Equilíbrio escrita por Huntress


Capítulo 2
Outro alguém.


Notas iniciais do capítulo

Eu postei mais cedo do que o planejado, pois eu tive tempo de sobra para escrever. Aproveitei isso da melhor forma que pude. Dei o texto para algumas pessoas revisarem e me disseram que ficou bom. Sinceramente, também estou satisfeita com o trabalho. Espero que gostem.



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Gritos podiam ser ouvidos por todos os cantos. Soavam a desespero e cortavam o ar como facas afiadíssimas. Seus ouvidos doíam ao ouvir tantos berros agonizantes e sua imaginação ia longe para tentar prever tamanha tortura: peles arrancadas inteiriças de corpos humanos maltratados e vivos; choques de milhares de volts em pessoas despreparadas para tal; aplicação de ferro quente em derme sensível ao calor, como se fossem marcar animais em seu pasto.

Tudo que ocorria naquele local era maléfico e horripilante. O medo criado por simplesmente estar pisando na mesma terra que tão sádicas criaturas parecia alimentá-las – haviam shows de horrores que pareciam deliciá-los enquanto irmãos viam outros tendo suas cabeças esmagadas por bigornas extremamente pesadas.

“Cave, Sofia, cave!”, Bill bradou para a garota loira e ensanguentada à sua frente. O homem parecia apressado – sua pele era composta por pedras-sabão e seu largo sorriso era assombroso. Parecia mais uma gárgula humanoide do que qualquer outra criatura. Seus chifres eram pontiagudos e suas asas de morcego davam a ele a aparência de que acabara de sair de algumas das pontes de castelos medievais literários; porém havia músculos em sua construção corporal, como se ele pudesse exercitá-los com o passar do tempo, embora fosse composto de material não-moldável.

A picareta nas mãos da adolescente pesava mais do que vinte quilos de chumbo e seu cansaço era visível. As pálpebras pareciam querer despencar por cima de seus orbes azulados – já trabalhara por doze horas, pelo que percebera, e queriam que cavasse mais rápido, mais fundo, para um lugar desconhecido e se meta. Seus braços estavam fracos e a cobrança deixava-a ansiosa.

O estômago rosnava de fome e sua situação corporal não era muito agradável. Os cortes que fizera, acidentalmente, em suas costas ao tentar levantar seu instrumento de trabalho da forma errada, por muitas vezes, ardiam como se tivessem a deitado em brasa e a forçado a se esfregar por ali.

Suspirou pesadamente quando ele colocou a mão em um de seus ombros depois de cerca de dez minutos de trabalho cansativo e forçado. Aquele era o sinal, já aprendera, de que ele estava satisfeito com o tempo que havia gasto para abrir um buraco no chão por absolutamente nada que ele pudesse explicar. O seu único toque carinhoso era quando seu esforço estava terminado – aquilo enchia-a de energia suficiente para andar uns treze quilômetros até a área das celas, onde era mantida com os outros.

“Está dispensada, Sofia.”, seu hálito pôde ser sentido mais uma vez. Amedrontada, segurou a respiração, temendo a proximidade. Depois de tanta angústia causada pelo rapaz, momentos e movimentos afetuosos não poderiam significar coisa boa, ainda mais em um local como aquele – sentia-se no seu Inferno particular, sem saber que lugar poderia ser tão ruim quanto um em que mergulhavam pessoas em óleo quente por pura diversão.

“Obrigada, senhor.”, o homem era para ser seu tutor de trabalho. Basicamente, era ele quem mandava e desmandava em seus ofícios e projetos. De alguma forma, ele havia pensado que abrir uma fossa no chão era uma boa ideia. Trabalhavam em locais separados de outros escravos, mas também não houvera resposta quando perguntara o porquê. Os gritos só começavam quando amanhecia; o silêncio era profundo enquanto caminhavam para perto e para longe do buraco.

Seguia um ritmo de submissão – quando chegara ali fizera um trato com a estátua-viva: se o obedecesse sem reclamações receberia comida e água ao final do dia. Sua figura loira vinha emagrecendo com o passar das semanas, mas ao menos não tinha os mesmos problemas com a fome que seus colegas de prisão. De alguma maneira, percebera que era especial para alguma coisa dentro daquele ambiente macabro.

Daquela vez, andou sozinha até os dormitórios. O tutor havia-a dispensado de forma silenciosa e, quando pensara que teria sua companhia assustadoramente reconfortante no meio de tanto horror, ele caminhara em direção contrária sem palavras ou discursos quaisquer.

Sua cela era solitária e vazia – não havia muito mais que uma pedra pouco acima do chão de terra, onde se deitava para dormir todas as noites, ou no que suspeitava que fossem noites, pois o fogo sempre queimava e o Sol nunca nascia, e um vaso sanitário que raramente utilizava, por não sentir vontade. Sua condição física fora modificada por alguma coisa que lhe haviam dado no início de todo aquele processo. Um início do qual não se lembrava.

Banhos ou quaisquer práticas higiênicas eram ignorados; a podridão deles, com certeza, fazia com que o odor dos humanos parecesse mínimo. O que seria suor no meio de carne em putrefação, enxofre e sangue? Absolutamente nada.

Contou mais um anoitecer, riscando, com o próprio sangue, uma das paredes. Não passavam de onze linhas vermelhas, mas se fossem vistos como dias, seriam vistos como uma eternidade. A presença e a visão de tantas torturas a inocentes poderiam ter lhe matado, não fosse pela expectativa de um dia conseguir sair daquela muralha de atrocidades.

Deitou-se em sua cama gélida e dura, sem conseguir buscar na memória a informação se algum dia já havia tido acomodações melhores. Para ser franca, não tinha recordações de grande parte de sua vida – ou quase nada que não fossem os últimos dez dias. Deram-lhe um nome novo e designaram-lhe funções para as quais nunca fora treinada. Colocaram-lhe em situações constrangedoras e traumáticas. E então sentiu nojo pela primeira vez.

Demônios a rodeavam. Criaturas horrendas a vigiavam, sem deixa-la fugir, como se a errada em toda aquela história fosse ela e não os monstros que a sequestraram; pelo menos era isto o que pensava sobre o ocorrido, afinal, nunca andaria até um local daqueles por própria vontade, sabendo ou não do que acontecia por ali.

Fechou os olhos, tentando dormir, embora tivesse a sensação de ser observada a cada instante. Sua mente enchia-se de medo e seu corpo paralisava-se por completo. Já havia acontecido anteriormente, mas nunca com tamanha força. Seus cortes ardiam e as marcas das chibatadas que havia recebido mais cedo queimavam, mas não conseguia gritar – dor, desespero e raiva uniam-se em um só sentimento. Porém nada seria expresso, pois não podia se mover; não podia respirar.

Sensações ruins lhe percorriam a alma e o físico por completos, mas cada ponto de si sentia-se seguro. Havia medo, mas não existia nada a se temer. Dedos gélidos percorreram por sua pele, deixando a derme fria e arrepiada, porém não sentia maldade naquele ato, pois não via maldade no dono de tais.

Seus pensamentos forçavam-na a pensar naquele ser macabro que punha-se acima de si todos os dias como a Morte, mas seu subconsciente repetia que, embora o olhar do Ceifador fosse tão assustador quanto o daquele homem, o Senhor das Almas não possuía deformações tão sinistras em sua face.

Devia ser outro alguém.


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Notas finais do capítulo

Bem, este capítulo foi a introdução real da história. A personagem principal é a Sofia, se ainda não perceberam. Alguém tem alguma ideia de onde ela possa estar?
Para quem tem dúvidas sobre o que é paralisia do sono, recomendo que leiam isto:
É quando o cérebro acorda, mas os músculos não, e você não consegue se mexer. Ela acontece quando a pessoa desperta durante o REM - a fase mais leve do sono, que ocorre várias vezes durante a noite. No breve período de paralisia, que dura apenas alguns minutos, a pessoa acorda e fica completamente consciente de si mesma e de seus arredores, mas seus músculos permanecem dormentes. Por isso, é incapaz de se mexer. Apesar de causar uma sensação aflitiva, o problema não deixa sequelas e é bastante comum. Cerca de 7,6% dos pesquisados disse ter experimentado-o pelo menos uma vez na vida. Entre estudantes, a porcentagem de casos relatados aumenta para 28,3%. Alguns casos também são citados como imediatamente antes de adormecer.
Comentem aí.



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