Três dias haviam se passado, três longos e sofridos dias para Zahira, que tentava aproveitar seus últimos momentos de convívio com os irmãos, principalmente com Alita Kaunis. A grande barriga que levava a vida do sobrinho de Zahira Xigmad nunca havia parecido tão linda, ela tinha vontade de chorar todas as vezes que via sua irmã pesada com a gravidez.

Os dias estavam agradáveis e calmos e, no segundo dia de espera, Zahira descobriu que Kaolin iria acompanhá-la na mudança. Isso fez com que a conselheira tivesse sentimentos ambíguos, tirar Kaolin do convívio com sua família e com seus amigos era uma grande covardia e um ato que ela abominava. Ao mesmo tempo, Kaolin a faria companhia em um plano completamente novo, Zahira Xigmad não estaria sozinha, cercada de pessoas as quais ela não poderia confiar por um tempo.

"Kaolin, eu não desejo esse destino para você." disse "É tão cruel quanto o imposto a mim, como poderia fazer o mesmo?"

"Isso não é um problema tão grande para mim." assegurou a jovem "Sei que em servir a você, estou servindo ao meu povo, Zahira Xigmad, me permita fazê-lo."

Inspirando profundamente, Zahira fechou os olhos. Isso tudo era tão injusto.

"Perdoe-me, por favor Kaolin. Estou afastando você de todos aqueles que ama, impedindo que você tenha um futuro traçado por você mesma."

Kaolin sentou-se em um sofá próxima a Zahira e segurou a mão desta, apertou-a em um gesto de demonstração da segurança que tentava passar. A conselheira pode sentir a calma que Kaolin sempre passava com sua alma, havia a insegurança, porém, e o medo.

"Zahira Xigmad, tudo pelo que estou passando você também irá passar." ela disse calma "E eu diria que de forma levemente pior... Você se casará com um homem que mal conhece, além de ter uma missão a cumprir. Será minha felicidade ajudar você a superar algumas dificuldades. Além de minha senhora, você é minha amiga, uma pessoa que eu amo e respeito."

Os olhos de Zahira lacrimejaram violentamente, ela ajoelhou-se em frente de Kaolin e a abraçou fraternalmente. Algumas lágrimas escaparam quando ela falou, "Obrigada Kaolin, por tudo! Você é e sempre será minha amiga, querida e amada..."

Uma ideia estalou na mente de Zahira Xigmad e ela se levantou em um pulo. "Eu devo ficar presa no plano do Inferno por tempo indeterminado, sim," começou a falar, se sentindo um pouco mais animada "mas ninguém nunca disse nada sobre você! Kaolin, você tem passagem livre para a troca de planos! Vê? Você poderá voltar quantas vezes quiser para rever sua família. Um dia pode até mesmo voltar para sempre."

Kaolin acompanhou a animação e seus olhos brilharam, no entanto ela negou a proposta, "Eu devo morrer ao seu lado, Zahira Xigmad. Não posso e não irei deixá-la sozinha."

"Pense comigo, você também poderá ser minha fonte de informações, minha mensageira entre planos! Este será o melhor de todos os serviços que você pode fazer, Kaolin. Irá me ajudar?"

A jovem piscou algumas vezes, como se estivesse tentando entender a situação. Em um momento, um grande sorriso surgiu em seus lábios e Zahira pode sentir satisfação e alívio.

"Sim! Será sempre meu prazer servi-la, Zahira Xigmad!"

Após a conversa, Zahira se sentia mais confiante em conseguir cumprir seu papel como diplomata. Não estava segura, no entanto, quanto ao casamento. Foi justamente nisso que estava pensando, no dia seguinte, quando Kaolin e Alita Kaunis entraram com um estrondo no quarto seguidas por mais três mulheres.

"O que está acontecendo?" Zahira questionou assustada.

"Precisamos preparar você agora, irmãzinha, seu futuro marido está chegando e você precisa estar vestida como a linda noiva que você será."

Naquele instante, Kaolin pegou a caixa com a roupa e as mulheres começaram a preparar o banho com a Água Sagrada e flores. Suspirando, Zahira levantou-se de seu sofá e olhou em volta. "Não sei se estou pronta."

"Não temos tempo para isso agora, Zahira. Anda, entre na banheira." Alita ajudou a irmã a subir e a observou enquanto as mulheres lavavam o corpo de Zahira com as flores e os cabelos com líquidos perfumados "Mal vejo a hora de vê-la como noiva."

"Queria estar tão feliz com isso quanto você, Alita. Será que não posso me lavar sozinha? Eu sempre faço isso."

"Não, querida, é uma tradição que outras mulheres preparem a noiva para o casamento. Isso traz bom agouro para você e para aquelas que ainda não casaram." as mulheres soltaram leves risadinhas. Alita sorriu e sentou-se para separar alguns enfeites de cabelo "Kaolin, pode me ajudar com isso?"

O silêncio e as mãos pelo seu corpo incomodavam Zahira. Talvez ela não estivesse dando muita sorte pra essas mulheres, pensou, não quando ela mesma estava sendo submetida a um casamento forçado, com um homem que mal conhecia e que parecia levar a malícia de todos os planos em seus olhos de caos. Mas ele era extremamente lindo... E o corpo...

Ela tentou mudar o foco para outros pensamentos desesperadamente, mas eles continuavam viajando para Cam Azai e a provável noite de núpcias que teriam para consumar o casamento. Esse tipo de reflexão a incomodava muito mais, principalmente porque levava ao seu rosto a coloração rósea do embaraçamento.

"Alita... Como foi sua noite de núpcias?" ela perguntou, precisava saber. Zahira Xigmad sabia o conceito da coisa toda, o desejo entre duas criaturas que acarretava no sexo. Era algo natural, no entanto a ideia da prática a assustava.

"Ora, muito boa. Turmil é um excelente amante, com grandes habilidades... Acrobáticas." as mulheres riram "Qual é sua grande dúvida, Zahira, o que você ainda não sabe?"

"Não sei como devo agir... Como devo me... Portar ou que devo fazer, ahn, na prática." Zahira podia sentir suas bochechas quentes como fogo. Alita Kaunis estava se divertindo com toda a situação.

"Irmãzinha, se o que dizem sobre os filhos de Lilith estiver certo, você não precisará se preocupar com a condução dos prazeres carnais." ela deu uma piscadela e as mulheres riram mais "No entanto, eu posso te dar um conselho, aja da forma mais natural possível e conte com seus instintos. Eles são os melhores guias para momentos como esses."

Zahira Xigmad engoliu em seco e saiu da banheira sentindo-se revitalizada pela força da água. Após ser seca, ela deixou que Kaolin a vestisse. A roupa era extremamente rica, fugindo do agrado da noiva, porém ela não poderia dizer que era feia. O vestido era longo e vermelho, com pequenos desenhos de flores de cerejeiras em rosa e dourado que adornavam todo o busto e se espalhavam pelas mangas -- largas e de um tecido fino quase transparente -- e pela saia.

Alita puxou Zahira para o banco da penteadeira e começou a escovar o cabelo vermelho vivo da irmã, até que esse ficasse brilhando. Depois, começou a trançá-lo e a fazer um penteado complexo, mesclando mechas com uma faixa dourada bordada com flores rosas como a do vestido. Alita Kaunis deixou que a trança do longo cabelo da irmã caísse ao longo das costas e começou a encrostar pequenas flores brancas ao longo do penteado. Tudo foi finalizado com um pente que pertencera a mãe de Zahira Xigmad, uma borboleta com pequenas pedras brancas e brilhantes. Kaolin desenhou o contorno dos olhos da conselheira com uma fina linha negra e finalizou passando uma pasta vermelha nos lábios.

"Você está magnífica, irmãzinha." Alita Kaunis suspirou e a virou para o espelho de corpo inteiro. Zahira Xigmad não se reconheceu, inicialmente. Ela estava tão paramentada com a vestimenta luxuosa e quase nunca se via com os olhos destacados que ficou em dúvida se a belíssima criatura que estava a sua frente era realmente ela.

Ao mesmo tempo que adorou, odiou a mudança. Aquela não era ela, não era assim que ela se sentia confortável ou verdadeira. Mas, novamente, ela estava indo para um compromisso que também não correspondia as suas expectativas, portanto fazia sentido parecer que havia entrado no corpo de outra pessoa. Suspirou passando, nervosamente, a mão pelo tecido delicado da saia do vestido.

Uma batida na porta fez com que a contemplação das mulheres se perdesse. Kaolin ajustou os enfeites de cabelo de Zahira por uma última vez. Em procissão, as mulheres saíram do quarto, a noiva por último, suspirando pelo lugar que deixava, todas as lembranças ficariam no coração e na mente dela. Caminhou lentamente em direção ao jardim, onde seu futuro esposo a aguardava.