A Inútil Capacidade de Ser Indiferente escrita por Fabrício Fonseca
—Também não sei se isso é considerado um crime – ele começa a falar assim que termino minha explicação. –, mas acho que deve ser já que você parece ter a alma de uma criminosa.
—Foi você quem despertou isso em mim. – Brinco.
—Tudo bem, vamos colocar esse plano em prática.
Andamos até a Alfred Montana já que é a avenida mais movimentada da cidade e esperamos o sinal ficar vermelho para atravessar e parar em um ponto próximo a virada da rua onde um triângulo pintado de branco é cercado por aquelas coisas amarelas que dividem as estradas e meu pai costuma chamá-las de “Olho de gato”, porque brilha quando um carro bate o farol sobre elas. E também porque nenhum veiculo pode passar por aqui – obrigada por ajudar em nossas loucuras, Leis de Trânsito!
—Quer escolher a musica? – Thomás pergunta tirando o telefone do bolso.
—Pode escolher qualquer uma, contanto que seja bastante animada.
Ele coloca a musica para tocar em seu telefone no volume máximo, fico um pouco impaciente porque nos primeiros vinte segundos a musica não está nada animada, mas então ela começa a ficar agitada e nós começamos a nos balançar no ritmo da musica. Alguns dos motoristas começam a usar freneticamente a buzina dos carros – espero eu que queiram dizer que estão achando divertido o que estamos fazendo – e eu tenho quase total certeza que passou um carro em que a mulher estava nos filmando. Eu começo a gargalhar alto e Thomás começa a rir junto comigo, mas mesmo assim não paramos de dançar, estamos ficando cada vez mais animados.
Eu estou me sentindo livre. Isso é tão bom!
—Estou amando fazer isso! – Grito sem parar de dançar.
E então a musica para, e nós ficamos olhando um para a cara do outro e sorrindo.
—Outra? – Ele pergunta sorrindo, e eu apenas assinto com a cabeça.
A segunda musica é ainda mais animada, bem no estilo musica eletrônica; gosto ainda mais de dançar essa... E a única coisa que consigo pensar é que queria que todos estivessem dançando conosco agora; que as pessoas parassem os carros e começassem a dançar, que todos parassem o que estivessem fazendo e começassem a dançar e tentassem esquecer suas vidas tristes com todas suas preocupações e todos os problemas que as rodeassem e simplesmente dançassem, simplesmente tivessem um momento de distração de suas vidas infelizes.
—Cansei – digo assim que a segunda musica para.
—Eu também, vamos sair daqui antes que a policia apareça para nos dizer se estamos cometendo um crime ou não.
Atravessamos a rua sem esperar pelo sinal vermelho, mas pelo menos passamos pela faixa de pedestre, o que nos faz rir.
Andamos até chegar ao lago e nos sentamos em um dos bancos de madeira, ficamos calados por um momento até que Thomás decide falar algo:
—Então, qual a sua relação com o D?
—Minha relação com o D? Mas quem...?
—Diego! O garoto que te ligou e eu atendi.
—Ele é meu melhor amigo... Na verdade é o único.
—Ele sabe que vocês são apenas amigos? Porque ele pareceu meio irritado quando conversei com ele.
Olho para ele com os olhos arregalados, por que ele não disse que o Diego ficou irritado quando atendeu ao telefone?
Decido deixar para lá e responder sua pergunta.
—A gente meio que ficou, foi só um beijo, mas isso foi o bastante para parecer “algo mais”... – paro por um momento tentando não parecer sentimental demais. – Eu estou sempre tentando não gostar demais das pessoas porque sei que uma hora ou outra elas irão me deixar, e se eu não criar muitas expectativas em relação á elas, não irei sofrer quando isso acontecer. Mas...
—Você sempre falha nessa missão.
Assinto, e começo a falar.
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