bagunça que o povo fazia Pryor e seus homens foram se deslocando, Ethan seguia—os junto de todos os outros, não era arriscado desde que permanecesse na multidão. Então alguém passou por Ethan e Xereu e enfiou um pedaço de papel entre a jaqueta e a camisa de Xereu.

O homem puxou o papel sem entender procurando por guardas que fossem dizer algo, que fosse prendê-lo ou algo assim. O medo era a única coisa que conhecia então a insegurança lhe tomou.

Ethan esticou o pescoço e assim que viu a assinatura no final pegou a folha das mãos de Xereu.

— Templários invadem o brasil aproveitando—se da corte. Ache o local e terá ajuda. E.E. — Ethan disse e Gus e Dominik entenderam na hora.

Na carta seguia um desenho feito à mão da baia de Guanabara com um X em um ponto. O que Elliott estava querendo dizer?

— Precisamos atravessar a baia. — Ethan respondeu se virando deixando Pryor seguir seu rumo. Independente de para onde fosse, Ethan não conseguiria segui-lo por muito tempo, nem com tantos guardas, eram no mínimo cem.

Então Ethan foi até o lugar marcado no mapa feito à mão. Convenceu os outros a ir sozinho, para que eles alertassem o resto da tripulação, que todos estivessem avisados dos templários, da invasão templária declarada.

Era começo de noite e o céu já tinha morrido no horizonte quando Ethan pulou do cavalo amarrando as rédeas no poste onde outros cavalos também estavam. Então olhou em volta sem ver o que procurava, o que procurava?

Estava na frente de uma casa qualquer em uma rua qualquer com meia dúzia de escravos a jogar um jogo que a ele era desconhecido. Dois brancos conversavam a distância.

— Sr. Cavendish! — Uma voz grossa e forçada chamou atrás de si, Ethan distinguiu—a no mesmo instante, todo aquele teatro se desfez por completo e ele abriu um sorriso.

— Paul. — Se virou olhando para o amigo... Como ele tinha mudado! — Quanto tempo!

Abriu os braços e Paul fez o mesmo em um abraço amigo.

— O que fazem aqui? E Elliott? Também veio? Deixaram a mansão desprotegida?

— Calma. — Paul disse levantando uma mão em sinal de paciência. — Elliott está morto. — As palavras mal saíram da boca de Paul e o rosto de Ethan se contorceu em fúria. — Causas naturais, morreu dormindo. A morte dele fragilizou muito a irmandade, quase desmoronamos quando os Leigham atacaram junto da guarda, não somos exatamente homens do Rei. E a casa foi passada para Mukonry Leigham. Aposto que se lembra dele!

— Sim. E a sucursal? A casa no campo que Joly e eu...

— Foi para onde fugimos. — Paul respondeu coçando a barba, uma densa barba de cinco centímetros crescia emaranhada de suas orelhas ao queixo estando raspada no bigode. — Então avisamos seu tio o Duque, e ele conversou com os Mestres da cúpula e a resposta deles foi para sair, largar Plymouth e ir para Exeter. Foi o que fizemos e chegando lá seu tio explicou a situação. Um templário foi mandado para cá pelos melhores do culto europeu, recuperar um fragmento, seu tio e os outros acham.

— Vi esse homem hoje. — Ethan respondeu, certo que era dele que Paul falava. — Albart Pryor.

— Isso. Elliott tinha dito ao seu tio que estava no Brasil junto do Rei, e seu pai e seu tio decidiram que seria bom se a gente viesse para cá formar uma equipe que você já conhecesse e que nós já conhecêssemos também, pouparia tempo, e sem você em Plymouth e depois sem o Elliott as coisas perderão o sentido.

— Quem veio?

— Poucos, a maioria morreu na empreitada dos Leigham, a outra metade ficou em Exeter, viemos em uma pequena nau de dez bocas de fogo. Quase fomos a pique no meio da viagem, se vier comigo...

Outras palavras não precisavam ser ditas.

Eles montaram nos cavalos e partiram. Por quase cinco horas quando já era noite e Ethan não fazia a menor ideia de onde estava que eles saíram da mata fechada para a areia e os cascos dos cavalos deixaram de fazer barulho. Os dois continuaram cavalgando.

Ethan podia ver que tinham contornado a Baia de Guanabara, não por completo, mas uma boa parte, então chegaram na boca de um rio e dentro deste rio uma nau não maior que um brigue os aguardava.

Dez homens e mulheres estavam no convés que tinha paredes baixas, alguém podia facilmente despencar na água com uma onda mais forte. Talvez tivesse ocorrido tal fato, até mesmo para uma embarcação daquele tamanho vinte braços eram poucos.

— Ali está. Rebeka, nossa Capitã.

Ethan desceu do cavalo olhando para Rebeka e Paolo lá em cima, eles sorriam e ele devolvia o mesmo sorriso, um sorriso bobo. Esticou os braços agarrando a escada de cordas jogadas pelo casco e subiu.

Abraçou alguns, apertou a mão de outros e foi apresentado a dois novos que ele antes não conhecia.

— Sinto muito por Elliott. — Foi a primeira coisa que Ethan falou depois das boas—vindas.

— Eu quem deveria dizer isso. — Retorquiu Rebeka educada como ele não se lembrava. — Sabe de algo que não sabemos?

— Seu templário, ele já chegou, e tem uma reunião com D. João amanhã de manhã. Ele veio buscar um relógio pelo qual pagou com dez mil escravos e mais um bocado de ouro.

— Deixaste isso acontecer? — Paolo indagou.

— Não, libertei a maioria dos escravos, dois se juntaram aos Assassinos e afundei as Naus Fragatas que foram mandadas, o homem que as capitaneava, Wemusa, era negro também.

— Alguns homens não possuem inteligência alguma! — Rebeka disse indo para trás então deixando—os.

— Ela foi buscar as cartas. — Paolo explicou.

— Essa banheira ainda flutua?

— Como uma pedra! — Paul respondeu abrindo um sorriso. — Porque?

— Vamos voltar para o centro da cidade, estou sob proteção de D. João, podemos desembarcar e em seguida vocês abandonam o navio... A não ser que este possua um valor sentimental.

— E se nos virem? Tivemos cautela para entramos no canal entre galés mercantes, as fragatas de bloqueio nem mesmo nos viram. E estamos estacionados aqui a quase um dia para ter certeza. O elemento...

— D. João sabe que sou um Assassino, e se ele conversar com este Albart e falar a ele sobre mim, o que não acho improvável, o templário saberá de nossa existência. Então não existe elemento surpresa. — Ethan concluiu dando de ombros. — Desçam as velas e soltem a ancora. O timoneiro?

— Rebeka tem sido. O nosso caiu no mar numa tempestade. — Ethan olhou as paredes daquele brigue ou daquela escuna, era um meio termo.

— Não me impressiona. — Disse subindo na proa e agarrando o timão. — Tem uma estalagem que está fechada para minha tripulação, tenho certeza que cabem mais dez.

E assim partiram, durante a noite mesmo, começo de madrugada. Ethan guiou a embarcação entre as outras todas, a baia de Guanabara estava com pelo menos duzentas embarcações, entre civis e de guerra diferentes navios se viam, Cutters, fragatas, naus, galés, escunas, brigues... eram muitos, mas nenhum Fluyt. Nenhum navio como o do Ethan, nenhum no mundo era como o navio de Ethan.

Finalmente chegaram na doca, Ethan chegou o mais perto que pode da terra, então desceram nos barcos e remarão por três minutos, depois andaram por mais duas horas até a estalagem, ao chegarem na porta Dominik os esperava, e seu rosto não era de contente, não até ver Rebeka, então a raiva competindo com a alegria lhe deixou sem palavras.

— O bilhete, o Duque de Devon os mandou, Elliott morreu.

— Como? — Dominik arregalou os olhos.

— Lá dentro. — Ethan completou então todos entraram e com um bolo de cenoura conversaram por horas, alguns que estavam dormindo tinham acordado, outros permaneceram dormindo, alguns foram dormir.

A reunião deles continuou até o sol nascer quando todos tinham acordado e Ethan apresentou um a um a todos. E então olhou para eles de cima de uma mesa pronto para fazer um discurso. Mas o sono lhe infligia e ele queria terminar logo com aquilo.

— Recebemos novos irmãos e irmãs hoje! E amanhã teremos muito o que fazer e descobrir. Vamos nos instalar aqui, achar uma casa nossa e criar nossa sucursal. A qual não abandonaremos mais! Todos nós, juntos, uma vez mais!

Todos gritarão e aplaudiram como de costume nessas ocasiões enquanto Ethan se virava e ia para as escadas se sentando nos degraus.

Rebeka foi até ele um minuto depois com três cartas nas mãos.

— Você cresceu.

— Continuo menor que você. — Ela respondeu sorrindo passando as cartas, cada uma com um selo diferente. — Seu pai, seu tio, seu mentor. Uma é pessoal, a outra é a missão, e a última é o adeus.

Ethan pegou as cartas nas mãos balançando—as então olhou para Rebeka, os dois trocaram olhares por alguns segundos, confusos demais para falar.

Aquela saudade de repente se transformou em algo que antes nunca tinha existido.

Os dois se aproximaram lentamente um do outro enquanto o som a volta silenciava em suas orelhas, e quando os lábios se tocaram tudo se calou por completo. Não foi um beijo de amor puro e intenso, Ethan podia jurar que não a amava como romeu há Julieta, mas gostava dela, e naquele instante o que sentia, o que sabia que ela também sentia era dor, vazio e necessidade de preencher esse vazio, era apenas isso, não era amor. Não dessa vez.

Então os lábios se separaram em um estalido úmido e os dois se olharam até que Rebeka se levanta—se ajeitando as roupas ficando vermelha.

— Vou te deixar ler as cartas.

Ela disse saindo em seguida.

Ethan continuou parado por um momento pensando em como nunca tinha pensado naquilo, nunca havia imaginado que Rebeka e ele pudessem um dia se beijar, e agora... lançou um olhar para Dominik que não olhava para ele, estava de lado, então é claro, tinha visto. Então desceu os olhos para as cartas tentando esquecer—se daquilo nesse momento, sabia que durante a noite pensaria em tudo isso e onde ele errou, o que fez de errado e se esse erro foi ter beijado Rebeka.

Rompeu o lacre da carta de seu tio, considerando—a mais importante de menor carga emocional, só de pensar em ler a carta de seu pai, ler o que aquele homem horrível tinha escrito para ele... Ethan não conseguia se lembrar do rosto dele, mais se lembrava dos dias na chuva treinando, dos exercícios e das pancadas, dos castigos... tinha até medo da carta de seu pai, mas estava disposto a ler as três.

— A cúpula dos mestres da Ordem Europeia detectou que Albart Pryor foi enviado junto de seu exército particular para a colônia portuguesa Brasil, durante a operação Assassina para impedir a partida de Albart Pryor informações templárias foram obtidas e os planos deles continuam os mesmos que os usados nas treze colônias. Aproveitar—se de uma colônia em surgimento para fundar uma nação baseada na Nova Ordem. Não podes permitir que Pryor obtenha sucesso em sua missão, também é de nosso conhecimento que os templários locais estão convictos da localização de uma peça do Éden na colônia Brasil. Se possível, encontre—a e avise a cúpula. Assim as devidas medidas serão tomadas.

Ethan observou a assinatura de seu tio com o carimbo do Duque de Devon ao lado o carimbo de Mestre Assassino. Rompeu o lacre da carta de Elliott e rolou os olhos nas letras caprichosas do homem que um dia fora seu Mentor. Cochichando para si mesmo, leu;

— Ethan, se lê esta carta é porque meu corpo descansa. Queria que soubesse meu último pedido, e que não voltasse em Plymouth, não por vingança. Aproveite seus dias e disfrute de sua vida como eu desfrutei da minha. Uma vez lhe disse, que a única coisa que sobraria dos Estover era a história e hoje certo que minha morte está a uma quinzena de mim ou menos a única coisa que não quero e não desejo é ser lembrado. Espero que o mundo esqueça os Estover, minha morte colocará fim a uma família milenar, e enfim, poderemos descansar em paz! Eu agradeço pelo tempo que passei com ti, me fizeste lembrar como a vida é especial, e que devemos vive-la no tempo que nos é dado, não querer mais tempo e por fim, descansar dessa jornada, descansar em paz sem ser lembrado. Assim que sua geração acabar os Estover serão esquecidos para sempre, perdidos na história. É assim que deve ser, destrua essa carta e qualquer outra coisa que possua meu nome ou de minha família, me permita descansar.

Ethan não soube o que pensar no final da carta, Elliott tinha mudado tanto desde sua partida. Era quase como se fosse outra pessoa. Rompeu o lacre da última carta e abriu o papel olhando a letra de seu pai pela primeira vez em anos, em quase seis anos.

— O que tem para mim pai. — Perguntou tomando coragem para começar a leitura. — O menino que fugiu de casa virou um homem longe de meus olhos e isso não fez dele menos digno de meu nome! Desejei esquecer—te por muito tempo meu filho, e jurei ter conseguido certa vez, pensei que tu eras um perdido e que jamais, jamais conseguiria te perdoar pelo que fizeste. Foi uma criança naquele dia, e um homem inocente, um irmão pagou por isso, mas tudo isso já passou, e você se tornou um homem, corrigiu seus erros salvando mais vidas que posso contar, e servindo a ordem como jamais consegui. Pela primeira vez em muitos anos eu sinto orgulho de dizer que tenho orgulho de ser seu pai. — No mesmo instante que Ethan pronunciou quase que mudo a última palavra uma gota salgada caiu sobre o papel borrando as letras, ele chorava pela primeira vez em anos por um sentimento que jamais havia sentido de verdade e agora entendia o que era, ele chorava de Saudade.


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Notas finais do capítulo

E então? Ethan tá perdoado pelo que fez quando fugiu de casa?



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