Danger escrita por Els


Capítulo 3
Demitida?!




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Confesso que, apesar de já estar na Europa há meses, não consigo me adaptar ao frio constante desse continente. Sendo assim, o clima glacial de Londres no mês de dezembro me incomodou bastante. O contrato de trabalho exigia a minha permanência fixa na capital inglesa. Como já esperava por isso e deixara minha mãe de sobreaviso, quando Gabe me contou sobre esta norma da contratação, eu imediatamente concordei, deixando-o surpreso, mas muito contente.

Algumas semanas depois, nos mudávamos do imóvel cedido pela minha irmã em Paris para um apartamento alugado, localizado no subúrbio de Londres. Nada muito luxuoso, mas o suficiente para nós duas, mamãe e eu. Estávamos às vésperas da semana do natal ao chegarmos à nossa nova moradia, portanto tivemos de enfrentar o auge do inverno londrino.

As datas de fim de ano não foram comemoradas por nós como de costume. Ver os primeiros flocos de neve caírem foi emocionante, mas logo a neve começou a me irritar, principalmente por me ocasionar inúmeras quedas e congelar a gasolina no tanque do meu calhambeque de segunda mão recém adquirido com minhas economias. Meu traseiro nunca esteve tão congelado!

Não recebemos o telefonema de Pietra no natal, o que já não era realmente uma novidade, e ficamos tão atoladas com a limpeza e organização do apartamento, que só houve tempo e disposição para eu preparar uma singela ceia. Logo após a refeição, fomos dormir bem cedo, mortas de cansadas.

Enfim, dezembro terminou e janeiro começou com tudo!

Eu, que há muito tempo me tornei indiferente às sextas-feiras, depois de duas semanas trabalhando com Samuel Danger, estou comemorando avidamente a sua chegada. Sinto-me verdadeiramente detonada estes dias e clamando por algumas horas derradeiras de sono.

Enquanto desencaixoto o último lote de roupas e as organizo na cômoda, posso sentir o olhar desconfiado da minha mãe sobre mim. De fato, meu humor não anda lá boa coisa e sequer consigo disfarçar. Nunca fui do tipo rancorosa, que remói amarguras por dias a fio, por outro lado, eu não tenho com quem desabafar sobre meus problemas e não quero fazê-lo com minha mãe para não preocupá-la. Até onde ela sabe, eu estou me adaptando muito bem ao novo emprego, apesar disso ser uma tremenda mentira. O salário é bom, não posso negar, e muito mais até do que eu ganhava na Galaxy Records, contudo trabalhar com Samuel Danger me deixa esgotada.

— Filha, tem certeza que essa mudança para Londres foi uma boa ideia? — ela questiona enfim, inábil em ocultar seus pensamentos. Eu a encaro com a sobrancelha erguida. — Não que eu esteja reclamando... Você sabe, eu adoro o frio. Mas, já faz quase um mês que viemos para cá e a cada dia que passa, você parece mais exausta e mal humorada.

Eu solto uma lufada de ar pelo nariz e sorrio, sendo correspondida por ela.

— Ah, mãe, não é nada — me aproximo, sento na cama de frente para ela e tomo suas mãos entre as minhas a fim de confortá-la. — Eu só estou com a cabeça no trabalho... Mas prometo que vou relaxar, tudo bem? Ainda mais agora que finalmente acabamos de organizar a bagunça — indico o canto do quarto com a cabeça, onde caixas de papelão vazias estão empilhadas —, nem pensar em nos mudarmos de novo por um longo tempo — nós rimos, cúmplices. — Vou preparar o nosso jantar. Descanse um pouco.

Na medida em que me viro na cozinha, tentando aprontar uma refeição decente com os ingredientes remanescentes da geladeira e dos armários, visto que há certo tempo não disponho de energia o bastante para ir às compras, não sei exatamente por que, mas a minha mente vaga para os primeiros dias de convivência com o meu novo chefe.

Foram dias tumultuados... Dois shows em um final de semana na Arena de Wembley, ao norte de Londres. Ambos os eventos esgotados puseram a equipe em polvorosa, ninguém conseguia parar um minuto para descanso. Quanto mais as datas se aproximavam, mais agitados nós ficávamos, correndo de um lado para o outro entre ditar e acatar ordens. Eram muitos detalhes a organizar para que tudo saísse perfeito e, para isso, corríamos contra o tempo.

A banda chegava cedo a fim de ensaiar o repertório e passar o som, com a exceção apenas de Danger, que ditava seus próprios horários e chegava na hora que bem lhe dava na telha. Logo de início, antes de ter o primeiro contato propriamente dito com ele, fui alertada por algumas funcionárias da equipe, com as quais simpatizei de imediato, que o vocalista dos The Thunderstruck era um pé no saco, mesmo que fosse um tesão encarnado. Nessa hora, eu tive que me esforçar para não fazer uma careta. Não sei se fora a má impressão que tive logo de cara referente a ele, mas Danger não me apetecia de jeito algum. O problema é que eu subestimei sua capacidade de fazer merda, mesmo que tivesse sido alertada por tantas pessoas, principalmente por Gabe.

Meu chefe folgado me incumbiu de uma porção de tarefas as quais não me cabiam, com o único propósito de me manter ocupada e o mais distante possível. Mas, ainda assim, eu tentei cumpri-las, sentindo uma necessidade tola de provar a minha eficiência a ele. No meio de uma dessas tardes, porém, após me desdobrar em mil Gins a fim de dar conta de tudo, me deparei com uma cena que provavelmente habitará meus piores pesadelos por muito tempo.

O corredor que dava para os camarins da banda estava silencioso e eu me encontrava à margem da loucura procurando pelo Danger, que sempre desaparecia de vista. Estava a ponto de seguir um outro rumo quando um barulho me alertou para a presença de alguém no camarim do vocalista. Sem pensar duas vezes e com meus nervos a aflorar sob a pele, meti a mão na maçaneta e adentrei o espaço.

Este foi o meu maior erro...

Antes mesmo de vê-los, ouvi vozes cochichadas e o ruído alto de rangido, como se arrastassem algum móvel pesado, arranhando o piso. Ao abrir a porta por completo, presenciei uma morena comportando a nítida expressão da luxúria: testa suada, rosto retorcido, olhos firmemente cerrados, boca entreaberta e os cabelos em uma completa desordem. Ela, sentada em cima da penteadeira, tinha Danger, de costas para a porta, encaixado entre suas pernas. Ambos estavam vestidos, mas ele investia com fúria contra o corpo da mulher, que, por sua vez, emitia uns barulhos estranhos – não sei se é adequado chamar aquilo de gemido. Só nesse momento percebi que, embora ela estivesse de saia, uma minúscula calcinha preta de renda encontrava-se dependurada em um de seus tornozelos.

Eu paralisei, arregalando os olhos pelo episódio bizarro que se passava perante mim. De repente, a mulher abriu os olhos, me fitando, assustada. Num instante, suas bochechas coradas perderam a cor e ela empurrou o peito de Danger. Confuso, ele cessou os movimentos, a encarou e depois seguiu a direção de seu olhar até mim. Merda! Eu tinha que correr dali! Por que minhas pernas não obedeciam?

— O que ainda está fazendo aí parada? — ele questionou sem o menor sinal de arrependimento ou vergonha, parecia muito mais chateado por ter sido interrompido em seu ato libidinoso durante a hora de trabalho. — Ou entra pra participar ou cai fora de uma vez.

A morena tornou a olhá-lo, franzindo a testa, descrente e supostamente ultrajada com a proposta do cantor. Eu também fui surpreendida por sua audácia, porém, em meio a toda àquela bizarrice, a indecência do convite era o de menos.

— Me d-desculpe. E-eu não queria... E-eu...

Saí às pressas, fechando a porta atrás de mim com mais força do que o necessário, fazendo-a estalar contra o batente. Apertei a minha prancheta, onde estavam anotadas as tarefas a serem cumpridas para o dia, contra o peito e ofeguei. Céus! O que eu acabara de ver? Verifiquei meu relógio de pulso: duas e quinze da tarde!

Ainda meio aturdida, senti um calor ascender pelo meu corpo ao olhar para o extremo oposto do corredor e dar-me conta de Gabe se aproximando com seu jeito de andar descontraído e extremamente sexy, passando a mão no cabelo a fim de afastá-lo da testa. Completamente absorta, por um instante, me permiti envolver por aquela cena, certa de que já tinha visto algo semelhante em algum comercial de perfume, com modelos de corpos provocantes e olhares arrebatadores ao encararem a câmera. Ok, Gabe não era modelo – bem que poderia ser, na minha opinião –, mas ninguém em sã consciência negaria que aquele olhar... Ai, ai!

Ele abriu um sorriso enorme ao me reconhecer e eu precisei segurar um suspiro.

— Hey! — cumprimentei muito mais empolgada do que deveria. — Pensei que não estivesse na cidade.

— Cheguei hoje cedo e decidi vir aqui verificar como estão as coisas. Está se adaptando bem a Londres?

— Oh, sim! Muito bem.

— Ótimo. Eu não encontrei o Sammy no palco junto com os outros, sabe se ele está no camarim? — ele indagou, já conduzindo uma das mãos à maçaneta.

Não houve tempo hábil para eu pensar no que fazer ou elaborar uma resposta que o convencesse a ficar longe daquela porta. No desespero, acabei cobrindo sua mão com a minha, impedindo-o de prosseguir na ação. Ao que ele voltou aqueles olhos azuis para mim, repletos de indagações, percebi o que estava fazendo e imediatamente desfiz o contato, sentindo a palma da mão formigar e meu rosto pegar fogo.

— Melhor você não entrar aí — balbuciei.

— E por que...?

Gabe não precisou terminar a pergunta. A porta foi escancarada, dando passagem ao casal desinibido. A mulher, à dianteira, dividia-se entre a tarefa de ajeitar o cabelo despenteado e puxar para baixo a saia-lápis amarrotada, nem um pouco preocupada em esconder de seu semblante sua completa satisfação sexual. Danger veio logo em seu encalço com um cigarro gingando na borda dos lábios enquanto mirava descaradamente o traseiro da morena. Assim que ela se despediu, lhe lançando um olhar cheio de malícia, ele acertou um tapa em uma das suas nádegas, fazendo-a soltar um gritinho de falso descontentamento.

— Te espero no show de sábado, Melissa — ele disse, agora virando-se para nós, Gabe e eu, que alternávamos olhares entre os dois, impressionados com tamanha esquisitice.

— Amber — a morena corrigiu-o, indignada por ter seu nome trocado.

É, ao que me parece, ele não confunde apenas o meu nome.

— Isso aí, meu anjo — Danger contrapôs com desdém, sem ao menos se dar ao trabalho de olhá-la. A mulher saiu soltando fogo pelas ventas, porém ninguém prestava mais atenção nela, muito menos seu atual parceiro de foda. — Nossa, que saudade, maninho! — Danger abraçou o irmão de lado, soltando a fumaça do cigarro propositalmente em seu rosto. Gabe fez uma careta e se afastou do abraço, mas não disse nada, apenas encarou o caçula com a expressão fechada. — Onde você estava mesmo? Ah, não interessa. Bom, tenho um ensaio para participar agora. — ele falou, já caminhando para longe de nós. Porém, não muitos passos adiante, voltou-se para trás a fim de nos encarar. — A propósito, Sex On The Beach, você está demitida.

Depois de dias trabalhando com o sacripanta que troca meu apelido por vários outros nomes de bebidas e drinks, eu já não me incomodava tanto com esses trocadilhos ridículos. No entanto, quando ouvi o anúncio da demissão, fiquei horrorizada e dividida entre a surpresa, indignação e ódio. Ele não podia fazer isso comigo! Não havia nenhuma justificativa plausível para a minha demissão. Constantemente, eu recebia elogios de todos da equipe pelo meu bom desempenho, só o Danger parecia desprezar meus esforços.

— Ela não está, não — Gabe pronunciou em alto e bom som. Seu maxilar encontrava-se apertado, transparecendo a irritação.

Danger refez o caminho até nós. Os dois mantinham o contato visual desafiador e mal se aperceberam da terceira pessoa presente, ou seja, eu. Dado o impasse entre eles, minha presença ali era absolutamente irrelevante, apesar de ambos estarem decidindo o meu destino. Por minha vez, preferi me abster da discussão e recolhi-me à insignificância, torcendo mentalmente para que Gabe fosse tão influente quanto eu o julgava.

— Sim, ela está — Danger ditou entredentes. — A assistente é minha, não é? E eu não estou satisfeito com os serviços dela.

Eu fiquei boquiaberta. Mas o quê...?

— Esta decisão não está nas suas mãos, Sam.

— Sei quais são as suas pretensões. Não preciso de uma babá, Gabriel.

— E eu já disse que essa decisão não é sua. Ela fica e este é o fim da conversa.

Logo após decretar o ultimato, Gabe se adiantou em direção ao local onde a banda ainda ensaiava, deixando-me sozinha com seu irmão à beira de uma síncope. Eu me encolhi e cerrei firmemente as pálpebras ao que Danger desferiu um soco na porta do camarim, afundando a madeira. Em seguida, olhei, estupefata, para o lugar deformado. Como um cara tão magro conseguia fazer um estrago tão grande? Por via das dúvidas, resolvi permanecer calada, abraçando a prancheta contra o corpo; ela me serviria como uma potencial arma, caso ele se voltasse com violência para mim.

Danger resmungou algumas palavras ininteligíveis e frases desconexas enquanto esmurrava as paredes ao lado e chutava todos os lugares ao seu alcance. Alguns funcionários chegaram a aparecer para dar uma espiada, movidos pelo grande estardalhaço provocado por ele, mas logo ao perceberem quem provocava o alarde, voltavam às suas obrigações. Ao que parece, todo mundo já estava acostumado com esses ataques vindo da parte dele.

De repente, e sem dizer uma palavra, Danger parou com o ataque de histeria, se recompôs e rumou para o palco. Tinha os punhos fechados ao lado do corpo e o nó de seus dedos sangravam, mas ele não parecia se importar ou mesmo sentir dor, talvez por estar com o sangue quente ou por conta da raiva, que era visível através do seu ritmo respiratório descompassado. Eu permaneci parada, indecisa se deveria segui-lo.

— Não ouviu meu querido irmãozinho, Tequila? — ele praticamente gritou sobre o ombro — Vamos logo!

— É Gin — me atrevi a falar baixinho, muito mais para mim do que para ele.

— Que seja!

É óbvio que todos do grupo demonstraram espanto ao repararem nas mãos sangrentas do companheiro, entretanto nenhum dos quatro atreveu a dizer qualquer palavra a respeito, nem mesmo o Cory, que é daquelas pessoas que não têm filtro de fala e noção de quando é apropriado dividir seus pensamentos com os demais. A bendizer, o baterista é uma ótima pessoa. No geral, os rapazes são muito legais e animados na maior parte do tempo, sempre prontos a contar uma piada ou fazer chacotas uns com os outros. Porém, o clima de descontração no ensaio se transformou em tensão com a chegada de Danger e sua fisionomia azeda. Ele consegue ser desagradável até para as pessoas que estão acostumadas a aturá-lo frequentemente.

Eu me acomodei na primeira fileira da plateia, descansando os cotovelos nos encostos e a prancheta sobre minhas pernas cruzadas. Acompanhei as duas primeiras canções, mas não muito tempo depois, acabei me desligando do que acontecia no palco, deixando minha mente divagar para outros lugares, sem me ater a nenhum pensamento especifico. Sinto saudades do meu país, do Pedro e me pergunto como estaria minha mãe em casa. Ela está acostumada a ficar sozinha enquanto estou no trabalho, mas, volta e meia, ao lembrar dela, me preocupo. Com isso, puxei o celular do bolso traseiro da calça social, checando se havia alguma ligação perdida. Respirei aliviada por não achar nada.

— Gin — saltei na poltrona ao notar Gabe sentado ao meu lado.

Quanto tempo estive fora de órbita? Ele sorriu ao se dar conta da minha distração.

— Me desculpe. O que disse?

— Eu vim te pedir desculpas pelo comportamento infantil do meu irmão — ele disse, tornando-se sério e exalando um suspiro cansado. Só então, reparei nas duas meias-luas arroxeadas abaixo de seus olhos. Embora ele fosse um homem divertido e de sorriso fácil, ultimamente, venho notando que seu irmão tem lhe tirado o sossego e o sono. — O problema não é contigo, Sammy sempre quer me desafiar. Provavelmente é uma coisa de irmãos.

— Tudo bem — eu concordei, apesar de não estar muito convicta quanto à sua justificativa. Afinal de contas, Danger não é um pé no saco só para o irmão.

— Não, é sério. Eu sei o quanto ele pode ser um filho da puta egoísta quando quer...

Tipo, vinte e quatro horas diárias?

— Vocês poderiam parar de namorico? — a voz rasgada soou do palco, sendo amplificada pelos alto-falantes. Imediatamente, Gabe e eu voltamos nossas atenções à frente. — O ensaio já acabou e eu preciso que minha assistente vá buscar café para mim.

Percebi Gabe empertigar o tronco e fazer menção de dar uma resposta à altura da arrogância de Danger, possivelmente devido ao seu autoritarismo ou pela incumbência da tarefa que não pertencia ao meu cargo. De qualquer forma, eu quis evitar mais uma confusão entre eles, portanto segurei no braço de Gabe até que tivesse seu olhar em mim. Quando o tive, sussurrei:

— Tudo bem, eu vou.

Dei-lhe um meio sorriso simpático antes de me colocar de pé e me afastar dali, ainda que relutantemente. O perfume de Gabe já estava entranhando em minhas narinas e me fazendo perder os sentidos e, claro, a sensação era ótima. Tive vontade de formar uma carranca e sair chutando o chão enquanto me encaminhava à cantina, como quando era criança e fazia malcriação para meus pais. Cada vez mais odiava meu chefe por me privar desses raros momentos de felicidade.

Com um enorme copo de café expresso descafeinado – não sei qual o propósito de tomar um café sem cafeína. Falta do que fazer desse playboyzinho de merda... ­– com três gotas de adoçante e um pingado de leite desnatado, segui de volta ao camarim do insuportável, xingando mentalmente mil palavrões e amaldiçoando até a décima terceira geração do infeliz.

Ao virar em um dos corredores, em um local quase deserto, fui surpreendida por um puxão no braço e, antes que eu pudesse gritar por socorro, acabei encurralada em um vão entre duas caixas de som logo abaixo do palco. Devido ao susto, por pouco o café não foi pelos ares. Mal me recompus e já tinha um par de olhos azuis zangados sobre mim, a espreitar minhas reações. Se não estivesse tão confusa, provavelmente teria jogado a bebida quente na cara dele e depois daria uma desculpa de ter sido sem querer. Danger, na borda do esconderijo, averiguou os dois lados do corredor e, ao se certificar de que estávamos a sós, voltou-se para mim novamente.

— Quanto você quer para me deixar em paz? — ele despejou de uma vez, sem rodeios.

Arregalei os olhos, assustada, e ainda com o coração a palpitar velozmente contra o esterno. Pelo visto, meu chefe não desistira da ideia de se livrar de mim. Qual era o meu problema? Ou melhor, qual era o problema dele?

— O quê? Eu não vou embora — neguei veementemente com a cabeça e Danger estreitou os olhos, bufando em seguida.

— Porra, você tá me deixando louco! — ele se aproximou, erguendo os punhos na minha direção, então eu recuei, mas minhas costas bateram de encontro às estruturas de ferro que sustentavam o palco. Como única medida de proteção, ergui o café, preparando-me para derramar o líquido fervente na sua cara, caso ele desse mais um passo. No entanto, Danger não o fez, apesar da nítida demonstração de ira por ter sido contrariado de novo. Em vez de me ameaçar, como eu havia suposto, conduziu as mãos ao cabelo, embrenhando os dedos e puxando os fios com demasiada força. — Você é a assistente mais chata que eu já tive! Quanto o Gabe está te pagando? Não importa, eu pago o triplo pra você pedir a demissão.

— Eu não vou me demitir — declarei com coragem, ainda que meus joelhos oscilassem como vara de bambu em vendaval em decorrência do olhar fuzilante que recebi. Ao contrário da simpatia e amabilidade que os olhos de Gabe transparecem a mim, os tons de azul tão semelhantes nos olhos de seu irmão me dão medo. — Por que você é sempre tão ruim? — deixo a pergunta escapar.

A princípio, Danger me encara, confuso. Um segundo depois, ele tomba a cabeça para trás em uma gargalhada sinistra antes de sustentar novamente aquele olhar ferino ao meu.

— Ruim? — ele sussurra de forma ameaçadora. — Ainda não viu nada do que eu sou capaz. Anota o que estou te dizendo, Tônica, eu nem comecei a infernizar a sua vida. Quando eu começar, você vai correr daqui como se o seu rabo estivesse em brasa.

Dito isso, ele deu um soco numa das caixas de som, que bambeou, induzindo-me a fechar os olhos, temendo que tudo desabasse sobre mim. Ao abrir as pálpebras, ele não se encontrava mais à vista e, mesmo que eu não pudesse ver meu reflexo no espelho, sabia que tinha o rosto pálido.

— Mas que porra...? — balbuciei comigo mesma, movida pela perplexidade do que acabara de acontecer.


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