A Lenda dos Sete escrita por Lótus Brum, Martins de Souza


Capítulo 22
O Fogo e o Rato


Notas iniciais do capítulo

" No meio da chama, que já havia consumido para além da porta, uma figura humana se formava. Não tinha feições, era um corpo humano feito de fogo, mas a figura tinha olhos. Olhos de luz amarela, que brilhavam mais do que o fogo que já consumia quase todo o gabinete da Cavaleira. "



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Enquanto Anne vivia suas desventuras, envolvendo florestas sombrias, vilarejos desconhecidos e goblins macabros; Lillian estava em Balran, fazendo seu serviço, o melhor que podia. Afinal, manter a ordem na “Cidades dos Ladrões” não é o mais simples dos trabalhos. Por exemplo, se tivéssemos aqui uma Bola de Cristal que mostra todos os acontecimentos do mundo, veríamos ela em seu gabinete, tendo um diálogo um tanto chamativo.

— E como vou fazer para trabalhar em paz, se esses molequinhos continuam me roubando?! — gritou o padeiro, que havia sido roubado recentemente.

— Senhor — a Loira tinha um tom apaziguador —, tente entender. Estamos fazendo o melhor possível, mas há crimes maiores para impedir, ladrões maiores para prender.

— E por causa disso, você vai deixar aquele bando de ranhentos me roubar todo o dia?! — ele bateu na mesa. — Se for assim, eu mesmo vou dar um jeito nessas pestes!

— Senhor, se fizer isso seremos obrigados a prendê-lo — falou a Loira.

— Me prender?! Agora, em vez de prender esses desgraçadinhos, vai me prender?! — ele deu uma risada sarcástica. — Mas que belo trabalho você está fazendo para essa cidade. Quer uma dica, mulher? — e quando disse isso, se aproximou dela, como se estivesse se certificando que ela ouviria. — Volte para seu lugar, na cozinha de um homem, e deixe um Cavaleiro de verdade assumir seu posto. Talvez ele faça direito o seu trabalho.

Ela apenas franziu o cenho, mas aquilo foi suficiente para o padeiro sentir-se o alvo de toda a ira do mundo. Era como se o olhar frio da mulher englobasse todo o ódio da terra ao redor dele.

Lentamente, ela levantou-se. Não usava sua armadura completa, mas sua espada estava embainhada, presa a cintura, pronta para partir qualquer um em dois. Caminhou até o lado do padeiro e pousou a mão em seu ombro. Esse, arrependido de suas palavras, olhou para ela coberto de medo. Cale a boca garoto burro, se fosse você lá, borraria as calças.

— Escute, senhor padeiro — ela começou. — Eu realmente não suporto o tipo de vocês, que falam demais sem pensar, e no final acabando defecando pela boca. — Sua mão apertou o ombro do homem com tanta força, que ele curvou o corpo para o lado apertado, dando gemidos, sem encontrar palavras para serem ditas. — Você realmente acha, que é o único, o único, a vir aqui para reclamar de furtos? O único, que tem problemas com bandidos nessa cidade? — ela ergueu o homem da cadeira, e foi levando-o a força até a porta. — Se é assim, aconselho que vá embora e volte outro dia. Aproveite esse tempo para repensar seus conceitos, e então me volte com seus pedidos.

Ela não deu nem tempo do padeiro responder. Abriu a porta e praticamente jogou-o para fora do gabinete. Os dois guardas que faziam a guarda do cômodo do lado de fora riram, enquanto o homem desajeitadamente se levantava, e saia correndo pelo corredor, buscando a saída. Sem dizer mais nada, a Loira bateu a porta e voltou para sua cadeira.

Suspirou, o apertado cômodo que estava ficava numa torre, no Castelo de Balran. Só podia ser acessado por uma ponte que servia de corredor, já que ela era toda de pedra polida, coberta em cima e nos lados por essa mesma pedra. Não havia janelas nesse corredor, apenas tochas. O único contato com o meio exterior era um pequeno buraco quadrado, que tinha uma vista direta para os portões da cidade. A porta desse gabinete era grossa, de madeira tão resistente quanto o aço. Era praticamente um forte aquele pequeno lugar, e era essa a função dele. Se houvesse algum ataque, era para ali que todos os nobres presentes em Balran deviam se dirigir, onde seriam protegidos pelos soldados mais fortes da cidade.

Mas não haviam mais nobres em Balran, pelo menos não o tipo “normal” de nobres, pensou Lillian, com os pés apoiados sobre a mesa, enquanto olhava para o braseiro ali no cômodo. Só restavam cinzas nele, naqueles dias de verão, não era necessário acendê-lo. Ficou ali em silêncio, olhando para o objeto, quase se perdendo no tempo. E quando se perdeu, sua mente viajou.

Começou com uma pequena chama se acendendo no meio das cinzas, uma pequena brasa que voltava dos mortos. Tremulou fraca, e Lillian estranhou o surgimento repentino dela, mas não protestou. Talvez se dissesse que aquilo era impossível, a pequena e graciosa chama que lutava tanto para sobreviver perceberia que a mulher falava a verdade, e deixaria de existir. E como a Loira não disse nada, o pequeno fogo continuou ali, tremeluzindo.

E daquele pequeno milagre, mais outros surgiram a partir dele. Começaram a queimar por toda a cinza no braseiro, até serem uma única e grande chama avermelhada. A Cavaleira prosseguiu sem dizer nada, e o fogo saltou do braseiro para o chão de madeira, e começou a queimá-lo. Não demorou a incendiar metade do cômodo, e só então Lillian percebeu o perigo em que se encontrava. Levantou da cadeira com o medo e a pressa em seu rosto, avançando na direção da porta. Trancada, mas ela não havia feito isso, então quem o fez? Não importava agora, ela tinha que escapar de alguma maneira, pois o fogo já estava querendo avançar e consumir o que restava. Ela recuou, encontrando a parede nua e a pequena janela. Olhou para fora, e sentiu medo. Balran não existia mais, tudo estava morto. A única vida existente era a dos corvos que bicavam os restos dos mortos. A loira olhou para o fogo, e levou outro susto.

No meio da chama, que já havia consumido para além da porta, uma figura humana se formava. Não tinha feições, era um corpo humano feito de fogo, mas tinha olhos. Olhos de luz amarela, que brilhavam mais do que o fogo que já consumia quase todo o gabinete da Cavaleira. O ser ergueu a mão e soltou uma espécie de gemido, que transformou-se numa palavra que pareceu ecoar.

Alenvia — disse o estranho ser, e então sua mão de fogo envolveu o pescoço da Cavaleira.

A dor da queimadura invadiu-a imediatamente. Ela tentou gritar, mas parecia que alguém havia roubado sua voz. Quando seus olhos se focaram outra vez nos olhos brilhantes, viu soltar outro gemido que transformou-se em palavras distintas.

Alenvia surad — a voz do monstro de fogo era coberta de melancolia, e de uma dor tão profunda, que ela sentiu pena. E de alguma forma, a criatura percebeu isso, e irou-se. Soltou palavras com o ódio mais puro que Lillian já presenciou em vida. — Lelaid geran, Alenvia! Lelaid, haurel! — e apertou o pescoço da mulher.

Ela estremeceu, sua visão foi escurecendo vagarosamente. A dor aumentava cada vez mais, e logo iria desmaiar. Então morreria, cairia nos braços frios da morte, isolada no meio do Escuro Eterno. Lá estava, já via o próprio Caçador de Almas ali atrás, no meio de todo aquele fogo. Um monstro, feito de um negro mais escuro que o da noite, com olhos vermelhos e brilhantes.

— Este é seu destino, se ir contra mim mulher — aquela era a voz do monstro negro, e parecia vir de todos os lados. — É o destino de todos que forem contra mim.

Lillian conseguiu ver o demônio negro se aproximar sem caminhar. Ele ergueu a mão e golpeou. Atravessou o coração da Loira, e ela viu os olhos vermelhos da besta a meio palmo de distância. E o reflexo daqueles dois brilhos vermelhos mostrava milhões de pessoas, torturadas com fogo e ferro, gritando todas as suas dores, até não terem mais o que gritar.

— Agora acorde, criança, e leve essa memória com você — e ela acordou.

Estava sentada, com os pés apoiados sobre a mesa, olhando para o braseiro. Não havia chama alguma nele.

— A cidade! — ela levantou-se e correu para a pequena janela. Lá fora, Balran continuava intacta, do jeito dela.

Ela botou a mão no pescoço, ainda podia sentir a mão de fogo. Olhou para trás, na parede do outro lado do cômodo havia um grande espelho. A mulher estava intacta, nenhum ferimento no pescoço, nem um ferimento no peito. Com as pernas bambeando, ela aproximou-se de sua mesa, onde apoiou as mãos.

— O que foi isso? — ela disse, depois de uns segundos. Percebeu que tremia e suava frio. — O que foi isso?! — ela gritou, cheia de medo. É aquele tal de Zen, ela pensou, desde que chegou, minha vida ficou cheia desses demônios!

A porta abriu, uma mulher de cabelos negros e pele clara entrou. Usava um vestido azul, e cabelo trançado. Lillian olhou para ela, e instantaneamente endireitou o corpo, assumindo sua expressão usual. Tomou mais um segredo para pigarrear e acalmar seus sentimentos.

— Iliet, pois não? — a Loira perguntou.

— Mais um querendo falar com você — disse Iliet. — Você devia aproveitar que tantos homens vem atrás de você para arranjar um pretendente. — Ela falou quase rindo, a loira não dignou-se nem a dar um sorriso.

— Não preciso de nenhum — ela forçou-se a dizer a palavra — pretendente. — E sentou-se em sua cadeira.

— Não devia falar isso — Iliet comentou, com outro riso —, sabe, há muitos homens por aí que não há olham como a mulher mais temida da cidade. Muitos teriam coragem de enfrentar o demônio para ganhar a princesa.

— Esse demônio eles não vão querer enfrentar — então percebeu sobre o que estava discutindo. — Afinal, quem é esse homem? Mande-o entrar de uma vez.

— Sim senhora — respondeu Iliet, e retirou-se do quarto.

Lillian voltou para seus pensamentos, olhando para um quadro perdido naquela parede fria. Nem percebeu quando a porta abriu, e ele entrou. A mente da loira voou, vagueando por pensamentos distantes.

— Está pensando no Zen, não é? — o visitante disse.

— É — a Loira respondeu, sem perceber o estranho falando.

— Ele foi bem heroico aquela vez, não é? — ele falou outra vez.

— É — respondeu novamente.

— E ele é bem bonitão, não é? — a Loira ia responder, mas então percebeu algo estranho.

— Mas o que? — ela olhou na direção do visitante e viu Zen, sentado, com um sorriso no rosto. — O que você está fazendo aqui?! — ela gritou. Zen tapou os ouvidos antes. — Eu não falei para ficar longe daqui?!

— Por que tanta raiva? — ele destapou os ouvidos. Agora tinha uma expressão de desinteresse.

— Porque você não consegue cumprir uma simples ordem! — ela gritou outra vez.

— Ei, não sou obrigado a seguir suas leis — ele respondeu, levantando-se. Caminhou até a pequena janela, olhando por ela. — Eu faço minhas próprias leis.

— Se quer ter um teto para dormir nessa cidade, vai ter que seguir as leis que eu mandar você seguir — ela respondeu. — Agora de logo o fora daqui, antes que Galbrei apareça e — foi interrompida pela porta abrindo.

— Que eu apareça, e o que? — o próprio Galbrei atravessou a porta, com seu nariz empinado. — Falava de mim, senhorita Lillian?

A Loira estacou, olhando assustada para o lorde. Será que tem alguma maneira nesse mundo, do Zen passar despercebido?, a loira pensou, mas suas esperanças se esvaíram quando o rapaz fez questão de se enfiar entre a loira e o lorde. Galbrei pousou os olhos nele, intrigado.

— E você é? — perguntou o nobre. Quando Zen ia responder, Lillian foi apressada pousar a mão nos ombros dele.

— Ele é ninguém! Senhor ninguém! Apenas um zero à esquerda! — ela tratou de ser rápida e empurrar Zen para o lado. — Tem algum assunto para tratar comigo, Lorde Galbrei? — deu um sorriso, tentando mudar o assunto.

O nobre olhou para Zen por mais alguns segundos, antes de pousar os olhos na Loira.

— Daqui a cinco dias, virá um membro da nobreza para cá — respondeu o lorde.

— Um membro da nobreza, Lorde Galbrei? — ela olhou-o intrigada.

— Sim Lillian, um membro da nobreza. E você deve preparar os guardas para recebe-la. — Disse com certo desinteresse.

— É uma mulher, Lorde Galbrei? — ela perguntou.

— Sim, sim, é uma mulher Lillian — respondeu ele, demonstrando tédio. — Agora, antes que me faça mais alguma pergunta. — Virou-se para Zen, que estava encostado na parede, com os braços cruzados. — Quem é você, rapaz?

Lillian foi rápida, e falou antes de Zen.

— Ele é um recruta — disse. — Vem de Carendal, é um sobrinho do Cavaleiro de lá.

— De Lendel? Não sabia que ele tinha um sobrinho — disse o nobre.

— Sim — ela deu um sorriso desajeitado. Por que ele sabe o nome do Cavaleiro de Carendal? Nem mesmo eu sei. — É de um irmão bastardo, que o pai teve com uma meretriz.

— Eu sou? — perguntou Zen, e a loira que tinha se aproximado dele pisou em seu pé. — Sim, eu sou! O titio Lendel foi muito bondoso em me enviar para essa posição — e deu um sorriso humilde, que foi acompanhado pelo sorriso da Loira.

Galbrei olhou para os dois, mas não demonstrou nenhum sentimento. Fez algo parecido com um pigarro, e então virou-se na direção da porta.

— Já gastei muito tempo com você, Lillian — falou caminhando. Parou antes de sair, virando o rosto na direção da Loira. — Que o pássaro seja eterno, Cavaleira.

— E eterno ele será, Lorde Galbrei. — Ela respondeu, e o nobre saiu pela porta. Só então ela suspirou.

Zen deu um assovio. A loira virou-se para ele, com uma expressão carregada de alívio.

— Me fale uma coisa — disse Zen. — Quando começo a trabalhar?

***

Foi depois do meio-dia, Loira e Zen caminhavam lado a lado pela cidade. Ela com os braços cruzados, ele com a mão na empunhadura da espada. A mulher não se sentia nada confortável com aquilo, e isso era raro. Preferia comandar um exército a ter que compartilhar a mesma rua com ele. E detestava o fato de que Zen parecia não dar a mínima para isso. Ou pelo menos, fingia que não dava.

— Não devíamos caçar alguns bandidos? — ele perguntou. — Você sabe, estapear umas faces, espetar uns traseiros.

— Não é assim que fazemos as coisas por aqui — respondeu a Cavaleira. — Não podemos bater em todos os bandidos, eles devem ser julgados.

— Eles não julgam a vítima antes de roubar dela — retrucou.

— Você não consegue ficar quieto, não é? — ela olhou-o de soslaio. Zen deu de ombros.

O silêncio entre os dois continuou durante longos minutos, onde Lillian olhava para todos os lados. Aquelas ruas estavam infestadas de criminosos. Em cada esquina, um assassino ou ladrão baixava a cabeça quando ela passava, mas soltava impropérios assim que ela os dava as costas. Talvez seu acompanhante estivesse certo? Que mal faria retalhar todos aqueles criminosos? É o preço que eles pagam por sua vida de crimes. Talvez... ela afastou esse pensamento com um balançar de cabeça. A voz de Zen chamou sua atenção.

— Lillian — a Loira inclinou levemente a cabeça, demonstrando estar ouvindo. — Viu Rey recentemente? — a Loira olhou-o de soslaio, e então voltou a olhar para frente.

— Pensei que ele passasse o dia todo com você — respondeu a mulher.

— Ele sumiu — disse o Zen. Vendo que a Loira não falaria nada, prosseguiu. — O vi falando com dois homens num beco, anteontem.

— É mesmo? — parecia não prestar atenção no que ele falava.

— Um era meio estranho, vestido com trapos, e tinha os cabelos ralos — disse. — E ele tinha uma cara de rato.

A Loira parou, olhando-o por cima dos ombros. Zen parou também.

— Você disse cara de rato? — Zen acenou com a cabeça. Lillian suspirou, fechando os olhos. — Certo, vamos lá. — E seguiu caminhando.

— Vamos lá onde? — Zen apressou o passo para acompanha-la.

— Ver o Jaene — respondeu a mulher.

— Jaene? Quem é Jaene?

— Um informante meu — e então olhou para o Zen. — Escute, você não vai falar nada quando encontrarmos ele, entendeu?

— Perfeitamente.

Lillian bufou, seguindo seu caminho pelo meio dos moradores. Jaene Cara de Rato, era assim que Lillian chamava aquele mequetrefe, pilantra, desgraçadinho de uma figa. Ele era o pior tipo de pessoa, fazia qualquer coisa por dinheiro, talvez até vendesse a própria mãe se o pagassem bem. Na verdade, alguns dizem que ele fez isso.

De qualquer forma, ele batia perfeitamente com a descrição do homem que foi falar com Rey, e se ele estava metido nisso, algo bom não era. Vejam, lá está ele, encostado numa casa aos pedaços. Podem vê-lo? Não? Então imaginem-no.

— Lillian, a Cavaleira — falou com uma voz cheia de segundas, terceiras, quartas, centenas de intenções. — Resolveu lembrar dos pobres?

— Não perco tempo com as pessoas da sua laia, Rato — ela agarrou o homem pelo colarinho. Moveu para o lado, e bateu-o com força contra a parede da casa, largando-o para cair no chão. — Tenho perguntas.

Ele começou a rir, enquanto caído no chão. Tinha olheiras avermelhadas e uma pele bem pálida. O cabelo ela preto e sujo, e de seus dentes de cima, só restavam os dois da frente. Suas roupas, assim como tinha dito Zen, eram trapos remendados, de várias cores.

— E quando — disse entre a risada —, e quando você não tem? — e levantou-se, apoiado na casa. — Você esquece de mim por um ou dois meses — ele estralou o pescoço. — E então volta para me bater e fazer perguntas.

— Temos um trato, Jaene — disse Lillian.

— Então você não está cumprindo sua parte — retrucou o bandido. — Os seus guardas tem sido bem violentos comigo. Será que você não consegue controlar seus cachorrinhos? — tomou um soco no estômago, que o fez recuar uns três passos, curvado com as mãos na barriga. Voltou a rir, enquanto erguia o tronco. Então percebeu Zen. — E esse aí? É seu namoradinho? Você deve ser bem corajoso para enfrentar isso aí.

A loira adiantou-se na direção dele, puxando uma adaga. O empurrou contra a parede da casa e pôs a adaga no pescoço do bandido, enquanto sua expressão era tomada por fúria.

— Eu não vou falar duas vezes, seu Rato, então é bom responder minhas perguntas — ela apertou a adaga contra o pescoço dele.

— Então é bom que você cumpra sua parte do trato, Cavaleira — ele respondeu, de forma quase grunhida. Mas isso não bastou para causar qualquer mudança no rosto da loira. Ele riu outra vez, mostrando os dois dentes sozinhos. — Eu vou falar, eu vou falar. Eu só estava brincando.

Ela o jogou para o lado, fazendo Jaene cair sobre uma pilha de lixo. O maltrapilho levantou-se, estapeando as roupas, enquanto a loira guardava a arma. Zen observou tudo com certo desinteresse.

— O que você quer saber? — ele deu um sorriso para a mulher. Era realmente desgostoso vê-lo.

— Rey, já ouviu esse nome? — ela cruzou os braços

— Oh... Esse nome eu conheço, Rey — ele deu uma risada. — Vocês encontraram ele? Andou sumido.

— Segundo meu amigo, foi você que encontrou ele — indicou com a cabeça o Zen, logo atrás dela.

— É? Talvez eu tenha visto — a loira fez menção de pegar a adaga outra vez, e o bandido ergueu os braços em sinal apaziguador. — Calma, calma aí com essa lâmina. Eu vi o moleque, anteontem.

— E o que você fez com ele, Rato? — ela se aproximou do maltrapilho.

— Eu? Nada. Já o chefe, ai não tenho como saber — respondeu.

— Chefe? — se aproximou outra vez.

— Não tá sabendo? Tem um chefe na área agora, ele que manda em todos nós aqui em Balran — disse, dando outra risada. — Chegou do nada, e dominou as três áreas do dia para a noite. Você tinha que ver quando ele esquartejou o Dalin e deu para os cachorros comerem.

— E quem é esse chefe? — aproximou-se mais um passo.

— Eu não sei — Jaene recebeu um soco no rosto que o jogou no chão. Quando percebeu, a Loira já tinha uma adaga em seu pescoço. — Eu não sei, merda! Eu nunca vi ele! O rosto está sempre escondido por uma máscara, e anda protegido por guarda costas onde quer que vá!

— É mesmo Rato? Você não está parecendo convincente para mim — ela apertou a adaga contra o pescoço do bandido, tirando um fio de sangue.

— E quer que eu diga o que, mulher?! Que eu minta?! — ele gritou para a Loira, ignorando a adaga. — Por que não vai perguntar para aquele novato que chegou na cidade?! Pelo grupo que ele está montando, só posso acreditar que ele veio para derrubar o chefe!

A loira ergueu uma sobrancelha, demonstrando dúvida.

— Que novato? E é bom que fale a verdade, Rato — ela falou em tom de ameaça, mas aquele bandido não ligava para ameaças.

— Tá, tá, tá, vá para os demônios Loira. — Ele tentou se mover, mas a adaga era realmente um empecilho. — Escute, dá para tirar essa adaga do meu pescoço? É difícil falar quando se tem uma arma pronta para te matar.

A loira olhou-o durante alguns segundos, e então voltou a arma para a bainha, recuando alguns passos. Jaene levantou-se em seguida, passando a mão no sangue, esfregando-o nos dedos.

— É um tal de Danon, Deimon, não tenho nem ideia qual é o raio do nome dele — a última vez que soube, ele estava procurando uma mulher.

— Mulher? Que mulher? — Lillian cruzou os braços outra vez.

— Meryd... Meryn... Meryna! — lembrou-se enfim. — É esse o nome que chamam ela, mas nunca vi nem ouvi falar dela.

— Meryna é? E esse grupo desse Caçador, quem está nele? — o Rato deu outra risada. Ela detestava aquelas risadas.

— Ele andou pelos bordéis perguntando pela Megera de Ferro, e nas mesas de jogos procurando um tal de Azarado, que vem lá de Haurun — mais uma risada. — Você lembra da Megera de Ferro? O corte que você deixou nela foi bem feio.

— Sim, eu lembro dela Rato — retrucou a Loira. — Sabe onde posso encontrar esse tal de Danon?

— Um moleque de rua desses aí me disse que ele estava indo para as bandas do Sepulcro da Serpente. Estava atrás de alguém para recrutar por lá.

A Loira estacou, e pareceu ficar tão pálida quanto a neve. Sepulcro da Serpente? Não pode ser, pensou, tentando afastar a ideia. Afinal, se fosse mesmo o que ela estava pensando, as coisas podiam dar muito errado.

— Então, acabou as perguntas? — Jaene interrompeu os pensamentos dela. A Loira olhou e soltou um suspiro.

— Não fuja de Balran, Rato. Ou vou te caçar, e te matar — e apertou a empunhadura da espada.

— Pode deixar, chefia — respondeu o Rato, dando uma risada.

A loira soltou outro suspiro, e então voltou-se para trás. Olhou Zen, e reparou que seu olhar parecia perdido, e seu cenho estava levemente franzido. Mas o que é agora?

— Zen? — o rapaz continuou com o olhar vago. — Zen! — ela gritou, e Zen tomou um susto, saltando para trás. — O que há com você?!

— O que há com você! Me assustando desse jeito! — ele botou a mão no peito. — Eu quase tive um infarto, sua maluca!

Ela balançou a cabeça, em negação. Continua um imbecil, pensou, e então olhou Jaene por cima do ombro, que observava os dois com certa dúvida no olhar.

— Circulando, Rato — disse ela, e ele atendeu prontamente.

Saiu correndo pelo meio das pessoas, meio curvado, quase igual um rato. Não demorou e já tinha desaparecido em um beco ou viela qualquer. Zen ficou com os braços cruzados, logo ao lado de Lillian, que mantinha seus braços na mesma posição dos do Atormentado.

— Depois dessa — comentou o rapaz —, vou pensar duas vezes antes de fazer gracinhas com você. — A loira deu uma risada, coisa rara, pensou ele.

— É bom mesmo que pense — e seguiu caminhando, com os braços cruzados. Parado no mesmo lugar, Zen perguntou.

— Onde está indo? — ela olhou por cima do ombro na direção dele, sem parar de caminhar.

— Encontrar esse tal novato na cidade — respondeu. Zen foi logo atrás dela.

— E quanto ao Rey? — perguntou.

— Acredite, se esse Denon está atrás de quem estou pensando, o alvo dele vai poder nos dizer onde está o Rey — falou, sem diminuir o passo.

— E quem é esse alvo, afinal? — perguntou Zen, apressando o passo para ficar ao lado da mulher.

Ela olhou Zen por um instante, mantendo o silêncio. E quando voltou a olhar para frente, disse:

— Um demônio intocável.


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Notas finais do capítulo

Desculpem o atraso pessoal! Demorou mais do que o normal para fazer esse capítulo! Espero que apreciem!
~ Ookuna



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