Em Chamas - Peeta Mellark escrita por Nicoly Faustino


Capítulo 34
Capítulo 34




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/560756/chapter/34

— É, parou — ouço Katniss dizer.

Finnick e eu olhamos para trás, e o que vejo é tão belo, que me emocionaria, se não fosse letal. A névoa adquire uma cor tão pura, um perolado como eu nunca havia visto antes. Me faz relaxar. Me faz pensar em nuvens, e parece estar sendo impedida de nos alcançar por uma parede invisível, se espalhando para os lados, e dançando fazendo aparecer brilhos prateados conforme se afasta de nós.

Finnick se deixa cair no chão. Eu rolo para o lado, saindo de cima de seu corpo, que se contorce devido aos espasmos. Katniss também está no chão, muito próxima de mim. Gostaria de ter forças para abraça-la. Sinto muito sono. Meu peito dói. Fito o céu, desejando que tudo isso seja apenas um sonho ruim. A morte de Mags. Esse massacre. Katniss sofrendo, com essas feridas horríveis provocado por esse maldito nevoeiro. Mas não é. Para minha surpresa, encontro um par de olhos me encarando. Já vi esse animal. Não me lembro onde, mas devo estar delirando.

– Macacos – consigo dizer apesar da dor em minha garganta.

Katniss olha para cima, e assente. Ficamos encarando o animal, até ele sumir na vegetação. Lentamente, fico de joelhos, e tento me levantar, o que parece impossível. Então, vou me arrastando seguido por Katniss e Finnick que também se arrastam, até uma faixa da praia, com agua salgada. Água. Sal. Isso tem que dar certo. Coloco minha mão na água, e sou obrigado a cerrar os dentes para evitar o grito que quer escapar de minha garganta. Mas depois, a terrível dor é substituída por alívio. Olho para a agua, e vejo uma substancia saindo da minha pele. Da mesma cor do nevoeiro. Entendo então que é o veneno saindo de minhas feridas. Está dando certo. E conforme isso vai saindo, a dor vai diminuindo. Me viro para dizer a Katniss o que fazer, mas ela, muito esperta já descobriu. Olhamos um para o outro num misto de dor, e perplexidade. Como é boa essa sensação. Imediatamente procuro Finnick, e o encontro deitado de bruços na areia. Faço o possível para livrar meu corpo desse veneno o mais rápido possível, para ajudar Finnick, afinal ele salvou minha vida não uma, mas duas vezes. Mesmo que eu saiba que ele terá de morrer de qualquer jeito, não posso permitir que seja agora. E não assim. Quero que ele tenha uma morte rápida, para não sofrer, pois eu realmente gosto dele. Quem diria, não? Mas, se eu tiver que escolher entre ele e Katniss, direi adeus a ele, desejando que ele se junte a Mags num lugar muito belo, onde não haja todo esse sofrimento.

Quando todo meu corpo está submerso na água, afundo minha cabeça também, e a dor, é muito maior do que eu esperava. Mas eu aguento, firme. Volto a superfície me sentindo quase bem, porém meus músculos estão rijos, e minha cabeça pesa de um lado. Vejo que Katniss está jogando pequenos punhados de agua no corpo de Finnick, tenho que ajudar também. Acho uma concha e a encho de água, e vou jogando em seu corpo. Os gemidos que ele solta são tão dolorosos, que me fazem estremecer ao pensar na dor que está sentindo.

– Aguente firme – sussurro. – Você vai ficar bem.

— Nós temos que colocar mais dele dentro da água – Katniss sussurra, consciente de como esses pequenos jorros de água farão ele sofrer ainda mais.

Aceno em direção a seus pés, e num acordo silencioso Katniss e eu o arrastamos para dentro da agua. Não de uma vez. Primeiro os pés, tornozelo, joelhos, e assim por diante. A agua fica inteiramente esbranquiçada. Não sei por qual motivo, Finnick foi o mais afetado. Quando a água bate em seu peito, ele abre os olhos, e quando se dá conta de que estamos o ajudando, seus olhos se iluminam, com lágrimas, provavelmente devido a Mags, e com gratidão, devido ao nosso gesto.

Katniss coloca a cabeça dele em seu colo, e ele começa a mexer um pouco os braços. Olho para Katniss e automaticamente sorrimos um para o outro. É estranho, mas acho que ambos ficamos com medo de perder Finnick.

— Falta apenas sua cabeça, Finnick. Essa é a pior parte, mas você vai se sentir muito melhor depois, se você puder suportá-lo — digo.

Nós o ajudamos a sentar, enquanto ele lentamente joga agua em seu rosto. Gemidos guturais escapam de sua garganta ferida.

— Eu vou tentar tirar seiva de uma árvore — Katniss diz, olhando piedosa para Finnick.

— Deixe-me fazer o furo primeiro — falo. — Você fica com ele. Você está curada.

E dizendo isto eu parto me embrenhando pela mata, a procura de alguma árvore. E fugindo dos gritos de Finnick.

Estou há uns 10 metros de distância, quando escolho uma árvore e começo a furá-la. Tenho que usar minha faca, o que dará mais trabalho, e fará mais barulho. Mas não sei o que aconteceu ao furador de Mags. Talvez tenha ido de encontro com a morte, junto com ela. Afasto estes pensamentos, e me concentro no fato de Katniss estar viva. E fico realmente feliz por isso. Começo a pensar então, por onde anda Chaff. E Johanna. Será que eles estão bem? Torço para que sim. E se já tiverem morrido, que tenha sido tão rápido a ponto de nem sentirem dor.

Estou quase conseguindo fazer um buraco quando a voz de Katniss chama minha atenção.

— Peeta — ela chama, num tom de voz contido e calmo. — Preciso de sua ajuda com uma coisa.

— Ok, só um minuto. Eu acho que quase consegui — digo, e com uma última facada, o buraco está feito. — Sim, aqui. Você ainda tem a goteira?

— Eu tenho. Mas descobrimos uma coisa que é melhor você dar uma olhada — ela diz, transparecendo uma certa urgência em sua voz. — Apenas venha em silêncio, para que você não os assuste.

— Tudo bem — digo, sentindo que está algo errado.

Caminho o mais silenciosamente que consigo, porém sem muito sucesso. Katniss não deve estar em apuros, mas há algo bem estranho acontecendo. Talvez estar em apuros, seja uma questão de tempo. E é nessa hora, quando estou quase chegando até ela e Finnick, que parece curado, com seu tridente em mãos, que sinto algo estranho no ar. Olho para cima, e vejo não um, mas dezenas, centenas de macacos, e meu olhar, parece ser o que precisavam, para avançar sobre mim, sobre nós, sobre Katniss.

Um instinto animal me invade, e eu me vejo lutando contra os macacos com uma ferocidade que eu nunca havia sentido antes. Consigo avançar até onde Katniss está, e nessa altura minha faca já está coberta de sangue desses animais. Aliás, eles não podem ser animais comuns, eles são bestantes. Não me permito olhar tempo demais para eles, com medo do que posso encontrar em seus olhos. Tento apenas cobrir Katniss. Matar todos os macacos que estão vindo na direção dela. Finnick não está tendo problema algum, pois ele é realmente muito ágil com seu tridente. Mesmo não estando cem por cento recuperado.

Ficamos os três, de costas um pro outro, formando um triângulo, matando sem parar as criaturas. Dois vem para cima de mim, e quando lanço minha faca sobre o peito de um deles, o outro crava as unhas na perna de Katniss. Ignoro a rigidez de meu corpo, e dou um giro cortando o pescoço da mutação, a tempo de impedir que Katniss de ser machucada ainda mais.

— Peeta! — ela grita. — Suas flechas!

Me viro para ela, e vejo ela segurando apenas uma faca, com sua bainha de flechas vazias. Jogo minha faca para mão esquerda enquanto puxo a bainha em minhas costas com a mão direita. Tudo é rápido demais. Por um segundo, olho para Katniss, e quando vejo sua expressão de terror, olho para frente, a tempo de ver a mulher do distrito 6, se jogar na minha frente de braços abertos, e soltar um grito estridente e horroroso, enquanto um macaco crava as unhas em seu peito, e mandíbula em seu pescoço, não deixando chance alguma de ela sobreviver.

Demoro um segundo para processar. Ela se jogou na minha frente. Para me proteger. Essa constatação, faz a dor em meu peito aumentar, pois, como uma pessoa pode perder a vida tentando te salvar, sendo que eu nem ao menos sei o seu nome? Haymitch estava certo. Isso está mesmo diferente. Só não aguento mais ver pessoas morrendo por mim, quando a única certeza que tenho, é que morrerei também. Jogo a bainha em minhas costas para o chão, enquanto apunhalo repetidas vezes a mutação, até que o animal se solte dela. Mas eu sei que desde o primeiro momento, já era tarde demais. Chuto o macaco de cima dela, e dou uma rápida olhada em seus ferimentos. O sangue escorre principalmente de seu pescoço, e quando nossos olhares se encontram, tudo que eu consigo dizer é “ – porque eu? “– mas eu não obtenho resposta alguma, e a pergunta continua ecoando na minha mente. Assim como o sangue escorre do corpo da mulher que acaba de dar a vida por mim.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!