Golpe de Estado escrita por M san


Capítulo 38
Aishiteru




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Uma luz prateada desafiou e venceu a escuridão noturna e Kakashi, no automático, colocou a palma da mão aberta à frente de seus olhos, tentando protegê-los de uma cegueira passageira. Ele ouviu os gritos de terror de seus soldados preencherem as lacunas sonoras deixadas pelo fluxo de cargas controlado por Aiko e, impotente, numa prece silenciosa pediu que Nana segurasse a energia. Mas, mais que isso, pediu que Aiko aguentasse. O que quer que tivessem plantado na cabeça da menina, ele só pedia para que ela aguentasse. Só um pouquinho mais.

A luz dissipou-se e Kakashi voltou à corrida de meio minuto antes. Ele mirava, metros acima de sua cabeça, Nana executar os selos que, diferentemente do passado, ele não conseguia mais distinguir. Acelerou o passo e sentiu Sakura, à sua direita, fazer o mesmo. Esperava que Naruto e Sasuke estivessem se posicionando pelo outro lado, como o combinado. Aquela seria a primeira tentativa e, o Hokage torcia, a última.

— Sakura, - Kakashi chamou, quando viu Nana acertar a mira, dois dedos estendidos juntos como um selo um pouco abaixo do queixo, o braço restante desenhando um arco ao redor de sua cabeça - vá.

Viu a aluna partir à sua frente, saltando sobre o relevo acidentando com uma habilidade felina, e recebeu aquilo como um Hai! de obediência. Acelerou, então, ele mesmo, indo na direção perpendicular à da garota, subindo a rocha a fim de encarar quem o tentava derrubar. Sentiu a fúria queimar seu peito e, por baixo da máscara, deformou os lábios em algo que poderia ser muita coisa, menos um sorriso. Talvez fosse uma fenda… de ódio.

Um raio cortou o céu e Kakashi interrompeu seu caminho, uma dezena de metros abaixo do topo da rocha. Concentrando chakra na sola dos pés, o ninja firmou-se esperando o momento do bote. A energia controlada por Nana viajou dela até os líderes do golpe e Kakashi sabia, mesmo sem ver, que ela mirava Takahashi. Contudo, a faixa de luz vermelha intensa desapareceu tão subitamente como surgiu. Kaneko, usando Aiko como escudo, colocou a menina à frente de si, pronta para receber qualquer ataque que Nana direcionasse a ele. Mas o Hokage previra aquilo.

Kakashi ergueu a cabeça e, vendo Nana no céu com os braços esticados indicando posições, atacou. Em um salto, venceu facilmente a distância até o topo da rocha, parando apenas quando seus pés atingiram o peito de Kaneko, fazendo-o voar até as árvores da orla superior da floresta. Sentiu Aiko às suas costas reagir ao mesmo tempo que Takahashi e Wada avançavam em ataque, mas aquilo também fora previsto. Em um segundo, a rocha em que se apoiavam cedeu, centenas de rachaduras transformando-a em brita, o impacto do soco que a partira igualando um terremoto sob seus pés e os de seus inimigos. Wada, que corria em ataque contra Kakashi, sem vacilar com o chão ruindo, viu o Hatake pronto para recebê-lo, kunai em mãos, mas travou. Seus olhos refletiram o alaranjado e o roxo da terceira frente do ataque, e o Hokage sorriu por baixo da máscara. Não havia tempo, mas, por uma fração de segundo, o sensei saboreou o desespero que seus alunos provocaram no rosto do traidor.

A rocha continuou a desmoronar, mas o Hatake equilibrava-se facilmente enquanto esperava a resposta do inimigo. Aquilo era o plano em ação e cada detalhe desse dependia da reação do lado de lá. Kakashi sabia que seus ataques eram limitados. Se fossem de vez para cima e Takahashi, Kaneko e Wada, a mente de Aiko seria destruída em segundos. Ele encarou Kaneko parado na orla da floresta e sentiu os olhos do ninja o fitarem em troca. Kakashi percebeu que o homem sabia tanto quanto ele o que iria acontecer. Seu coração tentou romper seu peito, mas a face imperturbável era tudo que ele se atrevia a mostrar.

Numa batalha, há sempre o momento em que tudo muda. O instante em que se decide o fim. Veterano de batalhas, Kakashi conhecia tal sentimento. Mas ainda não se acostumara a ele. Por isso, quando chegou, pegou-lhe de susto. E, pelos segundos que o seguiram, tudo pareceu acontecer em cortes. Algo púrpuro o levantou pela cintura, uma voz lhe chamou pelo nome, uma espada caiu à sua frente, ele por reflexo a segurou pelo punho. Uma luz prateada deixou um rastro, uma vermelha a seguiu. Elas se misturaram. O coração do Hatake parou, vendo a dança das suas meninas. Descreveram um círculo argeo-escarlate. Puseram-lhe num transe. E, num grito, duplo, agudo, de agouro e dor, trouxeram-lhe de volta.

Kakashi liberou no punho da espada a tsunami emocional que guardava em si e sentiu algo quente escorrer entre sua pele e o couro. Sua visão estava embaçada pelo chakra do Susanoo de Sasuke, mas ele enxergava o suficiente. Viu Sakura correr pelas rochas quebradas e, agradecido, viu-a saltar em encontro à sua filha inconsciente, quando Nana a empurrou para longe. Não havia mais áurea prateada circundando Aiko, seus cabelos não flutuavam fantasmagóricos às suas costas, seus olhos não estavam mais vidrados, dominados. Estavam fechados, Kakashi viu mesmo de longe. Parecia dormir, a menina. Naruto, por fim, terminou o resgate, buscando Sakura e Aiko, protegendo ambas com o chakra da Kyuubi.

— Ela saiu do genjutsu - Kakashi ouviu a voz de Sasuke lhe informar - O chakra normal na cabeça dela.

— Então o plano deu certo… - afirmou o Hokage, sem qualquer necessidade.

— Sempre soubemos que essa parte daria certo - contrapôs Sasuke, ríspido - O problema é agora. Você tem certeza que dá conta dela?

Sasuke apontou para o alto, indicando o problema, e o Hatake travou a mandíbula. Aquele era o plano. Trocar Aiko por Nana. Funcionara. E o prêmio era uma fera descontrolada, imprevisível, irracional. Ele tinha a resposta para a pergunta de Sasuke. Preferiu não a dar.

— Vamos - ele ordenou, para o que o Susanoo abriu as asas e obedeceu.

Do alto, enquanto subia até onde devia estar, carregado por Sasuke e sua defesa absoluta, Kakashi sentiu a tristeza mais profunda que já o perfurara arrancar dele o ar, a força, a razão. Seus olhos viram a selvageria lupina da kunoichi mais brilhante que conhecera ser liberta da jaula que fazia da mulher fascinante e transformá-la em pura arma nas mãos de quem o queria destruir. Piscou rápido, tentando focar em seu próximo passo, mas, como uma lente, apenas focou a imagem antes distorcida de uma Nana dominada. Era aquele o plano, ele tentava repedir a si mesmo intimamente, o corpo mole, febril, doente. Desde o início, trocariam Aiko por Nana, pois a última podia atacar, lutar, parar… Se preciso, matar. De Aiko não, mas de Nana… A vila estava acima de Nana.

— Quando a Sakura agir, vou te colocar atrás dela, Kakashi… - a voz de Sasuke soou como um trovão rompendo o silêncio fúnebre que o Hokage ouvia. Isso o trouxe de volta. Ele apertou o punho da espada uma pouco mais, o sangue do ferimento que ele mesmo fizera para conter a raiva escorrendo um pouco mais pelo couro e metal da arma - Naruto e eu vamos proteger todos dela… Mas seja rápido! Ainda há um exército de clones atacando, não esqueça - o Uchiha acrescentou, dando ordens (ou relembrando-as) como se as posições dos dois homens dentro do Susanoo tivessem se invertido. Kakashi sequer reparou - Não hesite!

Não hesite… Era um eco.

— Agora! - Sasuke gritou. Uma sensação já conhecida mostrou-se à Kakashi, algo próximo à um vortex puxando-o pela perna, e ele, num piscar de olhos, deixou de ver o mundo em tons de roxo para encarar os cabelos ruivos de Nana sendo movidos como braços de polvo às costas da mulher. O Hatake apontou a lâmina em suas mãos para a coxa esquerda da kunoichi e desceu-a, rápida. Não precisava matá-la, só causá-la dor, tirar ela do genjutsu. Esse fora o argumento que o convencera a concordar com o plano. Um corte profundo na perna e estaria acabado. Mas a espada cortou nada e Kakashi levantou o rosto a tempo apenas de desviar porcamente do fluxo quente que a Hikari lançava contra ele.

 Seu corpo começou a despencar, a gravidade exigindo dele o que ele não sabia: voar. Mas o Hokage tinha seus truques. Algo em torno de mil deles. Soltou a espada por um segundo, a arma acompanhando-o em sua queda livre, e, concentrando chakra na sola dos pés, realizou os selos que copiara em uma missão na Vila da Areia há quase uma década. Sentiu de imediato uma rajada de vento escapar de seus pés, em direção ao chão, lançando-o, por ação e reação, ao sentido oposto. Não conseguia controlar perfeitamente a intensidade de seus propulsores, mas também não precisa. Estando próximo à Nana, sua habilidade física compensaria a falta de treinamento de voo.

 Subiu vertiginosamente, segurando a espada novamente no meio do caminho. Desviou uma, duas, três vezes dos ataques da kunoichi, a consciência de que os olhos vidrados dela estavam fixos nele o incomodando de uma forma que ele conhecia. A luta contra o fantasma de uma pessoa amada. Mas ali tinha suas diferenças. Se ele ganhasse, teria Nana de volta.

O Hatake sentiu algo o sugar e viu as mãos de Nana prontas para recepcionar seu pescoço num aperto fatal. Arremessou a espada contra a mulher, sabendo que essa ricochetearia, e com as mãos livres tornou a fazer selos. Um jato d’água se interpôs entre ele e a ninja e a energia que o puxava para ela se desfez, enquanto a força do jutsu empurrava a ruiva para longe. Kakashi, então, aproveitou. Veloz, colocou-se em direção à Hikari, recuperando, mais uma vez, a espada antes que essa caísse abaixo dele. Não teria chance tão boa, ele pensou, consciente de que a água bloqueava a visão de Nana e de quem a controlava. Ele viu a silhueta da mulher subir, tentando sair da onda que a afogava, e imitou-a, pronta para recebê-la antes mesmo que o ar. Nos membros, ele pensava, firmando a espada em punho, mire os membros!

E ele mirou. A coxa, como fizera antes. Mas a falta de treino aéreo cobrou seu preço. Quando recebeu a mulher, fora do jato que ele lançara, ela foi mais rápida. Desviou de seu ataque e o ergueu, apenas alguns centímetros. O suficiente. A espada, entretanto, não cortou o nada, como da vez anterior. Kakashi a sentiu perfurar algo firme, sólido e macio. Sentiu os olhos de Nana se fixarem nos dele como antes. E sentiu o sangue escorrer pelo metal, pelo couro do punho da katana, por sua pele. O Hokage baixou o rosto, para ver o que atravessara e, quando o ergueu novamente, seu corpo agora tremendo fraco, viu os olhos amarelos da loba o reconhecerem num sorriso leve e inédito. Mas totalmente consciente.

— Ka-ka… - Nana balbuciou, mas um golfo de sangue a fez calar.

O Hatake, então, mas uma vez olhou para baixo. Sentiu sua vista embaçar e piscou para tentar clareá-la. Engolindo em seco, ignorando a súbita e anormal consciência de como era difícil respirar com máscara, ele pousou sua mão esquerda às costas de Nana, o braço correspondente circundando sua cintura, e concentrou chakra na direita, da maneira que aprendera na Anbu. Pousou a palma envolta em chakra no abdome da mulher, onde a lâmina transpassara, e puxou a espada. Fizera do modo como os médicos-nin fariam, mas não impediu a Hikari de cuspir sangue mais uma vez.

— Desculpa… - ele murmurou, enquanto desfazia toda a distância que o separava do chão, trazendo Nana consigo. Levantou o rosto para mirar a mulher e, na palidez doentia dela, encarando seus olhos, agora inofensivos, semicerrados, sentiu o medo dominar cada célula de seu corpo - Des…culpa… Era pra ser a perna, eu mirei a perna… A Sakura vai… A Tsunade… Isso não é nada pra elas…

— Hey, calma, Kakashi - ela o cortou no instante em que seus pés tocaram o chão. O Hatake então percebeu como era fácil não falar - Aiko? - ele acenou, positivo. Queria dizer ela está bem, mas o nó do tamanho de uma laranja em sua garganta não deixava. Nana suspirou aliviada e fechou os olhos. Ela estava em pé, ele não a segurava, mas, ilogicamente, temeu que a mulher não abrisse mais os olhos.

— Nana… - chamou desesperado, baixo, rouco, como se a voz vazasse pelas frestas entre a laranja e sua garganta.

— Tive medo… - ela respondeu, desmoronando finalmente, cada sílaba mais fraca que a anterior. Kakashi a amparou por reflexo, abaixando-se para evitar a queda. Ouviu uma movimentação às suas costas e virou-se, procurando o que era. Viu Sasuke se apressar em sua direção, mas não encontrou Sakura. Precisava da menina - ...que desse errado. Obrigada, Kakashi…

— Não… Não, NÃO! NÃO SE ATREVA! - esgoelou, cuspindo o nó imaginário fora - VOCÊ NÃO PODE… SAKURA! CADÊ A SAKURA?

— A gente teria sido feliz, né? Se eu tivesse ficado… Tivesse voltado com a Aiko…

— CADÊ A SAKURA? - gritou ao aluno, que ainda estava a dezenas de metros deles. Sasuke deu meia volta e, conjurando o Susanoo, abriu asas, em voo. Kakashi entrou em pânico, o peso na mulher apoiado em seus braços servindo-lhe de relógio. E se o Uchiha não voltasse a tempo com Sakura?

— Kakashi… - Nana o chamou, mas ele a cortou.

— Não fala, Nana, fica quieta… A Sakura tá…

Me ajuda a levantar? - ela pediu. Por um segundo, ele apenas a encarou. Poderia, durante aquele tempo, dizer que não, não ajudaria. Que ela precisava ficar quieta, poupar energia. Que ficaria tudo bem, mas ela precisava se comportar. Contudo, não pode… Esquecera-se por um momento, mas a realidade da batalha o atingira como uma bala de canhão no pedido de Nana. Ele piscou e algo quente lhe escorreu pelas bochechas. À sua frente, viu a mulher sorrir, fraca - Não posso deixar ele viver…

— Eu faço…

— Eu prometi… - a kunoichi respondeu, tomando impulso para se levantar. Kakashi, a contragosto, ajudou. Puseram-se de pé e fitaram-se. O Hatake estava mal. Podia facilmente desmaiá-la ali, impedindo-a de ir, completando o serviço ele mesmo.  Mas nada fez, apenas a encarava. Sendo sincero, não sabia o que fazer - Pare de chorar, Kakashi, você não é criança… - zombou a mulher, secando o rosto do Hokage com as costas da mão. Ele segurou a mão dela por um momento, fechando os olhos, sentindo o toque.

Me perdoa…— implorou, incapaz de conter as lágrimas - Me…

— Não é sua culpa, Kakashi… - ela sussurrou, debilmente - A Aiko está bem, é o que importa… Fica bem, tá? Cuida dela…

Ele não abriu os olhos. Não soltou a mão dela. Nem quando o chamou, pelo nome, e expirando as palavras como um sopro muito fraco, completou:

— Não chora, você é um ninja, é o Kage… Me desculpa… Aishiteru.

A mão dela se soltou da dele e ela partiu. Kakashi abriu os olhos no segundo seguinte, observando-a voar vinte metros acima de sua cabeça, três corpos vivos sendo conduzidos por ela mesma para algo próximo à altura em que estava. Os braços dos homens estavam colados ao tronco, as pernas presas uma a outra. Foram três raios, três miras, três acertos, três quedas. O da ponta encontrara o chão carbonizando, os gritos tão altos que se sobrepunha ao som da luta entre os exércitos, ali ao lado. Não era fogo comum o que o consumia. Nana prometera a ele o pior castigo. Os dois restantes jaziam inertes, desacordados, talvez mortos, próximos ao que gritava.

Já Nana, caia sem força para amortecer, para lutar. Para viver.


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Notas finais do capítulo

Mina-san, primeiro, antes de qualquer coisa, me desculpem. Por favor.
A ausência de posts não foi proposital, logicamente, mas compreendo se estiverem chateados, bravos, muito bravos, bravíssimos!, comigo... Me enrolei muito com o fim do semestre da facul, projetos, tcc (coisas que não param durante as férias =[ ) e não consegui tempo ou inspiração pra escrever. Fiquei mais de 30 dias sem adicionar uma palavra ao capítulo e, mesmo hoje, com ele pronto, posto-o sem estar satisfeita com o resultado final.
Não sei quando será o próximo post, sendo sincera, mas tentarei ser breve. Faltam entre 3 e 5 capítulos para a fic acabar (o enredo do fim está decidido, falta apenas escolher como o escreverei) e, assim, peço por favor para não me abandonarem (mesmo não tendo mais o direito de pedir coisa alguma, né?). Comentem, please. Digam o que estão achando, se estão muito bravos, se me perdoaram (*carinha de cachorro sabendo que apontou*). Mas comentem, por favor. Estamos na retal final, final, já to vendo a bandeirada. Então, se você, caro leitor gasparzinho, nunca comentou, sinta-se em casa e comente, please!

Muito obrigada por lerem, muito obrigada pela paciência e, mais uma vez, desculpa...

Comentem, please!
Kissu, kissu!



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